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Processo n.º 787-A/2001
 
 2.ª Secção
 Relator: Conselheiro Bravo Serra
 
  
 
  
 
                   1. Notificado do acórdão nº 208/2005, veio o Licº A. deduzir, 
 relativamente àquele aresto, «reclamação» que, disse, era “apresentada tendo 
 presente o disposto nos artigos 202.º e 668.º do Código de Processo Civil”, 
 solicitando, a final, a anulação do julgamento, sanando as irregularidades que 
 argui.
 
  
 
                   Em síntese, diz o ora «reclamante»:-
 
  
 
                   - que os «dados concretos» de que dispunha o Tribunal aquando 
 da prolação do Acórdão nº 425/2004 eram os mesmos de que dispunha aquando do  
 proferimento dos Acórdãos números 100/2005 e 101/2005 e, em face do que naquele 
 primeiro aresto foi consignado quando se escreveu “E, não fora a circunstância 
 de este órgão de administração de justiça não dispor, muito concretamente, de 
 dados dos quais resultasse inequivocamente que a actividade do reclamante é 
 iluminada por um dolo ou uma grave negligência na defesa dos seus pontos de 
 vista ou que, com tal actividade, visa unicamente entorpecer a acção da justiça 
 
 - pontos de vista esses que, como resulta dos anteriores acórdãos já proferidos, 
 não são, nem podem ser, acolhidos pelo Tribunal -, seguramente que este já teria 
 desencadeado o procedimento previsto no artº 456º do Código de Processo Civil”, 
 
 é de entender que a aplicação do indicado procedimento levado a efeito nos dois 
 
 últimos acórdãos é contraditória com o que foi dito no mencionado Acórdão nº 
 
 425/2004, pelo que, nos termos do artº 675º do Código de Processo Civil, porque 
 se deve cumprir a decisão que em primeiro lugar passou em julgado, se haverá de 
 considerar ter existido uma nulidade acarretadora da sanção prevista no artº 
 
 201º daquele corpo de leis;
 
  
 
                   - que no Acórdão nº 208/2005 “não é possível ver-se onde acaba 
 o relatório e começa a exposição dos fundamentos da decisão e não se consegue 
 descortinar nele um enunciado sucinto das questões que foram decididas”, não se 
 discriminaram os factos que foram tidos em consideração, não se operou o exame 
 crítico das provas, não se fez referência às passagens dos anteriores acórdãos 
 já proferidos nos autos e que foram invocadas pelo reclamante, aquando da sua 
 pronúncia após os Acórdãos números 100/2005 e 101/2005, para demonstrar que 
 havia fundamento sério para ter reagido como reagiu, e não se indicaram os 
 elementos processuais concretos que permitiam verificar a correcção da imputação 
 conclusiva nele feita ao mesmo reclamante, nos passos em que aí se disse que na 
 sua «pronúncia» sobre a eventual condenação como litigante de má fé “concluiu no 
 sentido de que a conduta que assumiu não poder consubstanciar um uso reprovável 
 dos meios processuais de que lançou mão, uso esse iluminado com o propósito de 
 atingir um objectivo ilegal” e que veio ele “a reiterar os motivos pelos quais, 
 no seu entender, tais «reclamações» tinham razão de ser em face da actuação 
 deste Tribunal que, repetiu, enfermava dos vícios acima sintetizados, resultante 
 de uma apreciação truncada e restritora da ‘materialização garantística do 
 direito a uma tutela jurisdicional efectiva’, nada mais tendo os órgãos 
 jurisdicionais intervenientes nestes autos do que procurado ‘inviabilizar o 
 reconhecimento das pretensões do’ reclamante”;
 
  
 
                   - que no Acórdão nº 208/2005 o Tribunal, embora tenha 
 concluído por que “uma actuação como a do respondente é inaceitável”, não 
 indicou “elementos que permitam ao destinatário ou a terceiros uma reconstrução 
 das operações de determinação, interpretação e aplicação de regras de direito 
 aos factos apurados”;
 
                   
 
