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Processo n.º 611/05
 Plenário
 Relator: Conselheiro Paulo Mota Pinto
 
  
 
  
 
  
 Acordam em plenário no Tribunal Constitucional:
 
  
 I. Relatório
 
 1.O Ministro da República para a Região Autónoma dos Açores veio, nos termos do 
 disposto no n.º 2 do artigo 278.º da Constituição da República Portuguesa (em 
 conjugação com o n.º 1 do artigo 45.º da Lei Constitucional n.º 1/2004, de 24 de 
 Julho) e dos artigos 57.º e seguintes da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, 
 requerer a apreciação preventiva da constitucionalidade das normas dos artigos 
 
 14.º, n.ºs 1 e 3, alínea c), 15.º, 19.º, 50.º, 51.º, n.º 2, 52.º, 53.º e 57.º do 
 
 “Regime Jurídico do Planeamento, Protecção e Segurança das Construções 
 Escolares”, aprovado pelo Decreto da Assembleia Legislativa da Região Autónoma 
 dos Açores n.º 23/2005. Essas normas têm a seguinte redacção:
 
 “Artigo 14.º
 Objectivos
 
 1. A carta educativa visa assegurar a adequação da rede de estabelecimentos de 
 educação pré-escolar e do 1.º ciclo do ensino básico para que, em cada momento, 
 as ofertas educativas disponíveis a nível municipal respondam à procura efectiva 
 que ao mesmo nível se manifestar.
 
 2. (...)
 
 3. A carta educativa deve:
 a) (...)
 b) (...)
 c) Garantir a coerência da rede educativa com a política urbana do município e a 
 articulação com a rede educativa dos 2.º e 3.º ciclos do ensino básico e ensino 
 secundário, tendo em conta as infra‑estruturas existentes e as constantes dos 
 instrumentos regionais de planeamento, incluindo a carta escolar.”
 
 “Artigo 15.º
 Objecto
 
 1. A carta educativa tem por objecto a identificação, a nível municipal, dos 
 edifícios e equipamentos educativos, e respectiva localização geográfica, bem 
 como das ofertas educativas da educação pré-escolar e do primeiro ciclo do 
 ensino básico, incluindo as suas modalidades especiais de educação, e da 
 educação extra-escolar.
 
 2. A carta educativa incide sobre os estabelecimentos de educação pré‑escolar e 
 do primeiro ciclo do ensino básico das redes pública, privada, cooperativa e 
 solidária.”
 
 “Artigo 19.º
 Efeitos
 Depois de aprovada e ratificada, a carta educativa constitui um instrumento de 
 orientação da gestão do sistema educativo, sendo responsabilidade da autarquia, 
 nos termos do n.º 1 do artigo 19.º da Lei n.º 159/99, de 14 de Setembro, a 
 concretização dos investimentos nas infra-estruturas da educação pré-escolar e 
 do 1.º ciclo do ensino básico ali previstas, sem prejuízo do co‑financiamento 
 comunitário e regional a que haja lugar nos termos legais e regulamentares 
 aplicáveis.”
 
 “Artigo 50.º
 Construção
 
 1. No âmbito dos investimentos previstos no domínio da construção de 
 infra-estruturas escolares, as autarquias adquirem os terrenos, elaboram o 
 projecto e constroem os edifícios escolares destinados ao funcionamento da 
 educação pré-escolar e ao 1.º ciclo do ensino básico que constem da carta 
 educativa por elas aprovada.
 
 2. Compete à administração regional autónoma, supletivamente ao disposto no n.º 
 
 1 do artigo 19.º da Lei n.º 159/99, de 14 de Setembro, a aquisição, projecto e 
 construção das instalações escolares destinadas aos 2.º e 3.º ciclos do ensino 
 básico e ao ensino secundário.
 
 3. Supletivamente, e quando conste da carta escolar em vigor, pode a 
 administração regional autónoma projectar e construir ou ampliar instalações 
 escolares, propriedade da Região, destinadas ao funcionamento da educação 
 pré-escolar ou do primeiro ciclo do ensino básico quando:
 a) Integradas em unidades orgânicas que englobem quaisquer dos outros níveis ou 
 ciclos de ensino;
 b) Em situações excepcionais, decorrentes de calamidades ou outras similares, e 
 mediante deliberação do conselho do governo.”
 
 “Artigo 51.º
 Manutenção
 
 1. (...)
 
 2. Sem prejuízo de eventuais contratos de cooperação, celebrados ao abrigo do 
 disposto no Decreto Legislativo Regional n.º 32/2002/A, de 8 de Agosto, nos 
 termos do n.º 1 do artigo 19.º da Lei n.º 159/99, de 14 de Setembro, cabem às 
 autarquias os investimentos na manutenção dos edifícios escolares destinados ao 
 funcionamento da educação pré-escolar e ao 1.º ciclo do ensino básico que sejam 
 sua propriedade, nomeadamente, suportando os custos com os consumos de 
 electricidade e água.”
 
 “Artigo 52.º
 Equipamento
 
 1. Constitui encargo da administração regional autónoma a aquisição e manutenção 
 do mobiliário e equipamento escolar básico, do material didáctico e dos 
 equipamentos tecnológicos, lúdicos e desportivos necessários ao funcionamento 
 dos estabelecimentos de educação e de ensino da rede pública.
 
 2. Os mobiliários e equipamentos escolares a que se refere o número anterior são 
 propriedade da Região, ficando integrados no património, sob administração da 
 unidade orgânica do sistema educativo em que o estabelecimento escolar se 
 insira.”
 
 “Artigo 53.º
 Transferência de património
 Por resolução do Governo Regional, a solicitação da autarquia interessada, podem 
 ser transferidos para o património municipal imóveis escolares, propriedade da 
 Região, onde funcione em exclusivo a educação pré-escolar e o 1.º ciclo do 
 ensino básico.”
 
 “Artigo 57.º
 Infra-estruturas escolares da Região
 
 1. Integram o património municipal, com dispensa de qualquer formalidade, os 
 estabelecimentos da educação pré-escolar e do 1.º ciclo do ensino básico que não 
 tenham ainda sido registados a favor da autarquia e se encontrem em qualquer das 
 seguintes categorias:
 a) Tenham sido construídos ou adquiridos pelas autarquias ou a elas legados, 
 incluindo as antigas escolas paroquiais;
 b) Tenham sido construídos na decorrência do Plano dos Centenários, aprovado em 
 Conselho de Ministros de 15 de Julho de 1941;
 c) Tenham sido construídos ao abrigo do disposto na Lei n.º 2107, de 5 de Abril 
 de 1961, com as alterações que lhe foram introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 
 
 49070, de 20 de Junho de 1969, pelo Decreto‑Lei n.º 299/70, de 27 de Junho, pelo 
 Decreto-Lei n.º 487/71, de 9 de Novembro, pelo Decreto-Lei n.º 675/73, de 20 de 
 Dezembro, e pela Lei n.º 1/87, de 6 de Janeiro;
 d) Resultem da reconstrução, requalificação ou ampliação, mesmo quando executada 
 pela administração regional autónoma ou pelas extintas Juntas Gerais, de imóveis 
 que se integrem em qualquer das alíneas anteriores;
 e) Tenham sido construídos pela autarquia em colaboração ou cooperação com a 
 administração regional autónoma, mesmo quando o terreno se encontre registado a 
 favor da Região ou das extintas Juntas Gerais.
 
 2. Constituem património da Região os estabelecimentos da educação pré‑escolar e 
 do 1.º ciclo do ensino básico que se integrem em qualquer das seguintes 
 categorias:
 a) Estejam registados a favor das extintas Juntas Gerais dos Distritos Autónomos 
 ou da Região, com excepção dos que se integrem em qualquer das categorias do 
 número anterior;
 b) Integrem outros níveis ou ciclos de ensino, para além da educação pré-escolar 
 e do 1.º ciclo do ensino básico;
 c) Foram ou venham a ser adquiridos ou construídos pela administração regional 
 autónoma em imóveis propriedade da Região.
 
 3. O disposto no presente diploma constitui título bastante para efeitos de 
 registo de edifícios escolares a favor das autarquias ou da Região.
 
 4. Até 60 dias após a entrada em vigor do presente diploma é publicada, por 
 despacho conjunto dos membros do Governo Regional competentes em matéria de 
 finanças e educação, a listagem dos imóveis afectos à educação pré-escolar e ao 
 
 1.º ciclo do ensino básico que são propriedade da Região.”
 
 2.O pedido vem formulado nos seguintes termos:
 
 «I
 No dia 5 de Julho de 2005, foi recebido no Gabinete do Ministro da República 
 para a Região Autónoma dos Açores o Decreto da Assembleia Legislativa Regional 
 n.º 23/2005, que aprova o Regime Jurídico do Planeamento, Protecção e Segurança 
 das Construções Escolares (anexo), para efeitos de assinatura como decreto 
 legislativo regional, nos termos do n.º 2 do artigo 233.º da Constituição. 
 II
 Sucede que as normas acima referenciadas – que, sublinhe-se, assumem uma posição 
 decisiva no que toca à repartição de competências, no domínio educativo, entre a 
 Região Autónoma dos Açores e os municípios nela sedeados – suscitam uma 
 importante questão de constitucionalidade, que interessa ver dissipada antes da 
 entrada em vigor do diploma em causa.
 Com efeito, o regime que se extrai das diversas normas em apreciação afigura-se 
 de duvidosa conformidade com o disposto nos n.º s 1 e 2 do artigo 19.º da Lei 
 n.º 159/99, de 14 de Setembro – Lei-Quadro da Transferência de Atribuições e 
 Competências para as Autarquias Locais, pontualmente alterada pela Lei n.º 
 
 55-B/2004, de 30 de Dezembro –, que constitui não apenas um diploma emanado pela 
 Assembleia da República ao abrigo da sua reserva de competência legislativa em 
 matéria de “estatuto das autarquias locais”, como é também um diploma 
 directamente aplicável em todo o território nacional. É o que resulta, por um 
 lado, da alínea q) do n.º 1 do artigo 165.º da Constituição e, por outro lado, 
 do artigo 33.º da Lei n.º 159/99, de 14 de Setembro, e da própria qualificação 
 desta como “lei geral da República” – qualificação que, não obstante ter 
 caducado com a revisão constitucional de 2004, não deixa de revelar a sua 
 aplicabilidade também no território insular.
 Em consequência, a ser verdade que as normas acima referidas do Decreto da 
 Assembleia Legislativa Regional n.º 23/2005 dispõem de forma divergente em 
 relação a normas legais produzidas no âmbito da reserva relativa de competência 
 legislativa da Assembleia da República e vigentes nos Açores, significará isso 
 então que aquele órgão legislativo regional ultrapassou os parâmetros da sua 
 própria competência normativa, fixada no n.º 4 do artigo 112.º, nas alíneas a), 
 b) e c) do n.º 1 do artigo 227.º e no artigo 228.º da Constituição (bem como, 
 transitoriamente, no artigo 8.º do Estatuto Político‑Administrativo dos Açores). 
 Concretamente, ter-se-á violado o parâmetro negativo da competência legislativa 
 regional constituído pelas “matérias reservadas aos órgãos de soberania”.
 III
 
 É sabido que a revisão constitucional de 2004 alterou muito substancialmente os 
 tradicionais parâmetros da competência legislativa regional – “interesse 
 específico”, “matérias reservadas aos órgãos de soberania” e “princípios 
 fundamentais das leis gerais da República” –, o que fez fundamentalmente com o 
 propósito declarado de alargar essa mesma competência, mas também com o 
 objectivo de proporcionar às assembleias legislativas dos Açores e da Madeira um 
 maior índice de segurança jurídica no desempenho da respectiva actividade 
 normativa. Contudo, em vários aspectos, não é claro o exacto sentido da Lei 
 Constitucional n.º 1/2004, de 24 de Julho, no que toca à delimitação dos poderes 
 legislativos regionais.
 A) Desde logo, no que respeita ao conceito de interesse específico, não é fácil 
 interpretar o seu completo “desaparecimento” das disposições da Lei Fundamental 
 respeitantes à configuração da competência legislativa regional – o n.º 4 do 
 artigo 112.º, as alíneas a), b) e c) do n.º 1 do artigo 227.º, e o n.º 1 do 
 artigo 228.º -, tendo aí sido substituída pela expressão “matérias enunciadas no 
 
 (...) estatuto político-administrativo”. Assim sucede porquanto, mais do que um 
 verdadeiro limite à legislação regional, o interesse específico sempre se 
 apresentou como o fundamento, por excelência, de todas as competências 
 legislativas regionais e, bem assim, de várias outras competências dos órgãos de 
 governo próprio dos Açores e da Madeira. Daí a utilização da expressão “limite 
 positivo” para designar o dito conceito de interesse específico – expressão de 
 há muito utilizada por Gomes Canotilho e, na sua senda, pela própria 
 Jurisprudência Constitucional –, que outra coisa não significa senão “fundamento 
 para uma legislação própria”, diferenciada da legislação nacional e, por isso, 
 melhor adaptada à realidade regional e às concretas necessidades de 
 desenvolvimento económico e social das Regiões Autónomas. Numa palavra, mais do 
 que um simples limite ao poder legislativo regional, o interesse específico 
 surgia, na arquitectura constitucional, como a pedra angular do edifício da 
 autonomia político‑administrativa dos Açores e da Madeira, nas suas diferentes 
 vertentes.
 Em consequência da revisão constitucional de 2004, pelo menos duas grandes 
 alternativas hermenêuticas parecem hoje perfilar-se quanto ao destino do 
 conceito de interesse específico. De acordo com uma primeira alternativa, o 
 legislador de revisão constitucional terá eliminado definitivamente o conceito 
 de interesse específico como parâmetro fundante da competência legislativa 
 regional, fazendo tábua rasa de toda a elaboração dogmática e jurisprudencial 
 que, em torno de tal conceito, se tinha vindo a desenvolver desde 1976. O 
 legislador estatutário deverá, em consequência, adoptar na próxima revisão dos 
 estatutos político-administrativos um catálogo taxativo de matérias sobre as 
 quais as assembleias legislativas regionais poderão exercer a sua competência 
 sempre e em quaisquer circunstâncias.
 Já de acordo com a segunda alternativa, o legislador de revisão constitucional 
 ter-se-á limitado a desconstitucionalizar o parâmetro positivo definidor da 
 competência legislativa regional, gozando agora o legislador estatutário – numa 
 veste especialmente qualificada, porque deliberando por maioria de 2/3 dos 
 deputados presentes na Assembleia da República, e após iniciativa legislativa 
 reservada das assembleias legislativas dos Açores e da Madeira (alínea f) do n.º 
 
 6 do artigo 168.º e n.º 1 do artigo 226.º - de uma significativa margem de 
 liberdade conformativa, para, considerando os dados jurídicos e fácticos já 
 conhecidos, optar entre diversas técnicas normativas de delimitação das 
 competências legislativas regionais (v.g., manutenção do conceito de interesse 
 específico como critério delimitador decisivo da competência legislativa 
 regional, fazendo-o acompanhar de uma listagem exemplificativa de matérias; 
 manutenção do conceito de interesse específico, embora apenas como critério 
 complementar de alargamento de um elenco de matérias fixado estatutariamente; 
 adopção de um critério material novo e mais amplo; fixação de um elenco taxativo 
 de matérias).
 B) Por sua vez, o limite constituído pelas matérias reservadas aos órgãos de 
 soberania foi comprimido pela possibilidade de as assembleias legislativas 
 acederem, mediante autorização, a algumas das matérias da reserva relativa de 
 competência da Assembleia da República (artigo 165.º da Constituição).
 Concretamente, em conformidade com a nova alínea b) do n.º 1 do artigo 227.º, 
 quando na posse de uma autorização legislativa, as assembleias legislativas 
 regionais podem hoje legislar sobre as matérias constantes das seguintes alíneas 
 do n.º 1 do artigo 165.º:
 
 -                                                                segunda parte 
 da alínea d), referente ao regime geral dos actos ilícitos de mera ordenação 
 social e respectivo processo;
 
 -                                                                alínea e), 
 relativa ao regime geral da requisição e expropriação por utilidade pública; 
 
 -                                                                alínea g), 
 sobre bases da protecção da natureza, do equilíbrio ecológico e do património 
 cultural;
 
 -                                                                alínea h), 
 respeitante ao regime geral do arrendamento rural e urbano;
 
 -                                                                alínea j), 
 relativa à definição dos sectores de propriedade dos meios de produção;
 
 -                                                                alínea i), 
 sobre meios e formas de intervenção, expropriação, nacionalização e privatização 
 dos meios de produção e solos;
 
 -                                                                primeira parte 
 da alínea m), que se refere ao regime dos planos de desenvolvimento económico e 
 social;
 
 -                                                                alínea n), 
 incidente sobre as bases da política agrícola;
 
 -                                                                alínea r), 
 relativa à participação das organizações de moradores no poder local;
 
 -                                                                alínea u), 
 sobre estatuto das empresas públicas e das fundações públicas;
 
 -                                                                alínea z), 
 concernente às bases dos ordenamentos do território e do urbanismo.
 Não é fácil determinar qual terá sido o critério que presidiu à divisão em dois 
 grupos do conjunto das alíneas do n.º 1 do artigo 165.º. Não é líquido também se 
 as matérias acabadas de mencionar se encontram ipso jure abertas à intervenção 
 legislativa regional, bastando para tal a obtenção de uma lei de autorização 
 legislativa, ou se, pelo contrário, têm que ser previamente inseridas no âmbito 
 da “autonomia legislativa das regiões autónomas”, tal como este deve ser 
 definido, nos termos do n.º 1 do artigo 228.º, pelos respectivos estatutos 
 político-administrativos. Em todo o caso, independentemente da resposta que 
 couber a esta questão, é certo que a competência aqui em causa não é uma 
 verdadeira competência legislativa autorizada, semelhante à que o Governo exerce 
 no domínio relativamente reservado do Parlamento. Trata-se, isso sim, de uma 
 competência a meio caminho entre uma iniciativa qualificada e uma competência 
 legislativa partilhada, em que a iniciativa e o acto final de aprovação cabe às 
 assembleias legislativas regionais, mas a palavra decisiva cabe sempre à 
 Assembleia da República. De facto, tendo as assembleias legislativas regionais 
 que apresentar à Assembleia da República um anteprojecto de decreto legislativo 
 juntamente com a proposta de lei de autorização, nos termos do n.º 2 do artigo 
 
 227.º, não parece que, aprovada esta (com modificações), o texto do referido 
 anteprojecto possa sofrer posteriores alterações substantivas, para além 
 daquelas que se revelarem absolutamente necessárias ao cumprimento do disposto 
 na lei de autorização.
 Em contrapartida, todas as demais matérias da reserva relativa (e absoluta) da 
 Assembleia da República que acima não foram referidas continuam, pois, excluídas 
 do poder legislativo regional. Ou seja, as matérias constantes das alíneas 
 exceptuadas na alínea b) do n.º 1 do artigo 227.º permanecem tão reservadas aos 
 
 órgãos de soberania como o eram antes da revisão constitucional de 2004, de 
 acordo com os três diferentes níveis desta reserva, não havendo razão para 
 qualquer redução do seu alcance ou abaixamento da sua intensidade: num primeiro 
 nível, todo o regime legislativo da matéria é da reserva do Parlamento – como 
 sucede, aliás, com a alínea q), sobre “estatuto das autarquias locais, incluindo 
 o regime das finanças locais”; num segundo nível, apenas o regime geral de certa 
 matéria se encontra reservado, abrindo‑se a possibilidade ao Governo e às 
 assembleias legislativas das regiões autónomas de disporem sobre eventuais 
 regimes especiais; num terceiro nível, menos exigente, tão-só as bases gerais 
 dos regimes jurídicos se encontram reservadas, o que significa, portanto, que 
 todo o desenvolvimento é concorrencial (Gomes Canotilho e Vital Moreira, 
 Constituição da República Portuguesa Anotada, 3.ª edição, Coimbra, 1993, pág. 
 
 670).
 C) Por fim, a revisão da Constituição operada em 2004 trouxe também a eliminação 
 do limite de legalidade consubstanciado pelo dever de respeito pelos princípios 
 fundamentais das leis gerais da República.
 Assim, para o futuro, não só os órgãos de soberania deixaram de poder qualificar 
 os diplomas que emanam como leis gerais da República, como as assembleias 
 legislativas regionais se libertaram do dever de respeito pelos princípios 
 basilares das leis e dos decretos-lei a que foi aposta aquela qualificação. Por 
 outras palavras, os diplomas legais emanados dos órgãos de soberania que no 
 passado foram qualificados como leis gerais da República (ou que, antes de 1997, 
 eram leis gerais da República “por natureza”), perderam em 2004 o valor 
 reforçado que até aí detinham. Não quer isto dizer, no entanto, que tenham 
 perdido vigência nas regiões autónomas dos Açores e da Madeira. Pelo contrário, 
 por força do n.º 2 do artigo 228.º - preceito que consagra hoje, de forma 
 expressa, o princípio da supletividade da legislação estadual –, os diplomas 
 qualificados antes de 2004 como leis gerais da República continuam a ter plena 
 aplicação no território das regiões autónomas, mas agora apenas como leis 
 ordinárias comuns e enquanto não for produzida legislação regional que os 
 afaste.
 Assim, por exemplo, o Decreto-Lei n.º 7/2003, de 15 de Janeiro (alterado pela 
 Lei n.º 41/2003, de 22 de Agosto), que concretiza o disposto no artigo 19.º da 
 Lei n.º 159/99, de 14 de Setembro, e que se encontra qualificado como lei geral 
 da República, continua hoje a vigorar na Região Autónoma dos Açores, mas apenas 
 a título supletivo, não constituindo o regime dele constante um limite de 
 legalidade que se imponha à respectiva Assembleia Legislativa.
 Já no que respeita ao passado – o mesmo é dizer, aos decretos legislativos 
 regionais emanados antes da entrada em vigor da lei de revisão de 2004 –, se 
 podem levantar problemas complexos de aplicação da lei constitucional no tempo. 
 Efectivamente, em face do princípio tempus regit actum, não é certo que a 
 modificação constitucional introduzida em 2004 tenha um efeito sanatório (ainda 
 que apenas para o futuro) de eventuais ilegalidades (orgânicas) de decretos 
 legislativos regionais originariamente emanados com desrespeito por princípios 
 fundamentais de leis gerais da República.
 IV
 A Lei n.º 159/99, de 14 de Setembro, estabelece um novo quadro de transferência 
 de atribuições e competências para as autarquias locais, bem como de delimitação 
 da intervenção da administração central (ou regional) e da administração local, 
 procurando assim concretizar os princípios constitucionais da descentralização 
 administrativa e da autonomia do poder local e, em última análise, como se 
 estabelece no n.º 2 do artigo 2.º, assegurar o respeito pelo princípio da 
 subsidiariedade.
 A) Esta Lei n.º 159/99, de 14 de Setembro, enumera no seu capítulo II as 
 atribuições dos municípios e das freguesias em geral (artigos 13.º a 15.º), 
 contendo igualmente, no capítulo III, um conjunto de disposições que especificam 
 as diversas competências dos órgãos municipais na prossecução das referidas 
 atribuições, que cobrem amplas matérias desde o equipamento rural e urbano, a 
 energia e os transportes e comunicações, até à promoção do desenvolvimento, 
 ordenamento do território e urbanismo, polícia municipal e cooperação externa, 
 passando ainda pela educação, património, cultura e ciência, tempos livres e 
 desporto, saúde, acção social, habitação, protecção civil, ambiente e saneamento 
 básico (artigos 16.º a 31.º).
 As atribuições e competências a transferir para os municípios são 
 tendencialmente universais, sendo efectuadas simultânea e indistintamente para 
 todos os municípios que apresentem condições objectivas para o respectivo 
 exercício. O artigo 6.º da Lei n.º 159/99, de 14 de Setembro, admite, porém, que 
 as novas atribuições e competências não assumam natureza universal, podendo, 
 pois, ser efectuadas apenas para algum ou alguns municípios, através da 
 contratualização entre os departamentos da administração central (ou regional) 
 competentes e todos os municípios interessados.
 Este novo quadro de atribuições e competências das autarquias locais em geral e 
 dos municípios em especial não é, no entanto, imediatamente aplicável. Pelo 
 contrário, nos termos do n.º 1 do artigo 4.º da Lei n.º 159/99, de 14 de 
 Setembro, “o conjunto de atribuições e competências estabelecido no capítulo III 
 desta lei-quadro será progressivamente transferido para os municípios nos quatro 
 anos subsequentes à sua entrada em vigor” – prazo, entretanto, prorrogado até ao 
 final de 2005 pela Lei n.° 55-B/2004, de 31 de Dezembro. O n.º 2 acrescenta que 
 
