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ACRL de 23-03-2000
Burla. Artifício. Alteração não substancial.
I - Entende-se por astúcia qualquer artifício fraudulento tendente a provocar o engano ou a induzir o burlado em erro, ou seja, uma actuação engenhosa, um estratagema ardiloso, uma encenação orientada a ludibriar.II - A simples emissão de cheque sem provisão não integra, só por si, o crime de burla e como meio enganatório não basta que o sacador, no momento da entrega do cheque, guarde silêncio sobre a falta de provisão.III - No caso, o arguido actuou, de forma pré-ordenada, usando uma encenação que ele próprio criou destinada à consecução dos seus desígnios, assim conseguindo a entrega de bens mediante engano astuciosamente provocado.IV - Expressões como «fazendo uso de um verbo fácil», «duma cuidada apresentação», «com o recurso a uma indumentária e adereços de conceituadas marcas», «jovem de sucesso» e «sólida e estável família», são de uso corrente e de significado bem preciso e imediatamente compreensível pela generalidade das pessoas, traduzindo factos caracterizadores da postura do arguido ou as impressões psicológicas que esta produziu nas pessoas que com ele contactaram - o que faz parte do domínio dos factos.V - O tribunal deu como provados factos, de capital importância para integrar os crime de burla imputados ao arguido, não constantes da acusação, sem ter dado cumprimento prévio ao disposto no art. 358º, n.º 1, do CPP.VI - Essa falta integra a nulidade prevista no art. 379º, alínea b), do CPP e implica a repetição do julgamento para que seja cumprida essa formalidade - dar conta ao arguido de que tais factos podem vir a ser dados como provados e conceder-lhe, se ele o requerer, o tempo necessário à preparação da sua defesa.Relator: Goes PinheiroAdjuntos: A. Mendes e S. VenturaMP: I. Aragão
Proc. 1086/2 9ª Secção
Desembargadores: N - N - N -
Sumário elaborado por Fernando Carneiro
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