ACSTJ de 31-10-2006
Acidente de viação Matéria de facto Presunções judiciais Prazo de propositura da acção Prescrição Suspensão da prescrição Interrupção da prescrição Ónus de alegação Ónus da prova
I - Tendo a Relação presumido, de acordo com a normalidade das coisas, que o lesado ficou na própria data do acidente a saber do seu direito à reparação, tal presunção, não pecando por ilogismo, não pode ser sindicada pelo Supremo, sendo admitida à Relação atento o art. 351.º do CC, sabido que as presunções judiciais ou naturais têm por base as lições da experiência ou as regras da vida (quod plerunque accidit), deduzindo o juiz, no seu prudente arbítrio, de certo facto conhecido um facto desconhecido, porque a sua experiência da vida lhe ensina que aquele é normalmente indício deste. II - Competia à seguradora apenas arguir a peremptória da prescrição, alegando e provando a data do acidente, presumindo-se que foi nessa mesma data que o autor/lesado teve conhecimento do direito que lhe compete (mesmo que desconhecesse ainda a pessoa do responsável e a extensão integral dos danos - ut n.º 1 do art. 498.º do CC), sendo sobre o autor/lesado que incumbia o ónus da prova de que apesar de ter decorrido o prazo prescricional após o acidente quando intentou a acção, o seu direito não prescreveu (por o início do prazo da prescrição ter sido diferido para ulterior momento, ou por tal prazo se ter interrompido). III - De contrário, poder-se-ia estar a lançar sobre a ré/seguradora o intolerável ónus da denominada prova diabólica ou impossível. IV - Há naturalmente excepções à regra, justificando-se a suspensão da contagem do prazo da prescrição sempre que se constate uma situação que se possa classificar de força maior (v.g. o lesado ficou em estado de coma prolongado), mas então caberá ao lesado alegar e provar o respectivo circunstancialismo, por fugir à normalidade das coisas. V - Provado que se completou o prazo prescricional, qualquer facto que infirmasse a prescrição teria de ser provado pelo lesado como titular do direito indemnizatório, pois tal facto funcionaria como impeditivo da extinção do direito, como elemento constitutivo da existência e sobrevivência desse direito. VI - Relativamente à extensão dos efeitos da interrupção da prescrição, a regra tradicional é a de que tais efeitos se restringem ao direito e às pessoas em relação aos quais a prescrição é interrompida (limites objectivo e subjectivo da interrupção), cingindo-se a causa interruptiva da prescrição a interromper a prescrição dos direitos a que se refere, e não quaisquer outros, donde resulta que, se tal causa for a citação judicial ou qualquer outro acto interruptivo judicial, o direito cuja prescrição fica interrompida é o feito valer por esse acto.
Revista n.º 2596/06 - 1.ª Secção Faria Antunes (Relator) *Sebastião PóvoasMoreira Alves
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