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Processo n.º 321/2005
 
 2.ª Secção
 Relatora: Conselheira Maria Fernanda Palma
 
  
 
  
 
  
 
  
 Acordam na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional
 
  
 
  
 
  
 
 1.  Nos presentes autos de fiscalização concreta da constitucionalidade, vindos 
 do Tribunal da Relação de Lisboa, em que figuram como recorrentes AA. e mulher e 
 como recorrido BB., é submetida à apreciação do Tribunal Constitucional, ao 
 abrigo do artigo 70º, nº 1, alínea b), da Lei do Tribunal Constitucional a norma 
 dos artigos 678.º, n.º 1 e 689.º, n.º 2, ambos do Código do Processo Civil, 
 segundo a qual, da Decisão de Embargos de Terceiro em que o valor dos Autos é 
 inferior ao valor da alçada do tribunal de 1.ª instância, deduzidos numa acção 
 de despejo, não se pode recorrer para o tribunal superior, neste caso, para o 
 Tribunal da Relação de Lisboa.
 Junto do Tribunal Constitucional, os recorrentes alegaram, concluindo o 
 seguinte:
 
  
 A.  Os Recorrentes Opuseram-se à Execução do Despejo da casa que habitam através 
 de Embargos de Terceiro já que não tinham sido intervenientes na Acção de 
 Despejo e, por eles, pretenderem a suspensão do respectivo mandado, bem como 
 pretenderam fazer valer a sua qualidade de arrendatários.
 A Diligência de Execução de Despejo foi suspensa e assim se encontra, não se 
 tendo ainda efectivado o respectivo despejo, continuando os Recorrentes a 
 habitar a casa e a pagar regularmente a renda.
 B.  Os Embargos foram julgados improcedentes na 1.ª Instância e da respectiva 
 Sentença foi interposto o Requerimento de Recurso para o Tribunal da Relação de 
 Lisboa.
 C.  Porém, sobre aquele Requerimento de Recurso recaiu, proferido pelo Mmo. Juiz 
 a quo, 14.º Vara Cível de Lisboa, um Despacho de não admissibilidade do mesmo e 
 do seguinte teor:
 
 “Atento o valor da acção, não é admissível recurso (art.ºs 678.º, n.º 1 e 462.º, 
 C.P.C. e art.º 24.º da LO.T.J.J., pelo que não se recebe o mesmo.”
 Ou seja, fundamentou-se no facto da causa ser de valor inferior ao da alçada do 
 Tribunal de que se recorre.
 D.  Inconformados, os Recorrentes Impugnaram aquele Despacho por meio de 
 Reclamação para o Presidente do Tribunal da Relação de Lisboa.
 E.  E, nessa Impugnação, alegaram logo, que a interpretação dos artigos 678.º, 
 n.º 1 e 689.º, n.º 2, do Código do Processo Civil, segundo a qual da Decisão de 
 Embargos de Terceiro, neste caso com o valor de Esc. 120.840$00, deduzidos numa 
 Acção de Despejo, não se pode recorrer para o Tribunal da Relação, é 
 inconstitucional, por violação dos artigos 13.º, 20.º e 277.º, n.º 1 da 
 Constituição da República Portuguesa e que assim já tinha sido declarada.
 E que, deste modo, ao impedir-se o recurso, se viola o princípio da igualdade, 
 atento o disposto no artigo 57.º, n.º 1 do RAU - Regime do Arrendamento Urbano, 
 aprovado pelo Decreto-Lei n.º 321-B/90, de 15 de Outubro, que consagra a 
 possibilidade de recurso para a Relação nas acções de despejo, independentemente 
 do valor da causa.
 F.  Não tendo sido reparado aquele Despacho de não admissibilidade do Recurso 
 subiu a Impugnação ao Tribunal da Relação onde veio a ser indeferida e, 
 consequentemente, mantido integralmente e com os mesmos fundamentos o Despacho 
 de não admissibilidade do Recurso, por ter entendido não haver lugar à aplicação 
 do disposto no artigo 57.º do RAU, por não concordarem com a interpretação de 
 que aos Embargos de Terceiro seja aplicado o regime especial daquele artigo, bem 
 como por entenderem (não se sabe como) que nos Embargos em causa não se discute 
 a questão do contrato de arrendamento, nem a sua resolução, mas uma situação de 
 facto relativa aos embargantes que, na sua perspectiva, implicaria a suspensão 
 do mandado de despejo.
 Concluindo, de seguida, que não se estando perante uma situação equiparada à 
 acção de despejo e não se verificando qualquer das situações previstas nos n.ºs 
 
 2 a 6, do artigo 678.º, do C.P.C. a sentença é irrecorrível.
 Porém, sem razão, porquanto, no caso, estamos mesmo perante uma situação 
 equiparada à acção de despejo, discutindo-se mesmo a validade e a subsistência 
 de contrato de arrendamento para habitação (n.º 5, do artigo 678.º, do C.P.C.), 
 vide, p.i. de Embargos, artigos 3.º a 7.º, 16.º, Acta de Audiência e Documento 
 designado de fls. 134 dos Autos de Embargos.
 G.  A Decisão do Tribunal da Relação de Lisboa ao indeferir a Reclamação e a, 
 consequentemente, confirmar a não admissibilidade do Recurso, atento o facto do 
 valor da Acção ser inferior ao da alçada do Tribunal de que se recorre (artigos 
 