 “as transferências de competências, a identificação da respectiva natureza e a 
 forma de afectação dos respectivos recursos serão anualmente concretizadas 
 através de diplomas próprios, que podem estabelecer disposições transitórias 
 adequadas à gestão do processo de transferência em causa”.
 B) A natureza da Lei n.º 159/99, de 14 de Setembro, aproxima-se, por isso, da 
 natureza das leis de enquadramento. Sem dúvida que, como qualquer lei‑quadro, 
 assume em alguns aspectos uma estrutura próxima da das leis de bases, postulando 
 desdobramentos legislativos posteriores para se tornar exequível (ou plenamente 
 exequível), bem como apontando para a existência de regulamentações legais que 
 se estendem por diferentes níveis de concretização. Não obstante, ao contrário 
 do que sucede na generalidade das leis de bases, procura-se sobretudo recortar 
 de forma densificada, embora sem chegar ao nível da pormenorização, um conjunto 
 de princípios e regras (fundamentalmente organizatórios e procedimentais) 
 através dos quais se devem operar as transferências de atribuições e 
 competências para as autarquias locais, em geral, e para os municípios, em 
 especial. Basta ver que o legislador se limita a enumerar, no capítulo II, as 
 atribuições dos municípios e das freguesias (artigos 13.º a 15.º), 
 estabelecendo, ao longo dos artigos 16.º a 31.º, disposições especificadoras das 
 diversas competências dos órgãos municipais na prossecução das referidas 
 atribuições – apenas uma disposição por cada área temática, por mais vasta que 
 seja –, procurando essencialmente definir com certo rigor os critérios e os 
 procedimentos a que deve obedecer a transferência de atribuições e competências 
 
 (capítulo I). Assim se explica, por exemplo, uma regra tão precisa como aquela 
 em que se estabelece que “o património e os equipamentos afectos a investimentos 
 públicos em domínios transferidos para as autarquias passam a constituir 
 património da autarquia, devendo as transferências a que houver lugar 
 processar-se sem qualquer indemnização” (n.º 1 do artigo 11.º).
 Numa palavra, a Lei n.º 159/99, de 14 de Setembro, está porventura mais próxima 
 das leis de enquadramento do que das leis de bases – o que reduz, naturalmente, 
 a margem de liberdade conformativa de que pode gozar o legislador de 
 concretização, quer se trate do Governo, quer se trate eventualmente das 
 assembleias legislativas regionais.
 Acima de tudo, porém, o que importa sublinhar agora quanto à natureza da Lei n.º 
 
 159/99, de 14 de Setembro, é o facto de ela ter sido emanada no exercício de uma 
 competência legislativa reservada à Assembleia da República – a alínea q) do n.º 
 
 1 do artigo 165.º da Constituição –, a qual corresponde ao nível máximo dessa 
 mesma reserva: isto é, em que a totalidade da matéria respeitante ao “estatuto 
 das autarquias locais, incluindo as finanças locais”, apenas pode ser objecto de 
 regulação por lei parlamentar (ou decreto‑lei autorizado). É por isso muito 
 duvidoso que o regime constante da Lei n.º 159/99, de 14 de Setembro – 
 juntamente com a Lei n.º 169/99, de 18 de Setembro, alterada pela Lei n.º 
 
 5-A/2002, de 11 de Janeiro (Organização e Funcionamento dos Órgãos das 
 Autarquias Locais) – esgote o âmbito da reserva da Assembleia da República no 
 domínio em apreço e que, até certo ponto, essa reserva não abarque também as 
 decisões política e financeiramente mais relevantes no que toca à concretização 
 das diversas transferências de atribuições e competências.
 Além disso, interessa ainda ter em atenção, já não tanto a sua qualificação como 
 lei geral da República (entretanto caduca), mas o disposto no artigo 33.º, onde 
 se lê que “a presente lei aplica-se às Regiões Autónomas dos Açores e da 
 Madeira” – aplicação essa que, dada a natureza reservada da disciplina em 
 apreço, tem índole imperativa (e não apenas supletiva).
 C) É, pois, neste contexto que o artigo 19.º da Lei n.º 159/99, de 14 de 
 Setembro, estabelece, em matéria de educação, que:
 
 1 – É da competência dos órgãos municipais participar no planeamento e na gestão 
 dos equipamentos educativos e realizar investimentos nos seguintes domínios:
 a) Construção, apetrechamento e manutenção dos estabelecimentos de educação 
 pré-escolar;
 b) Construção, apetrechamento e manutenção dos estabelecimentos das escolas do 
 ensino básico.
 
 2 – É igualmente da competência dos órgãos municipais:
 a) Elaborar a carta escolar a integrar nos planos directores municipais;
 b) Criar os conselhos locais de educação.
 
 3 – Compete ainda aos órgãos municipais no que se refere à rede pública:
 a) Assegurar os  transportes escolares;
 b) Assegurar a gestão dos refeitórios dos estabelecimentos de educação 
 pré-escolar e do ensino básico;
 c) Garantir o alojamento aos  alunos que frequentam o ensino básico, como 
 alternativa ao transporte escolar, nomeadamente em residências, centros de 
 alojamento e colocação familiar;
 d) Comparticipar no apoio às crianças da educação pré-escolar e aos alunos do 
 ensino básico, no domínio da acção social escolar;
 e) Apoiar o desenvolvimento de actividades complementares de acção educativa na 
 educação pré-escolar e no ensino básico;
 f) Participar no apoio à educação extra-escolar;
 g) Gerir o pessoal não docente de educação pré-escolar e do 1.º ciclo do ensino 
 básico.
 Por sua vez, foi ao abrigo deste preceito que o Governo emanou o Decreto‑Lei n.º 
 
 7/2003, de 15 de Janeiro, também ele destinado a vigorar em todo o território 
 nacional, e em cujos artigos 12.º e 22.º se pode ler o seguinte:
 Artigo 12.º
 
 1 – A carta educativa tem por objecto a identificação a nível municipal, dos 
 edifícios e equipamentos educativos, a respectiva localização geográfica, bem 
 como as ofertas educativas da educação pré-escolar, incluindo as suas 
 modalidades especiais de educação, e da educação extra-escolar. 
 
 2 – (...)
 
 3 – A carta educativa incide sobre os estabelecimentos de educação pré‑escolar e 
 de ensino da rede pública, privada, cooperativa e solidária.
 
 4 – (...)
 Artigo 22.º
 
 1 – A realização dos investimentos na construção, apetrechamento e manutenção 
 dos estabelecimentos de educação pré-escolar e do ensino básico, previstos na 
 carta educativa, é da competência dos municípios.
 
 2 – A realização dos investimentos previstos no número anterior, no que se 
 refere à educação pré-escolar e ao 1.º ciclo do ensino básico, compreende a 
 identificação, a elaboração e a aprovação dos projectos, o seu financiamento e a 
 respectiva execução.
 
 3 – O exercício das competências previstas no n.º 1 efectiva-se, no que respeita 
 aos 2.º e 3.º ciclos do ensino básico, através de contrato entre o Ministério da 
 Educação e os municípios, assente na identificação padronizada de tipologias e 
 custos.
 
 4 – A realização dos investimentos, nos termos do n.º 2, na construção, 
 apetrechamento e manutenção dos estabelecimentos do ensino secundário, previstos 
 na carta educativa, é da competência do Ministério da Educação.
 V
 Os objectivos a que se propõe o Decreto da Assembleia Legislativa Regional n.º 
 
 23/2005, que aprova o Regime Jurídico do Planeamento, Protecção e Segurança das 
 Construções Escolares ora em apreciação, encontra[m]-se explicad[os] de forma 
 relativamente clara no respectivo preâmbulo:
 Desde logo, interessa esclarecer a forma como é elaborada a carta escolar, tendo 
 em conta que tal competência foi transferida para os órgãos de governo próprio 
 por força da alínea a) do artigo 8.º do Decreto-Lei n.º 338/79, de 25 de Agosto 
 
 (...), face às competências que em matéria de infra-estruturas escolares são 
 cometidas às autarquias por força da Lei n.º 159/99, de 14 de Setembro.
 Se tal não for feito, ficam cometidas aos municípios todas as competências em 
 matéria de construções escolares destinadas à educação pré-escolar e ao ensino 
 básico, conforme disposto no Decreto‑Lei n.º 7/2003, de 15 de Janeiro (...), já 
 que aquele diploma, por força da redacção dada ao n.º 2 do artigo 228.º da 
 Constituição pela Lei Constitucional n.º 1/2004, de 24 de Julho, passou 
 inequivocamente a aplicar-se na Região Autónoma dos Açores.
 Com esse objectivo, pelo presente diploma são fixadas normas sobre elaboração da 
 carta escolar e sobre a construção e manutenção dos estabelecimentos de ensino 
 básico na Região (...).
 No que respeita à construção de novas infra-estruturas escolares, sem prejuízo 
 das competências legalmente cometidas às autarquias, nos termos da Lei n.º 
 
 159/99, de 14 de Setembro, a administração regional autónoma assume a construção 
 dos edifícios necessários aos 2.º e 3.º ciclos do ensino básico e ao ensino 
 secundário, ficando à responsabilidade das autarquias a construção dos edifícios 
 destinados à educação pré-escolar e ao 1.º ciclo do ensino básico que deliberem 
 incluir nas respectivas cartas educativas.
 Estes objectivos são, depois, concretizados ao longo do articulado do diploma e, 
 muito em particular, nas seguintes disposições:
 A) O n.º 1 e a alínea c) do n.º 3 do artigo 14.º, bem como os n.ºs 1 e 2 do 
 artigo 15.º, reduzem o âmbito da carta educativa, para cuja elaboração são 
 competentes os órgãos autárquicos (municipais), ao 1.º ciclo do ensino básico, 
 dele excluindo, portanto, o 2.º e o 3.º ciclos do ensino básico, que passam a 
 ser responsabilidade exclusiva da administração regional (ao contrário do que 
 resulta actualmente da aplicação do Decreto-Lei n.º 7/2003, de 15 de Janeiro); 
 B) O artigo 19.º estabelece que tão-somente são da “responsabilidade da 
 autarquia, nos termos do n.º 1 do artigo 19.º da Lei n.° 159/99, de 14 de 
 Setembro, a concretização dos investimentos das infra-estruturas da educação 
 pré-escolar e do 1.º ciclo do ensino básico (...), sem prejuízo do 
 co-financiamento comunitário e regional a que haja lugar nos termos legais e 
 regulamentares aplicáveis”;
 C) O artigo 50.º prevê o regime de repartição de competências entre as 
 autarquias locais e a administração regional no domínio da construção de 
 infra-estruturas escolares: as autarquias adquirem os terrenos, elaboram os 
 projectos e procedem à construção dos edifícios relativos aos edifícios 
 escolares destinados à educação pré-escolar e ao 1.º ciclo do ensino básico; a 
 administração regional exerce as mesmas competências em relação aos edifícios 
 destinados ao 2.º e 3.º ciclos do ensino básico e ao ensino secundário. 
 Verificadas certas circunstâncias particulares, pode ainda a administração 
 regional assumir a realização do projecto, construção ou ampliação de 
 instalações escolares dirigidas à educação pré-escolar e ao 1.º ciclo do ensino 
 básico;
 D) O n.º 2 do artigo 51.º, no que toca aos investimentos relativos à manutenção 
 dos edifícios escolares, limita a competência das autarquias locais aos 
 estabelecimentos de educação pré-escolar e do 1.º ciclo do ensino básico;
 E) O artigo 52.º determina que o apetrechamento de todos os estabelecimentos de 
 educação e ensino da rede pública constitui encargo exclusivo da administração 
 regional – com exclusão de qualquer competência das autarquias –, constituindo 
 os respectivos equipamentos, por isso, património da Região;
 F) Os artigos 53.º e 57.º, em consequência do disposto nos preceitos 
 anteriormente referidos, apenas regulam a (possibilidade de) transferência 
 patrimonial para as autarquias dos imóveis escolares onde funcione em exclusivo 
 a educação pré-escolar e o 1.º ciclo do ensino básico.
 VI
 Em face do exposto, duas dúvidas de constitucionalidade se podem colocar 
 sucessivamente. Primeiro: os preceitos referidos do Regime Jurídico do 
 Planeamento, Protecção e Segurança das Construções Escolares violam ou não o 
 disposto na Lei n.º 159/99, de 14 de Setembro, em especial o seu artigo 19.º? Se 
 a resposta for afirmativa, estará consequentemente demonstrada a violação pela 
 Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores da reserva relativa da 
 Assembleia da República em matéria de “estatuto das autarquias locais”. Por sua 
 vez, se a resposta for negativa, surge então a segunda dúvida: apesar de os 
 regimes constantes dos artigos submetidos a fiscalização da constitucionalidade 
 serem conformes com o disposto na Lei n.º 159/99, de 14 de Setembro, será que 
 aquela Assembleia Legislativa, ao proceder à concretização desta lei no âmbito 
 regional, não estará ainda a legislar em matéria de “estatuto das autarquias 
 locais”, tomando decisões muito relevantes no que toca às atribuições e 
 competências dos municípios açorianos?
 A) A razão de ser da primeira questão prende-se com a impossibilidade de ler o 
 artigo 19.º de forma isolada em relação aos restantes preceitos da Lei n.º 
 
 159/99, de 14 de Setembro, e, em especial, ao princípio da progressividade das 
 transferências (artigo 4.º) e às regras que permitem a realização de 
 transferências não universais, isto é, que se efectuam apenas para alguns 
 municípios, de forma contratualizada (artigo 6.º).
 Com efeito, se o confronto entre o teor literal do artigo 19.º da Lei n.º 
 
 159/99, de 14 de Setembro, sobretudo do seu n.º 1, e os preceitos do Decreto n.º 
 
 23/2005 submetidos a fiscalização da constitucionalidade revela uma clara 
 divergência de soluções no que toca ao 2.º e ao 3.º ciclos do ensino básico – 
 com evidente redução de poderes das autarquias insulares –, a verdade é que pode 
 também entender-se que a Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores 
 pretendeu apenas, ao efectuar a exclusão dos municípios açorianos do âmbito de 
 aplicação do Decreto-Lei n.º 7/2003, de 15 de Janeiro, transformar em não 
 universal uma transferência concebida pelo Governo da República como universal – 
 embora em tal caso, há que reconhecê-lo, também não tenha adoptado o 
 procedimento contratualizado previsto no n.º 3 do artigo 6.º da Lei n.º 159/99, 
 de 14 de Setembro. Um pouco nesta linha argumentativa, pode invocar-se o facto 
 de o próprio Decreto-Lei n.º 7/2003, de 15 de Janeiro, não deixar de estabelecer 
 também, no n.º 3 do seu artigo 22.º, uma solução diferenciada aplicável ao 2.º e 
 ao 3.º ciclos do ensino básico.
 Ficaria assim em aberto a possibilidade de, num momento futuro, de acordo com 
 uma ideia de progressividade, se transferirem para os municípios da Região as 
 atribuições e competências que por agora permaneceriam ainda reservadas à 
 administração regional autónoma.
 B) Se for considerada procedente a argumentação baseada no princípio da 
 progressividade e na admissibilidade de transferências não universais – e, em 
 consequência, os preceitos em questão do Regime Jurídico do Planeamento, 
 Protecção e Segurança das Construções Escolares forem tidos como não 
 desconformes com o respectivo diploma de enquadramento, ou seja, com a Lei n.º 
 
 159/99, de 14 de Setembro –, colocar-se-á então com grande acuidade o problema 
 do exacto alcance da reserva da Assembleia da República em matéria de “estatuto 
 das autarquias locais”.
 Como se disse acima, à alínea q) do n.º 1 do artigo 165.º corresponde, em 
 princípio, o nível mais exigente da reserva de competência legislativa do 
 Parlamento. Quer isto dizer que lhe está reservada toda a disciplina jurídica 
 que, assumindo dignidade legislativa (e não apenas regulamentar), contenda com 
 as atribuições e competências das autarquias – a ideia de “estatuto” compreende 
 por certo a definição precisa das atribuições da pessoa colectiva e das 
 competências dos respectivos órgãos. A reserva em causa não se basta, pois, com 
 uma lei da Assembleia da República (ou com um decreto-lei autorizado) que se 
 limite a definir “bases gerais”, “normas de enquadramento”, “regimes gerais” ou 
 
 “disposições não exequíveis”, absolutamente carecidas de concretização ou 
 densificação posterior – como sucede com o artigo 19.º da Lei n.º 159/99, de 14 
 de Setembro (e como muitos outros artigos da mesma lei). No que toca à alínea q) 
 do n.º 1 do artigo 165.º da Constituição e ao “estatuto das autarquias locais”, 
 não parece pois que o legislador parlamentar (ou o Governo, mediante decreto-lei 
 autorizado) possa ficar-se pelas opções fundamentais, relegando a quase 
 totalidade dos problemas referentes à sua concretização legislativa para o 
 legislador concorrencial, concedendo-lhe, ao mesmo tempo, uma ampla liberdade de 
 conformação – a qual lhe poderá conferir importantes capacidades de decisão, não 
 apenas sobre o “como” e o “quando” da concretização a efectuar, mas também sobre 
 o próprio “se” dessa mesma concretização (na falta de mecanismos eficazes de 
 controlo da ilegalidade por omissão).
 Em todo o caso, tudo dependerá de uma ponderação concreta da disciplina 
 
 (seguramente inovadora) que o Decreto n.º 23/2005 da Assembleia Legislativa 
 açoriana pretende introduzir na ordem jurídica, sendo certo que, à partida, não 
 parece de todo despicienda a decisão sobre se os municípios açorianos possuem ou 
 não atribuições e competências no que respeita à construção e manutenção dos 
 estabelecimentos destinados ao 2.º e 3.º ciclos do ensino básico e, 
 consequentemente, sobre a titularidade patrimonial dos respectivos edifícios.
 C) A aparente consistência dos argumentos esgrimidos num e noutro sentido, assim 
 como a impossibilidade de superar um problema jurídico com estas características 
 e com este melindre no quadro institucional da Região Autónoma dos Açores, 
 aconselham, pois, claramente, o recurso a uma intervenção do Tribunal 
 Constitucional.
 Acresce que, o Regime Jurídico do Planeamento, Protecção e Segurança das 
 Construções Escolares, agora aprovado pelo Decreto n.º 23/2005, pretende 
 desempenhar uma função clarificadora e estabilizadora das relações entre a 
 administração regional e os municípios açorianos no domínio fundamental da 
 educação, função que só poderá levar a cabo em termos adequados se forem 
 previamente esclarecidas as dúvidas de constitucionalidade acima apontadas.
 VII
 Nestes termos, o Ministro da República para a Região Autónoma dos Açores vem 
 submeter a apreciação preventiva da constitucionalidade, por eventual violação 
 da reserva relativa de competência legislativa da Assembleia da República 
 
 (alínea q) do n.° 1 do artigo 165.º e alínea a) do n.º 1 do artigo 227.º da 
 Constituição), as normas constantes do n.° 1 e da alínea c) do n.º 3 do artigo 
 
 14.º, do artigo 15.º, do artigo 19.º, do artigo 50.º, do n.º 2 do artigo 51.º, 
 do artigo 52.º, do artigo 53.º e do artigo 57.º do Regime Jurídico do 
 Planeamento, Protecção e Segurança das Construções Escolares, aprovado em 16 de 
 Junho pelo Decreto da Assembleia Legislativa Regional n.° 23/2005.»
 
 3.Notificada nos termos e para os efeitos dos artigos 54.º e 55.º, n.º 3, da Lei 
 de Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional, a 
 Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores pronunciou-se, por 
 intermédio do seu Presidente, dizendo o seguinte:
 
 «1.º
 O Decreto da Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores n.º 23/2005, 
 está em conformidade com a Constituição orgânica, formal e materialmente.
 
 2.º
 Com efeito, e conforme o próprio preâmbulo do diploma em apreciação afirma, a 
 relação entre a administração regional autónoma e as autarquias em matéria de 
 educação é enquadrada pela Lei n.º 159/99, de 14 de Setembro, conforme 
 regulamentada pelo Decreto-Lei n.º 7/2003, de 15 de Janeiro.
 
 3.º
 A Lei n.º 159/99, de 14 de Setembro, regula matéria enquadrável no disposto na 
 alínea q) do n.º 1 do artigo 165.º da Constituição, integrando a reserva 
 relativa da Assembleia da República.
 
 4.º
 Já a concretização daquela Lei, que se encontra plasmada no Decreto-Lei n.º 
 
 7/2003, de 15 de Janeiro, pode ser levada a cabo pelo legislador regional, tendo 
 em conta a realidade do arquipélago, respeitando necessariamente a normação 
 enquadradora constante da Lei n.º 159/99, de 14 de Setembro.
 
 5.º
 Se é verdade que a Região decidiu não contestar a qualificação abusiva como lei 
 geral da República do Decreto-Lei n.º 7/2003, de 15 de Janeiro, tal deveu-se à 
 iminência da revisão constitucional, que se veio a concretizar através da Lei 
 Constitucional n.º 1/2004, de 24 de Julho, a qual abriu caminho para que a 
 Assembleia Legislativa dispusesse sobre a matéria em causa, resolvendo os 
 problemas insanáveis que a aplicação daquele diploma causaria.
 
 6.º
 De facto, as autarquias açorianas nunca tiveram qualquer responsabilidade em 
 matéria de edifícios escolares dos 2.º e 3.º ciclos do ensino básico, tendo 
 exercido apenas competências em matéria das escolas do 1.º ciclo do ensino 
 básico (então designadas por “escolas primárias”), conforme decorre do Decreto 
 Legislativo Regional n.º 33/84/A, de 6 de Novembro, alterado pelo Decreto 
 Legislativo Regional n.º 31/86/A, de 11 de Dezembro, e pelo Decreto Legislativo 
 Regional n.º 4/95/A, de 29 de Março.
 
 7.º
 A vigência destes diplomas regionais durante quase 20 anos vem atestar a 
 competência legislativa regional nesta matéria, na sequência do artigo 8.º do 
 Decreto-Lei n.º 338/79, de 25 de Agosto, que é prosseguida pelo diploma em 
 análise.
 
 8.º
 Tendo em conta o disposto no n.º 1 do artigo 19.º da Lei n.º 159/99, de 14 de 
 Setembro, é agora “da competência dos órgãos municipais participar no 
 planeamento e na gestão dos equipamentos educativos e realizar investimentos” 
 nos estabelecimentos de educação pré-escolar e nas escolas do ensino básico.
 
 9.º
 Na Região tal corresponde a um alargamento até ao 3.º ciclo do ensino básico das 
 competências autárquicas que antes se restringiam à educação pré-escolar e ao 
 
 1.º ciclo do ensino básico, abrangendo assim um conjunto de equipamentos 
 educativos que até agora são responsabilidade e propriedade exclusiva da Região.
 
