Procuradoria-Geral Distrital de Lisboa
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I – A responsabilidade, principal e agravada, do empregador, prevista no artigo 18.º, n.º 1, da LAT, pode ter dois fundamentos autónomos: (i) um comportamento culposo da sua parte; (ii) a violação, pelo mesmo empregador, de preceitos legais ou regulamentares ou de directrizes sobre higiene e segurança no trabalho.II – A única diferença entre estes regimes reside na prova da culpa que é indispensável no primeiro caso e desnecessária no segundo. III – Mas ambos os fundamentos exigem, a par, respectivamente, do comportamento culposo ou da violação normativa, a necessária prova do nexo causal entre o acto ou a omissão – que os corporizam – e o acidente que veio a ocorrer. IV – O ónus da prova dos factos susceptíveis de agravar a responsabilidade do empregador cabe a quem dela tirar proveito, sejam eles os beneficiários do direito reparatório, sejam as instituições seguradoras que pretendem ver desonerada a sua responsabilidade infortunística. V – Em termos genéricos de segurança no trabalho, a lei privilegia as medidas de protecção colectiva, conferindo às medidas individuais natureza subsidiária e complementar, uma vez que aquelas se apresentam mais fiáveis, na medida em que estão a cargo exclusivo de uma única entidade – o empregador –, enquanto estas pressupõem a actuação colaborante – responsabilizante – de cada trabalhador. VI – Tendo-se o sinistrado, e um outro trabalhador, deslocado a um telhado (com a inclinação de cobertura de 10 graus e com a superfície seca), em vidro (clarabóia), no hall central de um Centro Comercial, a fim de substituir um vidro do mesmo que previamente havia sido retirado, sendo certo que a estrutura do telhado (em vidro) permitia que sobre ela se caminhasse – desde que junto às extremidades dos vidros, sobre a zona das calhas –, não era exigível ao empregador, à luz do corpo do artigo 44.º do Decreto-Lei n.º 41 821, de 11 de Agosto de 1958, a implementação de qualquer medida de protecção colectiva, de entre aquelas que o preceito enumera. VII – Porém, tratando-se da substituição de um vidro previamente retirado, de onde resulta que o sinistrado, e um outro trabalhador, iriam operar numa zona aberta e completamente desprotegida, mesmo desconhecendo-se as dimensões do buraco existente na cobertura (onde iria ser colocado o vidro), a referida operação exigia concretas medidas de protecção individual, que não se podiam reduzir ao uso de capacete e de calçado adequado que eram utilizados por aqueles trabalhadores. VIII – Ao não proceder assim, o empregador violou as normas de segurança previstas no § 2 do aludido artigo 44.º, na medida em que devia ter implementado a utilização pelos referidos trabalhadores de cintos de segurança providos de cordas que lhes permitissem prender-se a um ponto resistente da construção. IX – Todavia, não é possível estabelecer o imprescindível nexo causal entre a apontada violação e a produção do sinistro, na medida em que apenas se apurou que o sinistrado caiu através do local onde ele e o seu colega iriam colocar o vidro substituto, sendo que esse local se encontrava desguarnecido, porque os dois trabalhadores haviam retirado, pouco antes, o vidro danificado, desconhecendo-se a(s) razão(ões) concreta(s) da queda.
         Recurso n.º 3370/08 -4.ª Secção Sousa Grandão (Relator)* Pinto Hespanhol Vasques Dinis
 
I – O artigo 213.º do Código do Trabalho de 2003, tal como o artigo 238.º do Código do Trabalho de 2009, subordinados à epígrafe «Duração do período de férias», estabelecem, como regime-regra, uma duração variável para as férias, que podem cifrar-se entre 22 dias úteis e 25 dias úteis, conforme a assiduidade do trabalhador, sendo que a duração do período de férias é aumentada no caso de o trabalhador não ter faltado ou ter apenas faltas justificadas no ano a que as férias se reportam, nos termos previstos nas alíneas do seu n.º 3. II – Os mencionados normativos pretendem disciplinar, globalmente, a duração do período de férias, conforme a expressão acolhida na respectiva epígrafe, sendo que o elemento sistemático de interpretação exige que o n.º 3 do artigo 213.º do Código do Trabalho de 2003 seja interpretado conjuntamente com o disposto no n.º 1 do mesmo preceito legal, pelo que a majoração do período de férias deve ser aferida relativamente ao período de 22 dias úteis e não ao fixado em CCT que disponha em sentido mais favorável ao trabalhador. III – É manifesto que o referido aumento da duração das férias não se apresenta como uma figura autónoma do regime de férias, concretamente da duração do período de férias, antes integra o todo incindível do aludido complexo normativo.
         Recurso n.º 472/09 -4.ª Secção Pinto Hespanhol (Relator)* Vasques Dinis Bravo Serra
 
I – Na acção de impugnação de despedimento, fundada na inexistência de justa causa, compete ao empregador demandado a prova dos factos que, imputados ao trabalhador despedido na nota de culpa e na decisão final do processo disciplinar, traduzem comportamentos ilícitos, gravemente violadores de deveres emergentes do contrato de trabalho, dos quais decorre a impossibilidade prática e imediata da subsistência da relação laboral. II – Ao trabalhador incumbe a prova dos factos, por ele, alegados com vista a afastar, no caso de se demonstrar a violação de deveres integrante da justa causa, o efeito decorrente de tal violação. III – Provado que o trabalhador — a quem, como encarregado de uma loja de supermercado, competia gerir, com autonomia, e, nessa qualidade, coordenar, supervisionar e fiscalizar directamente os trabalhadores envolvidos na elaboração dos inventários de produtos nela existentes e proceder ao respectivo fecho/consolidação, depois de comunicar a outros responsáveis, os resultados e obter destes concordância, bem como cumprir e fazer cumprir, por parte de todos os trabalhadores da loja, os procedimentos administrativos, aprovados pela empregadora —, por acção ou omissão, permitiu que, durante vários meses, fossem elaborados inventários com resultados adulterados das existências de produtos na loja de que era encarregado e que, por diversas vezes, contrariando instruções da empregadora, instruiu subordinados seus no sentido de serem trocados códigos de vendas de produtos, demonstrada fica a violação gravemente culposa dos deveres de lealdade, de zelo e diligência, e de obediência, integrante da justa causa de despedimento, se o trabalhador não logra provar que a adulteração de resultados dos inventários e a troca de códigos de venda eram do conhecimento dos funcionários que, na loja, de algum modo actuavam como seus superiores hierárquicos, a quem os resultados eram apresentados antes do respectivo fecho/consolidação. IV – A norma do artigo 381.º, n.º 2, do Código do Trabalho de 2003, que exige documento idóneo para prova do trabalho suplementar prestado há mais de cinco anos, atenta a data da reclamação dos correspondentes créditos, é uma norma de direito material probatório, que tem a sua razão de ser na possibilidade que é concedida, pelo n.º 1 do mesmo artigo, de os créditos emergentes de relações laborais, independentemente da sua antiguidade, poderem ser exigidos até um ano depois de cessado o contrato, num regime especial que consagra a imprescritibilidade dos mesmos durante a vigência do contrato. V – As normas vertidas nos artigos 10.º, n.ºs 1 e 4, do Decreto-Lei n.º 421/83, de 2 de Dezembro (com as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 398/91, de 16 de Outubro), 23.º, n.ºs 1 e 4, e 24.º do Decreto-Lei n.º 491/85, de 26 de Novembro, consagram um regime de apertado controlo formal da prestação de trabalho suplementar, em ordem a permitir, por um lado, a fiscalização pelos organismos da administração, e, por, outro, a garantir aos trabalhadores, mediante o acesso ao registo obrigatório — existente na empresa e/ou nos referidos organismos — e à informação deles constante, o exercício dos direitos emergentes da referida prestação, constituindo os documentos do registo os documentos idóneos a que se refere o n.º 1 do artigo 381.º, n.º 2, do Código do Trabalho de 2003. VI – A inexistência de registo relativamente a trabalho suplementar realizado por um concreto trabalhador é um facto que o interessado não podia ignorar, desde logo porque o registo pressupunha a sua assinatura, impondo-se, em tal caso, que actuasse no sentido de promover, junto da entidade empregadora ou dos competentes organismos, diligências no sentido regularizar a situação, sendo que é a inércia do trabalhador — ao qual, nos termos do artigo 342.º, n.º 1, do Código Civil, incumbe a prova de ter prestado trabalho suplementar — que justifica, à face da lei, a inadmissibilidade de prova testemunhal, por razões de certeza e segurança.
         Recurso n.º 3536/08 -4.ª Secção Vasques Dinis (Relator)* Bravo Serra Mário Pereira
 