                   - que, muito embora no Acórdão nº 101/2005 se tivesse dito que 
 o Tribunal, até ao momento, tinha pautado a sua actuação com benevolência, veio, 
 no Acórdão reclamado, declarar que os seus anteriores arestos foram proferidos 
 por complacência, assentando na premissa de que poderia limitar-se, 
 pretorianamente, a indeferir as pretensões de reforma e arguição de nulidades, 
 revelando que “foi restringida ou anulada a dimensão garantística” reservada à 
 função jurisdicional, visto não ter havido fundamentação necessária ao controlo 
 público da justiça;
 
  
 
                   - que no Acórdão nº 208/2005 se não especificaram os elementos 
 que permitam identificar a moldura de ilícito em que foi enquadrada a conduta 
 processual do respondente, não respondendo ao contraditório exercido pelo 
 reclamante aquando da sua «pronúncia» sobre os Acórdãos números 100/2005 e 
 
 101/2005, nomeadamente quando nela se disse, indicando as razões que o levaram a 
 assim agir, que o próprio texto do Acórdão nº 101/2005 continha “declarações que 
 demonstram que o arguido tem fundamento sério para reagir aos doutos acórdãos 
 proferidos nestes autos”;
 
  
 
                   - que a expressão do Acórdão nº 208/2005 no sentido de “O uso 
 de incidentes processuais que, tantas vezes, mais não representam que a defesa 
 de um ponto de vista já anteriormente não acolhido pelo Tribunal, volens nolens, 
 manifesta um propósito de entorpecimento da sua actuação”, por estar revestido 
 de “intuito generalizador”, não possibilita que, no caso concreto, se verifique 
 se os factos que conduziram às reacções do reclamante aos anteriores acórdãos 
 são os mesmos que aqueles enunciados nas reclamações que apresentara;
 
  
 
                   - que a qualificação da conduta processual do reclamante como 
 integrando litigância de má fé foi efectuada tão só por ainda se não ter 
 atingido o resultado da existência de trânsito em julgado da decisão, não tendo 
 o Acórdão nº 208/2005 especificado os elementos que permitam o controlo da 
 correcção da expressão, utilizada em tal acórdão, de que o “resultado da não 
 existência de trânsito em julgado, quer da decisão (datada de 5 de Fevereiro de 
 
 2002) de indeferimento da reclamação do despacho do Conselheiro Relator do 
 Supremo Tribunal de Justiça de não admissão do recurso interposto para o 
 Tribunal Constitucional, quer da decisão (datada de 26 de Maio de 2003) que 
 entendeu que era devido o pagamento da multa a que se reporta o nº 6 do artº 
 
 145º do Código de Processo Civil, é, e tão só, imputável ao respondente”, pelo 
 que “não fica assegurado o respeito pelas garantias de imparcialidade”.
 
  
 
                   Cumpre decidir.
 
  
 
  
 
                   2. No que toca à pretensa violação de caso julgado, tem o 
 Tribunal por certo que a mesma não ocorre.
 
  
 
                   Efectivamente, se é facto que no Acórdão nº 425/2004 se 
 escreveu a frase acima transcrita, menos não é que, a seguir à mesma se escreveu 
 também:-
 
  
 
 “(...)
 
                   Mas, não obstante essa falta desses dados concretos, o que é 
 seguro é que a inusitada persistência do reclamante tem, até ao momento, levado 
 o Tribunal a uma actuação, repetida e paciente, sendo que a reiteração a que 
 agora se assiste já ultrapassa mesmo o mínimo do aceitável face à missão da 
 defesa dos direitos e interesses legalmente protegidos e de dirimição de 
 conflitos.
 
                   Neste contexto, não poderá mais o Tribunal pactuar com uma tal 
 postura do impugnante, não podendo, neste particular, olvidar que é para si por 
 demais claro que o acórdão em crise não enferma dos vícios que lhe são 
 imputados, em consequência nada havendo a reformar, a que se adita que o mesmo 
 Tribunal tem perfeita consciência que não actuou, de todo em todo, por uma forma 
 que, ainda que de uma perspectiva meramente objectiva, se possa rotular como 
 parcial.
 
                   É que, tudo o que haveria a dizer e decidir quanto ao actual 
 pedido foi já dito e decidido, sem que se vislumbre que tivesse havido 
 contradições, inobservância do princípio do contraditório, omissão de pronúncia 
 ou pronúncia sobre questões sobre as quais ao Tribunal era vedado conhecer, ou 
 qualquer outro atentado a direitos, liberdades ou garantias fundamentais do 
 reclamante.
 
