Procuradoria-Geral Distrital de Lisboa
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    Jurisprudência da Relação Criminal
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 - ACRL de 14-09-2006   DESERÇÃO. Crime militar. CJM. Sucessão leis no tempo. Serviço obrigatório. NÃO descriminalização
I- O Magistrado do Ministério Público interpôs o presente recurso por inconformado com o despacho judicial que julgou extinto o procedimento criminal instaurado ao arguido, por crime de deserção do artº 72° do actual CJM por se entender que os factos se encontram descriminalizados.
II- O arguido foi incorporado no Regimento de Infantaria de Beja, em 1989-07-18, e entrou em licença (artº 94º do RGIE) com a obrigação de se apresentar na sua Unidade, no dia 02 de Outubro de 1989 - o que não fez, livre e conscientemente, bem sabendo que a sua conduta era proibida e punida por lei.
III- À data dos factos, a conduta do arguido constituía o crime previsto no artº 142º do DL 144/1977, de 9 de Abril, que estipulava 'Em tempo de paz, comete o crime de deserção o militar que:- b) Encontrando-se na situação de licença de qualquer natureza, na de disponibilidade, na de licenciado ou na de reserva, se não apresente onde lhe for determinado dentro do prazo de 10 ias a contar da data fixada no passaporte de licença, no aviso convocatório, no edital de chamada ou em qualquer outra forma de intimação.' A punição respectiva encontrava-se no artº 149º do mesmo Código (militar).
IV- Actualmente, o crime de deserção tem a sua previsão no artº 72º da Lei do Serviço Militar (Lei nº 174/99, de 21 de Setembro, regulamentada pelo DL 289/2000, de 14/11), sendo que a respectiva punição está definida no seu artº 74º.
V- É sempre pressuposto para o preenchimento do tipo que o agente seja militar. O conceito de militar está vertido no artº 4º do actual CJM. O arguido, que fora convocado, incorporado e mobilizado, encontrava-se na situação de 'efectividade de serviço', para efeitos do artº 140º do Estatuto dos Militares das Forças Armadas (DL 236/99, de 25 de Junho), logo era militar (cfr. n. 2 do artº 3º do citado DL 236/99). Com interesse para o caso concreto, note-se que, nos termos do artº 34º e segs da Lei 174/99, a qualidade de militar compreende o serviço prestado na sequência de recrutamento excepcional.
VI- Assim, ao contrário do que foi decidido no despacho recorrido, o serviço militar obrigatório não desapareceu, enquanto forma de prestação de serviço que origina a aquisição do estatuto de militar para efeitos penais, desde que tal serviço se mostre realizado em 'efectividade'. A única diferença, para além da terminologia utilizada - antes serviço efectivo normal (SEM) e, agora, serviço efectivo por convocação - é que anteriormente (à data dos factos) a mobilização ou convocação era o meio normal para se ingressar, ou fazer ingressar, os cidadãos nas fileiras das Forças Armadas, ao passo que, actualmente, tal meio só excepcionalmente será utilizado, tal como a Lei refere - o que se compreende, face à menor necessidade de efectivos.
Deste modo, uma vez que o arguido cometeu os factos imputados, e a lei nova não determinou a sua descriminalização, pese embora apelidar de serviço efectivo, revoga-se a decisão recorrida, devendo os autos prosseguir os seus ulteriores termos.
Proc. 6819/06 9ª Secção
Desembargadores:  Fernando Correia Estrela - Cid Geraldo - João Carrola -
Sumário elaborado por João Parracho