I – O despacho que admite o recurso no tribunal recorrido e mesmo o despacho do relator que o admite no tribunal “ad quem” não são vinculativos, não obstando à ulterior rejeição do recurso (artºs 687.º, n.º 4, 700.º a 704.º e 726.º doCPC). II – Decorre do disposto no art. 678.º, n.º 1, do CPC que, em processo laboral, a regra é a de que só admitem recurso as decisões que, cumulativamente: (i) sejam proferidas em causas de valor superior à alçada do tribunal de que se recorre; (ii) em que a decisão impugnada for desfavorável para o recorrente em valor superior a metade da alçada do mesmo tribunal. III – O valor da sucumbência, para efeitos de admissibilidade de recurso, reporta-se ao montante do prejuízo que a decisão recorrida importa para o recorrente, o qual é aferido em função do teor da alegação do recurso e da pretensão nele formulada, equivalendo, assim, ao valor do recurso, traduzido na utilidade económica que, através dele, se pretende obter, ou seja, corresponde à diferença entre o montante da condenação fixado na decisão recorrida e o que a parte pretende seja fixado na decisão do recurso. IV – Não é admissível recurso de revista, por o valor da sucumbência ser inferior a metade da alçada da Relação (€ 7.481,97) se, não obstante o valor da causa ser de € 18.678,79, na apelação a recorrente apelou apenas da condenação no valor de € 4.248,00 (pela não concessão de descanso compensatório relativamente ao trabalho prestado e em dia de descanso suplementar) e, tendo o recurso sido julgado parcialmente procedente e a condenação a esse título (sido) reduzida para € 2.124,00, pretende agora recorrer de revista.
         Recurso n.º 2564/08 -4.ª Secção Mário Pereira (Relator) Sousa Peixoto Sousa Grandão
 
I – Numa interpretação do artigo 318.º do Código do Trabalho conforme à jurisprudência comunitária, deve entender-se que a “transmissão” de estabelecimento nele contemplada é a transferência de uma unidade económica que mantém a sua identidade, entendida esta como um conjunto de meios organizado com o objectivo de prosseguir uma actividade económica, essencial ou acessória. II – Nas empresas cuja actividade assenta essencialmente na mão-de-obra – como é o caso da actividade de prestação de serviços de limpeza –, o factor determinante para se considerar a existência da mesma unidade económica é saber se houve manutenção do pessoal ou do essencial deste, na medida em que é esse complexo humano organizado que confere individualidade à empresa, e não tanto se se transmitiram, ou não, activos corpóreos. III – Constituem indícios da manutenção da “unidade económica” a transmissão de parte significativa dos efectivos da empresa, a natureza claramente similar da actividade prosseguida antes e depois da transmissão e a continuidade dessa actividade. IV – Inexiste transmissão de estabelecimento, a que se refere o n.º 1 do artigo 318.º do Código do Trabalho, se uma empresa (primeira ré), que se dedica à prestação de serviços de limpeza, executava a actividade de recolha de lixo/resíduos, nessa área de prestação de serviços, num estabelecimento hospitalar, e uma outra empresa (segunda ré), que se dedica à prestação de serviços na área da gestão ambiental nas suas várias componentes, nomeadamente a recolha, transferência, triagem, reacondicionamento, descontaminação e eliminação de resíduos hospitalares, passa a assegurar nesse mesmo estabelecimento a actividade de gestão ambiental, consistente na gestão de resíduos médico-hospitalares, que abarca várias componentes desde a recolha até à eliminação dos resíduos, não tendo a 1.ª ré transmitido para a 2.ª ré qualquer equipamento. V – A actividade da segunda ré – gestão de resíduos hospitalares –, engloba um conjunto de tarefas, que vão desde a recolha de resíduos, na fase inicial, até ao tratamento, na fase final, cuja complexidade supõe qualificações que a mera prestação de serviços de limpeza dispensa, ainda que nela se possa incluir, na fase inicial, a recolha e lixo ou resíduos. VI – Por isso, na apreciação da existência, ou não, de transmissão de estabelecimento, as tarefas de recolha de lixo ou resíduos não podem ser encaradas como actividade diferenciada, de funcionamento autónomo, passível de exploração isolada ou independente.
         Recurso n.º 3256/08 -4.ª Secção Mário Pereira (Relator)* Sousa Peixoto Sousa Grandão
 
I – O regime jurídico do pagamento dos prémios de seguro traçado pelo DL n.º 142/2000, de 15 de Julho, no que diz respeito ao seguro obrigatório do ramo de acidentes de trabalho, confere à seguradora dois ónus fundamentais: (i) o envio, ao tomador do seguro, do aviso do pagamento do prémio, ali contendo, além do mais, a indicação das consequências da eventual omissão desse pagamento; (ii) o envio à Inspecção-Geral do Trabalho das listagens mensais com a enumeração dos contratos resolvidos por falta de pagamento do prémio de seguro. II – A omissão dos assinalados envios -ou a falta de prova sobre a sua efectivação -acarreta, por sua vez, e respectivamente, a inoperância resolutiva (mantendo-se o contrato de seguro em vigor) e a inoponibilidade da sua resolução a terceiros lesados. III – É de considerar que se mantém válido o contrato de seguro celebrado entre um empregador e uma seguradora, para transferência da responsabilidade civil emergente de acidente de trabalho, se da matéria de facto apenas consta que o prémio do seguro era devido até ao dia 20/05/2004, data indicada pela seguradora ao tomador do seguro como sendo a data limite para proceder ao respectivo pagamento, não provando, porém, a referida seguradora, a data em que produziu tal comunicação (e, consequentemente, se o foi no prazo a que alude o artigo 7.º, n.º 1, do DL n.º 142/2000), assim como se o tomador foi advertido das consequências de uma eventual omissão neste domínio. IV – Mantendo o contrato de seguro a sua plena validade, torna-se indiferente que o prémio de seguro só haja sido pago depois de terem decorrido mais de 30 dias sobre a data limite para o efeito. V – Na situação descrita, sempre haveria, também, inoponibilidade resolutiva do contrato de seguro em relação ao autor/sinistrado, por se desconhecer se a ré/seguradora produziu a supra aludida comunicação à Inspecção-Geral do Trabalho.
         Recurso n.º 3768/08 -4.ª Secção Sousa Grandão (Relator)* Pinto Hespanhol Vasques Dinis
 
I – O simples facto de o legislador anunciar, no Decreto-Lei n.º 16/94, de 22 de Janeiro, que aprovou o novo Estatuto do Ensino Superior Particular e Cooperativo, o propósito de vir a consignar em diploma próprio o 'regime de contratação do pessoal docente para ministrar ensino nos estabelecimentos de ensino superior particular ou cooperativo', significando o reconhecimento da necessidade de um regime especial — no sentido de contemplar particularidades inerentes à actividade em causa, mas diferente do estatuído para o ensino público — não implica que, enquanto tal não suceder, deva considerar-se afastada a aplicação às relações laborais em causa, designadamente em matéria de retribuição, dos princípios e normas do regime geral do contrato individual de trabalho, não podendo, por conseguinte, considerar-se que existe uma lacuna de previsão, entendida esta expressão no sentido da inexistência de normas potencialmente aplicáveis ao exercício da actividade de docência, em regime de contrato individual de trabalho. II – Ao contrato de trabalho de docência no ensino superior privado não é de aplicar o estatuto remuneratório do ensino superior público definido nos Decretos-Leis n.ºs 408/89, de 19 de Novembro e 388/90, de 10 de Dezembro, mas os princípios e normas de carácter geral que regulam a matéria de retribuição. III – Se o contrato de trabalho cessou em virtude de o trabalhador ter solicitado à entidade empregadora a demissão das funções que exercia, a partir de certa data, mediante comunicações escritas, em que invocou motivos alheios à relação laboral, sem que se prove qualquer vício da vontade expressa em tais comunicações ou desconformidade entre a vontade declarada e a vontade real, não se configura uma resolução do contrato fundada em justa causa (artigo 441.º do Código do Trabalho de 2003), antes uma denúncia do mesmo (artigo 447.º, n.º 1, daquele Código). IV – A circunstância de o ano lectivo não coincidir com o ano civil não tem virtualidade para afastar a aplicação ao contrato de trabalho de docência do regime de aquisição do direito a férias estabelecido no artigo 212.º do Código do Trabalho.
         Recurso n.º 3435/08 -4.ª Secção Vasques Dinis (Relator)* Bravo Serra Mário Pereira
 