 (...)”
 
  
 
                   No contexto em que aqueles excertos foram escritos, qualquer 
 destinatário médio entenderia que, se bem que, no momento da sua redacção, ainda 
 o Tribunal não dispusesse de «dados concretos» que, desde logo, o levassem a 
 concluir pela indiciária actuação de má fé por banda do ora reclamante, o que 
 era certo é que com a reiteração, a partir daí, de uma postura reveladora de uma 
 inusitada persistência na manutenção de uma actividade processual tal como a até 
 ali levada a efeito e já, por várias vezes, desatendida por este órgão de 
 administração de justiça, não podia o mesmo pactuar, pois que, então, estaria 
 ultrapassado mesmo o mínimo do aceitável.
 
  
 
                   Ora, esse reiterar veio, afinal, a verificar-se, e por mais de 
 uma vez.
 
  
 
                   Daí que, com essa nova actuação - aliás devidamente 
 especificada nos Acórdãos números 100/2005 e 101/2005 - tivesse o Tribunal 
 concluído por se indiciar a má fé processual do ora reclamante.
 
  
 
                   Inexiste, assim, qualquer contradição ou ofensa de caso 
 julgado.
 
  
 
  
 
                   2.1. Teve o Tribunal, na sua óptica, a preocupação - que mais 
 não é que um seu dever - de enunciar as vicissitudes processuais que ocorreram 
 nestes autos, o que fez nos já aludidos Acórdãos números 100/2005 e 101/2005.
 
  
 
                   No Acórdão agora em apreço - o nº 208/2005 - não se deixou de 
 fazer referência a esses arestos e, porque promanados do mesmo Tribunal e sendo 
 as mesmas as «partes», não faria sentido repetir-se, nele, a enunciação feita.
 
  
 
                   A questão a decidir, na decorrência dos Acórdão números 
 
 100/2005 e 101/2005, era, unicamente, a de saber se a actuação processual do 
 reclamante, que decorria da referida enunciação, era passível de ser integrada 
 no conceito de litigância de má fé.
 
  
 
                   E isso foi, na perspectiva deste órgão de administração de 
 justiça, devidamente efectuado, procedendo-se, criticamente, à apreciação dessa 
 actuação.
 
                   
 
                   Não tem qualquer suporte, ainda na mesma perspectiva, a 
 afirmação de que se não sabe, pela leitura do texto do Acórdão nº 208/2005, onde 
 acaba o «relatório» e começa a fundamentação da decisão.
 
  
 
                   Seria estulto estar o Tribunal, no Acórdão nº 208/2005, a 
 expor tudo o que pelo agora reclamante foi dito aquando das «reclamações» e 
 arguições de nulidades assacadas aos anteriores arestos e descrever 
 detalhadamente as pronúncias decisórias que, sobre essas pretensões, foram 
 tomadas.
 
  
 
                   A síntese que, naquele Acórdão, foi feita quanto à pronúncia 
 que o reclamante fez quanto aos Acórdãos números 100/2005 e 101/2005, no 
 particular de o mesmo ter concluído por que a sua actuação foi cabida em face do 
 que, anteriormente, no seu modo de ver, não teria sido correctamente julgado 
 pelo Tribunal, não se mostra minimamente incorrecta. Assim o demonstra a leitura 
 das peças processuais consubstanciadoras dessa pronúncia e a «reclamação» ora 
 deduzida.
 
  
 
                   Esgrimir com tais argumento é, mais uma vez, algo revelador da 
 impropriedade de actuação do reclamante.
 
  
 
                   2.2. Nunca o Tribunal, ao empregar a asserção «complacência», 
 afirmou que poderia, «pretorianamente», limitar-se a indeferir as anteriores 
 reclamações e arguições de nulidade, sem justificar porque o fazia.
 
  
 
                   O que decorre de todo o contexto dos autos é que, ao curar 
 delas, o fez sempre analisando a panóplia argumentativa utilizada pelo 
 reclamante, sendo certo que, porque, tantas vezes, as pretensões apresentadas 
 mais não eram que a reiteração das anteriores, poderia limitar-se a, por mera 
 referência ao já decidido em anteriores arestos, ancorando-se nas razões que o 
 levaram a essas decisões, indeferir o peticionado.
 
