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ACRL de 05-07-2007
SIGILO BANCÁRIO. Segredo profissional. Pedido de elementos. Investigação de crime de roubo. Recusa legítima. Competência do T. superior. Incidente
I- O tribunal a quo, de 1ª instância, considerou ilegítima a recusa da CGD em fornecer os elementos solicitados (identificação dos titulares de determinada conta bancária), em vista à investigação de crime de roubo, pelo que, desobrigando o banco do dever de sigilo a que está vinculado, ordenou que fornecesse tais dados, em 20 dias.
II- Inconformada mas sem por em causa a imprescindibilidade das informações pretendidas pelo Tribunal, na qualidade de interveniente acidental, a Caixa Geral de Depósitos interpôs recurso.
III- Em causa, investigando-se crime de roubo, reside saber: 1) se a recusa da entidade bancária se deve ter como legítima ou ilegítima; 2) e se, em concreto, a quebra do sigilo bancário constitui matéria da competência reservada da 2ª instância (o Tribunal superior), sob pena de nulidade (artºs 119º, al. e) e 135º, n. 3 do CPP).
IV- Na génese do despacho recorrido está o entendimento segundo o qual o Tribunal de 1ª instância é competente para desobrigar o banco do dever de segredo, só havendo lugar ao “incidente” a que se refere o citado artº 135º, n. 3 CPP (fazendo intervir o T. superior), se a diligência não for ordenada pela 1ª instância com base em legitimidade formal e substancial da recusa do banco. Esta posição parte, essencialmente, da ideia de que os tribunais superiores são, em regra, instâncias de recurso, não se justificando a sua intervenção sistemática, cada vez que se torne necessário obter certos elementos sujeitos ao sigilo bancário (cfr. artºs 11º e 12º do CPP).
V- O Regime Geral de Instituições de Crédito e sociedades financeiras ( DL nº 298/92, de 31 de Dezembro) prevê um conjunto de regras de conduta, cuja finalidade é proteger de forma eficaz a posição do consumidor. É no seu artº 78º que se contempla, genericamente, “dever de segredo”. Mas o seu artº 79º prevê um regime de “excepções”. São, assim estes normativos que regulam o regime substantivo do dever de segredo bancário e as suas excepções.
VI- Da sua conjugação resulta uma consagração taxativa dos casos excepcionais, pelo que, a não se verificarem, em nome do interesse preponderante ou prevalecente (a realização da justiça), deve ser decidida a quebra do segredo bancário.
VII- In casu, as informações pretendidas estão, efectivamente, a coberto do sigilo bancário, a que acresce o facto de a lei não prever expressamente para a investigação do crime de roubo a derrogação da regra, como acontece para o crime de emissão de cheque sem provisão, tráfico de estupefacientes ou branqueamento de capitais.
VIII- Como se viu, a 1ª instância não questionou se estava perante um caso não abrangido pelo segredo profissional, limitando-se a considerar que o interesse na boa administração da justiça, em concreto, devia prevalecer sobre o dever de sigilo bancário, invadindo a competência do tribunal superior.
IX- Houve violação do princípio da legalidade no domínio dos actos processuais (aludido no artº 118º, n. 1, em conjugação com o a al. e) do artº 119º, ambos do CPP), verifica-se e reconhece-se a nulidade insanável, pois que o tribunal recorrido errou na aplicação do direito ao considerar ilegítima a recusa do banco, quando a deveria ter aceite como legítima.
X- Termos em que procedendo o recurso, declara-se nulo e de nenhum efeito o despacho recorrido, que deve ser substituído por outro que suscite à Relação, por ser a competente para o efeito, o incidente de quebra de sigilo bancário.
Proc. 5051/07 9ª Secção
Desembargadores: Ribeiro Cardoso - Francisco Caramelo - Gilberto Cunha -
Sumário elaborado por João Parracho
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