I – A noção de justa causa de despedimento, constante do artigo 396.º do Código do Trabalho de 2003, à semelhança do que se entendia no âmbito do n.º 1, do artigo 9.º da LCCT (aprovada pelo Decreto-Lei n.º 64-A/89, de 27-02) exige a verificação cumulativa de dois requisitos: (a) um comportamento ilícito e culposo do trabalhador, violador de deveres de conduta ou de valores inerentes à disciplina laboral, grave em si mesmo e nas suas consequências; (b) que torne imediata e praticamente impossível a subsistência da relação laboral. II – Existe tal impossibilidade quando ocorra uma situação de absoluta quebra de confiança entre o empregador e o trabalhador, susceptível de criar no espírito do primeiro a dúvida sobre a idoneidade futura da conduta do último, deixando de existir o suporte psicológico mínimo para o desenvolvimento dessa relação laboral. III – No âmbito do Código do Trabalho, à semelhança do que se verificava na LCCT (art. 12.º, n.º 4), deve entender-se que os factos integradores da justa causa são constitutivos do direito do empregador ao despedimento do trabalhador ou, na perspectiva processual da acção de impugnação, impeditivos do direito à reintegração ou ao direito indemnizatório que o trabalhador nela acciona, com base numa alegada ilicitude do despedimento, e como tal a provar por ele, empregador. IV – O dever de obediência abrange não apenas as directrizes do empregador sobre o modo de desenvolvimento da actividade laboral, mas também as directrizes emanadas do poder disciplinar prescritivo, em matéria de organização da empresa, do comportamento no seu seio, de segurança, higiene e saúde no trabalho, ou outras. V – Assim, o facto de a justificação das despesas feitas e a prestação das respectivas contas e regularização de eventual saldo do trabalhador para com o empregador, referentes aos adiantamentos por este feitos àquele, não respeitarem às funções pelo trabalhador exercidas ao serviço do empregador, no quadro do contrato de trabalho que os ligava e da categoria profissional que lhe era própria, mas sim à actividade de dirigente sindical (como representante dos trabalhadores junto do Comité Europeu de trabalhadores da ré), não impede que a conduta do trabalhador, traduzida na não apresentação dessa justificação, prestação e regularização, no prazo marcado pelo empregador, traduza uma violação do apontado dever de obediência. VI – A conclusão pela gravidade da infracção disciplinar não depende, necessariamente, da comprovação de elevados prejuízos materiais para o empregador, nem, sequer, da existência de prejuízos. VII – Verifica-se a violação dos deveres de probidade e de obediência, previstos nas alíneas a) e d) do n.º 1 do artigo 121.º do Código do Trabalho, por parte do trabalhador/autor, no seguinte circunstancialismo: -a empregadora/ré fez-lhe dois adiantamentos, cada um deles de € 600,00, referentes à sua participação, como representante no referido Comité Europeu de Trabalhadores da ré (em Março de 2004 em Paris e em Abril de 2005 em Cracóvia); -o autor não veio, por sua iniciativa, a prestar contas dessas verbas nem a entregar os documentos de suporte das despesas feitas, bem como a devolver o dinheiro de saldo que houvesse a favor da empregadora; -posteriormente, tendo esta, na sequência da reconciliação financeira das contas de empregados com o objectivo de fecho do exercício de 2005, constatado que o autor tinha saldo devedor ou negativo, em que se incluía verba respeitante aos aludidos adiantamentos, instou-o, sucessivamente, no período de Dezembro de 2005 a Março de 2006, para regularizar as contas, o que este não fez sem dar justificação para o facto; -apenas em 29 de Março de 2006, o autor entregou alguns documentos justificativos das despesas, ficando por pagar à ré a quantia de € 977,21. VIII – O referido comportamento configura justa causa de despedimento, uma vez que reveste a natureza de infracção disciplinar laboral e prolongou-se durante cerca de três meses, a tal não obstando o facto de apenas em Dezembro de 2005 a ré ter instado o autor a justificar as despesas, a prestar contas e a regularizar o saldo – sendo que não vem apurada a data em que os responsáveis da ré com competência disciplinar tiveram conhecimento da não justificação das despesas e que a iniciativa para levar a efeito tais procedimentos cabia ao autor –, deste ter cerca de 24 anos de antiguidade na empresa, nunca anteriormente ter manifestado faltas de respeito no seu posto de trabalho e não ter antecedentes disciplinares registados.
         Recurso n.º 3085/08 -4.ª Secção Mário Pereira (Relator)* Sousa Peixoto Sousa Grandão
 
I -A autorização provisória de docência prevista nos art.ºs 58.º e 59.º do Estatuto do Ensino Particular e Cooperativo, aprovado pelo D.L. n.º 553/80, de 21 de Novembro, só é válida para o ano lectivo para que foi concedida.
II - No final do ano, a autorização caduca e o mesmo acontece ao respectivo contrato de trabalho.
III - O contrato de trabalho celebrado sem a referida autorização é nulo (artigos 280.º do CC, 4.º, n.º 1, da LCT e 113.º, n.º 1, do CT/2003.
IV - O indeferimento da autorização provisória para leccionar não acarreta a caducidade do contrato que estava em execução, uma vez que a impossibilidade de leccionar já existia à data da celebração do contrato.
V - Apesar de nulo, o contrato produz efeitos como se válido fosse, enquanto a nulidade não for declarada, em relação ao tempo em que esteve em execução.
VI - E é precisamente por isso (por produzir efeitos como se válido fosse) que o contrato também é tido como válido, no que toca aos factos extintivos do mesmo, ocorridos antes da declaração da sua nulidade ou anulação (art.º 116.º, n.º 1, do CT/2003).
VII - O despedimento, independentemente do motivo que lhe esteja subjacente, caracteriza-se por ser uma decisão unilateral do empregador, que assenta numa resolução, também unilateral, que, sendo embora vinculada, aquele é livre de tomar ou de deixar de tomar, por depender exclusivamente da sua iniciativa.
VIII - Não configura uma situação de despedimento a comunicação enviada pelo empregador ao trabalhador, comunicando-lhe que não podia continuar a receber o seu trabalho, em virtude do pedido de autorização provisória para o ano em curso ter sido indeferido pela Direcção Regional de Educação.
         Recurso n.º 622/09 -4.ª Secção Sousa Peixoto (Relator)* Sousa Grandão Pinto Hespanhol
 
I – Para que o STJ possa ordenar a ampliação da matéria de facto, nos termos do n.º 3 do art. 729.º, do Código de Processo Civil, é imperioso constatar-se que, aquando da elaboração da base instrutória ou, na sua ausência, da própria fixação dessa matéria, tenha havido preterição da “matéria de facto relevante para a decisão da causa, segundo as várias soluções plausíveis da questão de direito”, nos precisos termos do art. 511.º, n.º 1, do mesmo diploma legal. II – Essa faculdade de ampliação, relativamente ao tribunal de recurso, só pode ser exercida relativamente a factos que tenham sido articulados pelas partes ou que sejam de conhecimento oficioso, de harmonia com o estatuído no art. 264.º do mesmo Código. III – No domínio do despedimento promovido pelo empregador, a vontade de pôr termo ao contrato há-de ser “inequívoca”, admitindo-se os “despedimentos de facto”, corporizados numa atitude inequívoca daquele, de onde decorre necessariamente a manifestação de uma vontade de fazer cessar a relação laboral. IV – Cabe ao trabalhador, na acção de impugnação de despedimento, alegar e provar a existência de um contrato de trabalho e a sua cessação através do despedimento promovido pelo seu empregador (artigo 342.º, n.º 1, do Código Civil). V – Não configura “despedimento de facto”, a circunstância da ré, no dia 30 de Maio de 2005, ter impedido a autora de trabalhar no seu antigo horário de trabalho, quando se constata que no dia 22, desse mesmo mês e ano, havia comunicado à autora a alteração do horário de trabalho, com efeitos a partir daquele dia 30 -advertindo-a que o não cumprimento do novo horário a fazia incorrer em desobediência -, alteração de horário com a qual a autora não concordou. VI – Relativamente à cessação do vínculo laboral por iniciativa do trabalhador, a lei distingue entre a sua resolução e a sua denúncia (artigos 441.º a 450.º do Código do Trabalho de 2003): no 1.º caso exige-se que a desvinculação seja operada através de documento escrito, com a indicação sucinta dos factos que a justificam e nos 30 dias subsequentes ao conhecimento desses factos; no 2.º caso exige-se, também, uma comunicação ao empregador, que, aqui como ali, constitui uma declaração negocial receptícia. VII – Diferentemente, o “abandono do trabalho” – artigo 450.º –, constituindo uma modalidade de denúncia tácita, pressupõe, ao invés, a omissão daquele acto. VIII – A figura jurídica do abandono do trabalho integra dois elementos: (i) um objectivo, que consiste num incumprimento voluntário do contrato de trabalho que, na generalidade dos casos se traduz na não comparência do trabalhador no local e no tempo de laboração, (ii) um elemento subjectivo, traduzido num “animus” extintivo, que se capta através de algo que o revele ou que exteriorize factos que, de acordo com a lei, “com toda a probabilidade revelem a intenção de não retomar o trabalho”. IX – Para que o facto seja considerado “concludente” da vontade de não retomar o serviço, não se torna necessário que o sentido dele extraível haja sido representado pelo respectivo agente: a concludência de um comportamento determina-se “de fora”, “objectivamente”. X – Não tendo a autora feito qualquer comunicação à ré de tipo resolutivo ou denunciativo – enviou, pelo contrário, uma carta a considerar-se despedida –, o pedido indemnizatório formulado pela ré contra a autora só pode basear-se no abandono do posto de trabalho. XI – Porém, nesta situação, para que pudesse haver lugar a indemnização à ré era necessário que esta tivesse produzido a comunicação enunciada no n.º 5, do artigo 450.º do CT, dando-lhe conta do abandono do trabalho por parte da mesma, comunicação essa através de carta registada com aviso de recepção para a última morada conhecida da autora.
         Recurso n.º 3696/08 -4.ª Secção Sousa Grandão (Relator)* Pinto Hespanhol Vasques Dinis
 