 10.º
 Tal alargamento não constitui, nem poderia constituir face às competências 
 regionais e à exclusividade conferida aos órgãos de governo próprio em matéria 
 de gestão do património regional, a atribuição de uma competência exclusiva aos 
 municípios, antes a criação da possibilidade da participação daquelas matérias 
 ali referidas (cf. n.º 1 do artigo 19.º da Lei n.º 159/99, de 14 de Setembro).
 
 11.º
 O que a Lei n.º 159/99, de 14 de Setembro, pretendeu não foi impedir a 
 administração regional autónoma de exercer as funções que lhe estão cometidas e 
 administrar o seu património, mas tão-somente atribuir uma competência 
 concorrencial, que as autarquias podem e devem utilizar, e que o diploma em 
 apreciação em nada cerceia.
 
 12.º
 Neste enquadramento, o diploma em análise limita-se a regular algumas matérias 
 constantes da Lei n.º 159/99, de 14 de Setembro, conformando-se integralmente 
 com esta, ainda que o seu artigo 6.º determinasse que as atribuições e 
 competências a transferir para os municípios são tendencialmente universais, o 
 que legitimaria uma menor responsabilização das autarquias açorianas na matéria 
 em análise através da manutenção das competências regionais. Contudo, como 
 adiante se demonstra, não foi essa a opção.
 
 13.º
 Conforme afirma Sérvulo Correia, em parecer que se anexa, página 71: “O 
 Decreto-Lei n.º 7/2003, de 15 de Janeiro, constitui um diploma de 
 desenvolvimento ou de concretização da Lei n.º 159/99, que constitui uma Lei de 
 enquadramento ou uma lei-quadro. Ora a menos que existam circunstâncias 
 ponderosas que exijam o alargamento da esfera da normação nacional fundamental, 
 tudo aponta para que a legislação nacional imperativa em matéria de 
 transferência de competências para as autarquias locais não se estenda aos 
 decretos-lei do Governo que, em matéria concorrencial, procedem à concretização 
 da Lei n.º 159/99. Isto significa que, em consequência da natureza da Lei n.º 
 
 159/99, os decretos legislativos regionais a emanar sobre a matéria devem 
 fundamentalmente respeitar o regime constante da Lei n.º 159/99, uma vez que 
 esta desempenha o papel, não apenas de uma Lei de Bases, mas de uma Lei de 
 Enquadramento e respeita a uma matéria da reserva de competência da Assembleia 
 da República, não estando à partida sujeitos a qualquer outro limite, para além 
 dos que decorrem da mesma Lei e dos limites constitucionais gerais”.
 
 14.º
 Neste contexto de respeito estrito pela reserva do estatuto das autarquias 
 locais e pela Lei n.º 159/99, não se compreende que sejam questionadas pelo 
 Senhor Ministro da República as normas que versam competências na área do 
 planeamento das construções escolares (n.º 1 e alínea c) do n.º 3 do artigo 
 
 14.º, artigo 15.º e artigo 19.º) e a construção, apetrechamento e propriedade 
 dos respectivos imóveis (artigo 50.º, n.º 2 do artigo 51.º, artigo 52.º, artigo 
 
 53.º e artigo 57.º).
 
 15.º
 Em relação ao primeiro grupo de normas não se vislumbra qualquer interferência 
 com o estatuto das autarquias locais, pois apenas se concretiza a competência em 
 matéria de planeamento dos equipamentos educativos no sentido de os harmonizar 
 com os instrumentos de planeamento regional e com a rede escolar existente, onde 
 todas as escolas do 2.º e 3.º ciclos são propriedade regional, nada se retirando 
 nem acrescentando ao disposto na lei enquadradora.
 
 16.º
 O diploma ao referir apenas a educação pré-escolar e o 1.º ciclo do ensino 
 básico, rede tradicionalmente confiada às autarquias, em nada impede que estas 
 se pronunciem sobre os restantes ciclos de ensino, nem limita a sua capacidade 
 conforme estabelece o artigo 19.º da Lei n.º 159/99, de 14 de Setembro, de 
 
 “participar no planeamento” de qualquer infra‑estrutura educativa.
 
 17.º
 O artigo 50.º do diploma em análise é claro no seu carácter supletivo em relação 
 
 às competências atribuídas aos municípios pela Lei n.º 159/99, de 14 de 
 Setembro, apenas ressalvando, na linha do propugnado no diploma, que se trata de 
 uma competência necessariamente concorrencial e complementar entre as 
 administrações regional, autónoma e local, em nada interferindo com a 
 possibilidade de as autarquias terem intervenção, que se deseja, na matéria em 
 causa.
 
 18.º
 O n.º 2 do artigo 51.º do diploma limita-se a manter as obrigações constantes da 
 parte em vigor do Decreto Legislativo Regional n.º 31/86/A, de 11 de Dezembro, 
 em nada beliscando as competências municipais, mantendo uma prática que deriva 
 da própria idade dos imóveis ali referidos, os únicos que à data estão na posse 
 das autarquias.
 
 19.º
 O artigo 52.º não impede as autarquias de participar no apetrechamento dos 
 edifícios escolares, adquirindo-lhes equipamentos que considerem necessários, 
 mas apenas pretende responsabilizar a administração regional autónoma. Não se 
 trata de uma norma que exclua a participação autárquica, mas que garante que as 
 escolas disporão daquele tipo de material, qualquer que seja a decisão da 
 autarquia.
 
 20.º
 O artigo 53.º limita-se a habilitar o Governo Regional a transferir para as 
 autarquias, a solicitação destas, património que indubitavelmente está na sua 
 disponibilidade, não criando qualquer ónus àquelas, nem interferindo com o seu 
 estatuto. Não se venha invocar o artigo 11.º da Lei n.º 159/99, de 14 de 
 Setembro, para unilateralmente dispor sobre o património regional, o que 
 configuraria uma clara violação das disposições conjugadas do artigo 113.º e da 
 alínea b) do artigo 60.º do Estatuto Político‑Administrativo da Região Autónoma 
 dos Açores.
 
 21.º
 O artigo 57.º limita-se a reconhecer a repartição patrimonial existente, nem 
 sempre titulada, dada a inexistência dos respectivos registos, criando a base 
 legal para sanar as indefinições existentes, continuando apenas a integrar na 
 esfera dominial da Região os imóveis que já nela se encontram.
 
 22.º
 Tendo presente a fundamentação expendida, conclui-se:
 a) As normas constantes do n.º 1 e da alínea c) do n.º 3 do artigo 14.º, do 
 artigo 15.º, do artigo 19.º, do artigo 50.º, do n.º 2 do artigo 51.º, do artigo 
 
 52.º, do artigo 53.º e do artigo 57.º do Decreto da Assembleia Legislativa da 
 Região Autónoma dos Açores n.º 23/2005 não violam a reserva relativa da 
 competência legislativa da Assembleia da República, consagrada na alínea q) do 
 n.º 1 do artigo 165.º, nem o disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 227.º, 
 ambos da Constituição.
 b) O Decreto da Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores n.º 
 
 23/2005, limita-se a legislar no âmbito regional em [matéria] de educação e de 
 equipamento social, conforme as alíneas v) e aa) do artigo 8.º do Estatuto 
 Político‑Administrativo, e que não está reservada aos órgãos de soberania.»
 O órgão autor da norma juntou também aos autos um parecer jurídico subscrito por 
 dois Professores de Direito e datado de 23 de Maio de 2003.
 II. Fundamentos 
 A) Questões prévias 
 
 4.Começando pelas questões prévias que possam obstar ao conhecimento do pedido, 
 verifica-se, em primeiro lugar, que o “Regime Jurídico do Planeamento, Protecção 
 e Segurança das Construções Escolares”, aprovado pelo Decreto da Assembleia 
 Legislativa da Região Autónoma dos Açores n.º 23/2005, foi recebido pelo 
 Ministro da República no dia 5 de Julho de 2005, tendo o pedido dado entrada, 
 entregue em mão, no Tribunal Constitucional, já depois de encerrada ao público a 
 Secretaria Judicial do Tribunal (na primeira folha dos autos encontra-se 
 registado o momento de entrada do pedido: “13/07/05 pelas 16,20h”), mas foi 
 depois igualmente recebido por telecópia, pelas 17 horas e 32 minutos.
 O artigo 278.º, n.º 3, da Constituição da República, dispõe, desde a revisão 
 constitucional de 1989, que a “apreciação preventiva da constitucionalidade deve 
 ser requerida no prazo de oito dias a contar da data da recepção do diploma”, 
 sendo tal prazo repetido (embora sem menção do dies a quo) no artigo 57.º da Lei 
 do Tribunal Constitucional.
 Entende-se que não é aplicável a este prazo para apresentação do pedido de 
 fiscalização preventiva da constitucionalidade a dilação de dois dias prevista 
 no artigo 56.º, n.º 4, da Lei do Tribunal Constitucional, para entidades 
 sediadas fora do continente da República. A questão da aplicabilidade desta 
 dilação aos pedidos de fiscalização preventiva de constitucionalidade foi 
 tratada pelo Tribunal logo no acórdão n.º 26/84 (publicado em Acórdãos do 
 Tribunal Constitucional [ATC], vol. 2.º, págs. 71-82), tendo, então, merecido 
 uma resposta afirmativa (embora com dois votos de vencido quanto a este ponto). 
 Ora (e independentemente de qualquer resposta à questão da conformidade 
 constitucional de um prolongamento, por lei, do prazo para apresentação do 
 pedido de fiscalização preventiva), entende este Tribunal que o referido artigo 
 
 56.º, n.º 4, é aplicável apenas aos prazos “processuais” (ou “adjectivos”). Já 
 não é, porém, de aplicar também a um prazo “substantivo”, ou equiparável – que, 
 como se disse no citado acórdão, é “pré-processual”, por “respeitante à 
 faculdade de accionar um tribunal, quer dizer, ao exercício de um ‘direito de 
 acção’ ou, pelo menos, de um ‘direito’ ou faculdade a tanto semelhante” –, como 
 
 é o caso do prazo para apresentação do pedido de fiscalização preventiva da 
 constitucionalidade. Isto, uma vez que não procedem já hoje as razões que 
 levaram, no citado aresto, a concluir pela aplicabilidade da referida dilação, e 
 que levaram a considerá-lo, não um prolongamento do prazo (que era então de 
 cinco dias), mas “uma condição para o seu completo aproveitamento”, uma vez que 
 os Ministros da República, tendo “a sua sede nos arquipélagos dos Açores e da 
 Madeira, e recebendo aí os diplomas das correspondentes assembleias regionais, 
 se veriam praticamente impossibilitados de utilizar na íntegra, para a tomada da 
 sua decisão, esse prazo constitucional, se os respectivos requerimentos devessem 
 obrigatoriamente dar entrada no Tribunal Constitucional até ao último dia desse 
 prazo”, ficando em “situação de clara desvantagem” relativamente a entidades 
 sediadas em Lisboa (situação “tanto menos compreensível e justificável quanto se 
 está perante um prazo de muito curta duração” – disse-se também no citado 
 acórdão n.º 26/84). Tal pleno aproveitamento do prazo é actualmente possível, 
 tendo em conta os meios de comunicação existentes, que permitem fazer chegar ao 
 Tribunal Constitucional o pedido de fiscalização preventiva praticamente sem 
 demora.
 Conclui-se, pois, não se aplicando o referido artigo 56.º, n.º 4, que o prazo 
 para apresentação do presente pedido de fiscalização preventiva terminava em 13 
 de Julho.
 Ora, no que diz respeito ao limite temporal para a entrega do pedido na 
 secretaria do Tribunal Constitucional, afirmou este Tribunal, já no acórdão n.º 
 
 94/84 (publicado em ATC, vol. 3.º, págs. 27-31), que “os requerimentos [de 
 fiscalização abstracta, no caso, preventiva] se destinam a desencadear uma 
 verdadeira e própria actividade judicial (ou seja, o exercício da função 
 jurisdicional por um tribunal) e que, portanto, não podem deixar de ter, no seu 
 recebimento e registo, um tratamento similar ao de quaisquer papéis destinados a 
 processos judiciais”. Tal significava, então, que a sua apresentação dependia do 
 horário dos serviços do Tribunal Constitucional (actualmente, aplicando-se ao 
 funcionamento da Secretaria Judicial do Tribunal Constitucional, como regime 
 supletivo nos termos do artigo 12.º do Decreto-Lei n.º 545/99, de 14 de 
 Dezembro, o artigo 122.º, n.ºs 1 e 3, da Lei de Organização e Funcionamento dos 
 Tribunais Judiciais, aprovada pela Lei n.º 3/99, de 13 de Janeiro, conclui-se 
 que o horário de funcionamento daquela Secretaria Judicial é, nos dias úteis, 
 até às 17 horas, encerrando ao público “uma hora antes do termo do horário 
 diário”, isto é, às 16 horas).
 A considerar-se, como no citado acórdão n.º 94/84, que a apresentação do 
 requerimento de fiscalização preventiva haveria de circunscrever-se ao período 
 de abertura ao público, teria, pois, de concluir-se que o pedido foi já 
 apresentado extemporaneamente.
 Entende-se, todavia, que esta conclusão não é de subscrever, considerando que o 
 pedido foi também recebido, ainda no dia 13 de Julho, por telecópia (tendo, 
 aliás, sido registado e distribuído ao relator ainda nesse mesmo dia).
 Com efeito, apesar de não se encontrar na Lei do Tribunal Constitucional 
 qualquer referência expressa à possibilidade de apresentação, por telecópia, de 
 pedidos de fiscalização preventiva de constitucionalidade, entende-se que não 
 existe obstáculo decisivo à sua utilização para o referido efeito. A existência 
 e disponibilidade desse meio de comunicação vem, assim, permitir o pleno 
 aproveitamento do prazo de oito dias previsto no artigo 278.º, n.º 3, da 
 Constituição da República e no artigo 57.º, n.º 1, da Lei do Tribunal 
 Constitucional, fazendo com que o limite horário para a apresentação do pedido 
 deixe de depender do horário de encerramento dos serviços do Tribunal 
 Constitucional (cfr., aliás, o lugar paralelo previsto, para o processo civil, 
 nos artigos 150.º, n.º 1, alínea c), e 143.º, n.º 4, do Código de Processo 
 Civil, onde se dispõe que os actos processuais podem hoje ser praticados por 
 telecópia “em qualquer dia e independentemente da hora da abertura e do 
 encerramento dos tribunais”, valendo como data da prática do acto processual a 
 da expedição).
 Conclui-se, assim, que o presente pedido não é extemporâneo, tendo dado entrada 
 no Tribunal Constitucional, por telecópia, no último dia do prazo para a sua 
 apresentação.
 
 5.Em segundo lugar, e tal como acontecera no pedido que deu origem ao acórdão 
 n.º 232/2003 (publicado em ATC, vol. 56.º, págs. 7‑51), os termos em que o 
 pedido de apreciação preventiva da constitucionalidade vem formulado também não 
 obstam a que o Tribunal dele tome conhecimento.
 Na verdade, embora o requerente acentue as “dúvidas de constitucionalidade”, o 
 
 “problema jurídico” e o seu melindre, no quadro das relações entre a 
 administração regional e os municípios, e acentue a “função clarificadora e 
 estabilizadora” que a solução das dúvidas de constitucionalidade possibilitará 
 ao diploma em causa exercer, sem tomar decididamente partido na controvérsia, o 
 pedido não deixa de ser claro na indicação quer das regras cuja conformidade com 
 a Constituição pretende ver apreciada, quer da norma constitucional 
 pretensamente violada, invocando, ademais, a necessidade de garantir a segurança 
 jurídica abalada pelos fundamentos aduzidos.
 Cumpre pois decidir, uma vez verificados os requisitos que o artigo 278.º da 
 Constituição e os artigos 51.º e 57.º da Lei do Tribunal Constitucional enunciam 
 para a apresentação de pedido de apreciação preventiva da constitucionalidade.
 B) Apreciação do pedido 
 
 6.O requerente suscitou, perante este Tribunal, a questão da 
 inconstitucionalidade orgânica das normas dos artigos 14.º, n.ºs 1 e 3, alínea 
 c), 15.º, 19.º, 50.º, 51.º, n.º 2, 52.º, 53.º e 57.º do “Regime Jurídico do 
 Planeamento, Protecção e Segurança das Construções Escolares”, por violação do 
 artigo 165.º, n.º 1, alínea q), e do artigo 227.º, n.º 1, alínea a), da 
 Constituição.
 Como este Tribunal tem repetidamente salientado (cfr., por ex., já o acórdão n.º 
 
 206/87, in Diário da República [DR], I série, de 10 de Julho de 1987), há, pois 
 que aplicar o parâmetro constitucional em vigor na data em que o referido regime 
 foi aprovado – isto é, em 16 de Junho de 2005 –, que era o texto saído da VI 
 revisão constitucional, aprovada pela Lei Constitucional n.º 1/2004, de 24 de 
 Julho (a qual entrou em vigor em Agosto de 2004).
 Recordando as alterações introduzidas nesta matéria na Constituição (artigo 
 
 227.º, n.º 1, alínea a)), verifica-se que: a) desapareceu a necessidade de 
 interesse específico da região na matéria a regular, como fundamento para o seu 
 poder legislativo; b) desapareceu qualquer referência constitucional expressa à 
 categoria das “leis gerais da República”, deixando o respeito pelos respectivos 
 
 “princípios fundamentais” de ser considerado como limite aos poderes 
 legislativos das regiões; c) concomitantemente, foi introduzido, no artigo 228.º 
 da Constituição, um novo n.º 2, a prever uma aplicação supletiva, ou 
 subsidiária, das “normas legais em vigor” (“Na falta de legislação regional 
 própria sobre matéria não reservada à competência dos órgãos de soberania, 
 aplicam-se nas regiões autónomas as normas legais em vigor”); d) os poderes 
 legislativos regionais foram expressamente limitados ao âmbito regional e passou 
 a exigir-se, como pressuposto de constitucionalidade, que esses poderes sejam 
 exercidos sobre matéria enunciada no estatuto político-administrativo da região; 
 e) manteve-se, como limite ao poder legislativo regional, a competência 
 reservada aos órgãos de soberania, embora com alteração de redacção (em vez de 
 matérias que “não estejam reservadas à competência própria dos órgãos de 
 soberania”, passou a falar-se de matérias “que não estejam reservadas aos órgãos 
 de soberania”). Estas alterações foram ainda acompanhadas pela modificação do 
 regime dos decretos legislativos regionais, no artigo 112.º, n.º 4, da 
 Constituição, e pela previsão de um regime transitório, constante do artigo 46.º 
 da Lei Constitucional n.º 1/2004, nos termos do qual, até “à eventual alteração 
 das disposições dos estatutos político-administrativos das regiões autónomas, 
 prevista na alínea f) do n.º 6 do artigo 168.º, o âmbito material da competência 
 legislativa das respectivas regiões é o constante do artigo 8.º do Estatuto 
 Político-Administrativo da Região Autónoma dos Açores e do artigo 40.º do 
 Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma da Madeira”.
 Ora, devendo as normas em apreciação ser confrontadas com o texto constitucional 
 saído da VI revisão constitucional, não há que tratar do seu confronto com os 
 
 “princípios fundamentais das leis gerais da República”. Diversamente, a questão 
 da qualificação como “lei geral da República” de qualquer diploma do qual as 
 normas em apreciação possam afastar-se, como, por exemplo, a Lei n.º 159/99, de 
 
 14 de Setembro, ou o Decreto-Lei n.º 7/2003, de 15 de Janeiro (questão, esta 
 
 última, sobre que versa o parecer jurídico junto pelo órgão autor da norma), só 
 poderá vir a ser relevante na medida em que, para determinação do efeito 
 jurídico a produzir pelas normas em apreciação, seja necessário apurar qual é, 
 actualmente, o regime jurídico em vigor na Região Autónoma dos Açores, sobre o 
 qual estas normas irão repercutir‑se.
 
 7.As normas dos artigos 14.º, n.ºs 1 e 3, alínea c), 15.º, 19.º, 50.º, 51.º, n.º 
 
 2, 52.º, 53.º e 57.º, do “Regime Jurídico do Planeamento, Protecção e Segurança 
 das Construções Escolares” (como todas as normas doravante citadas sem indicação 
 especial), podem, considerando o seu contexto e teor, ser divididas em dois 
 grupos.
 a) Um primeiro grupo é o que inclui as normas relativas aos objectivos, objecto 
 e efeitos da carta educativa (artigos 14.º, n.ºs 1 e 3, alínea c), 15.º, 19.º).
 A carta educativa é definida no artigo 3.º, alínea a), do “Regime Jurídico do 
 Planeamento, Protecção e Segurança das Construções Escolares”, como um 
 
 “instrumento de planeamento e ordenamento prospectivo de edifícios e 
 equipamentos educativos de responsabilidade municipal, organizada de acordo com 
 as ofertas de educação e formação que seja necessário satisfazer, tendo em vista 
 a melhor utilização dos recursos educativos, no quadro do desenvolvimento 
 demográfico e sócio‑económico de cada município”; isto, enquanto o conceito 
 carta escolar é dado pela alínea b) do mesmo artigo: “instrumento de planeamento 
 e ordenamento da rede educativa, do pré-escolar ao secundário, e de fixação das 
 orientações a seguir na sua evolução, com particular ênfase na vertente 
 organizativa e de infra-estruturas educacionais, por forma a reflectir a oferta 
 existente e perspectivar eventuais alterações, integrando o conteúdo das cartas 
 educativas municipais”.
 A carta escolar é, pois, concebida, com um âmbito mais amplo, tendo carácter 
 regional (artigo 8.º, n.º 1, do “Regime Jurídico do Planeamento, Protecção e 
 Segurança das Construções Escolares”) e incluindo as cartas educativas, as quais 
 são elaboradas à escala municipal, referindo-se apenas à educação pré-escolar e 
 ao primeiro ciclo do ensino básico.
 Na legislação proveniente dos órgãos de soberania, a Lei n.º 159/99, de 14 de 
 Setembro (que estabeleceu o quadro de transferência de atribuições e 
 competências para as autarquias locais) refere apenas, no artigo 19.º, n.º 2, 
 alínea a), e sem maior concretização, a “carta escolar a integrar nos planos 
 directores municipais”, cuja elaboração se prevê seja da competência dos órgãos 
 municipais. Diversamente, o Decreto-Lei n.º 7/2003, de 15 de Janeiro, que, na 
 sequência dessa Lei n.º 159/99, regulamentou os conselhos municipais de educação 
 e aprovou o processo de elaboração da carta educativa, transferindo competências 
 para as autarquias locais, precisou o âmbito deste instrumento, cuja designação 
 alterou (a “carta escolar, identificada na alínea a) do n.º 2 do artigo 19.º da 
 Lei n.º 159/99, de 14 de Setembro, passa a designar-se por carta educativa” – 
 artigo 2.º, n.º 2). A carta educativa é definida, neste Decreto-Lei, como sendo, 
 
 “a nível municipal, o instrumento de planeamento e ordenamento prospectivo de 
 edifícios e equipamentos educativos a localizar no concelho, de acordo com as 
 ofertas de educação e formação que seja necessário satisfazer, tendo em vista a 
 melhor utilização dos recursos educativos, no quadro do desenvolvimento 
 demográfico e sócio-económico de cada município” (artigo 10.º). Não se limita, 
 pois, à educação pré-escolar e do primeiro ciclo do ensino básico (nem, 
 aparentemente, aos edifícios e equipamentos educativos “de responsabilidade 
 municipal”), antes inclui, nos termos dos artigos 11.º, n.º 1, e 12.º, n.º 1, 
 daquele Decreto-Lei, os estabelecimentos de educação pré-escolar e de ensino 
 básico e secundário.
 
