A mera instauração da execução não é causa de suspensão da prescrição da coima.
Nota -
Segue parecer do MP nº. 2698/2006
Proc. 7034/06 3ª Secção
Desembargadores: Conceição Gomes - Teresa Féria - Carlos Almeida -
Sumário elaborado por João Ramos
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PROC. nº 7034/06 (3.ª Secção)
Proc. nº 2151/03.0TBLRS - 2º Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Loures
Acordam em Conferência na 3ª secção Criminal do Tribunal da Relação de Lisboa
1. Relatório
1.1. Inconformado com o despacho de 27Set04, que nos termos do art. 29º, nº 1, alínea b), do Regime Geral das Contra Ordenações, julgou extinta a execução por coima instaurada pelo Ministério Público contra f. …, por prescrição da coima, veio o MP interpor o presente recurso, que motivou concluindo nos seguintes termos:
«1 ° - Face ao documentado nos autos e às disposições normativas aplicáveis constata-se que o Ministério Público interpôs a execução no prazo legal.
2° - Ao proferir a sentença em apreço, violou o Mmo Juiz “a quo' o disposto nos artigos 156° do Código da Estrada, e 29°, nºs 1 e 2, 59°, nº3, e 60º do RGCO.
Termos em que, deve ser revogada a sentença recorrida que julgou extinta a presente execução”.
1.2. Na 1.instância não houve resposta.
1.3. Nesta Relação o Exmo PGA emitiu douto Parecer no sentido da rejeição recurso por manifesta Improcedência, porquanto: «O confronto da documentação dos autos permite analisar a data do trânsito ou, com mais precisão, o carácter definitivo da decisão administrativa, e a existência ou inexistência de factos interruptivos ou suspensivos da contagem do prazo da prescrição e, por isso, concluir sobre o acerto da decisão recorrida.
Em causa uma contra-ordenação prevista e sancionada pelo Código da Estrada, em seu artigo 81°, nº1, e5 c).
A decisão da autoridade administrativa foi notificada por via postal simples com depósito no dia 28-10-2002, segunda-feira (fls. 18). Nos termos do artigo 156°, nºs 3 e 6 do C. Estrada, então vigente (DL n.º 265-Al2001, de 28/09) a notificação considera-se efectada no terceiro dia útil posterior ao do envio, ou seja, quinta-feira, dia 31-10-2002.
Em harmonia com as disposições dos artigos 59°, nº3 e 60° do RGCO, o prazo de recurso, de 20 dias, terminou a 29-11-2002 (descontados os Sábados, Domingos e o feriado de 01 de Novembro),
Daí resulta que a coima prescreveria a 29-11-2003(1 ano após o carácter definitivo da decisão da autoridade administrativa - art. 29°, nº1, alínea b) e nº 2 do RGCO, se, entretanto, não ocorresse facto interruptivo ou suspensivo.
A execução foi instaurada a 27-11-2003 (fls. 2), logo, antes de prescrita a coima.
A instauração da execução interrompeu a contagem do prazo de prescrição, passando a mesma a reger-se pelo prazo máximo de 18 meses, nos do artigo 30°-A do RGCO, no qual deverá descontar-se o tempo de suspensão.
Sem novo facto interruptivo ou sem facto que ocasionasse a suspensão, o prazo interrompido pela instauração da execução terminaria a 29-5-2004. Sendo o despacho recorrido datado de 27-9-2004, estaria excedido esse prazo e seria acertada a decisão recorrida.
Na realidade, examinados os autos, verifica..se que nenhum outro facto ocorreu com efeito interruptivo ou suspensivo da contagem do prazo de prescrição. Ao contrário do que se argumenta na motivação do Ministério Publico da 1ª instância, a instauração da execução não suspende esse prazo.
No ensinamento do Prol Figueiredo Dias, in D. Penal Português, in “As Consequências Jurídicas do Crime, §§ 1144, 1149 e 1150”: O instituto da suspensão da prescrição radica na ideia segundo a qual a produção de determinados eventos, que excluem a possibilidade de o procedimento se iniciar ou continuar, deve impedir o decurso do prazo de prescrição”.
Mas, também, considera que as causas de suspensão têm de constar expressamente da Lei. A propósito da interrupção de prescrição do procedimento, num raciocínio fundado no elemento teleo16gico e na razão de política criminal, que, por paralelismo, pode aplicar-se à suspensão quer do procedimento criminal, quer da coima, afirma que “nem todos os actos do juiz ou do MP devem possuir aquela virtualidade, antes só aqueles que, no decurso do processo penal, assumam um relevo e um significado que dê claramente a entender que o Estado, como intérprete das exigências comunitárias, continua interessado em efectivar, no caso, o seu ius puniendi”. E, mais adiante, que as causas de interrupção da prescrição têm a característica objectiva “de assumirem um relevo processual que traduza a afirmação solene da pretensão estadual de efectivação do ius puniendi”.