 678.º, n.º 1 e 689.º, n.º 2, do C.P.C.) é, assim, inconstitucional, por violação 
 dos artigos 13.º, 20.º e 277.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa, 
 mostrando-se violado o princípio da igualdade, atento o disposto no artigo 57.º, 
 n.º 1, do RAU.
 H.  Donde, e como bem se fundamenta no Acórdão n.º 655/99 deste Tribunal 
 Constitucional, Processo n.º 423/97, 1.ª Secção, que temos vindo a acompanhar, a 
 situação dos Embargantes aqui Recorrentes é manifesta e substancialmente 
 idêntica à situação de um qualquer Réu numa Acção de Despejo. Na medida em que, 
 em ambas as situações os sujeitos pretendem ver reconhecida a validade da 
 posição de arrendatários que invocam, sendo bem clarificadora a seguinte 
 passagem do supra identificado Acórdão:
 
 “A diferença entre as duas situações consiste no mecanismo processual utilizável 
 para provar o direito do gozo do prédio arrendado.”
 Mas, a utilização de um ou de outro mecanismo processual pode depender de o 
 proprietário do prédio intentar ou não a acção de despejo contra o sujeito que 
 alega ser arrendatário. Tal circunstância, porque resultante de uma opção do 
 proprietário, não altera materialmente o interesse daquele que invoca essa 
 qualidade, não podendo, nessa medida, repercutir-se na sua posição processual. 
 Não existe assim, fundamento para um tratamento substancialmente diferenciado 
 das duas situações.”
 I.  A interpretação normativa que fundamenta a não admissão do recurso 
 interposto da decisão de embargos de terceiro deduzidos na acção de despejo dos 
 presentes Autos, viola o princípio da igualdade, na dimensão de igualdade no 
 acesso aos meios processuais de realização do Direito, que emana do artigo 13.º 
 da Constituição em conjugação com o artigo 20.º do mesmo Diploma.
 J.  O Acórdão do TC em que nos vimos apoiando julgou inconstitucional a 
 interpretação das normas constantes dos artigos 678.º, n.º 1 e 689.º, n.º 2, do 
 C.P.C., segundo a qual da decisão de embargos de terceiro, deduzidos contra 
 execução de sentença de despejo em que o Recorrente invoca a qualidade de 
 arrendatário, não é admissível para o Tribunal da Relação (nos casos em que o 
 valor da causa seja inferior ao da alçada da Relação), diferentemente do 
 estipulado no artigo 57.º, n.º 1, do RAU, por violação dos artigos 13.º e 20.º, 
 da Constituição da República Portuguesa.
 Termos em que deve ser julgada inconstitucional a interpretação das normas 
 constantes dos artigos 678.º, n.º 1 e 689.º, n.º 2, do Código do Processo Civil, 
 segundo a qual a decisão dos embargos de terceiro, deduzidos contra execução de 
 sentença de despejo em que o Recorrente invoca a qualidade de Arrendatário, não 
 
 é admissível o Recurso para o Tribunal da Relação (nos casos em que o valor da 
 causa seja inferior ao da alçada da Relação), diferentemente do estipulado no 
 artigo 57.º, n.º 1, do Regime do Arrendamento Urbano, por violação dos artigos 
 
 13.º e 20.º da Constituição e ser, assim, concedido provimento ao Recurso, 
 determinando-se, consequentemente, a reformulação da Decisão Recorrida em 
 conformidade com o presente juízo de inconstitucionalidade.
 
  
 
  
 O recorrido não contra‑alegou.
 
  
 
  
 Cumpre apreciar.
 
  
 
  
 
 2.  Os recorrentes submetem à apreciação do Tribunal Constitucional a 
 interpretação dos artigos 678º, nº 1, e 689º, nº 2, do Código de Processo Civil, 
 segundo a qual da decisão dos embargos de terceiro, deduzidos contra execução de 
 sentença de despejo em que o recorrente invoca a qualidade de arrendatário, não 
 
 é admissível recurso para o Tribunal da Relação, nos casos em que o valor da 
 causa seja inferior ao da alçada da Relação, diferentemente do estipulado no 
 artigo 57º, nº 1, do Regime do Arrendamento Urbano.
 Ora, o Tribunal Constitucional já apreciou a conformidade à Constituição de tal 
 dimensão normativa. Com efeito, no Acórdão nº 655/98, de 18 de Novembro (D.R., 
 II Série, de 22 de Março de 1999), o Tribunal Constitucional julgou 
 inconstitucional a interpretação agora impugnada, por violação dos artigos 13º e 
 
 20º da Constituição.
 Não suscitando os presentes autos qualquer questão nova que deva ser apreciada, 
 remete‑se para a fundamentação do mencionado Acórdão nº 655/98, concluindo‑se 
 pela inconstitucionalidade da norma impugnada.
 
  
 
  
 
 3.  Em face do exposto, o Tribunal Constitucional decide conceder provimento ao 
 recurso, julgando inconstitucional, por violação dos artigos 13º e 20º da 
 Constituição, a norma dos artigos 678º, nº 1, e 689º, nº 2, do Código de 
 Processo Civil, segundo a qual, da Decisão de Embargos de Terceiro deduzidos 
 contra execução de sentença de despejo em que o recorrente invoca a qualidade de 
 arrendatário, nos casos em que o valor da causa seja inferior ao da alçada do 
 tribunal de 1.ª instância, não é admissível o recurso para o Tribunal da 
 Relação, revogando, consequentemente, a decisão recorrida, que deverá ser 
 reformulada de acordo com o presente juízo de inconstitucionalidade.
 
  
 
  
 Lisboa, 28 de Setembro de 2005
 
  
 Maria Fernanda Palma
 Mário José de Araújo Torres
 Benjamim Rodrigues
 Paulo Mota Pinto
 Rui Manuel Moura Ramos