Procuradoria-Geral Distrital de Lisboa
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    Jurisprudência da Relação Laboral
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 - ACRL de 02-10-2002   Remuneração. Retribuição. Mudança das instalações da entidade patronal. Pagamento a título de horas de viagem. Passe social.
I - O conceito de retribuição assenta em três caracteristicas fundamentais: a obrigatoriedade das prestações efectuadas pela entidade patronal, a periodicidade ou regularidade do seu pagamento e a correspectividade entre as prestações do empregador e a disponibilidade do trabalhador, ou seja, que as prestações não tenham uma causa específica e individualizável diversa da remuneração do trabalho.II - A remuneração é um elemento fundamental do contrato de trabalho, na medida em que normalmente constitui a base do sustento do trabalhador e da sua família, sendo, por isso, objecto de especial protecção da lei que, no artigo 21.º, n.º 1, alínea c) da LCT, proíbe a entidade patronal de diminuir a retribuição, salvo em certos casos especialmente previstos. Este princípio da irredutibilidade da retribuição refere-se ao valor total da retribuição e não à estrutura da mesma, podendo esta ser unilateralmente alterada pelo empregador, quer mediante a supressão de algum componente, a mudança de frequência de outro ou, ainda a criação de um terceiro.III - Está em causa saber se as quantias atribuídas a título de horas de viagem passaram a integrar a retribuição do Autor, na sequência da mudança das instalações da Ré. E a resposta só pode ser afirmativa.IV - Por um lado, o recebimento pelo Autor dessas quantias durante um período de 20 anos é apto a criar no espírito do trabalhador a convicção de que as mesmas constituem um complemento normal do seu salário. E, no caso concreto, nunca lhe foi referido que esse pagamento seria temporário ou transitório, assim como nunca lhe foi comunicado que a mudança de instalações era temporária.V - Por outro lado, o pagamento pela Apelante dessas quantias de forma regular e periódica durante 20 anos faz presumir que constitui retribuição, nos termos do artigo 82.º, n.º 3 da LCT.VI - Além disso, a nosso ver, as importâncias pagas a título de horas de viagem, descritas nos recibos como "despesas de transporte", não integram quaisquer das importâncias abrangidas pelo artigo 87.º da LCT, na medida em que, na verdade, não constituem despesas de transportes, nem abonos de viagem, nem ajudas de custo. Trata-se pura e simplesmente de uma importância paga, sem um título específico, apenas para compensar o trabalhador da maior distância que tem de percorrer para chegar ao local de trabalho, após a sua alteração inicial.VII - O passe social, esse sim, é uma típica despesa de transporte, abrangida pelo artigo 87.º da LCT, a qual porém não está em causa.
Proc. 4703/02 4ª Secção
Desembargadores:  Seara Paixão - Ferreira Marques - Maria João Romba -
Sumário elaborado por Helena Varandas