Procuradoria-Geral Distrital de Lisboa
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    Sumários do STJ (Boletim) - Cível
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ACSTJ de 24-10-2006
 Direito de propriedade Direitos de personalidade
I - Provado que a construção efectuada pelo réu no seu prédio, priva a habitação dos autores, no seu lado poente, onde se situam quartos de dormir, da exposição normal e prolongada aos raios solares, para os autores serem titulares do direito à demolição a que se arrogam com base na violação do direito à saúde, protegido no n.º 1 do art. 70.º do CC, teriam de demonstrar que a privação da exposição normal e prolongada aos raios solares na fachada poente da sua habitação afecta as condições de salubridade do seu prédio, sendo de molde a causar-lhes problemas de saúde.
II - Não tendo os autores demonstrado que a exposição aos raios solares e o nível de luminosidade com que ficaram não garantam minimamente a sua qualidade de vida, no que respeita à pretensa violação dos seus direitos de personalidade, não pode senão a diminuição dessas condições que da construção do réu lhes resultou ser considerada como uma consequência normal e necessária da transformação lícita do prédio vizinho.
III - Não tendo o réu violado, com a construção efectuada, qualquer das disposições do CC que impõem restrições ao direito de propriedade (nomeadamente os arts. 1346.º a 1352.º, 1360.º, e 1362.º a 1365.º), tanto mais que, para além de os autores não beneficiarem sequer de qualquer servidão de vistas, nenhuma disposição existe que proíba o proprietário de fazer no seu prédio, construção que entrave, total ou parcialmente, a luz natural do prédio vizinho, ou retire, total ou parcialmente, as vistas até então fruídas - fora os casos de servidões -, ou que imponha uma distância mínima de 10,50 metros entre a nova construção e outra já existente, não se pode entender haver qualquer ilicitude na conduta do réu ao construir o novo edifício.
IV - O RGEU não se destina a proteger as construções anteriores à sua entrada em vigor, por ser manifesto que o que o legislador pretende é conseguir que todas as novas construções, mesmo as que venham a substituir as anteriormente existentes, satisfaçam os requisitos que ali prescreve, sem embargo de dessa forma originar também, reflexamente, benefícios para as construções anteriores.
V - Os direitos subjectivos dos particulares que o RGEU salvaguarda são apenas, em princípio, os de quem, após a sua entrada em vigor, proceda à construção ou reconstrução de edifícios, como bem se compreende: ao impor determinadas obrigações a quem, de futuro, construa ou reconstrua edifícios, é também a eles que reconhece, em compensação, de forma implícita, o direito de exigir de prevaricadores o cumprimento das respectivas normas se com o seu incumprimento ficarem lesados.
VI - Assim, não podem os autores invocar, em seu benefício, as normas do RGEU, que não têm por objectivo reconhecer-lhes direitos subjectivos nem conceder-lhes protecção aos seus interesses.
Revista n.º 2593/06 - 6.ª Secção Silva Salazar (Relator)Afonso CorreiaRibeiro de Almeida