 É neste contexto que têm de ser entendidas as normas dos artigos 14.º, n.ºs 1 e 
 
 3, alínea c), 15.º e 19.º do “Regime Jurídico do Planeamento, Protecção e 
 Segurança das Construções Escolares”, as quais, genericamente, diferem das 
 disposições sobre a carta educativa previstas no citado Decreto-Lei n.º 7/2003 
 por se limitarem à educação pré‑escolar e ao primeiro ciclo do ensino básico.
 Assim, o artigo 14.º, n.º 1, enuncia, como objectivos da carta educativa, 
 
 “assegurar a adequação da rede de estabelecimentos de educação pré-escolar e do 
 
 1.º ciclo do ensino básico para que, em cada momento, as ofertas educativas 
 disponíveis a nível municipal respondam à procura efectiva que ao mesmo nível se 
 manifestar”, enquanto no n.º 3, alínea c), se exige que a carta garanta “a 
 coerência da rede educativa com a política urbana do município e a articulação 
 com a rede educativa dos 2.º e 3.º ciclos do ensino básico e ensino secundário, 
 tendo em conta as infra-estruturas existentes e as constantes dos instrumentos 
 regionais de planeamento, incluindo a carta escolar” (cfr., com diferenças 
 resultantes do âmbito mais amplo da carta educativa, o artigo 11.º, n.ºs 1 e 3, 
 do Decreto-Lei n.º 7/2003).
 O artigo 15.º define o objecto da carta educativa como sendo a “identificação, a 
 nível municipal, dos edifícios e equipamentos educativos, e respectiva 
 localização geográfica, bem como das ofertas educativas da educação pré-escolar 
 e do primeiro ciclo do ensino básico” (n.º 1), incidindo sobre os 
 
 “estabelecimentos de educação pré‑escolar e do primeiro ciclo do ensino básico 
 das redes pública, privada, cooperativa e solidária” (n.º 2 – itálicos 
 aditados).
 Diversamente, o artigo 12.º, n.ºs 1 e 3, do Decreto-Lei n.º 7/2003, alarga o 
 objecto da carta educativa à educação pré-escolar, aos ensinos básico e 
 secundário.
 No diploma regional em apreciação, o artigo 17.º (norma não questionada pelo 
 requerente) é que atribui competência à câmara municipal para a elaboração da 
 carta educativa, com os objectivos e objecto referidos. De entre as normas 
 questionadas, pode dizer-se que os artigos 14.º, n.ºs 1 e 3, alínea c), e 15.º 
 vêm a produzir efeitos jurídicos quanto às competências das autarquias apenas 
 por força do artigo 19.º, que dispõe sobre os efeitos da carta educativa: depois 
 de aprovada e ratificada, tal carta constitui um instrumento de orientação da 
 gestão do sistema educativo, atribuindo-se à autarquia a “responsabilidade”, 
 
 “nos termos do n.º 1 do artigo 19.º da Lei n.º 159/99, de 14 de Setembro”, de 
 concretização dos investimentos nas infra-estruturas da educação pré-escolar e 
 do 1.º ciclo do ensino básico ali previstas, “sem prejuízo do co‑financiamento 
 comunitário e regional a que haja lugar nos termos legais e regulamentares 
 aplicáveis”.
 Também aqui se nota uma diferença em relação ao disposto no Decreto-Lei n.º 
 
 7/2003 (artigo 21.º), segundo o qual, depois de aprovada e ratificada, a carta 
 educativa “constitui um instrumento de orientação da gestão do sistema 
 educativo, de acordo com as competências do Ministério da Educação e dos 
 municípios”, sem se precisar, a este propósito, qualquer “responsabilidade” na 
 concretização dos investimentos em infra-estruturas nela previstos.
 b) Um segundo grupo, de entre as normas indicadas pelo requerente, insere-se no 
 capítulo sobre “Construção, manutenção e equipamento das infra-estruturas 
 escolares” (e, quanto ao artigo 57.º, nas normas transitórias e finais).
 Sobre a matéria da construção, apetrechamento e manutenção de infra-estruturas 
 escolares, o artigo 19.º, n.º 1, da Lei n.º 159/99, de 14 de Setembro, previra, 
 sem qualquer distinção ou maior precisão do seu âmbito de aplicação, que é da 
 competência dos órgãos municipais realizar investimentos na construção, 
 apetrechamento e manutenção dos estabelecimentos de educação pré-escolar e “das 
 escolas do ensino básico”. E o Decreto-Lei n.º 7/2003, de 15 de Janeiro, 
 atribuindo, no n.º 1 do artigo 22.º, a competência respectiva aos municípios 
 para os “estabelecimentos de educação pré-escolar e do ensino básico”, 
 distinguiu entre a realização dos investimentos relativos à educação pré-escolar 
 e ao primeiro ciclo do ensino básico, por um lado, e relativos aos segundo e 
 terceiro ciclos deste mesmo nível de ensino, por outro lado, dispondo que estes 
 
 últimos se efectivam “através de contrato entre o Ministério da Educação e os 
 municípios, assente na identificação padronizada de tipologias e custos”.
 O “Regime Jurídico do Planeamento, Protecção e Segurança das Construções 
 Escolares”, ora em questão, separa, nos artigos 50.º, 51.º e 52.º, a matéria da 
 construção, manutenção e equipamento das infra-estruturas escolares.
 O artigo 50.º, n.º 1, sobre construção de infra-estruturas escolares, dispõe que 
 compete às autarquias adquirir os terrenos, elaborar o projecto e construir os 
 edifícios escolares destinados ao funcionamento da educação pré-escolar e do 
 primeiro ciclo do ensino básico.
 Os n.ºs 2 e 3 do artigo 50.º, por sua vez, prevêem competências da administração 
 regional autónoma: “supletivamente ao disposto no n.º 1 do artigo 19.º da Lei 
 n.º 159/99, de 14 de Setembro”, a competência para “aquisição, projecto e 
 construção das instalações escolares destinadas aos 2.º e 3.º ciclos do ensino 
 básico e ao ensino secundário”; e, também supletivamente, “e quando conste da 
 carta escolar em vigor”, competência para projectar, construir ou ampliar 
 instalações escolares propriedade da Região, destinadas ao funcionamento da 
 educação pré-escolar ou do primeiro ciclo do ensino básico, desde que integradas 
 em unidades orgânicas que englobem quaisquer dos outros níveis ou ciclos de 
 ensino, ou em situações excepcionais, decorrentes de calamidades ou similares.
 Quanto ao artigo 51.º, n.º 2, que dispõe sobre investimentos na manutenção dos 
 edifícios escolares, prevê que, “nos termos do n.º 1 do artigo 19.º da Lei n.º 
 
 159/99, de 14 de Setembro”, cabem às autarquias os destinados ao funcionamento 
 da educação pré-escolar e ao primeiro ciclo do ensino básico que sejam sua 
 propriedade.
 O artigo 52.º, sobre equipamento, contém, no n.º 1, a previsão de que é encargo 
 da administração regional autónoma a “aquisição e manutenção do mobiliário e 
 equipamento escolar básico, do material didáctico e dos equipamentos 
 tecnológicos, lúdicos e desportivos necessários ao funcionamento dos 
 estabelecimentos de educação e de ensino da rede pública”, sem distinção entre 
 níveis de ensino (ou respectivos ciclos). Por sua vez, no n.º 2 prevê-se que os 
 mobiliários e equipamentos adquiridos nos termos do n.º 1 são propriedade da 
 Região, ficando integrados no seu património.
 Este artigo 52.º, n.º 2, pode, aliás, ser aproximado já das normas dos artigos 
 
 53.º e 57.º do “Regime Jurídico do Planeamento, Protecção e Segurança das 
 Construções Escolares”, que, de certa forma, constituem um sub-grupo dentro 
 deste segundo grupo de normas, pois versam sobre o património escolar, municipal 
 e da Região.
 Assim, o artigo 53.º prevê que, por resolução do Governo Regional, podem ser 
 transferidos para o património municipal imóveis escolares que sejam propriedade 
 da Região e em que funcione apenas a educação pré-escolar e o primeiro ciclo do 
 ensino básico. 
 Já o artigo 57.º, na sequência da repartição de competências efectuada pelo 
 diploma entre os municípios e a Região, dispõe, nos n.ºs 1 e 2, sobre a 
 integração das infra‑estruturas escolares no património dos municípios e da 
 Região. Além de outros critérios relativos a situações especiais, atende-se para 
 este efeito, designadamente, à circunstância de: por um lado, os imóveis 
 integrarem, ou não, outros níveis ou ciclos de ensino além da educação 
 pré-escolar e do primeiro ciclo do ensino básico, ou de terem sido (ou virem a 
 ser) construídos pela administração regional autónoma em imóveis da sua 
 propriedade (casos em que são património da Região); ou, por outro lado, de 
 terem sido construídos pela autarquia (caso em que serão propriedade desta). 
 Prevê-se, igualmente, que o disposto no “Regime Jurídico do Planeamento, 
 Protecção e Segurança das Construções Escolares” constitui título bastante para 
 registo dos edifícios escolares a favor das autarquias ou da Região (artigo 
 
 57.º, n.º 3). No artigo 57.º, n.º 4, prevê-se a publicação, por despacho 
 conjunto dos membros do Governo Regional competentes em matéria de finanças e 
 educação, da listagem dos imóveis afectos à educação pré-escolar e do primeiro 
 ciclo do ensino básico, que são propriedade da Região.
 Sobre a matéria de património apenas se encontra, no Decreto-Lei n.º 7/2003, o 
 artigo 26.º, prevendo uma transferência para os municípios do património e dos 
 equipamentos afectos aos estabelecimentos do primeiro ciclo do ensino básico, 
 sem qualquer outra formalidade e sendo esse Decreto-Lei título bastante para 
 esse efeito.
 Também a Lei n.º 159/99, de 14 de Setembro não contém qualquer disposição 
 específica sobre património escolar. Mas prevê, em geral, no artigo 3.º, n.º 2, 
 que a “transferência de atribuições e competências é acompanhada dos meios 
 humanos, dos recursos financeiros e do património adequados ao desempenho da 
 função transferida” (itálico aditado). E no artigo 11.º dispõe que o património 
 e os equipamentos afectos a investimentos públicos em domínios transferidos para 
 as autarquias locais “passam a constituir património da autarquia”.
 
 8.O requerente invoca a violação, pelas normas cujo conteúdo foi descrito, do 
 artigo 165.º, n.º 1, alínea q), e do artigo 227.º, n.º 1, alínea a), da 
 Constituição. Fundamenta o seu pedido, portanto, na violação da reserva relativa 
 de competência legislativa da Assembleia da República. Sobre a densificação do 
 sentido deste artigo 227.º, n.º 1, alínea a), da Constituição, na redacção saída 
 da revisão constitucional de 2004, não existe ainda praticamente jurisprudência 
 constitucional: o recente acórdão n.º 376/2005 (disponível em 
 
 www.tribunalconstitucional.pt), depois de dar conta das alterações, pôde, 
 atendendo à matéria em questão, basear-se no disposto nos n.ºs 3 e 4 do artigo 
 
 232.º da Constituição; no acórdão n.º 246/2005 (publicado no DR, I série-A, de 
 
 21 de Junho de 2005), por sua vez, estava em questão um problema de sucessão de 
 normas constitucionais no tempo, e, em particular, a questão da influência das 
 alterações introduzidas em 2004 no artigo 227.º, n.º 1, alínea a), sobre um 
 decreto legislativo aprovado anteriormente à entrada em vigor da VI revisão 
 constitucional.
 Invocando o requerente o artigo 227.º, n.º 1, alínea a), da Constituição, poderá 
 questionar-se se estarão também preenchidos os restantes pressupostos de que 
 esta norma faz depender a existência de poder legislativo da Região.
 Ora, quanto a este ponto, conclui-se, sem dificuldades de maior, a partir logo 
 da descrição do conteúdo das normas cuja apreciação é requerida, que tais normas 
 não só têm âmbito regional como versam genericamente sobre educação, podendo, 
 portanto, ser incluídas, para efeito de determinação do “âmbito material da 
 competência legislativa” da Região (artigo 46.º da Lei Constitucional n.º 
 
 1/2004), na alínea v) do artigo 8.º do Estatuto Político-Administrativo da 
 Região Autónoma dos Açores (na redacção dada pela Lei n.º 61/98, de 27 de 
 Agosto), que indica a matéria de “educação pré-escolar, educação escolar e 
 educação extra-escolar”.
 Tratar-se-á, pois, seguidamente, apenas da questão da violação, pelas normas em 
 causa, da reserva relativa de competência legislativa da Assembleia da República 
 
 (a que se refere, aliás, a questão de inconstitucionalidade orgânica suscitada 
 pelo requerente), dando por verificados os restantes pressupostos de que a 
 Constituição faz depender o poder legislativo das regiões autónomas.
 
 9.Em face da anterior formulação do artigo 227.º, n.º 1, alínea a), da 
 Constituição (matérias “que não estejam reservadas à competência própria dos 
 
 órgãos de soberania”), o Tribunal Constitucional pronunciara-se, repetidas 
 vezes, no sentido de que essas “matérias reservadas à competência legislativa 
 própria dos órgãos de soberania não se circunscrevem às que a CRP expressamente 
 reserva à Assembleia da República (cfr. em especial os artigos 164.º, 167.º e 
 
 168.º da CRP) e ao Governo (cfr. em particular o artigo 201.º da CRP), 
 abrangendo ainda as matérias em relação às quais a CRP, implicitamente embora, 
 exige a intervenção do legislador nacional (acórdãos n.ºs 82/86, 164/86 e 
 
 326/86, Diário da República, 1.ª série, n.ºs 176, de 2 de Abril de 1986, 130, de 
 
 7 de Junho de 1986, e 290, de 18 de Dezembro de 1986)” – como se pode ler no 
 acórdão n.º 268/88, in ATC, vol. 12.º, pág. 460. Assim, disse-se no acórdão n.º 
 
 348/93 (publicado em ATC, vol. 25.º, págs. 7-35):
 
 «O Tribunal Constitucional tem entendido que o carácter unitário do Estado e os 
 laços de solidariedade que devem unir todos os portugueses reclamam que a 
 legislação sobre matérias com relevo imediato para a generalidade dos cidadãos 
 seja produzida pelos órgãos de soberania (cfr., nomeadamente, os Acórdãos n.ºs 
 
 220/92, cit., 91/84 e 256/92, Diário da República, I série, de 6 de Outubro de 
 
 1984, e I série-A, de 6 de Agosto de 1992, respectivamente). Tais matérias – e 
 não apenas as expressamente previstas nos artigos 167.º, 168.º e 201.º da 
 Constituição – estão reservadas à competência dos órgãos de soberania».
 A mesma posição fora, posteriormente, retomada, por exemplo, no acórdão n.º 
 
 235/94 e no acórdão n.º 711/97 (respectivamente in ATC, vols. 27.º, págs. 7-37, 
 e 38.º, págs. 45-70), escrevendo-se neste último:
 
 «6. A Constituição, ao indicar os limites dos poderes legislativos das regiões 
 autónomas, não fornece uma definição das matérias “reservadas à competência 
 própria dos órgãos de soberania” [artigo 227.º, n.º 1, alínea a)] ou das 
 matérias “reservadas à Assembleia da República ou ao Governo” (artigo 112.º, n.º 
 
 4). Uma tal definição encontra‑se, no entanto, na jurisprudência do Tribunal 
 Constitucional, a qual continua válida em face do texto da Constituição 
 emergente da Revisão Constitucional de 1997.
 Segundo a jurisprudência reiterada e uniforme deste Tribunal, matérias 
 reservadas à competência própria dos órgãos de soberania e, como tais, vedadas 
 ao poder legislativo regional, são, desde logo, as que integram a competência 
 legislativa própria da Assembleia da República, enumeradas nos artigos 161.º, 
 
 164.º (reserva absoluta) e 165.º (reserva relativa) da Constituição, bem como a 
 que é da exclusiva competência legislativa do Governo, ou seja, a matéria 
 respeitante à sua própria organização e funcionamento (artigo 198.º, n.º 2).
 Mas, como tem sublinhado o Tribunal Constitucional, embora com vozes 
 discordantes, as matérias reservadas à competência própria dos órgãos de 
 soberania não se circunscrevem às que constituem a reserva de competência 
 legislativa da Assembleia da República e do Governo. A tal competência acham‑se  
 também “reservadas todas as matérias que reclamem a intervenção do legislador 
 nacional”. Com efeito, “o carácter unitário do Estado e os laços de 
 solidariedade que devem unir todos os portugueses exigem que a legislação sobre 
 matéria com relevo imediato para a generalidade dos cidadãos seja produzida 
 pelos órgãos de soberania (Assembleia da República ou Governo), devendo ser 
 estes a introduzir as especialidades ou derrogações que se mostrem necessárias, 
 designadamente por, no caso, concorrerem interesses insularmente localizados”. 
 Os referidos princípios da unidade do Estado e da solidariedade entre todos os 
 portugueses reclamam, assim, a intervenção do legislador nacional nas matérias 
 que se apresentam com relevo imediato para a generalidade dos cidadãos ou que 
 respeitam ou se repercutem nas diferentes parcelas do território nacional [cfr. 
 os já citados Acórdãos n.ºs 91/84, 164/86, 326/86 e 212/92. Cfr., ainda, Mário 
 de Brito, Competência Legislativa das regiões autónomas, Separata da «Scientia 
 Juridica», n.ºs 247/249 (1994), p. 20-21, e Rui Medeiros/J. Pereira da Silva, 
 ob. cit., p. 114-115]».
 Poderá hoje questionar-se se esta jurisprudência (cfr. também, posteriormente, o 
 acórdão n.º 330/99, in ATC, vol. 44.º, págs. 7-24), sobre o sentido do requisito 
 negativo do poder legislativo regional, se mantém válida, nos seus traços 
 gerais, em face do novo texto constitucional – questão, esta, que não foi ainda 
 tratada adrede na jurisprudência constitucional.
 O ponto não deixou, aliás, de ser objecto de atenção durante os trabalhos 
 preparatórios da VI revisão constitucional, pois nos diversos projectos eram 
 apresentadas diversas soluções, quanto ao limite ao poder legislativo regional: 
 o projecto de revisão constitucional n.º 1/IX (PS) remetia, no artigo 227.º, n.º 
 
 1, alínea a), para o artigo 112.º, n.º 4, e neste indicava como limite as 
 matérias “previstas nos artigos n.ºs 161.º, 164.º, 165.º, n.º 2 do artigo 
 
 198.º”, bem como as “que cabem ao Governo no exercício de funções de soberania”; 
 o projecto n.º 2/IX (BE) mantinha como limite negativo apenas as matérias 
 
 “reservadas à competência absoluta da Assembleia da República”; o projecto n.º 
 
 3/IX (PSD e CDS-PP) mantinha o requisito formulado nos termos em que se 
 encontrava, o mesmo acontecendo com o projecto n.º 4/IX (PCP). A finalidade do 
 referido projecto n.º 1/IX era, como foi dito na sua apresentação, “eliminar 
 zonas de indefinição entre as competências dos órgãos de soberania e as 
 competências dos órgãos do governo próprio dos Açores e da Madeira”, pelo que se 
 usava uma “nova técnica de repartição de competências entre a República e as 
 regiões”, destinada a “definir com maior precisão o âmbito das matérias de 
 reserva dos órgãos de soberania”. Na discussão e votação na especialidade 
 chegou‑se a uma solução de consenso (cfr. a acta n.º 10 da Comissão Eventual 
 para a Revisão Constitucional, reunião de 21 de Abril de 2004 – disponível em 
 
 www.parlamento.pt), que se concretizou na proposta de substituição n.º 34, e 
 corresponde ao que veio a ser o texto definitivo do artigo 227.º, n.º 1, alínea 
 a), da Constituição (e cfr., ainda, sobre o sentido da solução adoptada, a 
 declaração de voto sobre a revisão constitucional, apresentada pelo Deputado 
 José Magalhães, in Diário da Assembleia da República [DAR], I série, n.º 79, de 
 
 24 de Abril de 2004, na qual se suscita o problema da existência de matérias 
 reservadas a órgãos de soberania como o Governo e a Assembleia da República, 
 mesmo no domínio das competências concorrenciais desta com o primeiro, e ainda 
 que “quanto a matérias hoje incluídas nos estatutos autonómicos”).
 Seja, porém, como for quanto ao exacto alcance da parte final do artigo 227.º, 
 n.º 1, alínea a), da Constituição, pode dar-se por assente que entre as matérias 
 
 “reservadas aos órgãos de soberania” se encontram, pelo menos, as matérias de 
 reserva de competência legislativa absoluta da Assembleia da República e, 
 também, as matérias de reserva relativa. Sobre estas últimas, as regiões 
 autónomas apenas poderão legislar, fora das matérias previstas na alínea b) do 
 n.º 1 do artigo 227.º, mediante autorização da Assembleia da República 
 
 (tratar-se-á, pois, nesta alínea b), de hipótese em que as regiões autónomas 
 poderão legislar em matérias reservadas a um órgão de soberania, mediante uma 
 autorização legislativa dele proveniente, e cuja possibilidade está 
 expressamente prevista na Constituição).
 O requerente não invoca, aliás, uma reserva de competência de qualquer outro 
 
 órgão de soberania (designadamente, do Governo), antes baseando o seu pedido 
 justamente na invasão de competências legislativas sobre matéria inserida na 
 reserva relativa da Assembleia da República – a matéria prevista no artigo 
 
 165.º, n.º 1, alínea q), da Constituição.
 Começar-se-á por verificar se é procedente a inclusão da matéria das normas em 
 apreciação, para efeitos do artigo 227.º, n.º 1, alínea a), parte final, da 
 Constituição (matérias reservadas aos órgãos de soberania), na reserva relativa 
 de competência legislativa da Assembleia da República prevista nesse artigo 
 
 165.º, n.º 1, alínea q).
 
 10. O Tribunal Constitucional tem distinguido o alcance das várias “cláusulas de 
 reserva” de competência legislativa previstas nos artigos 164.º e 165.º, 
 tendo-se dito, a este propósito, no acórdão n.º 494/99 (publicado in ATC, vol. 
 
