ACSTJ de 01-07-2008
Gravação da prova Reapreciação da prova Duplo grau de jurisdição Falta de fundamentação Princípio da imediação Alegações de recurso Junção de documentos Poderes do Supremo Tribunal de Justiça
I -Foi intenção do legislador, aliás expressamente confessada no relatório do DL n.º 39/95, de 1002 (e claramente expressa na letra da lei), criar um duplo grau de jurisdição em sede de matéria de facto, embora temperado pelo ónus, imposto ao recorrente, da delimitação concreta do objecto do recurso e da respectiva fundamentação, a fim de evitar a impugnação genérica da decisão de facto no seu todo. II - De facto, se a Relação deve reapreciar as provas indicadas pelas partes, o que, no caso de gravação dos depoimentos, passa, necessariamente, pela respectiva audição, podendo, inclusive, recorrer oficiosamente a qualquer outro elemento de prova que haja servido de fundamento à decisão sobre os pontos de facto impugnados -art. 712.º, n.º 2 -e, sendo-lhe ainda permitido ordenar a renovação dos meios de prova produzidos em 1.ª instância que se mostrem absolutamente necessários ao apuramento da verdade, quanto à matéria de facto impugnada (renovação que, naturalmente, se faz perante a Relação -art. 712.º, n.º 3), logo se conclui que a Relação há-de formar a sua própria convicção, no gozo pleno do princípio da livre apreciação das provas, tal como a 1.ª instância, sem estar de modo algum limitada pela convicção que serviu de base à decisão recorrida, em função do princípio da imediação da prova ou de qualquer outro. III - Assim, não obstante a importância do princípio da imediação das provas, que não se nega, não poderá, em função dele, limitar-se a Relação a procurar determinar se a convicção expressa pelo Tribunal de 1.ª instância tem suporte razoável naquilo que a gravação da prova pode exibir perante si, como, com demasiada frequência se tem vindo a decidir. IV - Diferentemente, o mecanismo legal que permite a reapreciação da prova pela 2.ª instância, implica necessariamente que a Relação, a partir da análise crítica das provas (sem limitação às indicadas pelo recorrente) forme a sua própria convicção (que pode ou não ser coincidente com a formada pelo julgador de 1ª instância), sob pena de não se mostrar viável qualquer controle efectivo ou real da decisão proferida sobre a matéria de facto, e de se converter o 2.º grau de jurisdição sobre matéria de facto, numa garantia meramente virtual. V - O STJ não pode apreciar se se verificam ou não os pressupostos exigidos pelo art. 706.º do CPC para junção de documentos com as alegações, por se tratar de matéria de facto da exclusiva competência das instâncias.
Revista n.º 191/08 -1.ª Secção Moreira Alves (Relator) Alves Velho Moreira Camilo
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