Procuradoria-Geral Distrital de Lisboa
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    Sumários do STJ (Boletim) - Cível
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ACSTJ de 10-07-2008
 Acção inibitória Cláusula contratual geral Nulidade Cartão de crédito
I -À luz do art. 22.º, al. b), do DL n.º 446/85, de 25-10, é inválida a estipulação que permite ao Banco predisponente “cancelar o cartão sem qualquer pré-aviso em quaisquer situações que impliquem para o emitente o risco de não ser ressarcido dos montantes em dívida decorrentes da utilização do cartão”.
II - São abusivas as cláusulas nos termos das quais os extractos da conta-cartão constituem documento de dívida do titular ao Banco , “que se considera exacta se não for recebida qualquer reclamação por escrito no prazo de 10 dias” por consubstanciarem ficções de recepção e aceitação e implicarem um desequilíbrio das posições contratuais, dificultando ao aderente o exercício dos seus direitos em diferendos que possam vir a surgir, desde logo por não acautelarem a necessidade do efectivo conhecimento pelo mesmo do teor dos avisos expedidos para efeitos de contagem do prazo de reclamação -cfr. art. 19.º, al. d), do DL n.º 446/85.
III - Já as cláusulas nos termos das quais o Banco fica autorizado a debitar, mediante aviso prévio, qualquer outra conta do titular existente no mesmo Banco desde que não exista provisão na conta que foi expressamente indicada na proposta de adesão, pois não se pode considerar que tais cláusulas ficcionem uma manifestação de vontade do consumidor de autorização de compensação, antes contendo uma antecipada, mas expressa, autorização à compensação, não infringem o disposto no art. 19.º, al. d), do DL n.º 446/85.
IV - A cláusula nos termos da qual o contrato “poderá ser resolvido (…) mediante comunicação escrita enviada ao titular, a qual se presume recebida por este no 3.º dia posterior à sua expedição postal” estabelece uma presunção de recepção que é aceitável, pois vem estabelecido no contrato em causa a obrigação do titular manter actualizado o domicílio, sendo de prever para um cidadão medianamente diligente que providencie pela recepção oportuna da correspondência em caso de ausência temporária do domicílio.
V - Infringe o disposto no art. 21.º, al. f), do DL n.º 446/85 a cláusula nos termos da qual “caberá ao titular a responsabilidade pela não execução ou pela execução defeituosa de uma operação, excepto nos casos de eventual recusa de autorização…”, pois, como é evidente, constitui uma alteração das regras legais sobre o risco, ficar o banco isento de assumir risco algum pela não execução de uma operação que faz parte do serviço que se obrigou a prestar.
VI - Não é abusiva a cláusula nos termos da qual o Banco se reserva o direito de alterar as condições gerais do contrato, mediante aviso prévio de 15 dias ao titular, podendo este rescindir o contrato caso discorde das alterações, ficando com o direito de reaver a anuidade paga na parte proporcional ao período decorrido.
VII - Não infringe as regras do ónus da prova a cláusula que estabelece manter-se a responsabilidade do titular do cartão até à entrega do mesmo ao Banco, em resultado da ordem de cancelamento, pois com esta apenas se pretende vincar que até à efectiva consumação do acto de cancelamento o titular continua vinculado aos deveres impostos pelo contrato.
VIII - É proibida por lei, por implicar uma desresponsabilização da predisponente de deficiências de ordem técnica e de aspectos ligados à normal execução da prestação a seu cargo a cláusula nos termos da qual o Banco “não pode ser responsabilizado pela não aceitação do cartão em qualquer estabelecimento (…) por quaisquer anomalias de natureza técnica ou operacional verificadas nos terminais de pagamento imediato”.
IX - A cláusula segundo a qual “em caso de divergência quanto aos valores constantes das facturas e dos registos magnéticos de utilização em caixas automáticas, o ónus de prova recai sobre o titular do cartão” é inaceitável, por alterar em desfavor do aderente os critérios de repartição do ónus de prova (al. f) do art. 21.º do DL n.º 446/85), conferindo aos registos magnéticos um valor probatório que a lei não lhes confere, enquanto meros documentos particulares e dessa forma sobrecarregando o utilizador com um ónus que o desfavorece na relação contratual.
X - É também abusiva a cláusula que faça reportar o início de um prazo para reclamação do extracto de conta a partir da própria data da emissão do aviso postal, pois implica uma ficção de recepção, eximindo-se de responsabilidades no caso de extravio postal.
Revista n.º 495/08 -6.ª Secção Cardoso de Albuquerque (Relator) Azevedo Ramos Silva Salazar