I – O n.º 3 do artigo 65º da Lei n.º 32/2003, de 22 de Agosto (Lei da Televisão), não se refere à comparticipação criminosa mas à punibilidade da omissão, fazendo recair sobre o director um dever de garante, em consonância com o previsto no n.º 2 do artigo 10º do Código Penal, e estabelecendo para o omitente uma moldura penal atenuada.
II – O director, como qualquer responsável por uma omissão imprópria, só pode ser punido quando, recaindo sobre ele o dever de agir, não tenha actuado (dolosamente – artigo 13º do Código Penal) podendo tê-lo feito.
III – A autoria fundada numa omissão dolosa em nada interfere com a co-autoria daqueles que tenham eventualmente assumido um comportamento activo. É uma responsabilidade por facto próprio e não por facto de outrem.
IV – Todos são responsáveis pelo evento, se bem que a sua contribuição para ele seja diferente.
V – Por isso, «a apresentação de queixa contra um dos comparticipantes no crime torna o procedimento criminal extensivo aos restantes».
VI – A desistência de queixa não pode deduzir-se do facto de o assistente se ter conformado com a decisão do Ministério Público de arquivar os autos quanto ao director, nem muito menos de não ter incluído todos os eventuais responsáveis na queixa oportunamente apresentada.
Proc. 2761/07 3ª Secção
Desembargadores: Carlos Almeida - Telo Lucas - Pedro Mourão -
Sumário elaborado por João Vieira
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Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação de Lisboa
I – RELATÓRIO
1 – O Ministério Público, no início do despacho que encerrou a fase de inquérito do processo n.º 1369/03.0TASTB, antes de deduzir acusação, nomeadamente contra os arguidos L. e M., no dia 7 de Maio de 2003, de um crime de difamação agravada cometido através da comunicação social, conduta p. e p. pelos artigos 26º, 180º, n.º 1, 183º, n.º 2, 184º, 132º, n.º 2, alínea j), e 386º do Código Penal e artigo 65º, n.º 1, da Lei n.º 32/2003, de 22 de Agosto, disse, nomeadamente, o seguinte (fls. 322 a 325):
«J., id. a fls. 2, apresentou queixa, designadamente, contra J., L., M., R. e V., à data jornalistas da estação de televisão «SIC - Sociedade Independente de Comunicação, S.A.» imputando-lhes a prática de factos susceptíveis de integrar o crime de difamação, na forma agravada, p. e p. pelos arts. 26º, 180º, n.º 1, 183º, n.º 2, 132º, n.º 2, alínea j) e 386º do Código Penal e artigo 65º, n.º 1 da Lei 32/2003, de 22 de Agosto.
Apresentou, também, queixa contra J., jornalista, B., jornalista, à data, ambos a exercer funções no jornal «Diário Económico» imputando-lhes igualmente a prática de factos susceptíveis de integrar o crime de difamação, na forma agravada, p. e p. pelos artigos 26º, 180º, n.º 1, 183º, n.º 2, 184º e 132º, n.º 2, alínea j) e 386º todos do Código Penal, conjugado com o disposto nos artigos 30º e 31º, n.º 1 da Lei 2/99, de 13 de Janeiro.
Em síntese, alegou que no dia 7 de Maio de 2003 a estação de televisão SIC transmitiu no seu noticiário, emitido às 20h00, uma peça jornalística, na qual se disse que haviam sido detidos funcionários dos Serviços de Finanças de Setúbal, um dos quais o respectivo director, «por suspeita de corrupção na administração fiscal» cujos autores foram L., J., M., V. e R.
E que, no 8 de Maio de 2003 foi publicada no jornal 'Diário Económico' uma notícia cujos autores foram os arguidos B. e J., na qual se referiu também que haviam sido detidos funcionários das Finanças, um dos quais o Director Distrital de Setúbal (J.) os quais seriam suspeitos da prática de factos susceptíveis de integrar crimes de corrupção activa e passiva.
À data o participante J. exercia funções de Director da Direcção Distrital de Finanças de Setúbal.
Não apresentou queixa contra os respectivos Director (artigo 19° da Lei de Imprensa) e Director de Informação (artigo 31º da Lei de Televisão).
Nenhum dos denunciados exercia à data funções de director de tal jornal ou de director de informação da estação de televisão em causa.
Atendendo à qualidade do ofendido tal ilícito assume natureza semi-pública - cfr. artigo 188°, 184°, 132°, n.º 2, alínea j) e 386°, todos do Código Penal.