 44.º, pág. 25): 
 
 «Assim, salientou-se logo em face do texto originário da Constituição de 1976 
 
 (v. a primeira edição de Gomes Canotilho/Vital Moreira, Constituição da 
 República Portuguesa anotada, Coimbra, 1980, anotação ao artigo 168.º, pág. 334) 
 que “nem sempre é fácil [precisar rigorosamente o âmbito das matérias aqui 
 enunciadas], particularmente nos casos em que a reserva de competência não 
 abrange todo o regime jurídico, mas apenas as respectivas bases (...).” Segundo 
 este autores, “em caso de dúvida, porém, deve preferir-se a interpretação mais 
 favorável ao alargamento da competência reservada da AR.”. Posteriormente, os 
 termos em que a distinção seria posteriormente formulada foram assim 
 introduzidos (na 2.ª edição da citada obra, 1985, 2.º vol., págs. 197-8):
 
 “O alcance da reserva de competência legislativa da AR não é idêntico em todas 
 as matérias. Importa distinguir três níveis: (a) um nível mais exigente, em que 
 toda a regulamentação legislativa da matéria é reservada à AR – é o que ocorre 
 na maior parte das alíneas; (b) um nível menos exigente, em que a reserva da AR 
 se limita ao regime geral (alíneas d), e), h) e p)), ou seja, em que compete à 
 AR definir um regime comum ou normal da matéria, sem prejuízo, todavia, de 
 regimes especiais que podem ser definidos pelo Governo (ou, se for caso disso, 
 pelas assembleias regionais); (c) finalmente, um terceiro nível, em que a 
 competência da AR é reservada apenas no que concerne às bases gerais do regime 
 jurídico da matéria (alíneas f), g), n) e u)).
 O segundo e terceiro níveis são bastante distintos, pelo menos quando 
 considerados em abstracto: naquele, a AR deve definir todo o regime geral ou 
 comum, sem prejuízo dos regimes especiais (que, todavia, hão-de respeitar os 
 princípios gerais do regime geral), enquanto que [no] terceiro nível a AR apenas 
 tem que definir as bases gerais, podendo deixar para o Governo o desenvolvimento 
 legislativo do regime jurídico (do regime geral e dos regimes especiais a que 
 haja lugar), não é fácil definir senão aproximadamente o que deve entender-se 
 por bases gerais. Seguro é que deve ser a AR a tomar as opções 
 político-legislativas fundamentais, não podendo limitar-se a simples normas de 
 remissão ou normas praticamente em branco.”
 Os termos da distinção foram acolhidos no Acórdão n.º 3/89 do Tribunal 
 Constitucional (DR, II série, de 12 de Abril de 1989, que transcreveu o primeiro 
 dos dois parágrafos acabados de citar, o que ocorreu também, nos mesmos termos, 
 no Acórdão n.º 257/88, publicado no Diário da República (doravante DR), II 
 série, de 11 de Fevereiro de 1989), e adoptados também por Jorge Miranda (Manual 
 de direito constitucional, tomo V, Coimbra, 1997, pág. 232), passando a ser 
 designados “reserva de densificação total e reserva de densificação parcial” 
 
 (por Gomes Canotilho, a partir da primeira edição do seu Direito constitucional 
 e teoria da constituição, Coimbra, 1998, pág. 645). No mesmo sentido se 
 pronunciou Manuel Afonso Vaz (Lei e reserva de lei – a causa da lei na 
 Constituição portuguesa de 1976, Porto, 1992, pág. 430), que, depois de 
 distinguir um critério material implícito de um critério material explícito de 
 fixação de uma reserva legislativa do Parlamento (o que “pressupõe a definição 
 de matérias subtraídas à acção legislativa primária de outros órgãos”, 
 respectivamente pelo preenchimento dogmático “da matéria constitucionalmente 
 carente de decisão parlamentar” ou pela sua indicação expressa no texto 
 constitucional) conclui que, no nosso caso, 
 
 “A questão da extensão da reserva do Parlamento torna-se, deste modo, um 
 problema interno de verificação e interpretação de preceitos e não, 
 primariamente, de princípios. Dessa indagação, recorta-se o âmbito material da 
 competência legislativa reservada ao Parlamento, o qual, por um critério de 
 menor, maior ou total exclusividade referida aos potenciais conteúdos de 
 legislação, assim se dispõe: 1) reserva limitada às bases gerais dos regimes 
 jurídicos; 2) reserva incidente sobre o regime comum ou normal; 3) reserva 
 completa ou total”».
 Por sua vez, a reserva de lei em matéria de “estatuto das autarquias locais” (a 
 que se refere a alínea q) do n.º 1 do artigo 165.º da Constituição, que, antes 
 da IV revisão constitucional, era a alínea s) do n.º 1 do artigo 168.º) foi já 
 tratada em decisões deste Tribunal. Assim, disse-se no acórdão n.º 674/95 
 
 (publicado em ACT, vol. 32.º, pág. 609):
 
 «O Estatuto das autarquias locais, que a al. s) reserva ao Parlamento, tem que 
 ver com a respectiva organização, atribuições e competência dos seus órgãos, 
 estrutura dos seus serviços e regime do respectivo funcionalismo (v. Gomes 
 Canotilho/Vital Moreira, ob. cit. [Constituição da República Portuguesa, 3.ª 
 ed., Coimbra, 1993], pág. 676), mas não abrange seguramente, como se refere na 
 decisão impugnada, os “concretos procedimentos administrativos através dos quais 
 se exercitam” essas atribuições.»
 Por sua vez, no acórdão n.º 329/99 (publicado no Diário da República, II série, 
 de 20 de Julho de 1999, e cuja fundamentação foi reiterada, posteriormente, em 
 fiscalização abstracta, pelo acórdão n.º 517/99, publicado no Diário da 
 República, II série, de 11 de Novembro de 1999), a propósito de normas que 
 exigiam que as licenças (de loteamento, de obras de urbanização ou de 
 construção) concedidas anteriormente pelas câmaras municipais, ainda que 
 tituladas por alvará, fossem submetidas a confirmação do Governo, com vista a 
 garantir a sua compatibilidade com os planos regionais de ordenamento do 
 território, sem a qual caducariam, o Tribunal Constitucional afirmou que:
 
 «Tais normas não estatuem, porém, sobre a organização ou as atribuições das 
 câmaras municipais, nem sobre as competências dos seus órgãos, que são as 
 matérias que, a par do regime das finanças locais, integram o estatuto, cuja 
 modelação tem de ser feita pela Assembleia da República ou pelo Governo com 
 autorização sua».
 E no acórdão n.º 377/99 escreveu-se:
 
 «Como salientam Gomes Canotilho/Vital Moreira (ob. cit., pág. 676, anotação XX 
 ao artigo 168.º), “o estatuto das autarquias locais (al. s)) abrange seguramente 
 a sua organização, as suas atribuições e a competência dos seus órgãos, a 
 estrutura dos seus serviços, o regime dos seus funcionários, bem como o regime 
 das finanças locais, ou seja, a generalidade das matérias tradicionalmente 
 incluídas no chamado ‘Código Administrativo’”. Ora, cometer às autarquias 
 competências de licenciamento não é o mesmo que cometer-lhes competências de 
 definição dos efeitos, duração e requisitos desses licenciamentos. Uma coisa é a 
 definição do quadro do exercício de competências das autarquias em matéria de 
 licenciamentos – que, por força do disposto no anterior artigo 239.º (actual n.º 
 
 1 do artigo 237.º) é matéria de reserva da Assembleia da República (artigo 
 
 168.º, n.º 1, alínea s), da anterior redacção e alínea q) do n.º 1 do artigo 
 
 165.º da actual); coisa bem diversa é, todavia, o regime dos actos que integram 
 esse quadro de competências, e, designadamente, o regime da caducidade das 
 licenças.
 Não fora assim, aliás, e a mera devolução às autarquias de qualquer competência 
 para prática de um acto (de autorização, licenciamento, aprovação, proibição, 
 etc.) implicaria a transferência para a competência reservada da Assembleia da 
 República da fixação de todo o seu regime.»
 Como resulta deste último aresto, pode discutir-se o alcance da reserva relativa 
 de competência legislativa sobre o “estatuto das autarquias locais”, quanto às 
 atribuições e competências das autarquias, designadamente, em confronto com a 
 regulação, por diplomas não parlamentares, da actuação administrativa, com 
 indicação das atribuições e competências (de actuação) que lhes servem de 
 suporte – cfr. o que se disse no aresto por último citado, ao distinguir entre o 
 
 “quadro do exercício de competências das autarquias” (em matéria de 
 licenciamentos), que se decidiu ser matéria de reserva da Assembleia da 
 República, e o “regime dos actos que integram esse quadro de competências” e, na 
 doutrina, António Cândido de Oliveira, Direito das autarquias locais, Coimbra, 
 
 1993, págs. 247 e segs..
 Tal não prejudica, porém, o entendimento, que se reitera no presente caso, de 
 que a reserva de competência legislativa parlamentar sobre o “estatuto das 
 autarquias locais”, que não se limita às bases gerais do regime ou ao regime 
 comum ou normal, abrange, pelo menos, a definição, a título principal, da 
 organização, das atribuições e da competência das autarquias locais e 
 respectivos órgãos.
 
 11.Do confronto entre este âmbito da reserva de competência legislativa da 
 Assembleia da República sobre o “estatuto de autarquias locais” e o conteúdo das 
 normas cuja apreciação é pedida resulta que nem todas estas merecem a mesma 
 qualificação e enquadramento.
 Assim, detectam-se em primeiro lugar, normas que, manifestamente, não procedem à 
 definição de tal “estatuto”, por não preverem qualquer atribuição ou competência 
 das autarquias açorianas. É o caso dos artigos 14.º, n.ºs 1 e 3, alínea c), e 
 
 15.º do “Regime Jurídico do Planeamento, Protecção e Segurança das Construções 
 Escolares”, que se limitam a enunciar os objectivos e o objecto da carta 
 educativa, sendo antes o artigo 17.º (cuja apreciação não foi pedida) que prevê 
 a competência da autarquia para elaboração da carta educativa, “nos termos da 
 alínea a) do n.º 2 do artigo 19.º da Lei n.º 159/99, de 14 de Setembro”.
 Diverso é, porém, o enquadramento que se impõe quanto aos artigos 19.º, 50.º, 
 n.º 1, e 51.º, n.º 2. A primeira destas normas atribui às autarquias a 
 
 “responsabilidade” de concretização dos investimentos nas infra-estruturas da 
 educação previstas na carta educativa (isto é, para a educação pré-escolar e o 
 primeiro ciclo do ensino básico), e as restantes prevêem que incumbe às 
 autarquias a realização de investimentos em construção (adquirir os terrenos, 
 elaborar o projecto e construir os edifícios escolares) e manutenção de escolas, 
 também apenas em relação à educação pré-escolar e ao primeiro ciclo do ensino 
 básico. Não só tais normas prevêem, pois, competências das autarquias locais, 
 como decorre mesmo da sua delimitação e do seu confronto, quer com outras normas 
 do mesmo diploma (cfr. os artigos 8.º e segs., e o artigo 50.º, n.ºs 2 e 3), 
 quer com o Decreto-Lei n.º 7/2003 (artigos 21.º e 22.º), que elas excluem a 
 competência das autarquias açorianas para planear e realizar investimentos para 
 além da educação pré-escolar e do primeiro ciclo do ensino básico 
 
 (designadamente, quanto aos segundo e terceiro ciclos deste nível de ensino). 
 Esses artigos 19.º, 50.º, n.º 1, e 51.º, n.º 2, incidem, pois, sobre o “estatuto 
 das autarquias locais”. Quanto às competências que estas normas atribuem às 
 autarquias açorianas, só não se verificará, pois, um vício de 
 inconstitucionalidade orgânica na medida em que tais normas não sejam inovadoras 
 
 – designadamente, na medida em que elas se limitem a repetir, ou a concretizar, 
 uma previsão de competências das autarquias já resultante de outro diploma.
 Quanto ao artigo 52.º, n.º 1, prevê um encargo ou responsabilidade da 
 administração regional, pelo que não versa, directamente, sobre atribuições ou 
 competências das autarquias locais. Todavia, na medida em que o seu objecto 
 
 (aquisição e manutenção de equipamento para os estabelecimentos de educação e de 
 ensino da rede pública, sem distinção) inclua matéria que integre já hoje a 
 esfera de atribuições e competências das autarquias locais, tais normas não 
 deixam de incidir igualmente sobre matéria integrante do “estatuto” destas, 
 alterando-o (diversamente se essa matéria estiver hoje cometida, nos Açores, à 
 administração regional autónoma ou a outras entidades). A resposta à questão de 
 saber se o artigo 52.º, n.º 1, procede à definição do estatuto das autarquias 
 locais depende, pois, de saber se incide sobre competências ou atribuições que 
 estão hoje, na Região Autónoma dos Açores, cometidas a essas autarquias.
 Já quanto às normas dos artigos 50.º, n.ºs 2 e 3, apesar de se referirem 
 igualmente a competências da Região, a sua inclusão entre as normas que incidem 
 sobre o “estatuto das autarquias locais” depende, antes de mais, não tanto de 
 saber se incidem sobre matéria hoje incluída na competência das autarquias 
 açorianas, como de apurar, por interpretação, se, mesmo a ser assim, delas 
 resulta verdadeiramente uma exclusão da competência destas. Na verdade, o artigo 
 
 50.º, n.º 2, atribui competência à administração regional autónoma para 
 adquirir, projectar e construir instalações escolares destinadas aos segundo e 
 terceiro ciclos do ensino básico e ao ensino secundário, mas apenas 
 
 “supletivamente ao disposto no n.º 1 do artigo 19.º da Lei n.º 159/99, de 14 de 
 Setembro”. E o n.º 3 apenas prevê competências da administração regional 
 autónoma “supletivamente, e quando conste da carta escolar em vigor” (itálicos 
 aditados), e relativamente a instalações de educação pré-escolar integradas em 
 unidades orgânicas ou do primeiro ciclo integradas em unidades orgânicas que 
 podem incluir outros níveis de ensino, além do ensino básico, ou em situações 
 excepcionais, decorrentes de calamidades ou outras similares, mediante 
 deliberação do conselho do governo regional. Ora, embora o sentido da referência 
 a uma intervenção da administração regional autónoma apenas “supletivamente” não 
 seja inteiramente isento de dúvidas, entende-se que ela é ainda compatível com 
 um entendimento segundo o qual se não prevê, nesse artigo 50.º, n.ºs 2 e 3, 
 qualquer intervenção da administração a título principal, que exclua ou limite a 
 eventual competência das autarquias locais nos domínios nela previstos. 
 Tratar-se-á, segundo essa interpretação, tão-só de prever, nestas normas uma 
 competência adicional da administração regional autónoma, a qual, 
 
 “supletivamente”, acresce à das autarquias locais. Ora, com este sentido, não 
 pode dizer-se que resulte dos n.ºs 2 e 3 do artigo 50.º, ao preverem 
 supletivamente competências da administração – e mesmo quanto à educação 
 pré-escolar e ao ensino básico, em todos os seus ciclos –, qualquer exclusão da 
 competência das autarquias açorianas. E não pode, portanto, considerar-se, que, 
 assim entendidas, estas normas tratem de matéria que integre o “estatuto das 
 autarquias locais” (já o mesmo não pode, porém, concluir-se, no referido artigo 
 
 51.º, n.º 2, a partir da ressalva de “contratos de cooperação, celebrados ao 
 abrigo do disposto no Decreto Legislativo Regional n.º 32/2002/A, de 8 de 
 Agosto, nos termos do n.º 1 do artigo 19.º da Lei n.º 159/99, de 14 de 
 Setembro”, desde logo, porque o Decreto-Lei n.º 7/2003 não reconheceu 
 competência aos municípios apenas nos termos de tais contratos).
 Por último, quanto às normas dos artigos 52.º, n.º 2, 53.º e 57.º, elas 
 perfilam-se, no “Regime Jurídico do Planeamento, Protecção e Segurança das 
 Construções Escolares”, como mera decorrência, quanto ao património, da 
 repartição de competências entre os municípios e a Região Autónoma dos Açores. 
 Na medida em que prevêem a possibilidade de transferência de imóveis para o 
 património municipal (artigo 53.º) e procedem a uma repartição do património 
 imobiliário (artigo 57.º) entre os municípios e a Região, bem como a uma 
 atribuição a esta de património mobiliário (artigo 52.º, n.º 2), fazem-no, na 
 lógica do diploma em apreço, apenas como decorrência da repartição de 
 competências e atribuições, estando dependentes desta.
 Conclui-se, assim, que algumas das normas em apreço – os artigos 14.º, n.ºs 1 e 
 
 3, alínea c), 15.º, e 50.º, n.ºs 2 e 3, do “Regime Jurídico do Planeamento, 
 Protecção e Segurança das Construções Escolares” – não incidem sobre matéria 
 relativa ao “estatuto das autarquias locais”. As restantes, porém – isto é, os 
 artigos 19.º, 50.º, n.º 1, 51.º, n.º 2, 52.º (e também os artigos 53.º e 57.º, 
 que pressupõem aqueles) –, versam sobre a matéria de competência legislativa 
 reservada enunciada no artigo 165.º, n.º 1, alínea q), da Constituição da 
 República, isto é, sobre matéria sobre a qual a Assembleia Legislativa da Região 
 Autónoma dos Açores não poderia legislar, nem sequer com autorização legislativa 
 da Assembleia da República (a alínea q) do n.º 1 do artigo 165.º é exceptuada no 
 artigo 227.º, n.º 1, alínea b), ambos da Constituição).
 O enquadramento destas normas no artigo 165.º, n.º 1, alínea q), da 
 Constituição, não conduz, porém, logo, sem mais, a um juízo de 
 inconstitucionalidade.
 Há, na verdade, que tomar em conta que o “Regime Jurídico do Planeamento, 
 Protecção e Segurança das Construções Escolares” se apresenta, quer no 
 respectivo preâmbulo (2.º e 5.º parágrafos), quer mesmo segundo o teor de 
 algumas das normas em apreciação (artigos 19.º, 50.º, n.º 2, e 51.º, n.º 2), na 
 sequência da Lei n.º 159/99, de 14 de Setembro – como não deixa, aliás, de 
 informar o requerente.
 
 12. A Lei n.º 159/99, de 14 de Setembro, veio estabelecer o quadro de 
 transferência de atribuições e competências para as autarquias locais. Este 
 diploma parlamentar foi expressamente apresentado, na exposição de motivos da 
 Proposta de Lei n.º 1117VIII, eu esteve na sua génese, como sendo uma lei-quadro 
 
 (DAR, II série-A, de 31 de Maio de 1997, pág. 951). Logo no seu artigo 1.º, 
 relativo à definição do objecto do diploma, se declara que com este se 
 
 “estabelece o quadro de transferência de atribuições e competências para as 
 autarquias locais, bem como de delimitação da intervenção da administração 
 central e da administração local, concretizando os princípios da 
 descentralização administrativa e da autonomia do poder local”.
 Como se salienta na doutrina (Gomes Canotilho, Direito constitucional e teoria 
 da Constituição, 7.ª ed., Coimbra, 2003, pág. 786), as leis-quadro “estabelecem 
 um regime jurídico global de regras e princípios para grandes espaços 
 jurídicos-materiais carecidos de ulteriores concretizações, mas sem que essas 
 concretizações se identifiquem com o esquema de actos legislativos de 
 desenvolvimento”. Isto – entenda‑se – porque tais leis vão mais longe do que as 
 leis de bases, fixando “mais ou menos pormenorizadamente um regime estruturante 
 que deverá ser respeitado pelos actos legislativos concretizadores desse 
 regime”.
 A Lei n.º 159/99, de 14 de Setembro, sendo uma lei-quadro, não deixa justamente 
 de enumerar, com um certo grau de densificação, os princípios e regras a que 
 deve obedecer a transferência de competências para os municípios, procedendo a 
 uma “delimitação das atribuições e competências em geral” que foi levada a 
 alguma pormenorização.
 Assim, nos termos do seu artigo 2.º, n.ºs 1, 5 e 6, a “descentralização de 
 poderes efectua-se mediante a transferência de atribuições e competências para 
 as autarquias locais”. Esta transferência “implica a concessão, aos órgãos das 
 autarquias locais, de poderes que lhes permitam actuar em diversas vertentes”, 
 cuja natureza pode ser consultiva, de planeamento, de gestão, de investimento, 
 de fiscalização ou de licenciamento, incluindo, nos poderes de investimento, “a 
 identificação, a elaboração dos projectos, o financiamento, a execução e a 
 manutenção dos empreendimentos”.
 Nos termos do artigo 3.º, n.º 2, a “transferência de atribuições e competências 
 
 é acompanhada dos meios humanos, dos recursos financeiros e do património 
 adequados ao desempenho da função transferida”.
 A Lei n.º 159/99, de 14 de Setembro, não procedeu, porém, a transferências de 
 atribuições e de competências com eficácia imediata – não é “imediatamente 
 aplicável” –, antes remetendo para diplomas próprios ulteriores a concretização 
 das transferências. Tal remissão para diplomas ulteriores, deixada clara logo na 
 exposição de motivos e sublinhada durante o debate da respectiva proposta de 
 lei, está prevista no seu artigo 4.º, com a epígrafe “Concretização e 
 financiamento das novas competências”, e que dispõe:
 
 «1 – O conjunto de atribuições e competências estabelecido no capítulo III desta 
 lei quadro será progressivamente transferido para os municípios nos quatro anos 
 subsequentes à sua entrada em vigor.
 
 2 – As transferências de competências, a identificação da respectiva natureza e 
 a forma de afectação dos respectivos recursos serão anualmente concretizadas 
 através de diplomas próprios, que podem estabelecer disposições transitórias 
 adequadas à gestão do processo de transferência em causa, de acordo com o 
 disposto nos artigos 2.º, 3.º e 5.º.
 
 3 – O Orçamento do Estado fixa anualmente, no montante e nas condições que 
 tiverem sido acordados entre a administração central e as autarquias locais, os 
 recursos a transferir para o exercício das novas atribuições.
 
 4 – O Orçamento do Estado procederá, sempre que necessário, à indicação das 
 competências a financiar através de receitas consignadas.» (itálico aditado)
 Assim, para o ano de 2001, a Lei n.º 30-C/2000, de 29 de Dezembro, que aprovou o 
 Orçamento do Estado, previu, no artigo 13.º, que, o Governo, no âmbito da Lei 
 n.º 159/99, de 14 de Setembro, tomaria as providências regulamentares 
 necessárias à concretização das transferências de atribuições e competências da 
 administração central para os municípios, em vários domínios (entre os quais o 
 planeamento e gestão dos equipamentos educativos e realização de investimentos 
 na construção, apetrechamento e manutenção dos estabelecimentos de educação 
 pré-escolar e do primeiro ciclo do ensino básico, e elaboração da carta escolar 
 
 – n.º 1, alíneas j) e l)). Disposição semelhante, embora abrangendo os 
 estabelecimentos das escolas dos 2.º e 3.º ciclos do ensino básico, continha-se 
 no artigo 12.º, n.º 1, da Lei n.º 109-B/2001, de 27 de Dezembro. Diversamente, a 
 Lei do Orçamento do Estado para 2003 não continha qualquer previsão relativa à 
 transferência de competências e atribuições para os municípios, mas, em matéria 
 de educação, logo em 15 de Janeiro de 2003 foi publicado o Decreto‑Lei n.º 
 
 7/2003 (que, como veremos, procedeu a tal transferência com efeitos reportados 
 ao início do ano de 2003).
 E, posteriormente, o prazo de quatro anos, referido no artigo 4.º, n.º 1, da Lei 
 n.º 159/99, foi sucessivamente prorrogado pelo artigo 12.º, n.º 1, da Lei n.º 
 
 107-B/2003, de 31 de Dezembro, e pelo artigo 11.º, n.º 1, da Lei n.º 55-B/2004, 
 de 30 de Dezembro (nos n.ºs 2 destes artigos autoriza-se também o Governo a 
 legislar, respectivamente durante os anos de 2004 e 2005, “no sentido de 
 regulamentar a transferência de competências para os municípios previstas nos 
 artigos 16.º a 31.º da Lei n.º 159/99, de 14 de Setembro, nos termos previstos 
 nos artigos 3.º, 4.º, 6.º, 11.º e 12.º da mesma lei”).
 Por sua vez, o artigo 6.º da mesma Lei n.º 159/99 dispõe sobre a “natureza das 
 atribuições e competências tranferidas”, distinguindo entre transferências de 
 competências universais e não universais, dispondo no seu n.º 2:
 
 “2 – Consideram-se universais as transferências que se efectuam simultânea e 
 indistintamente para todos os municípios que apresentem condições objectivas 
 para o respectivo exercício e não universais as que se efectuam apenas para 
 algum ou alguns municípios, nas condições previstas no número seguinte.”
 As novas atribuições e competências transferidas para os municípios são 
 tendencialmente universais (da epígrafe, do n.º 1 e do n.º 3, num certo 
 entendimento, parece, aliás, resultar a aplicação do qualificativo “universais” 
 
 às atribuições e competências, enquanto, como se vê, o citado n.º 2 refere este 
 adjectivo às próprias transferências), podendo, no entanto, assumir a natureza 
 de não universais. A transferência destas últimas efectua-se mediante um 
 procedimento que envolve a celebração de um contrato “entre os departamentos da 
 administração central competentes e todos os municípios interessados”, com 
 
 “identificação padronizada de custos, de acordo com a actividade a transferir”, 
 e que será publicado no Diário da República.
 Especificamente quanto a competências em matéria de educação, dispõe-se na Lei 
 n.º 159/99:
 
 «Artigo 19.º
 Educação
 
 1 – É da competência dos órgãos municipais participar no planeamento e na gestão 
 dos equipamentos educativos e realizar investimentos nos seguintes domínios:
 a) Construção, apetrechamento e manutenção dos estabelecimentos de educação 
 pré-escolar;
 b) Construção, apetrechamento e manutenção dos estabelecimentos das escolas do 
 ensino básico.
 