As causas de suspensão da prescrição das coimas terão de estar previstas pela lei. No caso, a previsto consta do art. 30° do RGCO. São assim autónomas do regime fixado pelo Código Penal para a suspensão da prescrição das penas, no seu artigo 125°. Porém, o conteúdo da alínea a) desse artigo 30° corresponde, ipsis verbis, ao da alínea a), do n.º1, do artigo 125°. Daí que, pressuposto que não possa admitir-se um regime mais rigoroso para as infracções contra-ordenacionais do que para as penais - importará menos a efectiva punição de uma contra-ordenação o cumprimento de uma coima do que o de um crime, de uma sanção penal - a interpretação do primeiro preceito deva ter a inspiração da do segundo. Primitivamente não existia norma autónoma no RGCO, tendo a mesma sido introduzida pelo DL nº 244/95, de 14 de Setembro, com esse objectivo de autonomização do regime penal afirmado no seu preâmbulo.
Quando, na citada alínea b), se prevê a suspensão se –“a execução for interrompida. têm-se em conta os casos legais de interrupção da instância executiva, não os casos, como o presente, de paragem e descontinuidade da tramitação por razões pr6prias do funcionamento do tribunal.
Será o caso da suspensão da execução resultante de ter sido proferida acusação, pelo mesmo facto, em processo criminal, previsto pelo nº 2, do artigo 90°, do próprio RGCO. Como poderá ser o da suspensão por efeito de oposição à execução ou à penhora, estabelecida no nº 2, do artigo 818º, do C. Processo Civil.
A lógica do preceito e a teleologia do instituto da suspensão levam-nos a concluir que, em todos os casos das diferentes alíneas do artigo 30°, está ínsita uma causa interna do sistema: a impossibilidade ou alongamento de execução da coima como resultado da interferência de normas relativas a outros procedimentos do caso. A diferença á a de que, na alínea a), esse resultado gera-se da aplicação directa e imediata da lei. No caso das alíneas b) e c), o resultado é indirecto sendo consequência da mediação de actos judiciais.
A mera instauração da execução, até por aplicação, a contrario, da alínea a), não é causa de suspensão. Se a lei declarou que se suspende a prescrição se a execução, por força da lei, não pode começar ou continuar, então é porque se a lei permitir que ela possa ser instaurada e prosseguida, não se suspende. A interpretação da alínea b) não pode ser feita à margem da previsão da alínea a).
Assim, não pode perfilhar-se a posição do Minist6rio Público na 1ª instância, de que não ocorreu, ainda, a prescrição da coima e, portanto, de que o despacho recorrido enferma de ilegalidade, carecendo de fundamento. Ao contrário, afigura-se-nos que a prescricãoo ocorreu em 29-05-2004.
Em conclusão; a instauração da execução de coima não suspende a prescrição pelo que o despacho recorrido, ao declarar prescrita a coima e extinta a execução, fez correcta aplicação do direito».
1.4. No exame preliminar foi suscitada a questão prévia da rejeição do recurso por manifesta improcedência.
1.5 Foram colhidos os Vistos legais.
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2.FUNDAMENT ACÃO
2.1.Resultam dos autos as seguintes ocorrências processuais relevantes para a decisão do presente recurso:
2.1.1. Por decisão de 100UTO2, da Governadora Civil de Lisboa, foi f. … … condenado pela prática em 02MARO2 da contra-ordenação, p. e p., pelos artigos 81°. nºs 1 e 5, 139º e 147°, do CE, na coima de € 540,00, bem como na sanção acessória de inibição do direito de conduzir pelo período de 60 dias (fls. 8 e 9).
2.1.2. A decisão da autoridade administrativa foi notificada ao arguido em 280UTO2, por via postal simples (fls. 18)
2.1.3. Em 27NOVO3 foi instaurada a execução pelo Ministério Público contra o arguido f. … …, por falta de pagamento da coima.
2.1.4. O executado foi citado para a execução em 29DEZ03, por carta registada com a/r (fls. 13}, na sequência de despacho judicial de citação (fls. 11).