Questão que tem vindo a ser debatida pela doutrina e jurisprudência é a de saber qual a responsabilidade de tais indivíduos, atendendo ao estatuído no artigo 31º n.º 3 e 65º, n.º 3, respectivamente da Lei de Imprensa e da Lei de Televisão.
Ou seja, se relativamente às notícias que emitam as estações de televisão ou que sejam publicadas em jornais a responsabilidade penal dos respectivos director e director de informação assume a natureza de co-autoria relativamente à dos autores das notícias em causa ou se pelo outro lado a respectiva responsabilidade é autónoma da dos autores de tais notícias.
Parece-me que se trata de responsabilidades autónomas .
Ou seja, julgo que para se lhes imputar a prática de factos qualificados como crime é necessário que para além da divulgação das notícias susceptíveis de integrar o mencionado crime de difamação, na forma agravada, se verifiquem os requisitos, legalmente definidos, ou seja, que tais indivíduos tenham a possibilidade de se opor à divulgação das notícias e não o façam, podendo fazê-lo, tendo obviamente conhecimento do teor das notícias em causa.
A responsabilidade criminal nos crimes cometidos através de imprensa cabe aos autores dos textos e imagens, sendo os respectivos directores penalmente responsáveis quando não se oponham à divulgação das notícias podendo fazê-lo, ou seja quando omitam o procedimento adequado à comissão do crime, obviamente quando nenhuma responsabilidade lhes deva ser imputada na elaboração das notícias em causa.
Em meu entender, a responsabilidade penal dos directores não se assume como co-autoria, por não se verificar em tais situações uma actuação conjunta, querida por todos em igualdade de circunstâncias, não podendo afirmar-se que actuem de forma concertada na execução de um plano por todos querido .
Assim sendo, parece-me que os directores de informação não devem ser acusados apenas em razão das funções que exercem, impondo-se que lhes possam ser imputados factos dos quais resulte a sua responsabilidade ao não se oporem à divulgação de tais notícias podendo fazê-lo, isto é, impõe-se que contra estes sejam apresentados factos dos quais resulte que tiveram oportunidade de se opor à divulgação das notícias e não o fizeram.
Pelo que, entendo que sendo autonomizáveis a responsabilidade dos autores das notícias e a dos respectivos directores, sendo objecto de imputações penais distintas, o Ministério Público só possui legitimidade para a promoção do procedimento se o ofendido, nomeadamente, manifestar vontade de que se proceda criminalmente contra os directores de informação, imputando-lhes a prática de factos dos quais resulte a respectiva responsabilidade criminal – artigo 49° do Código de Processo Penal.
Não foi apresentada queixa quanto ao director do «Diário Económico» nem contra o director de Informação da SIC.
Pelo que determino, nesta parte, o arquivamento do inquérito, nos termos do disposto no artigo 277º, n.º 1 do Código de Processo Penal.
Notifique o ofendido – artigo 277º, n.º 3 do Código de Processo Penal.
Dê conhecimento aos arguidos, com cópia do despacho que antecede».
Os arguidos L. e M. requereram a abertura de instrução (fls. 395 a 400) suscitando, logo no início do requerimento apresentado, a seguinte questão prévia:
«1 – O Assistente não apresentou queixa contra o Director da SIC, apesar de conhecer a sua identidade, como em regra a maioria da população portuguesa.
2 – Com tal conduta, o Assistente desistiu da queixa contra o mencionado director.
3 – Mais, foram diversas as reportagens sobre a matéria em causa, com a 'voz off” de várias jornalistas, cuja identidade o Assistente não quis apurar, sendo estas também comparticipantes do alegado ilícito em causa.
4 – Ao contrário do defendido pelo despacho que encerrou o inquérito, a conduta do director ou quem o substitua não são autónomas, da do autor da peça.
5 – Isto porque, o crime de difamação só se considera praticado, com a emissão da reportagem em causa, uma vez que só assim é que esta se torna pública.
6 – Ou seja, apesar de um jornalista elaborar uma reportagem, só por si não é garante de que a mesma é emitida.
7 – É, por isso, necessário e fundamental a intervenção de um terceiro, que ordene a emissão da reportagem em causa – o director ou quem o substitua.
8 – Nos presentes autos, o Assistente não quis perseguir criminalmente, os responsáveis pela ordem de emissão das reportagens em causa.