 2 – É igualmente da competência dos órgãos municipais:
 a) Elaborar a carta escolar a integrar nos planos directores municipais;
 b) Criar os conselhos locais de educação.
 
 3 – Compete ainda aos órgãos municipais no que se refere à rede pública:
 a) Assegurar os transportes escolares;
 b) Assegurar a gestão dos refeitórios dos estabelecimentos de educação 
 pré-escolar e do ensino básico;
 c) Garantir o alojamento aos alunos que frequentam o ensino básico, como 
 alternativa ao transporte escolar, nomeadamente em residências, centros de 
 alojamento e colocação familiar;
 d) Comparticipar no apoio às crianças da educação pré-escolar e aos alunos do 
 ensino básico, no domínio da acção social escolar;
 e) Apoiar o desenvolvimento de actividades complementares de acção educativa na 
 educação pré-escolar e no ensino básico;
 f) Participar no apoio à educação extra-escolar;
 g) Gerir o pessoal não docente de educação pré-escolar e do 1.º ciclo do ensino 
 básico».
 Durante a votação da Proposta de Lei n.º 111/VII, que deu origem à Lei n.º 
 
 159/99, foi, a este propósito, apresentada (pelo PCP) uma proposta de alteração 
 do artigo 19.º, justamente dirigida a limitar o âmbito do n.º 2, alínea b) (bem 
 como do n.º 3, alíneas b), d) e e)), quanto no ensino básico, ao seu primeiro 
 ciclo – proposta de alteração, essa, que foi, porém, rejeitada (com os votos 
 contra do PS e do PSD e com os votos a favor do CDS-PP, do PCP e de Os Verdes – 
 cfr. DAR, I série, n.º 102, de 3 de Julho de 1999, pág. 3761).
 Quanto ao seu âmbito de aplicação, importa notar que a Proposta de Lei n.º 
 
 111/VII (DAR, II série-A, n.º 47, de 31 de Maio de 1997) se referia à 
 
 “administração central e regional” nos seus artigos 1.º (correspondente ao 
 artigo 1.º da Lei), 2.º, n.ºs 4 e 5 (artigo 2.º, n.ºs 3 e 4, da Lei), 3.º, n.º 6 
 
 (artigo 3.º, n.º 4, da Lei n.º 159/99), 6.º, n.º 1 (artigo 8.º, n.º 1, da Lei), 
 e 11.º, n.º 5 (sem equivalente na lei). Particularmente significativo era o 
 artigo 4.º, n.º 5, da Proposta de Lei, epigrafado, como o da Lei n.º 159/99, 
 
 “Concretização e financiamento das novas competências”, que dispunha assim:
 
 «As transferências financeiras previstas no presente diploma efectuam-se a 
 partir do Orçamento do Estado ou dos orçamentos regionais, consoante a 
 titularidade das competências transferidas.»
 Todas estas referências desapareceram, porém, no texto final (DAR, II série-A, 
 n.º 79, de 13 de Julho de 1999) da Comissão de Administração do Território, 
 Poder Local, Equipamento Social e Ambiente (numa modificação a que não será, 
 possivelmente, alheio o referendo, entretanto realizado, sobre a matéria da 
 regionalização – note-se que a referida proposta incluía, igualmente, um artigo 
 
 12.º, sobre “Regiões Administrativas”, que não tem equivalente na lei). 
 De todo o modo, e no que toca à aplicação nas regiões autónomas, pode 
 observar‑se, sobre a Lei n.º 159/99, de 14 de Setembro: por um lado, que ela foi 
 aprovada “para valer como lei geral da República”; por outro lado, que, segundo 
 o seu artigo 33.º (com a epígrafe “Regiões Autónomas”), “[a] presente lei 
 aplica-se às Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira”.
 
 É certo que, desde o Decreto-Lei n.º 338/79, de 25 de Agosto, já se operara uma 
 transferência, para as regiões autónomas, de certos serviços do Ministério da 
 Educação, dizendo-se que compete “aos órgãos de Governo próprio da Região 
 Autónoma dos Açores assegurar o correcto desenvolvimento da acção educativa na 
 Região, promovendo a aplicação dos princípios gerais do sistema nacional de 
 educação”, e atribuindo-se aos órgãos de Governo próprio da Região as 
 correspondentes competências.
 Ainda assim, tendo-se mantido a disposição que determina a aplicação da Lei n.º 
 
 159/99, de 14 de Setembro, tem de concluir-se que o legislador parlamentar 
 pretendeu que os municípios das regiões autónomas também fossem dotados, tal 
 como os do Continente, das competências para cuja transferência previu um quadro 
 geral. Não se vislumbra, na verdade, outro sentido útil para o citado artigo 
 
 33.º (embora dele não resulte necessariamente a impossibilidade de uma 
 concretização específica, nas regiões autónomas, das transferências de 
 competências previstas). E note-se, aliás, que se encontram, ao longo da lei, 
 referências, por exemplo, à rede viária regional (artigo 17.º, n.º 2, alínea 
 d)).
 Não pode, pois, deixar de concluir-se que a Lei n.º 159/99 é também aplicável 
 nas regiões autónomas.
 
 13.A conclusão a que se chegou é relevante para a questão de constitucionalidade 
 em apreciação. Com efeito, se as normas do “Regime Jurídico do Planeamento, 
 Protecção e Segurança das Construções Escolares” se apresentam como aprovadas na 
 sequência da referida Lei n.º 159/99, aplicável na Região Autónoma dos Açores, e 
 se esta mesma previu que as transferências de competências e atribuições, cujo 
 quadro definiu, seriam concretizadas mediante diplomas próprios posteriores – 
 sem mais especificações, para além de se referir a uma concretização anual –, 
 importa perguntar se aquelas normas podem ser vistas como meramente realizadoras 
 de tal concretização, prevista na Lei n.º 159/99.
 Esta mesma questão é, aliás, posta pelo requerente, quando destaca a 
 impossibilidade de ler o artigo 19.º de forma isolada em relação aos restantes 
 preceitos dessa Lei n.º 159/99 (designadamente, os artigos 4.º e 6.º), 
 relacionando as normas questionadas com este. E facilmente se deixa ver que a 
 resposta a tal questão tem consequências para a questão de saber se foi ou não 
 invadida a área de competência legislativa reservada da Assembleia da República. 
 Pois se se entender que as normas em apreço se limitam a concretizar a 
 transferência de competências prevista no artigo 4.º da Lei n.º 159/99, o 
 problema será apenas o de saber se tal concretização era possível por diploma 
 não parlamentar (no caso, por decreto legislativo regional), por a reserva de 
 lei ter ficado esgotada com aquela Lei.
 A possibilidade de as normas em apreciação serem consideradas uma concretização 
 das transferências de competências previstas na Lei n.º 159/99, de 14 de 
 Setembro, nos termos do seu artigo 4.º, n.º 2, não é, aliás, afastada pela 
 circunstância de se tratar de uma transferência (aparentemente) apenas parcial, 
 ou, mais precisamente, de uma transferência de competências apenas em relação à 
 educação pré-escolar e ao primeiro ciclo do ensino básico.
 Com efeito, e desde logo, o artigo 19.º, n.ºs 1, alínea b), e 2, alínea a), 
 refere‑se, sem distinção, às “escolas do ensino básico” e à “carta escolar”. 
 Todavia, nada precisa quanto ao âmbito que esta última, cuja elaboração é da 
 competência dos órgãos municipais, deverá revestir, pelo que, apesar da sugestão 
 literal do n.º 1, alínea b), resultante da ausência de distinção (enquanto no 
 n.º 3, alínea g), se limita a transferência ao primeiro ciclo desse nível de 
 ensino) e do argumento histórico (já referido) em contrário, poderia suscitar-se 
 a dúvida sobre se o referido n.º 1, alínea b), inclui necessariamente escolas de 
 todos os ciclos do ensino básico. Seja como for – isto é, mesmo que se entenda 
 que a dúvida precedente não tem razão de ser –, entende‑se que uma transferência 
 parcial de competências, como aquela que então se encontraria no “Regime 
 Jurídico do Planeamento, Protecção e Segurança das Construções Escolares”, não é 
 inviabilizada pelo artigo 4.º, n.ºs 1 e 2, da Lei n.º 159/99. Antes pelo 
 contrário, dir-se-á mesmo, a previsão de uma progressiva concretização da 
 transferência de competências (n.º 1 do artigo 4.º), com “identificação da 
 respectiva natureza e a forma de afectação dos respectivos recursos” (n.º 2 do 
 mesmo artigo), implica, lógica e necessariamente, a possibilidade de 
 transferências parciais, concretizadas através de diplomas próprios.
 Não é, pois, a circunstância de o diploma em causa não transferir já para os 
 municípios as competências relativamente a todos os ciclos do ensino básico – 
 mas apenas para a educação pré-escolar e para o primeiro ciclo do ensino básico 
 
 – que impede de as considerar como uma concretização da transferência de 
 competências, conforme previsto no artigo 4.º, n.ºs 1 e 2. 
 E também não parece que proceda, no sentido de conduzir a um juízo de 
 inconstitucionalidade orgânica, a objecção ao referido enquadramento das normas 
 em apreciação resultante de se não ter adoptado o procedimento contratualizado 
 previsto, para a transferência de competências não universais, no artigo 6.º, 
 n.º 3, da Lei n.º 159/99. Na verdade, ainda que, de acordo com a razão de ser da 
 distinção, se defenda que o que releva para a qualificação como transferência de 
 competências não universais é o facto de os destinatários das competências serem 
 todos os municípios (com condições objectivas para as exercer), 
 independentemente de tais competências serem anteriormente de entidades 
 diversas, não parece (também de acordo com a razão de ser da distinção) que ela 
 tenha de se aplicar a qualquer transferência de competências de uma região 
 autónoma para os respectivos municípios. 
 A razão de ser da distinção entre a transferência de competências universais e 
 não universais – sendo estas últimas também admitidas –, para o efeito da 
 imposição de um particular procedimento, contratualizado, nos termos do artigo 
 
 6.º, n.º 3, prende‑se, com efeito, com a previsível necessidade de meios 
 
 (humanos, financeiros ou de património) para fazer face a essas competências, os 
 quais não são objecto de uma previsão geral (universal) e antes carecem de uma 
 concretização para cada município (ou conjunto de municípios) destinatários das 
 competências. Ora, como se sabe, apesar de as finanças das autarquias locais e 
 das regiões autónomas serem independentes (artigo 43.º, n.º 1, da Lei n.º 13/98, 
 de 24 de Fevereiro – Lei de Finanças das Regiões Autónomas), é possível, tendo 
 em conta a especificidade das regiões autónomas (para as quais as competências 
 em causa estão há muito transferidas), a definição, pelas assembleias 
 legislativas das regiões, de formas de cooperação técnica e financeira diversas 
 das que existem no Continente (cfr. o artigo 7.º, n.º 7, da Lei n.º 42/98, de 6 
 de Agosto – Lei das Finanças Locais – e o acórdão n.º 4/2000, publicado no 
 Diário da República, I série-A, de 5 de Fevereiro de 2000, onde se decidiu que a 
 assunção de dívidas não bastava como objectivo da cooperação em causa, no 
 sentido de caracterizar qualquer especificidade regional). 
 E, por último, mesmo a entender-se que, efectivamente, a ausência de um 
 procedimento contratualizado, nos termos do artigo 6.º, n.º 3, da Lei n.º 
 
 159/99, se afasta do previsto neste diploma, sempre poderia questionar-se se tal 
 afastamento em matéria de procedimento para a transferência de competências 
 implicaria, só por si, uma violação da reserva de competência relativa da 
 Assembleia da República. Pois mesmo se se entender que aquela decisão política, 
 que se consubstanciou na aprovação da Lei n.º 159/99, de 14 de Setembro, esgotou 
 a matéria de reserva relativa de competência legislativa da Assembleia da 
 República, não é, porém, forçoso entender também que todos os aspectos atinentes 
 
 à transferência de competências constituem matéria de reserva. E um dos aspectos 
 tratados nessa Lei que, se não pelas razões referidas, pelo menos pela sua 
 relevância sobretudo procedimental, parece escapar à área de reserva de 
 competência legislativa parlamentar, poderia ser, justamente, o da exigência de 
 celebração de um contrato entre o município interessado e o departamento da 
 Administração Central em causa.
 
 14.Como já resulta do que se disse, entende-se que a reserva relativa de 
 competência legislativa parlamentar, prevista no artigo 165.º, n.º 1, alínea q), 
 da Constituição, não obsta à possibilidade de concretização da transferência de 
 competências, nos termos previstos na Lei n.º 159/99 (artigo 4.º), por diplomas 
 legislativos que não sejam leis parlamentares.
 Com efeito, à luz da razão de ser dessa reserva – manter na Assembleia da 
 República a decisão político-legislativa sobre o quadro das competências dos 
 municípios –, o exercício da competência legislativa consumou-se com a Lei n.º 
 
 159/99, e a decisão sobre o quando e o quanto da transferência de competências 
 foi deixada para diplomas próprios posteriores. A possibilidade de uma 
 concretização das transferências por estes outros diplomas, que não têm de ser 
 diplomas parlamentares, foi, aliás, prevista pela própria Lei n.º 159/99, de 14 
 de Setembro, que não se limitou a qualquer “deslegalização” da matéria de 
 
 “estatuto das autarquias locais”. Antes dispôs sobre tal matéria, indicando, com 
 algum pormenor, quais as competências que se transfeririam, nos diversos 
 domínios, para os municípios, e um prazo-limite (um dies ad quem para a 
 realização de todas as transferências). O facto de ter deixado em aberto um 
 espaço para a concretização desta transferência, por diplomas posteriores, não 
 acarreta, pois, só por si, violação da área de reserva, tendo a razão de ser 
 desta ficado satisfeita com a disciplina da Lei n.º 159/99, de 14 de Setembro.
 Este entendimento não é contrariado pela prática, mais recente, de inserir 
 normas a autorizar o Governo a “regulamentar” a transferência de competências 
 para os municípios (os citados artigos 11.º, n.º 2, e 12.º, n.º 2, da Lei n.º 
 
 107-B/2003, de 31 de Dezembro e da Lei n.º 55-B/2004, de 30 de Dezembro). Isto, 
 tal como, por outro lado, não é, só por si, decisivo o facto de ter 
 anteriormente variado a prática quanto à aprovação de diplomas concretizadores 
 das transferências de competências previstas na Lei n.º 159/99: os Decretos-Leis 
 n.ºs 260/2002 e 261/2002, de 23 de Novembro, n.º 267/2002, de 26 de Novembro, e 
 n.º 309/2002, de 16 de Dezembro foram aprovados ao “abrigo da alínea c) do n.º 1 
 do artigo 198.º da Constituição” e “no desenvolvimento do regime” estabelecido 
 na Lei n.º 159/99, de 14 de Setembro; o Decreto-Lei n.º 69/2003, de 10 de Abril 
 
 (sobre atribuições e competências que, no âmbito do licenciamento industrial, 
 são transferidas para as autarquias locais) foi aprovado nos termos da alínea a) 
 do n.º 1 do artigo 198.º da Constituição.
 Em matéria de educação, também já antes, aliás, o Decreto-Lei n.º 7/2003, de 15 
 de Janeiro, que foi aprovado, sem autorização legislativa, ao abrigo da alínea 
 a) do n.º 1 do artigo 198.º da Constituição, veio, justamente, concretizar a 
 transferência de competências para os municípios em matéria educativa, 
 regulamentando os conselhos municipais de educação e aprovando o processo de 
 elaboração da carta educativa. A intenção desse Decreto-Lei n.º 7/2003, como 
 concretização da Lei n.º 159/99, foi claramente expressa logo no respectivo 
 preâmbulo:
 
 “A Lei n.º 159/99, de 14 de Setembro, procurou estabelecer um quadro de 
 transferências de atribuições e competências para as autarquias locais, 
 determinando que a concretização dessas transferências se efectivasse através de 
 diplomas específicos. O artigo 19.º da Lei n.º 159/99 elencou as competências a 
 transferir na área da educação e do ensino não superior, tendo, sequencialmente, 
 o artigo 13.º da Lei n.º 30-C/2000, de 29 de Dezembro, e o artigo 12.º da Lei 
 n.º 109-B/2001, de 27 de Dezembro, pretendido concretizar as mesmas. Tratou-se, 
 no entanto, de uma intervenção meramente formal, que, em termos reais, nada 
 acrescentou a estatuições anteriores constantes dos Decretos-Leis n.ºs 77/84, de 
 
 8 de Março, 299/84, de 5 de Setembro, 399-A/84, de 28 de Dezembro, e 115‑A/98, 
 de 4 de Maio.
 O presente diploma visa suprir essa lacuna, transferindo efectivamente 
 competências relativamente aos conselhos municipais de educação, um órgão 
 essencial de institucionalização da intervenção das comunidades educativas a 
 nível do concelho, e relativamente à elaboração da carta educativa, um 
 instrumento fundamental de ordenamento da rede de ofertas de educação e de 
 ensino”.
 Tal como este Decreto-Lei n.º 7/2003, aprovado pelo Governo sem autorização 
 legislativa, podia concretizar a transferência de competências prevista no 
 artigo 4.º, n.º 2, da Lei n.º 159/99 – e sem vício de inconstitucionalidade 
 orgânica –, também a reserva de competência legislativa parlamentar não obstava 
 a que tal concretização tivesse lugar, para as regiões autónomas, por decreto 
 legislativo regional. A decisão político-legislativa relevante consumou-se já – 
 e com um regime com algum pormenor material e um limite temporal geral – com a 
 aprovação da Lei n.º 159/99, de 14 de Setembro, no exercício da reserva relativa 
 de competência legislativa da Assembleia da República, podendo entender-se a 
 remissão para diplomas posteriores no sentido de incluir, não apenas 
 decretos-leis do Governo mas também, para as regiões autónomas, decretos 
 legislativos regionais.
 A consideração do referido Decreto‑Lei n.º 7/2003, de 15 de Janeiro (citado, 
 aliás, logo no preâmbulo do diploma regional onde se contêm as normas em 
 apreciação), e da concretização, por ele efectuada, da transferência de 
 competências prevista na Lei n.º 159/99, impõe, porém, que se analise o seu 
 conteúdo e os efeitos que terá produzido. Análise, esta, que é relevante, desde 
 logo, para a determinação exacta do efeito que as normas em apreciação produzem, 
 e, portanto, também para a possibilidade do seu enquadramento como concretização 
 do citado diploma legislativo parlamentar.
 
 15.Verifica-se, com efeito, que o Decreto-Lei n.º 7/2003, de 15 de Janeiro, foi 
 aprovado também “para valer como lei geral da República”, tendo sido para tanto 
 
 “ouvidos os órgãos de governo próprio das Regiões Autónomas”. Apesar de nenhuma 
 disposição deste diploma se referir especificamente à realidade das regiões 
 autónomas – e antes, aparentemente, se trabalhar aí apenas com um modelo 
 dualista de administração (administração central e administração local) –, 
 resulta claramente das duas circunstâncias apontadas, que o legislador pretendeu 
 que ele se aplicasse também nas regiões autónomas. Conclusão, esta, que, se não 
 
 é imposta, é, pelo menos, reforçada, pela consideração de que o Decreto-Lei n.º 
 
 7/2003 visou claramente concretizar, em matéria educativa, a transferência de 
 competências para os municípios que já fora prevista pela Lei n.º 159/99, de 14 
 de Setembro, a qual, como se concluiu, previu, sem deixar margem para dúvidas, a 
 sua aplicação também aos municípios das regiões autónomas.
 Como já se disse a propósito da descrição do conteúdo das normas do “Regime 
 Jurídico do Planeamento, Protecção e Segurança das Construções Escolares”, 
 confrontando-as com as do Decreto-Lei n.º 7/2003, verifica-se que estas últimas 
 pretenderam transferir para os municípios competências, de elaboração da carta 
 educativa (artigos 10.º, 11.º, n.º 1, 12.º, n.º 1, 19.º, n.º 1 e 21.º) e em 
 matéria de investimentos na construção, apetrechamento e manutenção dos 
 estabelecimentos, para toda a educação pré-escolar e ensino básico, isto é que 
 abrangiam todos os ciclos deste último, e não apenas o primeiro ciclo (quanto ao 
 património, diversamente, e como já se referiu, não se encontra qualquer 
 disposição no Decreto-Lei n.º 7/2003 que preveja a sua transferência, 
 reportando-se o artigo 26.º apenas ao património e aos equipamentos “afectos aos 
 estabelecimentos do 1.º ciclo do ensino básico”).
 Ora, não pode deixar de se concluir desse confronto que, se o Decreto-Lei n.º 
 
 7/2003 tiver já produzido efeitos jurídicos na Região Autónoma dos Açores, as 
 competências relativas à elaboração da carta educativa e à construção, 
 apetrechamento e manutenção dos estabelecimentos de educação pré-escolar e do 
 ensino básico, incluindo os segundo e terceiro ciclos deste nível de ensino, já 
 se terão transferido para os municípios – independentemente de terem ou não sido 
 já postas em prática.
 Perante um tal contexto competencial, a norma do artigo 52.º, n.º 1, estará 
 então a retirar competências que já eram dos municípios. E, por outro lado, 
 também as normas dos artigos 19.º, 50.º, n.º 1, e 51.º, n.º 2, ao limitarem o 
 seu âmbito à educação pré‑escolar e ao primeiro ciclo do ensino básico, estarão, 
 na realidade, a proceder a um retorno de competências à Região e a retirar 
 competências aos municípios.
 Este é, aliás, o efeito que parece pretendido pelo próprio legislador regional, 
 quando afirma, no preâmbulo do diploma em análise, que “importa esclarecer a 
 forma como é elaborada a carta escolar (...) face às competências que em matéria 
 de infra-estruturas escolares são cometidas às autarquias por força da Lei n.º 
 
 159/99, de 14 de Setembro”, pois, “[s]e tal não for feito, ficam cometidas aos 
 municípios todas as competências em matéria de construções escolares destinadas 
 
 à educação pré-escolar e ao ensino básico, conforme disposto no Decreto-Lei n.º 
 
 7/2003, de 15 de Janeiro (...), já que aquele diploma, por força da redacção 
 dada ao n.º 2 do artigo 228.º da Constituição pela Lei Constitucional n.º 
 
 1/2004, de 24 de Julho, passou inequivocamente a aplicar-se na Região Autónoma 
 dos Açores” (itálico aditado).
 Deve atentar-se, porém, em que o Decreto-Lei n.º 7/2003 produziu efeitos, nos 
 termos do seu artigo 30.º, logo a partir do início de 2003 (e que a VI revisão 
 constitucional entrou em vigor em Agosto de 2004). Ora, considerando um tal 
 efeito jurídico das normas em apreciação não só tem de entender-se que também a 
 norma do artigo 52.º, n.º 1, incide sobre competências dos municípios (e, 
 portanto, sobre matéria de “estatuto das autarquias locais”), como, por outro 
 lado (e com relevância decisiva para o juízo a formular sobre tais normas), não 
 se vê como podem as normas em apreciação ser consideradas mera concretização da 
 transferência de competências para os municípios, prevista no artigo 4.º, n.ºs 1 
 e 2, da Lei n.º 159/99, de 14 de Setembro – o que, recorde-se, seria necessário 
 para tais normas, que versam sobre matéria de “estatuto das autarquias locais”, 
 não estarem feridas de inconstitucionalidade orgânica. É que (e para além de, 
 numa certa perspectiva, a concretização da transferência nos termos do artigo 
 
 4.º da Lei n.º 159/99 se ter já verificado, e se ter esgotado), decisivamente, 
 as normas aprovadas pela Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores 
 terão, pelo contrário, o efeito justamente inverso do previsto na Lei n.º 159/99 
 
 – não transferir para as autarquias, mas retirar ao município competências que 
 já eram suas. E uma norma que pretende produzir tal efeito não pode ser 
 considerada ainda uma concretização da transferência de competências para os 
 municípios, prevista no artigo 4.º, n.ºs 1 e 2, da Lei n.º 159/99.
 