2.1.5. Por despacho de 27SET04, que nos termos do art. 29°, nº1, alínea b), do Regime Geral das Contra Ordenações, julgou extinta a execução por coima intentada pelo Ministério Público contra f. … …, por prescrição da coima, com os seguintes fundamentos:
«Nos presentes autos de execução por coima intentado pelo Ministério Público, em representação da Direcção-Geral de Viação, contra o executado verifica-se que: a contra ordenação foi cometida em 02/03/2002; a decisão administrativa é de 10/10/2002; a notificação desta é de 28/10/2002; a interposição desta execução é de 27/11/2003.
Assim, pelo decurso do prazo de 1 (um) ano, (entre os dois últimos factos), nos termos do art. 29°, n.º1, alínea b), do Regime Geral das Contra Ordenações, declaro verificada a prescrição da coima e, em consequência, julgo extinta a presente execucão».
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3. O DIREITO
3.1. O objecto do presente recurso, atentas as conclusões da respectiva motivação, limita-se à questão de saber se ocorreu ou não a prescrição da coima, e consequentemente se a execução deve ou não ser declarada extinta.
3.1.1, Vejamos, antes do mais as normas que regem o instituto da prescrição da coima.
De harmonia com o disposto no art. 29°, nº 1, do DL nº 433/82, de 270UT, as coimas prescrevem nos prazos seguintes:
a) três anos no caso de uma coima superior ao montante previsto no no1 do art. 17°;
b) Um ano nos restantes casos.
Por seu turno disposto no nº2, do citado preceito que «O prazo conta-se a partir de carácter definitivo ou do trânsito em julgado da decisão condenatória.
As causas de suspensão da prescrição da coima vêm previstas no art. 300 , do mesmo diploma legal, dispondo o citado normativo que a prescrição da coima suspende-se durante o tempo em que:
“a) Por força da lei a execução não pode começar ou não pode continuar a ter lugar;
b) A execução foi interrompida;
c) Foram concedidas facilidades de pagamento”.
O art. 30º-A, nº 1 do DL nº 433/82, de 270UT, consagra que, “a prescrição da coima interrompe-se com a sua execução, sendo que nos termos do n.º 2, do citado normativo “A prescrição da coima ocorre quando, desde o seu início e ressalvado o tempo de suspensão, tiver decorrido o prazo normal da prescrição acrescido de metade”.
3.1.2. No caso dos autos como se viu, o prazo de prescrição da coima é de um ano, nos termos do art. 29º, nº1, do DL. n.º 433/82, de 29DEZ, atento o montante máximo da coima aplicável à infracção.
Como resulta dos autos a decisão da autoridade administrativa, foi notificada ao arguido f. … … em 280UT02, por via postal simples.
As decisões das autoridades administrativas que aplicam uma coima são susceptíveis de impugnação judicial, por meio de recurso, interposto pelo arguido ou pelo seu defensor, por escrito e apresentado à autoridade administrativa que aplicou a coima, no prazo de 20 dias após o seu conhecimento pelo arguido, devendo constar de alegações e conclusões (art. 59º, nºs 1 , 2 e 3, do DL 433/82, de 270UT, na redacção dada pelo DL. 244/95, de 14SET).
Na vigência do DL n.º 433/82, de 270UT, na redacção, que lhe foi introduzida pelo DL. n.º 356/89, de 170UT, o ST J, pelo acórdão n.º 2/94, de 10MAR, fixou Jurisprudência obrigatória, no sentido de que “não tem natureza judicial o prazo mencionado no n.º 3 do artigo 59°, do DL. n.º 433/82, de 27OUT, com a alteração introduzida pelo DL 356/89, de 170UT' .
Daqui se conclui, assim, que se trata de um prazo de natureza administrativa.
Porém, o regime geral das contra-ordenações previsto no mesmo diploma - DL. n.º 433/82, de 270UT, alterado pelo DL 359/89, de 170UT - veio a sofrer nova alteração, por via do supra mencionado DL n.º 244/95, de 14SET.
Conforme consta expressamente do seu Preâmbulo, a reforma do regime geral das contra-ordenações introduzida pelo citado diploma, “intensificou a coerência interna do regime geral de mera ordenação social e da respectiva coordenação coma legislação penal e processual penal, devendo entender-se especialmente orientada para o efectivo reforço das garantias dos arguidos perante o crescente poder sancionatório da Administração. Afigurou-se adequado proceder ao aperfeiçoamento da coerência interna deste com o disposto na legislação penal e processual penal”.
Nesta linha de orientação o artigo 60º, do mesmo diploma estabelece as regras como deve contar-se o prazo para a impugnação, determinando que “o prazo para a impugnação da decisão da autoridade administrativa se suspende aos sábados, domingos e feriados”, aliás, em conformidade com a regra prevista no art. 72°, n.º 1, al. b), do Código do Procedimento Administrativo, que prevê que “o prazo começa a correr independentemente de quaisquer formalidades e suspende-se nos sábados, domingos e feriados”.
