Procuradoria-Geral Distrital de Lisboa
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    Jurisprudência da Relação Criminal
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 - ACRL de 19-12-2006   Detenção de estupefacientes para consumo pessoal – Crime – Contra-ordenação – Aplicação da lei no tempo
I – A sentença recorrida deu como provado, que os arguidos se encontravam na posse de 244,159 g de haxixe, que haviam adquirido por 40.000$00, tendo cada um deles contribuído com 20.000$00, e destinando todo esse produto estupefaciente ao seu consumo pessoal;
II – Em sede de enquadramento jurídico, o Tribunal “a quo” considerou que tal factualidade integrava, à data da sua prática, o ilícito p. e p. pelo artigo 40.º n.º 1 do Decreto-Lei n.º 15/93 de22/01, deixando de ser criminalmente punível com a entrada em vigor da lei n.º 30/00 de 29/11, por via dos seus artigos 2.º e 28.º;
III – Porém, à data da sua prática a conduta dos arguidos integrava, antes, sem margem para dúvidas, a previsão do artigo 40.º n.º 2 do Decreto-Lei n.º 15/93 de 22/01 – reguladora da detenção de estupefacientes em quantidade superior à necessária para o consumo médio individual do agente durante o período de 3 dias;
IV – Actualmente, à aquisição e detenção para consumo próprio de estupefacientes em quantidade que exceda a necessária para o consumo médio individual durante o período de 10 dias não é aplicável o regime instituído pela Lei n.º 30/00 de 29/11, por a tal obstar o n.º 2 do artigo 2.º da referida lei, pelo que tais condutas não foram transformadas em simples contra-ordenação.
V – A quantidade de estupefaciente detida pelos arguidos – “canabis-resina” - supera largamente a necessária para o consumo médio individual durante o período de 10 dias, face ao estabelecido no artigo 9.º da Portaria n.º 94/96 de 26/03 e no mapa a ela anexo.
VI – Perante a matéria de facto dada como provada e a delimitação do âmbito de aplicação da Lei n.º 30/2000, de 29/11, estabelecida no seu artigo 2.º, deveriam os arguidos ter sido condenados pela prática do crime p. e p. pelo artigo 40.º n.º 2 do Decreto-Lei n.º 15/93 de 22/01, por via de interpretação restritiva do artigo 28.º daquela Lei n.º 30/2000.
VII – O Tribunal “a quo”, embora considerando descriminalizada a conduta dos arguidos por força da entrada em vigor da Lei n.º 30/00 de 29/11, não tece qualquer consideração sobre a quantidade do estupefaciente detido, parecendo entender que a concreta ponderação dessa quantidade é irrelevante para tese que perfilhou.
VIII – Ao eximir-se a tal ponderação, a sentença recorrida violou a norma constante do artigo 2.º da Lei n.º 30/00 de 29/11, interpretando-a no sentido de a aquisição e detenção de estupefacientes para consumo próprio constituir sempre mera contra-ordenação, independentemente da sua quantidade e, designadamente, dos limites estabelecidos no n.º 2 daquele artigo, quando a deveria ter interpretado no sentido de que a punição como contra-ordenação só ocorre quando a quantidade de estupefaciente adquirida ou detida não excede a necessária para o consumo médio individual do agente durante o período de 10 dias.
Proc. 5788/06 5ª Secção
Desembargadores:  Filipa Macedo - Nuno Gomes da Silva - Santos Rita - Pulido Garcia
Sumário elaborado por Gilberto Seabra