 16.A conclusão a que se chegou – a impossibilidade de as normas em causa serem 
 consideradas como concretização da Lei n.º 159/99 – resulta directamente de três 
 premissas acima identificadas e que não se julga que possam ser postas em causa: 
 a inclusão da matéria das normas em apreciação no “estatuto das autarquias 
 locais”; a consideração do sentido da Lei n.º 159/99, de 14 de Setembro, em 
 geral, e em particular do seu artigo 4.º (transferência de competências para os 
 municípios); e a produção, na Região Autónoma dos Açores, dos efeitos do 
 Decreto-Lei n.º 7/2003, de 15 de Janeiro.
 Este último ponto poderia ser posto em causa se fosse de entender que o 
 Decreto-Lei n.º 7/2003 não tinha, nos seus próprios termos, o alcance de 
 transferir competências para os municípios açorianos, ou se não o pudesse ter, 
 designadamente, por tal implicar uma violação da Constituição. Nenhuma destas 
 asserções pode, porém, ser considerada procedente.
 Quanto ao âmbito de aplicação tal como resulta do Decreto-Lei n.º 7/2003, já se 
 disse que este diploma pretendeu igualmente aplicar-se, imperativamente, às 
 regiões autónomas. E, numa certa perspectiva, poderia, eventualmente, 
 entender-se mesmo que tal pretensão era contestável, pondo-se em causa a 
 qualificação como “lei geral da República” do Decreto-Lei n.º 7/2003, por a sua 
 
 “razão de ser” não envolver as regiões autónomas (isto, para quem entendesse que 
 a “razão de ser” deste diploma, ao concretizar a transferência de competências 
 para os municípios prevista na Lei n.º 159/99, não poderia envolver a sua 
 aplicação a todo o território nacional, e, designadamente, a previsão de 
 transferência de competências que eram já das regiões autónomas). Todavia, ainda 
 que, por hipótese, se acompanhasse o entendimento de que existira um erro de 
 qualificação (cfr., restritivamente sobre a alteração da qualificação como “lei 
 geral da República” – embora deixando a questão do “erro de qualificação” em 
 aberto –, o acórdão n.º 631/99, publicado no Diário da República, I série-A, de 
 
 28 de Dezembro de 1999), é claro que tal não bastaria, só por si, para concluir 
 que o referido Decreto-Lei n.º 7/2003 não se aplicou na Região Autónoma dos 
 Açores. Na verdade, os diplomas emanados dos órgãos de soberania que não 
 restringissem o seu âmbito de aplicação – como é o caso do Decreto-Lei n.º 
 
 7/2003 –, e mesmo que não fossem qualificados como “leis gerais da República”, 
 não deixavam, por isso, de aplicar-se a todo o território nacional, apenas não 
 dispondo da qualificada força vinculativa que resultava (antes da revisão 
 constitucional de 2004) da imposição do respeito, por parte das regiões 
 autónomas, pelos seus “princípios fundamentais”.
 Como se referiu, a aplicação das “normas legais em vigor”, sem restrição, na 
 
 “falta de legislação regional própria sobre matéria não reservada à competência 
 dos órgãos de soberania”, passou, aliás, desde a VI revisão constitucional (isto 
 
 é, desde meados de 2004), a estar expressamente prevista no artigo 228.º, n.º 2, 
 da Constituição. E, no caso vertente, não existe – nem foi invocada pelo órgão 
 autor da norma – legislação regional própria que pudesse obstar à aplicação do 
 Decreto-Lei n.º 7/2003. O próprio Decreto Legislativo Regional n.º 33/84/A, de 6 
 de Novembro, sobre investimentos públicos em geral, vira já expressamente 
 revogado pelo artigo 34.º da Lei n.º 159/99, de 14 de Setembro – isto é, antes 
 de o Decreto-Lei n.º 7/2003 entrar em vigor –, o diploma legislativo que ele 
 visara “adaptar” à Região Autónoma dos Açores (o Decreto-Lei n.º 77/84, de 8 de 
 Março). E, por sua vez, o Decreto Legislativo Regional n.º 31/86/A, de 11 de 
 Dezembro, apenas se referia à reparação e conservação de estabelecimentos de 
 ensino primário.
 Em face do respectivo conteúdo normativo, tem de concluir-se que as disposições 
 do Decreto-Lei n.º 7/2003, de 15 de Fevereiro, eram aplicáveis também na Região 
 Autónoma dos Açores, tendo concretizado a transferência de competências para os 
 municípios da Região logo no início de 2003.
 Não se acompanha, por outro lado, a consideração de que a produção desse efeito 
 jurídico (transferência de competências da Região para os municípios), por um 
 diploma legislativo do Governo, seria inconstitucional.
 Na verdade, a Constituição da República não impõe que a concretização da 
 transferência de competências já regionalizadas para os municípios não só possa, 
 como tenha de (rectius, apenas possa) ser efectuada pelos órgãos legislativos 
 regionais.
 Ou por outras palavras: não existe parâmetro constitucional que proíba a 
 concretização de tal transferência para os municípios por órgãos de soberania 
 como a Assembleia da República, ou – no caso – o Governo, ouvidos os órgãos de 
 governo próprio das regiões autónomas, e na sequência de um diploma parlamentar 
 que claramente se aplica também às regiões autónomas (artigo 33.º), tendo 
 pretendido estender a todo o território nacional a transferência de atribuições 
 e competências para os municípios, sem deixar de fora os municípios das regiões 
 e sem reservar a sua concretização, nesse domínio, aos órgãos legislativos da 
 região.
 Tal como se entende que a Assembleia da República – à qual a matéria do 
 
 “estatuto das autarquias locais” está reservada – podia, sem violação das 
 competências regionais ou da garantia da autonomia regional, prever a extensão 
 da transferência de competências (mesmo das regiões autónomas) aos municípios 
 regionais, também não existe obstáculo constitucional a que, tomada essa decisão 
 por diploma parlamentar, a sua concretização ocorra por decreto-lei.
 
 17.Impõe-se, pois, a conclusão de que, a partir do início de 2003, com a 
 
 “produção de efeitos” jurídicos do Decreto‑Lei n.º 7/2003, as “competências em 
 matéria de edifícios escolares dos segundo e terceiro ciclos do ensino básico” 
 foram transferidas para os municípios também nas regiões autónomas (não sendo 
 evidentemente decisivo que as competências transferidas por tais normas tenham, 
 ou não, vindo a ser desde então efectivamente exercidas pelos municípios, ou que 
 tenha continuado a ser a Região a exercê‑las).
 Se as competências em causa estão já, actualmente, na titularidade dos 
 municípios açorianos – como na dos municípios do restante território nacional –, 
 então não se vislumbra como podem as normas em questão deixar de ter como efeito 
 uma sua transferência (parcialmente) de novo para a Região. E este efeito das 
 normas em causa, acima identificadas – repete-se, os artigos 19.º, 50.º, 51.º, 
 n.º 2, e 52.º, e, por conseguinte, também os artigos 53.º e 57.º do “Regime 
 Jurídico do Planeamento, Protecção e Segurança das Construções Escolares” –, não 
 pode corresponder a qualquer concretização da transferência para os municípios 
 prevista no artigo 4.º, n.ºs 1 e 2, da Lei n.º 159/99, de 14 de Setembro.
 Como essas normas, ao alterarem o quadro de competências dos municípios versam 
 sobre matéria de “estatuto das autarquias locais” sem concretizarem aquela Lei 
 n.º 159/99, tem de concluir-se que a sua aprovação pela Assembleia Legislativa 
 da Região Autónoma dos Açores violou os artigos 165.º, n.º 1, alínea q), e 
 
 227.º, n.º 1, alínea a), parte final, da Constituição da República.
 III. Decisão 
 Pelos fundamentos expostos, o Tribunal Constitucional decide:
 a)           Não se pronunciar pela inconstitucionalidade dos artigos 14.º, n.ºs 
 
 1 e 3, alínea c), 15.º e 50.º, n.ºs 2 e 3, do “Regime Jurídico do Planeamento, 
 Protecção e Segurança das Construções Escolares”, aprovado pelo Decreto da 
 Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores n.º 23/2005;
 b)           Pronunciar-se pela inconstitucionalidade, por violação dos artigos 
 
 165.º, n.º 1, alínea q), e 227.º, n.º 1, alínea a), da Constituição da República 
 Portuguesa, dos artigos 19.º, 50.º, n.º 1, 51.º, n.º 2, 52.º, 53.º e 57.º do 
 mesmo “Regime Jurídico do Planeamento, Protecção e Segurança das Construções 
 Escolares”, na medida em que excluem a competência das autarquias locais 
 açorianas para realização de investimentos na construção, apetrechamento e 
 manutenção, e a consequente titularidade de património, de estabelecimentos de 
 educação dos segundo e terceiro ciclos do ensino básico.
 Lisboa, 4 de Agosto de 2005
 Paulo Mota Pinto
 Maria Fernanda Palma
 Vítor Gomes
 Rui Manuel Moura Ramos
 Maria Helena Brito
 Mário José de Araújo Torres (com declaração de voto junta)
 Maria João Antunes (votei vencida quanto à decisão de conhecer do pedido, por 
 entender que este é extemporâneo, pelas razões constantes da declaração de voto 
 da Senhora Conselheira Maria dos Prazeres Beleza).
 Gil Galvão (vencido quanto à decisão de conhecer do pedido pelas razões 
 constantes da declaração que junto)
 Carlos Pamplona de Oliveira (vencido, conforme declaração)
 Benjamim Rodrigues (com a declaração de voto quanto ao conhecimento e vencido 
 quanto ao fundo nos termos constantes do anexo)
 Maria dos Prazeres Pizarro Beleza (vencida, conforme declaração junta)
 Artur Maurício (vencido quanto ao conhecimento do pedido nos termos da 
 declaração da Exª Consª Maria dos Prazeres Beleza)
 
  
 
  
 DECLARAÇÃO DE VOTO
 
  
 
                   Discordei do precedente acórdão apenas no ponto (n.º 4) em 
 que, decidindo em sentido oposto ao adoptado no Acórdão n.º 26/84, considerou 
 inaplicável à apresentação do pedido de fiscalização preventiva a dilação de 2 
 dias prevista no n.º 4 do artigo 56.º da Lei de Organização, Funcionamento e 
 Processo do Tribunal Constitucional (Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro – LTC).
 
                   No sentido da inaplicabilidade dessa dilação podiam ser 
 invocados três argumentos: (i) tratar‑se de um inconstitucional prolongamento, 
 pelo legislador ordinário, de um prazo fixado na Constituição; (ii) ser a 
 dilação, por natureza, aplicável apenas a prazos processuais ou adjectivos e 
 não a prazos substantivos ou equiparáveis, como seria o prazo de apresentação do 
 pedido de fiscalização preventiva de constitucionalidade; e (iii) terem‑se 
 verificado progressos nas tecnologias das comunicações que tornaram 
 injustificada a concessão de dilação.
 
                   O precedente acórdão não se estribou no primeiro argumento 
 
 (que fora invocado na declaração de voto aposta pelo Cons. Vital Moreira ao 
 Acórdão n.º 26/84), mas apenas nos dois seguintes, de uma forma aparentemente 
 conjugada (na verdade, refere que o artigo 56.º, n.º 4, da LTC não é de aplicar 
 a um prazo substantivo, como se entende ser o prazo da apresentação do pedido de 
 fiscalização preventiva da constitucionalidade, “isto, uma vez que não procedem 
 já hoje as razões que levaram, no citado aresto, a concluir pela aplicabilidade 
 da referida dilação”, a saber, assegurar o pleno aproveitamento do prazo pelos 
 Ministros da República, já que os meios de comunicação actualmente existentes 
 permitem fazer chegar ao Tribunal Constitucional o pedido de fiscalização 
 preventiva praticamente sem demora.
 
                   Entendo que os dois argumentos são autónomos, não se 
 justificando a sua conjugação (não é por hoje pretensamente não valerem as 
 razões invocadas no Acórdão n.º 26/84 relativas às demoras nas comunicações que 
 o prazo em causa deve ser qualificado como substantivo e por isso entender‑se 
 ser‑lhe inaplicável a dilação), mas que nenhum deles procede.
 
                   O segundo argumento assenta neste silogismo: a dilação só se 
 aplica, “por natureza”, aos prazos processuais; o prazo de apresentação de 
 pedido de fiscalização preventiva de constitucionalidade não é um prazo 
 processual; logo, a dilação é inaplicável a este prazo. Acontece, porém, que, 
 mesmo a estarem certas essas qualificações dos prazos, o Acórdão n.º 26/84 já 
 salientou que “o facto de o conceito e o expediente da «dilação» ou «prazo 
 dilatório» se referirem, em princípio, na dogmática jurídica, a prazos 
 processuais não impede o legislador de utilizá‑los também, se julgar isso 
 necessário, quanto a um prazo substantivo”. Neste domínio, há que atender, não a 
 considerações de índole estritamente conceptualista ou formalista, mas antes à 
 finalidade e razão de ser material das normas; neste sentido, já se decidiu, 
 por exemplo, que “o prolongamento do termo do prazo para a prática de actos com 
 fundamento em justo impedimento, regulado nos artigos 145.º, n.º 4, e 146.º do 
 Código de Processo Civil, representa regra geral válida para todos os actos 
 peremptórios, independentemente da sua natureza substantiva ou adjectiva, sendo 
 designadamente aplicável ao prazo de interposição do recurso contencioso” 
 
 (acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 25 de Novembro de 1998, proc. 
 n.º 34 284, de que fui relator, publicado, com anotação concordante de Armindo 
 Ribeiro Mendes, em Cadernos de Justiça Administrativa, n.º 13, 
 Janeiro/Fevereiro 1999, pp. 15‑32). Acresce que a figura da dilação não é 
 exclusiva dos processos judiciais, sendo adequada a sua adopção em qualquer 
 tipo de procedimentos em que se verifique uma sucessão de actos cuja prática 
 esteja sujeita a prazos peremptórios, designadamente o procedimento 
 administrativo (cf. artigo 73.º do respectivo Código) ou o procedimento 
 legislativo. O pedido de fiscalização preventiva de constitucionalidade 
 formulado pelo Ministro da República para a Região Autónoma dos Açores insere‑se 
 num procedimento legislativo já em curso, sendo, assim, de natureza claramente 
 diferenciada da dos actos de proposição de acções nos tribunais, não existindo, 
 a meu ver, qualquer impedimento, pretensamente fundado na “natureza das 
 coisas”, a que ao prazo para apresentação daquele pedido se aplique a figura da 
 dilação.
 
                   Resta o argumento da “desactualização” ou “desnecessidade” da 
 previsão da dilação, atentas as actuais facilidades de comunicação de textos à 
 distância, seja por telecópia, seja por correio electrónico. Sem desmentir a 
 evidência desta evolução tecnológica, entendo, porém, que cabe ao legislador a 
 adaptação das soluções legais às novas realidades, devendo ser muito cautelosa a 
 intervenção dos tribunais neste domínio, “decretando” a “revogação” ou a 
 
 “caducidade” dessas soluções, por entender que não se justificam na actualidade, 
 sobretudo quando essa intervenção jurisprudencial possa representar quebra da 
 certeza e da segurança do direito. No referido Acórdão n.º 26/84, o Tribunal 
 Constitucional considerou aplicável a dilação de 2 dias ao prazo de apresentação 
 do pedido de fiscalização preventiva da constitucionalidade por parte dos 
 Ministros da República nas Regiões Autónomas, não tendo sobrevindo desde então 
 qualquer decisão em sentido contrário. A Lei n.º 28/82 foi objecto de profunda 
 revisão em 1998, sendo deixado intocado o seu artigo 56.º, n.º 4. O legislador 
 não ignorava as dúvidas que esse preceito suscitara e o entendimento que, 
 embora não pacífico, a jurisprudência do Tribunal Constitucional lhe dera. Ao 
 manter o preceito inalterado, apesar dos avanços na tecnologia das comunicações 
 verificado ao longo de cerca de 16 anos, desde 1982 até 1998, é legítimo 
 presumir que designadamente os mais directos destinatários da norma (os 
 Ministros da República) confiassem que fosse mantido o entendimento da 
 aplicabilidade da dilação. Nada justifica que, decorridos 7 anos sobre a revisão 
 da LTC de 1998, época em que as facilidades de comunicação por telecópia ou por 
 correio electrónico já eram similares às actualmente existentes (diversamente do 
 que sucedia em 1982), se inverta o entendimento jurisprudencial e, de surpresa, 
 se fraudem as expectativas fundadas na anterior jurisprudência, “tacitamente 
 ratificada” pela manutenção do preceito na última revisão da LTC. Acresce que 
 não se pode esquecer que ao requerente assiste a faculdade de apresentar o 
 pedido no Tribunal em suporte de papel, pelo que o entendimento de que não 
 beneficia da dilação porque podia recorrer a meios electrónicos, significa que 
 se lhe está a cercear o uso daquela faculdade em condições de igualdade com os 
 requerentes sedeados no Continente.
 
                   A aplicabilidade da dilação ao prazo de apresentação de pedido 
 de fiscalização preventiva de constitucionalidade formulado por Ministro da 
 República na Região Autónoma tem suporte literal directo no n.º 4 do artigo 56.º 
 da LTC, não é afastada pela “natureza” desse prazo e não se evidencia uma 
 situação de manifesta desadequação ou desactualização da solução legal que 
 justifique uma intervenção “derrogatória” do Tribunal, em substituição do 
 legislador.
 
                   Concluindo pela aplicabilidade da dilação, o prazo para 
 apresentação do pedido terminava apenas no dia 15 de Julho, pelo que a sua 
 entrada no dia 13 foi manifestamente tempestiva.
 
                   Tendo a maioria do Tribunal considerado inaplicável a dilação, 
 acompanhei o precedente acórdão quando atribui relevância à apresentação do 
 pedido por telecópia.
 
                   Salvo o devido respeito pelas opiniões adversas, afigura‑se 
 desrazoável o entendimento de que é extemporânea a apresentação do pedido no 
 que foi considerado ser o último dia do prazo, tendo esse pedido sido nesse 
 mesmo dia objecto de distribuição ao Conselheiro Relator e ainda nesse mesmo 
 dia 13 de Julho expedida notificação ao órgão autor da norma para se 
 pronunciar, pelo que não ocorreu nenhuma perturbação ou afectação dos prazos 
 subsequentes.
 
  
 Mário José de Araújo Torres
 
  
 DECLARAÇÃO DE VOTO
 
  
 Votei vencido quanto à decisão de tomar conhecimento do pedido, no essencial, 
 pelas razões que passo a enunciar:
 
 1. Não sendo aplicável a dilação prevista no n.º 4 do artigo 56º ao prazo 
 previsto para apresentação do pedido de fiscalização preventiva de 
 constitucionalidade, o pedido, entrado após o fecho ao público da Secretaria do 
 Tribunal Constitucional, é manifestamente intempestivo.
 
 2. Sendo o original do pedido, entrado às 16H20 do último dia do prazo, 
 manifestamente intempestivo, não deixa de ser insólito, independentemente da 
 questão de saber se é admissível que o termo prazo varie consoante o meio 
 utilizado para fazer chegar o pedido a este Tribunal, que um fax, enviado 
 posteriormente à entrega do original na Secretaria, possa ter a virtualidade de 
 tornar tempestivo um tal extemporâneo pedido. Consideraria, assim, inteiramente 
 irrelevante o envio de cópia do pedido por fax posterior à entrega do original 
 na Secretaria do Tribunal Constitucional.
 
 3. Finalmente, ao contrário do que sucedeu no acórdão n.º 232/2003, não havendo 
 agora nenhuma questão que tenha ficado por analisar em anterior acórdão, apesar 
 de ter sido colocada ao Tribunal Constitucional, entendo que a forma como a 
 questão foi apresentada ao Tribunal Constitucional pelo requerente não é idónea 
 para desencadear a função jurisdicional do Tribunal em processo de fiscalização 
 preventiva da constitucionalidade. Na verdade, não sendo este Tribunal um órgão 
 de consulta, a apresentação de um pedido que, em última instância, se traduz na 
 pretensão de esclarecimento das dúvidas do requerente causadas pelo facto de, 
 
 “em vários aspectos, não [ser] claro o exacto sentido da Lei Constitucional n.º 
 
 1/2004, de 24 de Julho, no que toca à delimitação dos poderes legislativos 
 regionais”, não pode, em meu entender, ser objecto de conhecimento.
 Lisboa, 4 de Agosto de 2005
 Gil Galvão
 
  
 
  
 
  
 DECLARAÇÃO DE VOTO
 
  
 Vencido. 
 Subscrevo, no essencial, as razões aduzidas pela Senhora Conselheira Maria dos 
 Prazeres Beleza na sua declaração de voto. 
 
  
 Pamplona de Oliveira
 
  
 DECLARAÇÃO DE VOTO
 
  
 
       1 – Embora concordando com a decisão de não extemporaneidade do pedido de 
 fiscalização abstracta, não acompanho, na sua totalidade, a fundamentação em que 
 a mesma se estribou.
 
       No n.º 3 do seu artigo 278º, a Constituição prescreve, sem distinção do 
 
 órgão político, que pode requerer a apreciação preventiva da constitucionalidade 
 
 – o Presidente da República e os Representantes da República –, que “a 
 apreciação preventiva da constitucionalidade deve ser requerida no prazo de oito 
 dias a contar da data da recepção do diploma”.
 
       O preceito estabelece, assim, um prazo para o exercício de um poder 
 funcional ou de uma competência constitucionais, conferidos a determinado órgão, 
 assinalando desde logo o seu dies a quo. 
 
       Estando em causa uma competência constitucional para cujo exercício a 
 Constituição fixa o prazo de 8 dias e o momento a partir do qual este se conta, 
 não tem qualquer sentido que a aplicação desse preceito fique, na sua aplicação 
 prática, dependente de condições fixadas pelo legislador infraconstitucional, 
 que não se limitem à regulação dos aspectos ou meios relacionados com a sua 
 simples operacionalidade que sejam possíveis, no momento da sua aplicação, no 
 Tribunal Constitucional. 
 
       Podendo, por outro lado, no estádio actual dos meios técnicos (cuja 
 relevância não pode deixar de ser considerada no plano da permanente actualidade 
 da norma constitucional), o pedido chegar ao Tribunal Constitucional em qualquer 
 momento das 24 horas do dia, independentemente de aí se achar, nesse momento do 
 dia (noite), pessoa que tome conhecimento da sua chegada, não se vê que não seja 
 manifestamente desadequada e desproporcionada uma interpretação do preceito no 
 sentido de apenas relevar o pedido cuja entrada se verifique dentro das horas de 
 funcionamento da secretaria judicial. 
 
       Aquando da abertura dos serviços, no dia seguinte, será possível tomar 
 conhecimento da existência do pedido e da sua apresentação dentro do prazo dos 8 
 dias (considerado o dia das 0 às 24 horas), conquanto acontecidos em momento em 
 que neles não estava ninguém, e certificar a sua fidedignidade através dos 
 actuais meios técnicos, como o fax ou o correio electrónico. 
 