Daí que, tendo a decisão da autoridade administrativa sido notificada ao arguido f. … … em 28OUT02, a notificação considera-se efectuada no terceiro dia útil posterior ao do envio, ou seja, dia 31OUTOO2 [quinta - feira] (art. 156°, nºs 3 e 6, do CE, na redacção dada pelo DL n.º 265-A/2001,de 28SET).
Assim, em face dos artigos 59°, n.º 3 e 60°, do DL n.º 433/82, de 270UT , na redacção dada pelo DL n.º 244/95, de 14SET, o prazo de impugnação judicial de 20 dias, terminou em 29NOV02, descontados os Sábados, Domingos e o feriado do dia 01 de Novembro.
Neste sentido, a decisão da autoridade administrativa, não tendo sido objecto de impugnação judicial constituiu caso decido ou caso resolvido, em 29NOV02, consolidando-se o acto administrativo na ordem jurídica, atendendo ao princípio da estabilidade dos actos administrativos, e que a doutrina faz uma equiparação entre o caso julgado judicial, decisão judicial que já não pode ser objecto de recurso, por ter transitado em julgado (art. 677°, da C PC), e o caso decidido ou resolvido dos actos administrativos, pelo que, por força do art. 79º, do DL n.º 433182, de 27OUT, que fixa o alcance definitivo da decisão administrativa, conferindo-lhe um valor em tudo igual ao caso julgado de uma decisão judicial, mais não significa que, uma vez proferida a decisão administrativa, que não foi objecto de impugnação judicial; por não ter sido interposta em tempo, ou porque o não foi mesmo, por o arguido com ela se ter conformado, constitui caso decidido ou resolvido.
Assim sendo, a coima prescrevia em 29NOV03, OU seja, um ano ap6s o carácter definitivo da decisão da autoridade administrativa, por força do disposto no art. 29°, no1, al. b), e no2, do DL n.º 433/82, de 270UT, se entretanto não tivesse ocorrido qualquer causa de suspensão ou de interrupção da prescrição da coima. Contudo, a execução foi instaurada em 27NOV03, ainda antes de prescrita a coima, pelo que nesta data [27NOV03] , ou, eventualmente, na data da citação do executado [29DEZ03], (art. 267° do C PC), [se assim fosse, nem sequer teria havido interrupção da prescrição porque o prazo já tinha, entretanto, decorrido}, ocorreu a interrupção da prescrição da coima (art. 30°-A, n.º1, do DL n.º 433/82, de 27OUT).
Assim, a partir de 27NOV03, começou a correr novo prazo de prescrição da coima.
Ora, de harmonia com o disposto no art. 30°-A, nº 2, do mesmo diploma legal, “a prescrição da coima ocorre quando, desde o seu início e ressalvado o tempo de suspensão, tiver decorrido o prazo normal da prescrição acrescido de metade”.
Assim sendo, não tendo ocorrido nos autos qualquer outro facto interruptivo ou qualquer causa de suspensão da prescrição da coima, a mesma prescreveu no dia 29MAI04 [18 meses sobre a data da consolidação do acto administrativo, o carácter definitivo da decisão da autoridade administrativa - 29NOV03].
Ora, à data em que foi proferido o despacho sob recurso - 27SET04 - já se mostrava extinta a coima por prescrição.
3.1.3. Conforme tem vindo a defender a melhor doutrina, o instituto da prescrição traduz-se na renúncia do Estado a um direito, 'ao jus puniendi” condicionado pelo decurso de certo lapso de tempo e que tem a razão determinante na não verificação actual dos fins das penas.
Cabe aqui citar a lição do Prof. Figueiredo Dias, “a prescrição da pena cria um obstáculo à sua execução apesar do trânsito em julgado da sentença condenatória e ganha nesta medida, o carácter de um autêntico pressuposto negativo ou de um obstáculo de realização (execução) processual. Já no que toca à vertente substantiva (...), a prescrição se funda na verdade, em que o decurso do tempo tornou a execução da pena sem sentido e, por aí, o facto deixou de carecer de punição” (1. in As Consequências Jurídicas do Crime, Editorial Noticias, 1993, pág. 702).