I -A norma do n.º 4 do artigo 646.º do Código de Processo Civil tem subjacente a distinção entre matéria de facto e matéria de direito, que se reflecte no julgamento separado — quer do ponto de vista do momento lógico quer no tocante aos poderes de cognição do julgador — das questões de facto e de direito.
II - Para efeitos processuais, é questão de facto tudo o que respeita ao apuramento de ocorrências da vida real e é questão de direito tudo o que diz respeito à interpretação e aplicação da lei.
III - O juízo sobre a existência de subordinação jurídica, pressupondo a verificação de que o trabalhador executa o contrato sob a autoridade e direcção do empregador, só é possível de alcançar mediante o apuramento de factos concretos — que revelem a interacção das partes na execução do contrato — e a respectiva subsunção nos referidos conceitos legais, o que implica a interpretação destes.
IV - Sendo tal juízo o ponto essencial da discussão entre as partes, a questão da subordinação jurídica apresenta-se como o thema decidendum, situando-se no domínio das realidades cujo conhecimento só pode ser adquirido através da interpretação e aplicação da lei, apresentando-se, pois, como questão de direito, que não pode ser resolvida no âmbito da decisão proferida sobre a matéria de facto.
V - As afirmações de que alguém, no âmbito de um contrato, frequentou um estágio com vista a exercer a sua actividade subordinada para o outro contraente; de que alguém, desde sempre exerceu, em concreto, sob as ordens, direcção, fiscalização e responsabilidade de outrem; de que executou o contrato, assumindo e exercendo as funções enquadráveis na categoria profissional de 'Director Comercial'; e de que resolveu o contrato de trabalho (...), tendo o contrato findado para todos os efeitos legais em determinada data, por força da rescisão operada desse modo, contêm, todas elas, valorações jurídico normativas, não podendo ser aceite a sua inclusão na decisão sobre a matéria de facto.
VI - O sentido alcançado com esta interpretação do art. 646.º do CPC, nada tem de arbitrário, inserindo-se num quadro razões de ordem lógico-processual que não distingue ou discrimina cidadãos colocados em idênticas situações contenciosas a que deva aplicar-se aquele preceito, pelo que não afecta o princípio da igualdade consagrado no art. 13.º da Constituição da República.
VII - Não constando das conclusões da revista qualquer reparo ao modo como o Tribunal da Relação operou a qualificação do contrato com base na factualidade expurgada das expressões que eliminou, fundando-se a pretensão do autor recorrente, exclusivamente, em deverem considerar-se escritas as mesmas expressões, não vindo este fundamento a ser atendido pelo Supremo, não pode este apreciar o decidido pela Relação no sentido de não poder concluir-se pela existência de um contrato de trabalho.
         Recurso n.º 3619/08 -4.ª Secção Vasques Dinis (Relator) Bravo Serra Mário Pereira
 
I -A descaracterização do acidente de trabalho, com fundamento na alínea a) do nº 1 do artº 7º da Lei nº 100/97, de 13 de Setembro, exige, cumulativamente, os requisitos de (i) existência de regras ou condições de segurança estabelecidas pela lei ou pela entidade empregadora, (ii) verificação, por parte do sinistrado, de uma conduta violadora dessas regras ou condições, (iii) voluntariedade na assunção dessa conduta, mesmo que não intencional, sem que, para tanto haja causa justificativa, e (iv) a existência de um nexo causal entre a conduta e a ocorrência do acidente. II – Ao se exigir que a violação careça de “causa justificativa” pretende-se atender à violação das condições de segurança específicas da empresa, bastando que o trabalhador conscientemente viole essas regras. III – As condições de segurança emitidas pela entidade empregadora são, apenas, as estabelecidas por esta em regulamento de empresa, ordem de serviço ou outra forma de transmissão. IV – Estando em causa um acidente de trabalho e sendo suscitada a questão da não reparabilidade do mesmo, o ónus da prova dos factos que conduzam a essa não reparabilidade impende sobre quem dessa circunstância retirar proveito, ou seja, as entidades às quais o nosso sistema jurídico-laboral infortunístico comete o encargo de reparar as consequências do sinistro. V – As prescrições constantes dos artigos 272º a 274º do Código do Trabalho aprovado pela Lei nº 99/2003, de 27 de Agosto – que correspondem, na sua essência, àquilo que se encontra normatizado, nomeadamente, nos artigos 4º, 8º, 9º e 12º do Decreto-Lei nº 441/91, de 14 de Novembro –, são aplicáveis às situações ocorridas após a vigência daquele Código, devendo, por isso, terem-se por revogados tacitamente os indicados normativos do Decreto-Lei nº 441/91. VI – Violou as regras de segurança contidas nos artigos 272º a 274º do Código do Trabalho e no Decreto-Lei nº 5072005, de 25 de Fevereiro, a entidade empregadora que dispunha de um equipamento (tapete rolante) em que laborava o sinistrado, dotado das seguintes características: -ao longo do tapete rolante e nas zonas da «cabeça» e alimentação com diversos elementos móveis – motor, roletes, tambores e correias, o primeiro e a última a trabalharem no mesmo sentido para darem movimento ao tambor e aos roletes intermédios -, não existiam elementos ou peças protectoras, como uma rede, que, relativamente aqueles vários elementos, impedissem o acesso aos elementos móveis ou o contacto com partes do corpo dos trabalhadores que manuseiam a máquina; -na máquina não existiam cabos de emergência e o respectivo manual explicitava que se não devia proceder a qualquer trabalho de manutenção nela quando a mesma se encontrasse em funcionamento e que, caso ocorresse uma deficiente aderência do tapete aos roletes que o movem, dever-se-ia imobilizar o tapete, proceder à remoção de parte da carga transportadora, afinar o esticador do «tambor/rolete», esticar as correias do motor do tapete e, só após, reiniciar a marcha do tapete; -era procedimento habitual colocar «cola» no tapete, nos dias húmidos e chuvosos, com o equipamento a funcionar, junto dos roletes intermédios, logo a seguir ao primário, situados a cerca de dois ou três metros do início daquele tapete, mas do lado de fora dos roletes e sem que o trabalhador introduzisse o braço na máquina; -a empregadora tinha informado os seus trabalhadores, incluindo o autor, do perigo de trabalharem na zona da «cabeça» do tapete e para ali não trabalharem com a máquina em funcionamento; -os superiores hierárquicos do sinistrado forneceram indicações no sentido de ser aplicada «cola» quando se verificasse que o tapete não aderia aos roletes, podendo a «cola» ser aplicada em qualquer ponto do tapete, sendo desnecessária a colocação junto do tambor. VII – Não configura a existência de ordens ou instruções proibitivas do acesso dos trabalhadores à zona da «cabeça» da máquina quando esta se encontrava em funcionamento, e a que o sinistrado desobedeceu ao ir apor a «cola» junto dos roletes da zona da cabeça, mas tão só informação dos perigos desse acesso, se apenas ficou apurado que não era habitual os trabalhadores da empregadora colocarem «cola» ou efectuarem qualquer trabalho de manutenção da máquina na zona da «cabeça» do tapete com o equipamento a funcionar, tendo já a empregadora informado os seus trabalhadores, incluindo o autor, do perigo de trabalharem naquela zona e para ali não trabalharem com a máquina em funcionamento, e que os trabalhadores são informados das tarefas que têm de desempenhar, como devem desempenhá-las e dos cuidados que devem ter no desempenho. VIII – Não se tendo provado a existência de ordens ou instruções expressas da empregadora a que o sinistrado desobedeceu, não cobra aplicação o que se consagra na alínea a) do nº 1 do artº 7º da Lei nº 100/97, de 13 de Setembro, e no nº1 do artº 8º do Decreto-Lei nº 143/99, de 30 de Abril, que aquela regulamentou. IX – No circunstancialismo descrito verifica-se nexo de causalidade entre o resultado da actuação da ré empregadora – ao não dotar o equipamento em causa de elementos protectores de acesso às suas partes móveis, ao não ter sinalizado o perigo decorrente da aproximação a elas, ao não ter procedido no sentido de aquele equipamento conter mecanismos apropriados que imobilizassem aquelas partes, designadamente ás zonas de maior perigo, aquando do acesso a elas, e ao ter dado indicações aos seus trabalhadores, aqui se incluindo o autor, de colocarem «cola» entre o tapete e os roletes, quando este «patinasse» – e o acidente, que ocorreu quando o autor, ao verificar que a tela do tapete rolante estava a «patinar», foi colocar «cola» ao longo do tapete, nos roletes, com a finalidade de se obter maior tracção entre estes e a tela e, ao se aproximar da zona da «cabeça», introduziu o braço na máquina junto do rolete dessa «cabeça», sendo agarrado pelo tambor na manga do «macaco» que envergava.. X – O âmbito de aplicação do disposto no nº 1 do artº 684º-A do Código de Processo Civil é diverso do constante do nº 2 do artº 715º do mesmo diploma legal, pois enquanto este último pressupõe que o tribunal a quo nem sequer se chegou a pronunciar sobre a precisa questão de mérito, por a considerar prejudicada pela solução que conferiu ao pleito, naquele artº 684º-A, parece estar subjacente a apreciação, por aquele tribunal, das várias questões co-envolvidas. XI – Tendo-se o acidente de trabalho ficado a dever a falta de observância, por parte da entidade empregadora, das regras de segurança, e resultando para o sinistrado uma incapacidade permanente, as prestações a conferir regem-se nos termos da alínea a) do artº 18º da Lei nº 100/97, devendo tais prestações ser iguais à retribuição. XII – A entidade seguradora é responsável apenas subsidiariamente pelas prestações normais, nos termos do nº 2 do artº 37, pautando-se a obrigação (subsidiária) de pagamento das prestações de harmonia com o artº 17º, ambos daquela Lei nº 100/97.
         Processo n.º 1321/05.1 TBAGH.S1 -4.ª Secção Bravo Serra (Relator)* Mário Pereira Sousa Peixoto
 