9 – Estamos pois, perante desistência de queixa, o que aproveita os restantes nos termos do disposto no artigo 116º do CP.
10 – O mesmo se diga quanto à não dedução de queixa contra as diversas jornalistas intervenientes nas reportagens e diversos apresentadores.
Deve pelo exposto, ser de imediato proferido despacho de arquivamento».
O sr. juiz, no início da decisão instrutória, apreciou essa questão dizendo o seguinte (fls. 733 a 736):
«Da alegada desistência de queixa
Os arguidos, M. e L., pediram a abertura de instrução – fls. 395 e ss – e, além do mais, como questão prévia, alegaram que o assistente não apresentou queixa contra o Director da SIC, o que implica uma desistência com o mesmo que aproveita os restantes, ao abrigo do disposto no artigo 116° do Código Penal.
Apreciando
A questão foi, a nosso ver, apreciada pelo M°P°, no seu douto despacho de encerramento do inquérito e no qual, nesta matéria, arquivou os autos segundo o entendimento, a nosso ver correcto, de que a responsabilidade dos directores é autónoma da dos autores da notícia. E haverá responsabilidade dos mesmos na medida em que possam ou devam obstar à publicação da notícia e de alguma forma não o façam, dando o seu contributo para a publicação da mesma.
Ademais subscrevemos o entendimento do M°P° e segundo o qual é necessário que, relativamente aos Directores, se demonstre que tiveram oportunidade de se opor à divulgação da notícia, alegando-se e provando-se que é uma das suas tarefas, que não o fizeram e que dessa forma subscreveram a notícia.
Isto mesmo resulta, a nosso ver, quer do disposto no artigo 65°, n.º 3, da Lei n.º 32/2003, de 22/08 (Lei da Televisão) como do artigo 31°, n.º 3, da Lei 2/99, de 13/01 (Lei de Imprensa).
Neste sentido, J. in 'Nova Lei de Imprensa' Livraria Petrony 1999, anotação ao artigo 31° da Lei de imprensa, pag. 99 e ss escreve:
'Para que o director …ou quem concretamente os substitua... sejam criminalmente responsáveis importa que:
a) tenham conhecimento do escrito ou da imagem susceptível de constituir crime;
b) tenham possibilidade (ou se encontrem em posição) de se opor à publicação do referido escrito ou da imagem;
c) não se oponham devida e eficazmente à publicação do escrito ou da imagem.
Estes requisitos são de verificação cumulativa'.
Já no que tange à co-autoria escreve ainda o citado autor (mesma obra e mesma anotação):
'A responsabilidade criminal por crime cometido através da imprensa cabe, em regra, a quem for o autor do texto...' e mais à frente entende que '...é de afastar a co-autoria mediata ou moral pois o facto, expresso na lei, de criar o texto ou imagem parece exigir a autoria material'.
Todavia, em sentido oposto, parecendo exigir um ónus da prova de inocência a recair sobre arguido, escreve J.M. Coutinho Ribeiro in Lei de Imprensa e Legislação Conexa , Quid Juris 2001, em anotação ao artigo 31, pag. 110 e 111:
'... parece ser solução adequada responsabilizar igualmente o director nos termos do número 3… caso não consiga demonstrar que não teve possibilidades de impedir a publicação do texto em causa'.
Para este autor o seu entendimento é de que '... continua a existir a responsabilidade solidária dos directores.' — pag. 110, obra citada.
Não nos parece ser, com o devido respeito, o melhor entendimento do texto legal cuja redacção nos deixa muitas dúvidas.
Parece-nos inexistir a aludida responsabilidade (pelo menos penal) solidária, o que implica que se demonstre uma co-autoria material na elaboração e/ou publicação do texto, que, muitas vezes, pode não existir.
E assim, parece-nos, que se o ofendido procede criminalmente contra o autor do texto e já não contra o eventual director, não se pode admitir que está a desistir da queixa contra o referido director, a aproveitar o autor do referido texto, mas antes e tão só que o ofendido não dispõe de elementos que lhe permitam proceder criminalmente também contra os directores.
Aliás, o n.º 3, do artigo 116°, do Código Penal, ao referir-se à desistência de queixa '… relativamente a um dos comparticipantes ...' implica que o ofendida conheça a sua existência, isto é, saiba que o crime foi cometido por mais do que um indivíduo, optando por proceder apenas contra um deles.