Por outro lado, como bem salienta o Exmo. PGA no seu douto Parecer, o Prof. Figueiredo Dias, ““também, considera que as causas de suspensão têm de constar expressamente da lei. A propósito da interrupção de prescrição do procedimento, num raciocínio fundado no elemento teleológico e na razão de política criminal que, por paralelismo, pode aplicar-se à suspensão quer do procedimento criminal, quer da coima, afirma que 'nem todos os actos do juiz ou do MP devem possuir aquela virtualidade, antes só aqueles que, no decurso do processo penal, assumam um relevo e um significado que dê claramente a entender que o Estado, como intérprete das exigências comunitárias, continua interessado em efectivar, no caso, o seu ius puniendi”. E, mais adiante, que as causas de interrupção da prescrição têm a característica objectiva 'de assumirem um relevo processual que traduza a afirmação solene da pretensão estadual de efectivação do ius puniendi'.
“As causas de suspensão da prescrição das coimas terão de estar previstas pela lei. No caso, a previsão consta do art. 30° do RGCO. São assim autónomas do regime fixado pelo C6digo Penal para a suspensão da prescrição das penas, no seu artigo 125°. Porém. o conteúdo da alínea a) desse artigo 30° corresponde, ipsis verbis, ao da alínea a), do nº l, do artigo 125°. Daí que, pressuposto que não possa admitir-se um regime mais rigoroso para as infracções contra-ordenacionais do que para as penais - importará menos a efectiva punição de uma contra-ordenação o cumprimento de uma coima do que o de um crime, de uma sanção penal - a interpretação do primeiro preceito deva ter a inspiração da do segundo. Primitivamente não existia norma autónoma no RGCO, tendo a mesma sido introduzida pelo DL n.º 244/95, de 14 de Setembro, com esse objectivo de autonomização do regime penal afirmado no seu preâmbulo.
Quando, na citada alínea b), se prevê a suspensão se 'a execução for interrompida' têm-se em conta os casos legais de interrupção da instância executiva, não os casos, como o presente, de paragem e descontinuidade da tramitação por razões próprias do funcionamento do tribunal.
Será o caso da suspensão da execução resultante de ter sido proferida acusação, pelo mesmo facto, em processo criminal, previsto pelo n.º 2, do artigo 90°, do próprio RGCO. Como poderá ser o da suspensão por efeito de oposição à execução ou à penhora, estabelecida no n.º 2, do artigo 818°, do C. Processo Civil.
A lógica do preceito e a teleologia do instituto da suspensão levam-nos a concluir que, em todos os casos das diferentes alíneas do artigo 30°, está ínsita uma causa interna do sistema: a impossibilidade ou alongamento de execução da coima como resultado da interferência de normas relativas a outros procedimentos do caso. A diferença é a de que, na alínea a), esse resultado gera-se da aplicação directa e imediata da lei. No caso das alíneas b)e c), o resultado é indirecto sendo consequência da mediação de actos judiciais””.
Neste sentido, a simples instauração do processo executivo para cobrança coerciva da coima, não tem a virtualidade por si só de constituir qualquer causa de suspensão da prescrição da coima, na exacta medida de que não consta do elenco das causas de suspensão da coima prevista no art. 30º, do DL n.º 433/82, de 270UT . Assim sendo, tendo ocorrido a prescrição da coima no dia 29MAI04 , à data em que foi proferido o despacho sob recurso - 27SET04 - já se mostrava extinta a coima por prescrição, pelo que não merece qualquer censura ou reparo o despacho recorrido, fazendo uma correcta interpretação e aplicação da lei.
3.2. Como tem vindo a entender o ST J, o recurso ter-se-á por manifestamente improcedente quando, através de uma avaliação sumária dos seus fundamentos, se puder concluir, sem margem para dúvidas, que o mesmo está claramente votado ao insucesso, que os seus fundamentos são inatendíveis. (2. Ac. do ST J de 31-05-2000, in Proc. n.º 210/2000 -3.ª secção). Por outro lado, a manifesta
improcedência tem a ver não só com questões processuais, mas também com questões de mérito dado o princípio de economia processual (3. do ST J de 12ABR200, in Proc, n.º 165/2000 - 3. secção).
Do exposto resulta que o recurso está manifestamente votado ao insucesso, sendo os seus fundamentos inatendíveis.
Assim sendo, “in casu”, o recurso terá que ser rejeitado, por manifesta improcedência, nos termos do artigo 420º, n.º 1, do CPP.
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4. DECISÃO
Termos em que acordam os Juízes que compõem a 3ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Lisboa, em rejeitar o recurso, por manifesta improcedência.
Sem tributação.
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Lisboa, 2006-09-27
RELATORA:
- Conceição Gomes
ADJUNTOS:
- Teresa Féria
- Carlos Almeida