ACSTJ de 14-01-2003
Contrato de trespasse Dever de informar Erro-vício Anulabilidade
I - No caso de dissimulação do erro, o dolo é irrelevante se o dever de elucidar o deceptor não for imposto pela lei, convenção ou pelas concepções dominantes no comércio jurídico. II - Não representam dolo as condições vagas e gerais usadas no comércio jurídico, mas já constitui dolo o engano específico, a dissimulação do erro que vá contra os deveres de lealdade e informação próprios da relação pré-contratual. III - A cláusula de boa fé contida no art.º 227, n.º 1, do CC engloba, no que aqui importa, os deveres de informação que obrigam as partes à prestação de todos os esclarecimentos necessários 'à conclusão honesta do negócio'. IV - O limite do dolo tolerado terá que ser harmonizado com a esfera de acção do respectivo art.º 227, do CC. V - A obrigação lateral da prestação de informação pode resultar da exigência da boa fé, exactamente em ligação com os usos do tráfico, com as excepções dominantes no comércio jurídico. VI - Comprovando-se nas instâncias que os recorrentes outorgaram como trespassários na escritura pública onde os trespassantes declaram entre o mais, 'serem donos e legítimos possuidores do estabelecimento comercial', existindo cláusula válida de reserva de propriedade do mesmos a favor de terceiro que veio a requerer a investidura na posse do estabelecimento, factos que os trespassantes omitiram aquando da escritura, ao actuarem desse modo, violaram os deveres acessórios de informação e de lealdade impostos pelo art.º 227, do CC, com óbvio relevo na formação da decisão de contratar. VII - Actuando do modo descrito em VI, os trespassantes actuaram com dolo ilícito, sendo o negócio anulável, nos termos do art.º 253 e 254, n.º 1, do CC.
Revista n.º 2155/02 - 1.ª Secção Pinto Monteiro (Relator) Lemos Triunfante Reis Figueira
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