Quando o ofendido desconhece o envolvimento de todos os co-autores não nos parece ser legítimo afirmar que o referido ofendido desistiu de proceder criminalmente contra todos.
Tendo então em atenção o supra exposto e compulsada a queixa feita pelo ofendido, verificamos que este procedeu criminalmente contra todos os eventuais responsáveis, como resulta, por exemplo, do artigo 7º da queixa inicial.
Deste modo, e porque nesta matéria nada foi demonstrado, o facto de não se ter procedido criminalmente, em termos de acusação, contra os aludidos directores, não consubstancia uma desistência de queixa, a aproveitar os restantes arguidos, nos termos do disposto no artigo 116º, do Código Penal.
Assim, não há qualquer 'desistência válida' improcedendo, nestes termos, a aludida questão prévia».
2 – Os arguidos L. e M. interpuseram recurso desse despacho, na parte em que ele apreciou essa questão prévia (fls. 761 a 767).
A motivação apresentada termina com a formulação das seguintes conclusões:
A) Num crime semi-público, existindo co-autoria e só sendo apresentada queixa quanto a alguns dos co-autores, não podem ser estes submetidos a julgamento (cf. acórdão da Relação de Guimarães de 02/12/2002);
B) O crime pelo qual vêm os Recorrente pronunciados, só se consuma com a publicação, que eles não fizeram nem promoveram, nem de tal vêm pronunciados;
C) Por isso, quem promoveu a publicação da reportagem em causa é também autor material do crime em causa;
D) A lei estipula como função e responsabilidade dos directores dos meios de comunicação social, essa tarefa de edição e publicação dos trabalhos elaborados pelos jornalistas;
E) Uma vez que a queixa criminal se estende a todos os comparticipantes, não colhe o facto de não ter sido apresentada queixa contra o director da SIC, uma vez que o inquérito deve apurar a responsabilidade dos autores, co-autores, cúmplices e demais auxiliares dos factos propostos à análise;
F) E o Assistente, representado por Advogado, não só não desconhece a co-autoria legalmente estabelecida do Director, como não lhe aproveita esse desconhecimento, a ter ocorrido;
G) E, assim sendo, deveria ter reagido à insuficiência de inquérito verificada, quando o processo lhe foi aberto para exame, isto é, no final do inquérito, com essa reacção possibilitando novas diligências de prova e a formulação de uma acusação isenta de erros ou defeitos;
H) Não tendo reagido contra a insuficiência de inquérito e não tendo, ab initio, apresentado queixa contra o director da SIC, e tendo aceite a acusação formulada pelo MP apenas contra os ora recorrentes, o Assistente praticou actos e omissões de onde se deduz a desistência de queixa criminal contra o Director da SIC;
I) A desistência de queixa aproveita aos Arguidos pronunciados, uma vez que este é um crime semi-público, sem cuja queixa os Arguidos não podem ser perseguidos;
J) Por tudo o que os Arguidos, ora recorrentes, devem ser despronunciados;
K) Foram, pela decisão recorrida, violados os seguintes preceitos legais conjugados: artigos 31 e 65 n.º 3 da Lei 32/2003, de 22 de Agosto e 20 e 31 n.º 3 da Lei 2/99, de 13 de Janeiro, artigos 114º, 115º n.º. 2 e 116º n.ºs 1 e 3, 180º n.º 1, 183º n.º 2, 184º e 188º, alínea a), todos do Código Penal e artigo 120º n.º 2, alínea d) do Código de Processo Penal».
3 – Esse recurso foi admitido pelo despacho de fls. 791.
4 – O Ministério Público respondeu à motivação apresentada defendendo a improcedência do recurso (fls. 800 a 806).
5 – Neste tribunal, o sr. procurador-geral-adjunto, quando o processo lhe foi apresentado, apôs nele o seu visto.
II – FUNDAMENTAÇÃO
6 – Uma vez que o recurso interposto pelos arguidos é manifestamente improcedente, o tribunal limitar-se-á, nos termos dos n.°s 1 e 3 do artigo 420° do Código de Processo Penal, a especificar sumariamente os fundamentos da decisão.
7 – De acordo com o n.º 1 do artigo 60º da Lei n.º 31-A/98, de 14 de Julho , «os actos ou comportamentos lesivos de interesses jurídico-penalmente protegidos perpetrados por meio da televisão são punidos nos termos da lei penal e do disposto no presente diploma».