I -O direito de aplicar a sanção de despedimento caduca decorrido que seja o prazo previsto na lei ou no instrumento de regulamentação colectiva, para o empregador proferir a decisão final, mas tal prazo só começa a correr depois de ter terminado o prazo para a comissão de trabalhadores emitir o seu parecer.
II - Por sua vez, o prazo para a comissão de trabalhadores emitir parecer só se inicia depois dela ter sido notificada para esse efeito, devendo essa notificação ser acompanhada de cópia integral do processo disciplinar.
III - Se a referida cópia não for remetida, o prazo para emitir parecer não começa a correr.
IV - E o mesmo acontece, quando a comissão de trabalhadores, tendo fundadas dúvidas acerca da integridade da cópia que lhe foi enviada, solicite ao empregador o esclarecimento das mesmas.
V - Neste caso, o prazo para emitir parecer só começa a correr depois daquelas dúvidas terem sido devidamente esclarecidas.
VI - Não constando o relatório final do instrutor da cópia enviada à comissão de trabalhadores, a dúvida acerca da integridade da mesma é absolutamente pertinente, por ser, pelo menos, discutível se aquele relatório, a existir, deve acompanhar, ou não, a dita cópia.
VII - A não especificação das normas violadas na decisão recorrida não conduz à deserção do recurso.
VIII - Só a falta absoluta da alegação implica a deserção do recurso.
         Recurso n.º 154/09 -4.ª Secção Sousa Peixoto (Relator)* Sousa Grandão Pinto Hespanhol
 
I -Face à literalidade do art.º 467.º, n.º 1, do CPC e ao formalismo que caracteriza toda a actividade processual, afigura-se-nos que a petição inicial deve ser constituída por uma só peça, não só por ser de presumir que o legislador soube exprimir cabalmente o seu pensamento (art.º 9.º do C.C.), mas também por essa ser a interpretação que se mostra mais razoável em termos de inteligibilidade da petição e de salvaguarda do direito de defesa do réu.
II - Admite-se, porém, que a exposição dos fundamentos de facto possa ser feita por remissão para os factos contidos noutros documentos que acompanhem a petição inicial, desde que essa remissão se destine a completar a exposição já feita na petição.
III - A resposta à nota de culpa não pode ser considerada parte integrante da petição inicial, apesar de, neste articulado, o autor a ter dado como reproduzida e integrada, se as questões nela suscitadas (prescrição das infracções disciplinares e caducidade do procedimento disciplinar) não tiverem sido invocadas na petição inicial.
IV - A impugnação da matéria de facto é de rejeitar, se o recorrente não especificar os factos que considera incorrectamente julgados e se não indicar, relativamente a cada um desses factos, quais os meios de prova que, na sua opinião, impunham uma decisão diferente.
V - Não constitui impugnação da matéria de facto aquela em que o recorrente, sem atacar as respostas dadas aos quesitos, se limita a alegar que os factos articulados na resposta à nota de culpa, para que havia remetido, também deviam ter sido levados em consideração pelo tribunal.
VI - A não consideração de tais factos, que não foram levados à base instrutória, não determina a nulidade da sentença.
         Recurso n.º 3967/08 -4.ª Secção Sousa Peixoto (Relator)* Sousa Grandão Pinto Hespanhol
 
I – Em processo a que é aplicável o CPT de 1999 e o CPC na versão anterior ao DL n.º 303/2007, de 24 de Agosto, se a recorrente interpôs recurso através de requerimento e, sem que tivesse aguardado por despacho liminar de admissão ou rejeição, apresentou desde logo a sua alegação, esta antecipação adjectiva traduz-se numa irregularidade da qual não resultam frustradas quaisquer das finalidades prosseguidas pelas regras atendíveis e que não teve a menor influência na tramitação do recurso. II – Sendo o empregador uma sociedade comercial é necessário que o despedimento do trabalhador – negócio jurídico unilateral receptício através do qual o empregador revela a vontade de fazer cessar o contrato de trabalho – seja praticado por quem tenha poderes para a representar. III – A emissão de uma declaração negocial gera uma obrigação vinculante para a sociedade sempre que a mesma seja produzida por um seu representante “de iure” -art. 258.º do CC, subsidiariamente aplicável. IV – Mas pode ainda vinculá-la, sempre que a sociedade aceite tacitamente a actuação de quem, não sendo embora seu representante em sentido jurídico, se comporte na prática como tal: basta, para isso, que se evidencie uma reiterada aceitação tácita dessa representação, necessariamente correspondente à sua ratificação, cujo acto não exige a observância de forma especial (arts. 268.º e 262.º, n.º 2 do CC). V – Não configura um despedimento, a comunicação feita pelo Encarregado da ré empregadora a uma filha da trabalhadora, no âmbito de um telefonema feito por esta, de que o contrato com a sua mãe não seria renovado e que esta estava despedida. VI – À autora cabia demonstrar (art. 342.º, n.º 1 do CC), o que não fez, que o dito Encarregado tinha poderes para emitir em nome da ré a declaração de despedimento que produziu ou, ao menos, que esses poderes eram tacitamente aceites por ela.
         Recurso n.º 3617/08 -4.ª Secção Sousa Grandão (Relator)* Pinto Hespanhol Vasques Dinis
 
I -O regime de arguição de nulidades decisórias da sentença prescrito no art. 77.º do CPT/99 também deve ser aplicado aos recursos que recaiam sobre os acórdãos da Relação (art. 716.º, n.º 1 do CPC, subsidiariamente aplicável aos recursos em processo laboral).
II - As razões de celeridade e economia processuais que justificam aquele regime -permitir ao tribunal a quo aperceber-se de forma mais rápida e clara da censura produzida, facultando-lhe o eventual suprimento -mostram-se mais prementes quando está em causa uma decisão da 2.ª instância, pois que a lei autonomiza neste caso a fase da interposição de recurso, da fase alegatória.
III - Se o recorrente guarda absoluto silêncio sobre a nulidade no requerimento de interposição da revista, reservando o seu anúncio e motivação para as subsequentes alegações, é intempestiva a correspondente arguição.
IV - Não incorre em omissão de pronúncia o acórdão da Relação que não se debruça sobre a questão de saber se é ilícita a declaração de “demissão” do trabalhador proferida com base numa informação do empregador de que lhe iria ser instaurado um procedimento disciplinar com vista ao despedimento (por a referida informação não conter a descrição circunstanciada dos factos imputados, gravidade da conduta, culpabilidade do infractor e impossibilidade da manutenção da relação de trabalho), se o apelante, nas suas alegações, não coloca tal questão à apreciação da Relação, partindo aí do pressuposto de que a sua declaração foi emitida e entregue em erro e sob “coacção moral” para, só depois, falar naquilo que considera ter sido um verdadeiro despedimento ilícito promovido pelo seu empregador.
V - Por virtude do n.º 6 do art. 712.º do CPC, torna-se claro que não cabe ao STJ censurar se a Relação fez um bom ou mau uso dos poderes de apreciação da matéria de facto, a menos que essa censura decorra dos poderes próprios que o Supremo também possui nesse domínio.
VI - Porque as presunções judiciais se integram no julgamento da matéria de facto e constituem um meio probatório de livre apreciação do julgador, está vedado ao STJ proceder à sua avocação, visto que a sua competência funcional, afora as situações de controlo da prova tabelada, se restringem à aplicação definitiva do regime jurídico que julgue adequado aos factos materiais fixados pelas instâncias.
VII - Apenas o poderá fazer, por ser uma questão de direito, para aferir se as presunções extraídas pelas instâncias violam os arts. 349.º e 351.º do CC, ou seja, se foram extraídas de factos desconhecidos não provados -, ou irrelevantes para o efeito -designadamente porque o facto presumido exige um grau superior de segurança na prova -, e, bem assim, se a ilação extraída conflitua com factualidade provada ou contraria outra que, submetida expressamente ao crivo probatório, tenha sido dada como não provada.
VIII - O Supremo jamais pode sindicar o juízo das instâncias quando estas entendem que nenhuma presunção é lícito extrair da factualidade provada.
IX - Não pode, através de presunção judicial, evidenciar-se o vício da vontade que alegadamente inquinou a declaração de “demissão” produzida pelo autor, se ficou expressamente “não provado” que os representantes do empregador tenham, por qualquer forma, ameaçado ou pressionado o autor no sentido de este apresentar a sua “demissão”, ou que lho tenham sugerido, ou que o texto da declaração do autor lhe tenha sido ditado por aqueles.
         Recurso n.º 3845/08 -4.ª Secção Sousa Grandão (Relator)* Pinto Hespanhol Vasques Dinis
 