  
 
                   Do mesmo modo, de todo em todo, poderá alguma vez ser extraído 
 que o Tribunal agiu por forma a que estivesse na sua inteira disponibilidade a 
 legalidade processual e a fundamentação das suas decisões, não se entendendo a 
 argumentação do reclamante quando refere que não foram identificados os 
 critérios normativos que, ao que tudo indica na óptica dele, reclamante, 
 restringiram ou anularam a possibilidade que lhe era conferida pelos artigos 
 
 202º e 668º do Código de Processo Civil. E não se entende, pois que nos 
 anteriores acórdãos sempre foi fundamentado o «porquê» do não atendimento das 
 
 «reclamações» e arguições de nulidades que deduzira, sendo que, como acima se 
 disse, era absolutamente desnecessário - repete-se, tratando-se do mesmo 
 Tribunal, processo e «partes» - estar, no acórdão ora reclamado, a repetir tudo 
 o que anteriormente foi dito pelo reclamante e por este órgão de administração 
 de justiça.
 
  
 
  
 
                   2.3. A subsunção da conduta do reclamante ao conceito de 
 litigância de má fé foi, na óptica do Tribunal, devidamente efectuada no acórdão 
 reclamado; e a pronúncia que levou a efeito sobre os Acórdãos números 100/2005  
 
 101/2005 foi, também ela, ponderada, anotando-se que o agora invocado «intuito 
 generalizador» que decorrerá da expressão acima transcrita não tem a mínima 
 consistência. E não tem, justamente pela circunstância de o «uso dos incidentes 
 processuais» estar amplamente descrito naqueles acórdãos, para os quais remeteu 
 o arguido aresto.
 
  
 
                   2.4. Segundo o reclamante, o não trânsito em julgado da 
 decisão tomada pelo Tribunal no Acórdão nº 47/2002 resultou ope legis, de acordo 
 com o prescrito no artº 677º do Código de Processo Civil, consequentemente 
 havendo imprecisão do julgamento constante do Acórdão nº 208/2005, pois que dele 
 resulta a condenação do reclamante como litigante de má fé pela não existência 
 de trânsito.
 
  
 
                   É por demais óbvio que um tal raciocínio não pode ser 
 acompanhado.
 
  
 
                   Como, por mais de uma vez nestes autos já o Tribunal decidiu, 
 embora seja lícito às «partes» servirem-se dos incidentes de reforma, aclaração 
 e arguição de nulidades, que, deduzidos, obstarão ao trânsito da decisão, já não 
 admissível que sobre as decisões que curaram de tais incidentes, recaiam novos 
 incidentes da mesma espécie, esteados em argumentação semelhante à usada aquando 
 dos primitivamente formulados e objecto de não atendimento. E, em situações 
 desse jaez, é a concreta actividade da «parte» que dessa sorte, sem razão 
 justificada, no entendimento do Tribunal, age, que vai obstar a um 
 desenvolvimento da lide que havia, em normalidade - e aqui se incluindo os 
 primitivos pedidos de reforma, aclaração ou arguição de nulidade -, de culminar 
 no trânsito do decidido.
 
  
 
  
 
                   2.5. Por último, refira-se não se debruçará este Tribunal 
 sobre tudo o mais o que, na «reclamação» agora em análise, é reportado ao 
 despacho proferido pelo relator em 15 de Março de 2005, e isso porque, no 
 Acórdão nº 208/2005 foi devidamente anotado que, não tendo sido tal despacho 
 impugnado, não competiria ao mesmo Tribunal efectuar pronúncia.
 
  
 
                   Em face do exposto, concluindo-se por que o Acórdão nº 
 
 208/2005 não enferma das nulidades ou «irregularidades» arguidas, desatende-se o 
 solicitado, condenando-se o impugnante nas custas processuais, fixando-se a taxa 
 de justiça em vinte unidades de conta.
 
  
 Lisboa, 8 de Julho de 2005
 
  
 Bravo Serra
 Maria Fernanda Palma
 Rui Manuel Moura Ramos