Uma vez que a mencionada lei não contém qualquer norma especial relativa à comparticipação criminosa , é aplicável aos crimes cometidos através da televisão o disposto nos artigos 26º e 27º do Código Penal.
Podem, por isso, ser responsabilizados pela prática de tais crimes os seus autores , instigadores e cúmplices.
Entre os primeiros podem muito bem incluir-se os directores , na medida em que eles tenham violado dolosamente o dever de garante que o n.º 2 do artigo 60º da então vigente Lei da Televisão sobre eles fazia impender .
Essa autoria, fundada numa omissão dolosa, em nada interfere com a co-autoria daqueles que tenham eventualmente assumido um comportamento activo . É uma responsabilidade por facto próprio e não por facto de outrem.
Todos são responsáveis pelo evento, se bem que a sua contribuição para ele seja diferente.
Todos eles são comparticipantes no mesmo crime.
Por isso, «a apresentação de queixa contra um dos comparticipantes no crime torna o procedimento criminal extensivo aos restantes» (artigo 114º do Código Penal).
8 – O direito de queixa deve ser exercido «no prazo de 6 meses a contar da data em que o titular tiver tido conhecimento do facto e dos seus autores» (artigo 115º, n.º 1).
Por isso, pode bem acontecer que, tendo o titular do direito de queixa tido conhecimento da identidade de um dos responsáveis pelo crime, tenha deixado decorrer esse prazo de 6 meses sem que tenha exercido o direito de queixa.
Nessa situação, «o não exercício tempestivo do direito de queixa relativamente a um dos comparticipantes no crime aproveita aos restantes» (artigo 115º, n.º 2).
Não foi certamente isto que aconteceu neste caso.
9 – A renúncia, a que se refere o n.º 1 do artigo 116º, pressupõe que o direito ainda não tenha sido exercido, o que não aconteceu nestes autos.
A queixa foi apresentada contra alguns dos eventuais responsáveis, estendendo-se aos outros comparticipantes nela não mencionados (artigo 114º).
10 – Também não encontramos nos autos qualquer desistência de queixa, quer expressa, quer tácita.
Ela não pode, com toda a probabilidade, deduzir-se do facto de o assistente se ter conformado com a decisão do Ministério Público de arquivar os autos quanto ao director (não tendo arguido a nulidade por insuficiência do inquérito e/ou requerido a abertura de instrução, como dizem os recorrentes), nem muito menos de não ter incluído todos os eventuais responsáveis na queixa oportunamente apresentada.
Como vimos, tal não era sequer necessário.
A este propósito acrescente-se apenas que o silêncio, que não se confunde com qualquer declaração tácita, não vale como desistência de queixa .
11 – Porque não existe qualquer desistência de queixa e isso se torna evidente, o recurso interposto pelos arguidos não pode deixar de ser rejeitado por manifesta improcedência.
12 – Uma vez que os arguidos decaíram no recurso que interpuseram são responsáveis pelo pagamento da taxa de justiça e dos encargos a que a sua actividade deu lugar (artigos 513º e 514º do Código de Processo Penal).
De acordo com o disposto na alínea b) do nº 1 e no nº 3 do artigo 87º do Código das Custas Judiciais a taxa de justiça varia entre ½ e 15 UCs.
Tendo em conta a complexidade do processo, julga-se adequado fixar essa taxa, para cada um dos arguidos, em 4 UCs.
Para além disso, uma vez que o recurso foi considerado manifestamente improcedente, devem os recorrentes, como medida dissuasória, pagar uma importância entre 3 e 10 UCs (nº 4 do artigo 420º do Código de Processo Penal).
Atendendo aos factores considerados na graduação da taxa de justiça e ainda ao grau de abuso do direito de recurso, julga-se adequado fixar essa importância no mínimo legal, ou seja, em 3 UCs.
III – DISPOSITIVO
Face ao exposto, acordam os juízes da 3ª secção deste Tribunal da Relação em:
a) Rejeitar, por ser manifestamente improcedente, o recurso interposto pelos arguidos L. e M.;
b) Condenar cada um dos recorrentes no pagamento das custas do recurso, com taxa de justiça que se fixa em 4 (quatro) UCs.
c) Condenar cada um dos arguidos na sanção processual correspondente a 3 (três) UCs.
Lisboa, 28 de Março de 2007
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(Carlos Rodrigues de Almeida)
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(Horácio Telo Lucas)
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(Pedro Mourão)