I -Fora dos casos de instauração de inquérito prévio, só a comunicação da nota de culpa ao trabalhador tem virtualidade para interromper o prazo de caducidade, marcando, para o efeito consignado no artigo 372.º, n.º 1, do Código de 2003, o momento em que o empregador exerce o procedimento disciplinar.
II - A data a considerar para se saber se o procedimento disciplinar foi exercido nos 60 dias subsequentes ao conhecimento da infracção é, ressalvando os casos atendíveis de inquérito prévio, aquela em que a comunicação da nota de culpa é recebida pelo trabalhador (ou aquela em que devia ter sido recebida e não o foi só por culpa do mesmo).
III - Imputada ao trabalhador motorista de transportes públicos uma infracção disciplinar que se traduziu na retenção indevida de receitas que cobrava a bordo da viatura que conduzia, o não pagamento da dívida respectiva integra esta infracção, não tendo autonomia para efeitos disciplinares.
IV - O não cumprimento de um acordo entretanto celebrado no sentido do pagamento daquela mesma dívida dentro de um determinado prazo, não constitui, em si mesmo, uma nova infracção disciplinar, pois a obrigação de pagar as quantias indevidamente retidas já existia, antes do acordo de pagamento, e manteve a sua natureza, por não ter sido objecto de novação, traduzindo-se o efeito útil do acordo, apenas, no reconhecimento, por parte do autor, do montante e proveniência da dívida, e, por parte da ré, na concessão de uma moratória para pagamento da mesma.
V - Tendo decorrido 63 dias desde a data em que o empregador teve conhecimento da indevida retenção, por parte do trabalhador, de valores que estava obrigado a entregar-lhe, até à entrega da nota de culpa, o direito de exercer o procedimento disciplinar já se encontrava extinto por caducidade, visto que o respectivo prazo não se interrompeu com o despacho de 16 de Dezembro de 2005 do Conselho de Administração que mandou instaurar o processo disciplinar.
         Recurso n.º 157/09 -4.ª Secção Vasques Dinis (Relator) Bravo Serra Mário Pereira
 
I -O despedimento com justa causa, pressupõe, nos termos do artigo artigo 396.º, n.º 1, do Código do Trabalho de 2003, um comportamento ilícito e culposo do trabalhador, de tal gravidade objectiva, que -apreciado no quadro da gestão da empresa, tendo em conta, entre outras circunstâncias relevantes, o grau de lesão de interesses da entidade empregadora, o carácter das relações entre as partes ou entre os trabalhador e os seus companheiros -torne, prática e imediatamente, impossível a subsistência da relação laboral, ou seja, torne inexigível ao empregador a manutenção do vínculo, o que supõe um juízo de prognose sobre a viabilidade daquela relação, que só não poderá manter-se se o trabalhador destruir ou abalar, de forma irreparável, a confiança na idoneidade futura da sua conduta.
II - Incorre em violação grave do dever de executar o trabalho com zelo e diligência, consignado no artigo 121.º, n.º 1, alínea c), daquele Código, preenchendo a previsão da alínea d) do n.º 3 do artigo 396.º do mesmo diploma, o trabalhador que, exercendo funções de Controlador de Tráfego de transporte público colectivo de passageiros, incumprindo instruções da empregadora, segundo as quais deveria entregar o dinheiro das multas cobradas e, bem assim, os respectivos autos de notícia e os documentos anexos aos recibos de multa, devidamente preenchidos, no prazo de três dias após a autuação ao passageiro encontrado sem título de transporte, excede, largamente, por três vezes, esse prazo, retendo as importâncias cobradas, e, por duas vezes, omite o preenchimento dos documentos anexos aos recibos de multa, para recolha de informação necessária à elaboração dos autos de notícia, e onde são mencionados, designadamente, os dados relativos à carreira, autocarro, e hora a que são passadas as multas, o que impossibilitou que tais elementos constassem dos respectivos autos de notícia.
III - Tais comportamentos, tidos por um trabalhador a quem, anteriormente, havia sido aplicada a pena disciplinar de três dias de suspensão sem vencimento por não ter prestado contas nem feito a conferência dos valores que tinha em seu poder, geram irremediável quebra de confiança na idoneidade futura do seu comportamento, tornando imediata e praticamente impossível a manutenção da relação laboral, não obstando à aplicação da sanção expulsiva o facto de o procedimento disciplinar ter sido instaurado depois de aquele haver feito, espontaneamente, a entrega dos montantes que tinha em seu poder.
         Recurso n.º 3698/08 -4.ª Secção Vasques Dinis (Relator)* Bravo Serra Mário Pereira
 
I -No regime definido pela Lei n.º 9/79, de 19 de Março (Lei de Bases do Ensino Particular e Cooperativo), pelo Decreto-Lei n.º 553/80, de 21 de Novembro (Estatuto do Ensino Particular e Cooperativo), pela Lei n.º 46/86, de 14 de Outubro (Lei de Bases do Sistema Educativo) e pelas Portarias de Regulamentação do Trabalho, relativas às condições de trabalho nas IPSS, publicadas no Boletim do Trabalho e Emprego I Série, n.º 31, de 22 de Agosto de 1985, e n.º 15, de 26 de Abril de 1996, o exercício das funções de educador de infância, bem como de coordenação pedagógica, em estabelecimento de ensino pré-escolar pertencente a instituição particular de solidariedade social, depende de habilitação específica.
II - As funções de direcção do estabelecimento e de coordenação pedagógica, não previstas no descritivo de qualquer das categorias profissionais, consignadas nas referidas PRT's, são de exercício temporário, podendo cessar em qualquer momento, por iniciativa do trabalhador ou do empregador, com a única consequência de aquele voltar à sua situação na carreira profissional.
III - O contrato de trabalho celebrado para o exercício de funções de educador de infância, sem a necessária habilitação, é nulo, à luz do disposto no artigo 4.º da LCT (Regime Jurídico do Contrato Individual de Trabalho, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 49 408, de 24 de Novembro de 1969) e do artigo 280.º, n.º 1, do Código Civil.
IV - Se ambas as partes sabiam da exigência de habilitação própria ou específica para o desempenho daquelas funções e, não obstante, celebraram e mantiveram entre elas um contrato de trabalho com tal objecto, sem aquela habilitação, não pode considerar-se que o trabalhador agiu de boa fé, para efeito do disposto nos n.º 5 do artigo 15.º da LCT.
         Recurso n.º 3841/08 -4.ª Secção Vasques Dinis (Relator)* Bravo Serra Mário Pereira
 
I -Não pode imputar-se a violação do disposto no artigo 712.º, n.º 2, do Código de Processo Civil (na redacção do Decreto-Lei n.º 329-A/95, de 12 de Dezembro), ao acórdão da Relação que altera a resposta a um quesito da base instrutória, de não provado para provado, se dele resulta que foram examinados todos os depoimentos gravados e bem assim a prova documental constante dos autos e que foi com base em tal exame que formulou o seu juízo relativamente àquela alteração.
II - Não cabe nos poderes do Supremo Tribunal, em face das limitações que decorrem do consignado nos artigos 712.º, n.º 6, 722.º, n.º 2 e 729.º, n.ºs 1 e 2, do CPC (versão anterior à da revisão operada pelo Decreto-Lei n.º 303/2007, de 24 de Agosto), censurar a decisão da Relação de alterar a resposta ao quesito que, reportando-se ao estabelecimento do nexo de causalidade, estritamente no plano naturalístico, entre um concreto acidente de trabalho e as lesões determinantes da morte do sinistrado, se insere no âmbito da matéria de facto submetida ao princípio da livre apreciação da prova.
         Recurso n.º 3921/08 -4.ª Secção Vasques Dinis (Relator)* Bravo Serra Mário Pereira
 
I -O despacho que ordena a repetição da notificação da admissão do agravo ao réu recorrente autónomo e distinto do despacho que admitiu o recurso e fixou a sua espécie e efeito -, cai na regra geral de impugnação dos despachos judiciais pela via dos recursos ou, nas hipóteses figuradas na lei, da reclamação (arts. 676.º, n.º 1 e 677.º do CPC).
II - Face a essa distinção e autonomia, não cobra aplicação ao caso o disposto no n.º 4 do art. 687.º do CPC, segundo o qual “[a] decisão que admita o recurso, fixe a sua espécie ou determine o efeito que lhe compete não vincula o tribunal superior, e as partes só a podem impugnar nas suas alegações”.
III - Não sendo impugnado pela forma própria, mas apenas nas contra-alegações do agravo, mantém-se subsistente e eficaz o despacho que mandou repetir a notificação da admissão do agravo ao réu e a respectiva alegação mostra-se tempestiva.
IV - O valor da causa a atender para efeitos gerais, incluindo os de admissibilidade de recurso, é o fixado definitivamente pela primeira instância, mesmo que tacitamente (artigo 315.º do CPC).
V - Formulando-se na petição inicial da acção de impugnação de despedimento um pedido de condenação em quantia certa que inclui juros legais e retribuições intercalares, o valor daqueles juros e destas retribuições não tem qualquer influência na determinação do valor da causa (esta acção não se reconduz à figura prevista no artigos 308, n.º 3.º do CPC, do processo de liquidação ou outro em que, analogamente, a utilidade económica do pedido só se define na sequência da acção).
VI - Fixado o valor da causa, este mantém-se, ainda que o valor da condenação seja superior, uma vez que a lei não prevê qualquer mecanismo de correcção automática daquele valor com base no montante da condenação.
VII - Esta interpretação não envolve violação dos princípios constitucionais da igualdade, designadamente na sua vertente de não discriminação, e da tutela jurisdicional efectiva, este no que respeita ao acesso ao recurso.
         Recurso n.º 3621/08 -4.ª Secção Mário Pereira (Relator) Sousa Peixoto Sousa Grandão
 
I -Cabe nos poderes do Supremo Tribunal de Justiça nos termos do n.º 2 do art. 722.º do Código de Processo Civil, o de verificar se, ao dar por demonstrado que determinados documentos denominados “certificados” foram feitos chegar à ré pelo autor “em datas não concretamente apuradas”, o tribunal recorrido não atendeu à confissão do autor quanto às datas em que os referidos documentos teriam sido recebidos pela ré -por não ter este impugnado na resposta à contestação o alegado pela ré quanto às indicadas datas e por ter reconhecido que posteriormente a ela enviou outros “certificados” -, pois o que com isso se quer significar é que aquele segmento fáctico foi apurado com inobservância da força de um determinado meio de prova.
II - Da circunstância de o autor, na resposta, não ter impugnado os “certificados” juntos pela ré com a contestação ou referido serem inverídicas as datas dos carimbos da sua entrada nos serviços da ré, não pode afirmar-se a confissão do autor quanto à data da recepção pela ré daqueles documentos em determinada data, se a ré não retirara, em sede de contestação, qualquer argumento concreto daquela junção e dos carimbos apostos em alguns deles.
III - Não é sustentável defender-se que a ré, em determinada data, tinha para si que se deparava um caso de forte perturbação do programa contratual que outorgara com o autor, impossibilitador da continuação do vínculo obrigacional que entre ambos fora firmado, se nessa data a mesma ré envia ao autor uma carta em que lhe pede para se apresentar ao trabalho.
IV - Os casos redutíveis a um exercício abusivo do direito por supressio, impõem que, patente ou ostensivamente, se crie, no obrigado, a convicção de que a prestação já não virá a ser exigida, sob pena de a posterior exigência representar para ele um incomportável sacrifício.
V - Esse incomportável sacrifício resulta, não na mais acentuada difficultas praestandi pelo passar do tempo, mas sim numa consciência que se assumiu de que a prestação não mais viria a ser pedida.
VI - A demora na realização da prestação, com acrescidos custos para tanto, não pode, por si só, demandar o apelo à figura do abuso do direito se não vier, ou não puder, ser alcançado que a actuação do credor foi de tal sorte que, num prisma objectivo, havia de criar no devedor a consciência convicta do não exercício do direito.
VII - Não integra abuso do direito a conduta do treinador desportivo que exercita o direito conferido por um “aditamento” ao contrato de trabalho desportivo em que a sua entidade empregadora se comprometeu a realizar um jogo de despedida em homenagem ao treinador, revertendo a favor do mesmo a respectiva receita líquida e a favor daquela as receitas da transmissão televisiva até ao limite de Esc. 15.000.000$00, sendo que o excedente, a havê-lo, reverteria em favor do treinador, ainda que este tenha já recebido a quantia de Esc. 30.000.000$00 também acordada naquele aditamento, e apenas quatro anos depois venha exigir o cumprimento da obrigação consistente naquela realização, uma vez que ficou provado pretenderem as partes com o referido “aditamento”, por um lado, proporcionar ao autor o recebimento de uma quantia em dinheiro que compensasse a diminuição da sua retribuição mensal e, por outro, homenagear o autor.
VIII - Perante esta dualidade de intenções que presidiu ao estabelecimento do clausulado, e uma vez que a realização do jogo não pode ser desligada daquele intuito de natureza não patrimonial -o de ele vir a representar um preito de homenagem que se quis dirigir ao autor -, não se pode considerar que a recepção pelo autor do valor de Esc. 30.000.000$00 logo no ano subsequente à subscrição do negócio, tenha levado a ré a ficar convicta de que a outra parte se conformaria com a não realização do “jogo de homenagem”e que, por isso, não mais exigiria o cumprimento da obrigação . IX – Não implica igualmente o exercício abusivo, por parte do autor, do direito de exigir a efectivação do jogo, a alegada circunstância de o decorrer do tempo (os referidos quatro anos depois de firmado o “aditamento” ao contrato) implicar um acréscimo dos custos de realização e perdas de receitas da transmissão televisiva, se, por um lado, a ré compara as receitas da transmissão televisiva de um jogo deste tipo com as de jogos de eliminatórias da Taça de Portugal entre equipas da Primeira Liga e jogos das ligas profissionais de futebol de outros países, nada demonstrando quanto a jogos com as mesmas características, no confronto entre aquelas épocas, e se, por outro, nos termos do “aditamento” somente revertiam a favor do autor as receitas líquidas do jogo, não provando a ré que os agravados custos derivados da realização do jogo quatro anos depois seriam sempre superiores às receitas.
         Recurso n.º 620/09 -4.ª Secção Bravo Serra (Relator)* Mário Pereira Sousa Peixoto
 
I – A responsabilidade civil contratual resulta do não cumprimento, lato sensu, dos deveres relativos próprios das obrigações contratuais, incluindo os deveres acessórios de conduta, ainda que impostos por lei, no seio da complexa relação obrigacional. II – Por sua vez, a responsabilidade civil extracontratual assenta na violação de deveres gerais de abstenção, omissão ou não ingerência, correspondentes aos direitos absolutos. III – Em qualquer dos casos, são os mesmos os pressupostos do dever de indemnizar: violação de um direito ou interesse alheio, o facto ilícito, a culpa, o dano e o nexo de causalidade. IV – Integra-se no âmbito da responsabilidade contratual a pretensão da autora/trabalhadora em ser indemnizada pelos danos decorrentes da conduta ilícita da ré, que, desrespeitando as regras previstas no acordo de Empresa (AE) aplicável, a não transferiu de uma Estação de Correios (EC) para outra. V – O nosso sistema jurídico consagra no artigo 563.º do Código Civil uma vertente ampla da causalidade adequada, ao não exigir a exclusividade do facto condicionante do dano: assim, poderá configurar-se a concorrência de outros factos condicionantes, contemporâneos ou não daquele facto condicionante, assim como se admite também a causalidade indirecta, bastando que o facto condicionante desencadeie um outro que, por sua vez, suscite directamente o dano. VI – Diversamente, o facto condicionante não deve ser havido como causa adequada do efeito danoso, sempre que o mesmo, pela sua natureza, se mostre de todo inadequado para a sua produção: é o que sucede quando o dano só tenha ocorrido por virtude de circunstâncias anómalas ou excepcionais de todo imprevisíveis no contexto do trajecto causal. VII – A Relação, conhecendo de facto, pode extrair dos factos materiais provados as ilações que deles sejam decorrência lógica e pode sindicar as presunções judiciais tiradas pela primeira instância no que respeita a saber se elas alteram ou não a factualidade apurada e, bem assim, se elas constituem, ou não, decorrência lógica de uma concreta factualidade apurada. VIII – Ao STJ cabe apenas indagar se é, ou não, admissível a utilização das referidas presunções, face ao estatuído no artigo 351.º do Código Civil; e se a ilação extraída contraria ou entra em colisão com um facto que foi submetido a concreta discussão probatória e que o tribunal teve como não provado, o STJ pode intervir correctivamente nos termos do artigo 729.º, n.º 3, do Código de Processo Civil, bastando-se a correcção com a simples eliminação da ilação extraída.IX – Tendo sido extraída pela Relação, como decorrência lógica da matéria de facto, a ilação de que, se a autora tivesse sido transferida, para a EC por ela pretendida e a que tinha direito, tomaria as refeições em casa e que com a não transferência a autora teve acréscimo de custos (com os transportes e refeições), face ao disposto no artigo 566.º, n.º 2, do Código de Processo Civil, tais acréscimos de custos configuram danos patrimoniais sofridos pela autora decorrentes de um facto ilícito e culposo da ré (não transferência da autora para a referida EC) que justificam a ressarcibilidade por parte desta. X – No circunstancialismo descrito, justifica-se uma indemnização à autora no montante de € 2.500,00, a título de danos não patrimoniais, por se demonstrar que a sua não transferência para a EC em causa, que se prolongou durante cerca de cinco anos e sem que lhe fosse dada qualquer explicação para o facto, lhe causou desgosto e humilhação, constando-se, ainda que a ré é uma empresa de dimensão nacional, que tem o exclusivo da distribuição postal.
         Recurso n.º 4117/08 -4.ª Secção Mário Pereira (Relator)* Sousa Peixoto Sousa Grandão
 
I -Sob pena de rejeição do recurso, ao impugnar a decisão proferida sobre a matéria de facto o recorrente tem de: -especificar, isto é, individualizar, os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados, o que significa que não se pode limitar a pedir pura e simplesmente, a reapreciação de toda a prova produzida em 1.ª instância; -indicar, relativamente a cada um desses pontos de facto, os concretos meios probatórios constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada que, em sua opinião, impunham uma decisão diferente, o que significa que não pode limitar-se a remeter abstractamente para todos os meios probatórios; -indicar, quando os meios probatórios por ele invocados tenham sido gravados, o suporte físico onde se encontra gravado cada um dos depoimentos em que fundamenta a impugnação, e a localizar, por referência aos elementos contidos na acta da diligência em que os mesmos foram produzidos, o início e o termo de cada um deles.
II - A lei processual não prevê o convite para aperfeiçoar o corpo das alegações e, face ao disposto no n.º 4 do art.º 690.º, deve entender-se que tal convite não é admissível, por tal preceito, atenta a sua natureza especial, afastar, nesta matéria, o princípio geral da cooperação previsto no art.º 266.º do CPC.
III - Como resulta do disposto no n.º 2 do art.º 528.º, conjugado com o estipulado no n.º 2 do art.º 519.º do CPC, a simples recusa da parte em apresentar os documentos que judicialmente foi notificada para juntar não acarreta, só por si, a inversão do ónus da prova.
IV - A hipótese da inversão do ónus da prova nem sequer se coloca se a parte não foi notificada para juntar os documentos.
V - O disposto no art.º 17.º, alínea j), conjugado com o estabelecido no art.º 33.º, n.º 2, dos Estatutos da Universidade Portucalense Infante D. Henrique, que atribui ao conselho directivo desta competência para julgar as infracções disciplinares imputadas ao pessoal administrativo, financeiro e auxiliar que aí presta serviço, deve ser interpretado restritivamente, de modo a excluir dessa competência, pelo menos, as infracções disciplinares que importem o despedimento dos trabalhadores, cabendo essa competência à Direcção da Universidade Portucalense Infante D. Henrique – Cooperativa de Ensino Superior, CRL, a quem aquele estabelecimento de ensino pertence.
VI - A não junção ao processo disciplinar, requerida pelo trabalhador na resposta à nota de culpa, de elementos e documentos que já se encontram na posse da entidade empregadora não constitui violação do direito de defesa do trabalhador nem acarreta a nulidade do processo disciplinar.
VII - Constitui um caso de infracção continuada a conduta da trabalhadora que, valendo-se do circunstancialismo em que exercia as suas funções (chefe de secretaria) e utilizando sempre o mesmo processo, se apropriou em diversas ocasiões das importâncias que recebia dos alunos da Universidade para pagamento dos serviços que por eles eram solicitados.
VIII - Na infracção continuada a prescrição só começa a correr na data da prática do último acto integrador da infracção e tal prazo interrompe-se com a notificação da nota de culpa ou com a instauração do processo prévio de inquérito quando a sua realização se mostre necessária.
IX - As apropriações referidas no ponto VII constituem justa causa de despedimento.
X - À luz do Decreto-Lei n.º 421/83, de 1 de Dezembro, o trabalhador que reclamava o pagamento de trabalho suplementar não tinha que provar que a realização desse trabalho tinha sido prévia e expressamente determinada pela entidade empregadora; bastava-lhe alegar e provar que prestou efectivamente trabalho fora do seu horário de trabalho e que esse trabalho tinha sido realizado com o conhecimento e sem a oposição do empregador.
XI - O facto de se ter provado que os registos de entrada e saída da autora das instalações da entidade empregadora, por ela realizados, iam para além do seu horário de trabalho, não permite concluir que a sua permanência na empresa fora do seu horário de trabalho tivesse correspondido à prestação efectiva de trabalho suplementar.
         Recurso n.º 3369/08 -4.ª Secção Sousa Peixoto (Relator)* Sousa Grandão Pinto Hespanhol
 
I -A aceitação tácita da decisão, a que a lei associa a vontade de não impugnar esta, pressupõe a prática de qualquer facto inequivocamente incompatível com a vontade de recorrer (art. 681.º, n.º 3 do CPC).
II - Se a decisão contiver segmentos distintos, pode a parte circunscrever a aceitação a algum ou alguns desses segmentos.
III - Sustentando a seguradora na acção que nunca fora aprazado com o empregador qualquer vínculo de onde adviesse a sua eventual responsabilidade pela reparação do acidente, e vindo a sentença a afirmar que as rés haviam celebrado entre si um válido contrato de seguro, a seguradora ficou vencida na 1.ª instância, assistindo-lhe legitimidade para impugnar a sentença.
IV - Se, antes de interpor recurso, a seguradora resolveu emitir o aviso para pagamento do prémio sem fazer qualquer reserva, não dando a menor notícia de que esse procedimento em nada beliscava o seu propósito de impugnar a decisão em todos os seus diversos segmentos, esta postura traduz uma óbvia aceitação da sentença na parte em que se pronunciou sobre as condições de validade do contrato e sobre a metodologia a seguir para o pagamento do prémio, enquanto pressuposto da sua eficácia.
V - Não estando demonstrado que o aviso de pagamento não tenha sido emitido pelos serviços da empresa com aptidão funcional para o efeito, o acto vincula a seguradora (art.s 800.º, n.º 1 e 165.º do CC).
VI - O ónus da prova dos factos susceptíveis de agravar a responsabilidade do empregador cabe a quem dela tirar proveito, seja a instituição seguradora que pretende ver desonerada a sua responsabilidade infortunística, sejam os beneficiários do direito reparatório.
VI - A lei dá prevalência às medidas de protecção colectiva contra quedas em altura, conferindo às medidas individuais natureza subsidiária e complementar, o que bem se compreende visto que as medidas colectivas são mais fiáveis (estão a cargo de uma única entidade, o empregador) enquanto as medidas individuais pressupõem a actuação colaborante de cada trabalhador.
VII - É de considerar que o empregador omitiu a implementação das regras de segurança que se impunham, violando o disposto nos art.s 272.º, 275.º e 278.º do Código do Trabalho de 2003, 11.º da Portaria n.º 101/96, 3.º e 4.º do DL n.º 348/93, no seguinte circunstancialismo: o sinistrado, cuja função habitual era a reparação de veículos, caiu de uma estante onde se encontrava material necessário ao exercício da sua actividade e onde se deslocava com alguma frequência, situada a cerca de 4 metros do solo; embora o piso das plataformas das estantes onde os trabalhadores se deslocavam para retirar ou depositar objectos seja anti-derrapante, possuisse 2,5 metros de largura e fosse protegido por barras metálicas a cerca de 90 cm de altura, quando efectivamente se procedia à colocação e recolha dos objectos, designadamente os de maiores porte e peso, os trabalhadores retiravam as barras metálicas, como fez o sinistrado, de forma a agilizar o armazenamento e posterior recolha dos produtos, ficando a plataforma completamente desprotegida (nessas ocasiões em que a protecção era mais premente); o empregador conhecia as condições em que os seus trabalhadores diariamente operavam, conhecendo, portanto, o hábito de retirar as barras metálicas nas sobreditas ocasiões, e não substituía esse meio de protecção colectiva por outro de idêntica natureza ou de protecção individual; o empregador nunca deu qualquer formação aos seus trabalhadores para as concretas tarefas de recolha e colocação dos objectos nas prateleiras, nem os alertou para os riscos inerentes.
VIII - Todavia, não se verifica nexo de causalidade entre essa violação e a queda, não se verificando, consequentemente, os pressupostos da responsabilização do empregador, previstos no n.º 1 do art. 18.º da Lei n.º 100/97, de 13 de Setembro, provando-se, apenas, que o sinistrado se desequilibrou e caiu de uma altura de cerca de 4 metros, desde a prateleira até ao solo, quando aguardava, imóvel e de pé, a chegada do empilhador, ignorando-se a razão dessa queda.
         Recurso n.º 4119/08 -4.ª Secção Sousa Grandão (Relator) Pinto Hespanhol Vasques Dinis
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