       Sendo assim, apenas se aceita que o legislador infraconstitucional 
 intervenha para regular os aspectos relativos à utilização dos actuais meios 
 técnicos de registo do momento de apresentação do pedido. 
 
       E não se diga que constitui óbice a tal interpretação a circunstância de o 
 processo de fiscalização preventiva estar sujeito a prazos curtos de tramitação 
 e decisão (cf. art.ºs 278º, n.º 8, da Constituição e 57º, n.º 2, e 58º e ss. da 
 LTC). 
 
       Sendo todos os prazos fixados em dias, nenhum deles fica afectado, pois 
 todos são mensurados pelo mesmo critério.
 
        Por outro lado, enquanto prazo substantivo relativo ao exercício de um 
 poder jurídico, atribuído constitucionalmente, perante um órgão jurisdicional – 
 o Tribunal Constitucional – ele aproxima-se da natureza de um prazo de 
 caducidade de um direito (de tipo potestativo). 
 
       Como tal, não são de lhe aplicar normas que dizem respeito já à regulação 
 da tramitação processual a seguir na apreciação jurisdicional do pedido, como 
 seja a dilação referida no n.º 4 do artigo 56º da Lei n.º 28/82, de 15 de 
 Novembro (LTC). Uma tal dilação apenas se aceita, hoje, como modo de conceder 
 algum acréscimo do prazo para a resposta, aproximando de algum modo os prazos do 
 requerente (de 8 dias) e do órgão requerido (de 3+2 dias), pois quanto à 
 possibilidade de fazer chegar o pedido ao Tribunal Constitucional, salvo no que 
 concerne à entrega em mão ou pelo correio, os dois órgãos estão em igualdade de 
 situações (caso de fax ou de correio electrónico).
 
       Finalmente, falando o preceito em dias, e tendo em conta que se refere ao 
 desempenho de uma actividade ou função constitucional de órgãos de natureza 
 política, tem todo o sentido que o prazo abranja, tendo em conta os actuais 
 meios técnicos, as 24 horas do dia, pois, segundo os usos e costumes, estes 
 
 órgãos não estão sujeitos a horários de funcionamento e de tomada de decisões.
 
       Nesta linha de pensamento, há que concluir que o prazo para os 
 Representantes da República requererem ao Tribunal Constitucional a fiscalização 
 preventiva de decreto legislativo regional é de 8 dias, tal como acontece para o 
 Presidente da República relativamente aos actos legislativos referidos nos n.ºs 
 
 1 e 5 do artigo 278º da CRP, e que esse prazo se esgota, assim, às 24 horas do 
 
 8º dia seguinte àquele em que o diploma foi por eles recebido.
 
       Anote-se, de resto, que o próprio legislador infraconstitucional não 
 deixou de atender, em algumas situações, à circunstância de a actividade a 
 praticar ter natureza política. 
 
 É o que se passa com a apresentação, nas secretarias dos tribunais judiciais, de 
 candidaturas às eleições autárquicas em que o legislador não deixou de adoptar 
 um horário de funcionamento desse serviço muito mais alargado, diferente do 
 regime normal que está previsto no artigo 122º da Lei Orgânica dos Tribunais 
 Judiciais n.º 3/99, de 13 de Janeiro) (cf. art.º 229º da Lei Orgânica n.º 
 
 1/2001, de 14 de Agosto), ao qual, todavia, não obstante a sua dignidade 
 constitucional, o acórdão acaba por sujeitar o prazo directamente fixado pela 
 Constituição.
 
       Se, naquele caso, existem razões de operacionalidade e de praticabilidade, 
 relacionadas com a multiplicidade de actos que são levados a cabo pelos diversos 
 
 “utilizadores” (partidos, tribunais, administração eleitoral, etc.) que podem 
 justificar a fixação de um horário, certo, de funcionamento dos serviços, seja 
 para a prática dos actos de natureza política que, pelos usos e costumes, 
 ocorrem sem dependência de horários, seja dos outros actos praticados já dentro 
 do processo ou procedimento eleitoral, já essa justificação não se imporá no 
 caso em que o número de órgãos que podem requerer a fiscalização preventiva de 
 constitucionalidade é muito restrito (cf. art.º 278º. n.ºs 1, 2 e 4, da CRP) e é 
 um só o Tribunal a receber o pedido.
 
       (Estamos, assim, próximos da declaração de voto do Conselheiro Vital 
 Moreira no Acórdão n.º 26/84, publicado nos Acórdãos do Tribunal Constitucional, 
 vol. 2º, pp. 71 e ss.).
 
  
 
       2 – Não acompanho, ainda, a nota constante do acórdão relacionada com os 
 termos em que o requerente formulou o pedido de fiscalização preventiva. Tenho, 
 para mim, que a forma não assertórica ou não apodítica de apresentação do 
 
 “problema” de constitucionalidade, usada pelo requerente, tem a ver apenas com 
 uma postura de humildade científica que o inibe de avançar uma posição própria 
 sobre a matéria. Não podendo o Tribunal deixar de conhecer do pedido por este se 
 apresentar claramente formulado e motivado, a melhor solução seria a de omitir 
 qualquer referência aos termos em que o problema foi colocado, mantendo-se, 
 assim, a questão “no plano de consciência” em que o requerente o quis colocar. 
 Aliás, foi este o procedimento recentemente seguido pelo Tribunal 
 Constitucional, no caso apreciado pelo Acórdão n.º 376/05, em que o requerente 
 adoptou a mesma postura relativamente a um fundamento de 
 
 (in)constitucionalidade.
 
  
 
       3 – Votei vencido quanto à declaração de inconstitucionalidade das normas 
 identificadas na decisão.
 
       Embora acompanhando, no essencial, as considerações tecidas no acórdão 
 relativamente ao âmbito do regime de autonomia regional, nomeadamente no que 
 tange aos poderes legislativos da Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos 
 Açores, decorrentes da revisão constitucional de 2004 (Lei Constitucional n.º 
 
 1/2004, de 24 de Julho) e à caracterização feita da Lei n.º 159/99, de 14 de 
 Setembro, enquanto lei quadro que «não deixa de operar, com um certo grau de 
 densificação, os princípios e regras a que deve obedecer a transferência de 
 competências para os municípios, procedendo a uma “delimitação das atribuições e 
 competências em geral” que foi levada a alguma pormenorização», o certo é que 
 divirjo completamente do juízo de inconstitucionalidade a que se chegou, pelas 
 razões que sumariamente passo a expor.
 
       Assim, antes de mais, importa acentuar – aspecto em que o acórdão se 
 releva algo desfocante do núcleo da autonomia regional constitucionalmente 
 estabelecida – que a Lei n.º 159/99, de 14 de Setembro, embora regendo para todo 
 o território nacional sobre o quadro jurídico de transferência de atribuições e 
 competências para as autarquias locais, teve bem presente que as atribuições e 
 competências a transferir para os municípios se poderiam encontrar sediadas, de 
 acordo com a lei então vigente, em diferentes sedes de administração: ou na 
 administração central ou na administração regional.
 
       Na verdade, o legislador da Lei n.º 159/99 não podia desconhecer, nem 
 desconhecia, que haviam muitas competências, da mais diversa natureza, que 
 haviam sido transferidas, anteriormente, da administração central para as 
 regiões autónomas dos Açores e da Madeira e cuja matéria passou a ficar 
 incluída, nos respectivos estatutos político-administrativos, como matéria sobre 
 a qual elas passaram a ter poderes legislativos, ou seja, que havia matérias 
 cuja regulação já estava regionalizada.
 
       No caso dos Açores, entre essas competências contam-se aquelas que estão 
 aqui em causa. Na verdade, tais competências haviam sido transferidas do âmbito 
 do Ministério da Educação e Investigação Científica para o da região autónoma 
 através do Decreto-Lei n.º 338/79, de 25 de Agosto e o seu regime havia, até, já 
 sido desenvolvido em diplomas legislativos regionais posteriores (Decretos 
 Legislativos Regionais n.ºs 33/84/A, de 6 de Novembro, e 4/95/A, de 29 de 
 Março). 
 
       E anote-se aqui que aquele Decreto-Lei n.º 338/79 foi emitido pelo Governo 
 com inteiro respeito da sua competência legislativa, tendo em conta o sistema de 
 repartição de competências entre o Governo e a Assembleia da República constante 
 da Lei fundamental, na sua versão originária, bem como de acordo com o Estatuto 
 Provisório da Região Autónoma dos Açores, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 
 
 318-B/76, de 30 de Abril, na redacção dada pelo Decreto-Lei n.º 427-B/76, de 1 
 de Junho, então em vigor.
 
       A possibilidade de transferência, relativamente a estas atribuições e 
 competências que haviam sido transferidas da administração central para as 
 administrações regionais, apenas poderia, assim, acontecer entre estas últimas 
 administrações e as autarquias locais.
 
       O artigo 33º da Lei n.º 159/99, ao dispor que “a presente lei aplica-se às 
 regiões autónomas dos Açores e da Madeira”, nunca poderia ignorar uma tal 
 situação jurídica.    
 Deste modo, o que este preceito quis dizer foi que o regime jurídico constante 
 da Lei, relativo aos termos em que poderia operar-se a transferência de 
 atribuições e competências da administração central para as autarquias locais (é 
 bom acentuar que nas disposições anteriores, a lei cura apenas de definir os 
 termos em que deve ocorrer a transferência de atribuições e competências da 
 administração central), se aplicaria, igualmente, nas regiões autónomas dos 
 Açores e da Madeira, quando fosse caso de transferência de atribuições e 
 competências do domínio da administração central para o das autarquias locais, 
 bem como quando fosse caso de transferência de atribuições e competências da 
 administração regional dos Açores e da Madeira para as autarquias locais da 
 respectiva região autónoma.
 
       Só entendido assim o preceito, se confere todo o sentido ao facto de a Lei 
 erigir a princípio geral, no regime jurídico de transferência de poderes ou de 
 descentralização administrativa adoptado, o princípio subsidariedade, segundo o 
 qual, de acordo com a própria enunciação legal, as atribuições e competências 
 devem ser exercidas “pelo nível de administração melhor colocado para as 
 prosseguir com racionalidade, eficácia e proximidade aos cidadãos” (art.º 2º, 
 n.º 2). 
 
       Ora, bem pode suceder que, na avaliação a fazer pela administração 
 regional e pelas autarquias da respectiva região autónoma, se chegue à conclusão 
 de que o “nível melhor colocado” para satisfazer esses objectivos seja o da 
 administração regional, caso em que deverá ser esse o nível de administração 
 elegido para a atribuição em concreto da competência.
 
       Por outro lado, só considerando extensíveis às administrações regionais, 
 onde as atribuições e competências podem estar sediadas, os princípios da 
 coordenação de intervenção efectua[n]da no exercício de competências próprias e 
 da concertação dos planos de investimento, que estão afirmados nos n.ºs 3 e 4 do 
 art.º 2º da Lei n.º 159/99, se torna possível prosseguir, na prática, essa 
 actividade de coordenação e cooperação entre a administração regional e as 
 autarquias, no caso em que as atribuições e competências pertencem não já à 
 administração central mas à administração regional.
 
       Finalmente, cabe, ainda, acentuar que, ao deixar (art.º 4º) a 
 concretização das transferências de atribuições (seja do âmbito da administração 
 central, seja do âmbito da administração regional para as autarquias locais da 
 região autónoma) para diplomas próprios a emitir posteriormente – e ao 
 estabelecer que essa transferência será feita de modo progressivo durante um 
 prazo de quatro anos (depois, alargado até 31 de Dezembro de 2005, pelo art.º 
 
 11º da Lei n.º 55-A/2004, de 30 de Dezembro) – o legislador da Lei n.º 159/99 
 quis deixar bem claro que essa transferência teria que ser o produto de uma 
 concertação entre os níveis de administração envolvidos. 
 
       E, assim, estando em causa atribuições e competências então sediadas na 
 administração regional e cuja competência legislativa é reconhecida nos 
 respectivos Estatutos, como é o caso das matérias aqui em causa [cf. art.º 8º, 
 alíneas b), v) e aa), do Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma dos 
 Açores, aprovado pela Lei n.º 61/98, de 27 de Agosto], desejou  o legislador da 
 Lei n.º 159/99 deixar aberta a porta para que essa transferência se pudesse 
 fazer com a sua efectiva intervenção.    
 Por outro lado, tendo a transferência de atribuições e de competências para os 
 municípios de ser acompanhada da transferência de recursos (humanos, financeiros 
 e de património), conforme emerge claramente do disposto nos art.ºs 3º, n.ºs 2 e 
 
 3, e 4º, n.ºs 2 e 3, da mesma Lei n.º 159/99, pretendeu o legislador 
 salvaguardar a intervenção da administração regional, por se estar perante meios 
 próprios desta, afectos à realização das suas atribuições próprias a transferir, 
 e fazerem parte integrante da autonomia regional em matéria de orçamento, 
 finanças e património [cf. art.ºs 227º, n.º 1, alíneas h), i), j), e 232º, n.º 
 
 1, da Constituição]. 
 Não se contesta, assim, a qualquer título, a constitucionalidade da Lei n.º 
 
 159/99, pois, além de se entender que a definição do quadro de competências que 
 poderiam ser transferidas para as autarquias locais integra matéria incluída na 
 reserva relativa da Assembleia da República [art.º 165º, n.º 1, alínea q), da 
 Constituição], reconhece-se, também, que esse diploma deixou às administrações 
 regionais, no que tange às competências já regionalizadas, a liberdade de 
 conformação legislativa exigida pelo espaço de reconhecimento constitucional e 
 estatutário da autonomia regional, constante, no âmbito material aqui em causa, 
 dos referidos preceitos constitucionais e do Estatuto Político-Administrativo 
 dos Açores.
 Na verdade, conquanto regulando o regime de transferência de atribuições e 
 competências para os municípios, nos aspectos estruturantes que deveriam ser 
 respeitados pelos actos legislativos posteriores, concretizadores desse regime, 
 como acima se deixou perfunctoriamente apontado – como é próprio de uma 
 lei-quadro (cf. Gomes Canotilho, Direito constitucional e teoria da 
 Constituição, 7ª edição, 2003, p. 786), e na medida exigida pelo âmbito material 
 da reserva de competência relativa da Assembleia da República – a Lei n.º 159/99 
 não deixou de reservar para o legislador regional o espaço legislativo demandado 
 pela autonomia regional relativamente às matérias em que viesse a concretizar-se 
 a transferência prevista apenas globalmente.
 
  
 
       O que vem sendo dito revela-se decisivo para o juízo a fazer sobre a 
 questão de saber se o Decreto-Lei n.º 7/2003, de 15 de Janeiro, se deve 
 considerar como dispondo também para as regiões autónomas e, nomeadamente, para 
 a Região Autónoma dos Açores. 
 
       O acórdão deu-lhe uma resposta positiva e foi a partir de tal pressuposto 
 que chegou à conclusão da inconstitucionalidade orgânica das normas 
 identificadas na decisão: na lógica do acórdão, estando já concretizada a 
 transferência das competências para os municípios, estas passaram a integrar, em 
 efectividade, o estatuto destas autarquias; a intervenção do legislador 
 regional, alterando os termos em que concretamente essa transferência se deveria 
 considerar concretizada, envolve reger sobre matéria do estatuto das autarquias 
 locais, abrangida na reserva relativa da Assembleia da República constante da 
 alínea q) do n.º 1 do art.º 165º da Constituição, por demandar como efeito 
 retirar aos municípios uma competência que já estava na sua titularidade.
 
       O meu juízo sobre a questão é, porém, completamente diferente. O 
 Decreto-Lei n.º 7/2003 foi emitido pelo Governo sob a invocação de uma 
 competência legislativa própria, como decorre do facto de invocar como fonte do 
 seu poder legislativo a alínea a) do n.º 1 do artigo 198º da Constituição. E foi 
 decretado “para valer como lei geral da República”. O diploma regulamenta os 
 conselhos municipais de educação, identificados no art.º 19º, n.º 2, alínea b), 
 da Lei n.º 159/99, aprova o processo de elaboração da carta educativa, 
 igualmente mencionada na alínea a) do mesmo número e artigo, e procede a uma 
 transferência universal de competências, no domínio da educação pré-escolar, do 
 ensino básico e do ensino secundário, para os municípios.
 
       Porém, não obstante haver adoptado, de entre os métodos de transferência 
 de atribuições e competências para os municípios, mencionados no art.º 6º da Lei 
 n.º 159/99, o método de uma transferência universal (convindo lembrar estar, 
 também, previsto um método de natureza não universal – de contratualização de 
 transferência de competências) não se segue daí que o universo tenha de 
 corresponder a todo o território nacional, como parece, aliás, ser sugerido pelo 
 facto de o diploma ser emitido “para valer como lei geral da República” e não se 
 restringir apenas ao âmbito universal das transferências de competências, 
 relativa à matéria em causa, a ter lugar entre a administração central e as 
 autarquias locais. Também, aqui, estamos perante uma transferência de âmbito 
 universal: só que ela apenas acontece no plano das relações entre a 
 administração central e os municípios, não tendo, forçosamente, de abranger a 
 administração regional que é uma realidade constitucional diferente. 
 
       Ora, os termos em que o Decreto-Lei concretiza a transferência de 
 atribuições e competências apenas se ajustam ao universo da administração 
 central e dos municípios.             Toda a regulamentação estabelecida no 
 diploma está efectuada com base no pressuposto de estar a concretizar-se uma 
 transferência entre a administração central e os municípios. 
 Tal sentido resulta claro do seu próprio texto. Sempre que tem de polarizar os 
 dois termos da relação de transferência, o diploma refere-se apenas ao 
 Ministério da Educação [art. 4º, n.ºs 1, alínea b), e 3; 12º, n.º 4; 14º; 17º, 
 n.º 2; 19º, n.ºs 2 a 6; 20º, n.ºs 2 e 3; 21º, 22º, n.ºs 3 e 4, 24º, n.º 1) ou ao 
 Governo da República (art.º 28º, n.º 1], ignorando, por completo, a posição de 
 ente interessado da administração regional.
 
       Por outro lado, ao regular o acesso dos municípios ao apoio financeiro no 
 domínio das infra-estruturas, equipamentos e apretrechamento dos 
 estabelecimentos de educação pré-escolar e do 1º ciclo do ensino básico (art.º 
 
 27º), o Decreto-Lei n.º 7/2003 apenas fala no apoio “relativo às intervenções da 
 administração central regionalmente desconcentradas, dos programas regionais do 
 Continente, do Quadro Comunitário de Apoio III”, não referindo qualquer programa 
 de apoio aos municípios das regiões autónomas. 
 Uma tal atitude, discriminatória, seria impensável perante os princípios da 
 
 “unidade nacional e dos laços de solidariedade entre todos os portugueses” que 
 enformam, constitucionalmente, o regime da autonomia regional” (art.º 225º, n.º 
 
 2, da Constituição), a entender-se que o diploma em causa concretizara a 
 transferência de atribuições e competências do domínio da administração regional 
 para o dos municípios.
 
       Em ponto algum, o Decreto-Lei n.º 7/2003 entra em linha de conta com as 
 administrações regionais no que tange à densificação/concretização dos termos 
 que a transferência de competências se há-de desenvolver, desenhada nos seus 
 diversos preceitos.
 
       Dificilmente se poderá admitir que o legislador do Decreto-Lei n.º 7/2003 
 pudesse desconhecer a existência das administrações regionais, os seus poderes 
 constitucionais e estatutários, bem como a realidade existente de as atribuições 
 a transferir caberem, aí, à administração regional e implicarem uma avaliação da 
 conveniência quanto ao “nível da administração melhor colocado para prosseguir 
 
 [as atribuições e competências] com racionalidade, eficácia e proximidade dos 
 cidadãos”, do quanto e do momento de transferência, incluindo no que se refere à 
 transferência de recursos.
 
       A atitude de, no concreto processo de transferência de atribuições, 
 ignorar por completo a posição da administração regional, relativamente às 
 atribuições e competências incluídas no seu Estatuto e também 
 constitucionalmente reconhecidas, mormente no que diz respeito à transferência 
 de recursos e de património próprios,  traduziria uma actuação contraditória com 
 a opção e afirmação políticas, concretizadas quer na Lei n.º 159/99, quer no 
 Decreto-Lei n.º 7/2003.
 
       Constitui, aliás, elemento sintomático de que tal resultado não estava nos 
 seus horizontes a circunstância de, no proémio do diploma, nem uma palavra se 
 dizer relativamente à intervenção das administrações regionais.
 Anote-se, por fim, que o diploma não foi aplicado directamente nas regiões 
 autónomas, no que concerne, às relações entre a administração regional e os 
 municípios.             Segundo diz o próprio requerente, o diploma apenas 
 vigora, aí, a “título supletivo”. 
 
  É difícil imaginar-se, como aceita expressamente o acórdão, que possa 
 concretizar-se uma transferência de competências sem que as entidades que 
 participam no respectivo processo concertem e conheçam os termos concretos em 
 que ela se efectua. Quem desempenharia o papel assinalado no Decreto-Lei n.º 
 
 7/2003, em várias das suas disposições, ao Ministério da Educação e ao Governo, 
 relativamente a competências que já não lhe cabiam? O Governo Regional? Mas, a 
 sê-lo, com base em que norma(s) atributiva(s) de competência? 
 
       Perante o que vem de dizer-se, é forçoso concluir que a qualificação como 
 
 “lei geral da República”, feita pelo legislador do Decreto-Lei n.º 7/2003, 
 ultrapassa o sentido da regulamentação estabelecida no diploma, assentando no 
 equívoco de que, pelo facto de versar sobre uma transferência de atribuições e 
 competências, feita de modo universal, da administração central para as 
 autarquias locais, essa seria a qualificação que lhe assentaria à face do 
 critério constante do n.º 5 do art.º 112º da Constituição, na versão, então, em 
 vigor. 
 
       Porém, essa qualificação não vincula o Tribunal Constitucional que pode 
 concluir de modo diferente.
 
       Deste modo, tendo as normas constitucionalmente questionadas pelo 
 requerente sido emitidas ao abrigo dos poderes constitucionalmente reconhecidos 
 
 às regiões autónomas pelo art.º 46º da Lei Constitucional n.º 1/2004, de 24 de 
 Julho, e pelos art.ºs 227º, n.º 1, alínea a), e 228º, n.º 1, da Constituição, na 
 redacção emergente da mesma Lei Constitucional, versarem sobre matérias 
 atribuídas à Região Autónoma dos Açores pelo art.º 8º, n.º 1, alíneas b), v) e 
 aa), do respectivo Estatuto Político-Administrativo, aprovado pela Lei n.º 
 
 61/98, de 27 de Agosto, e havendo sido emitidas de acordo com as regras 
 constantes da Lei n.º 159/99, e dentro do prazo para a transferência progressiva 
 de competências, estabelecido no seu art.º 4º, n.º 1, na redacção dada pela Lei 
 n.º 55-A/2004, não sofrem as mesmas da inconstitucionalidade imputada.
 
       Entre os diplomas próprios de concretização da transferência de 
 competências, a que alude o n.º 2 do art.º 4º da Lei n.º 159/99 cabe, 
 precisamente, o diploma legislativo onde se inserem as normas aqui sindicadas – 
 
 “O Regime Jurídico do Planeamento, Protecção e Segurança das Construções 
 Escolares”, aprovado pelo Decreto da Assembleia Legislativa da Região Autónoma 
 dos Açores, n.º 23/2005, como, de resto, o próprio acórdão admite.
 
  
 
       Mas, mesmo que se admita que o Decreto-Lei n.º 7/2003 procedeu, também, a 
 uma transferência para os municípios das competências antes regionalizadas, que 
 aqui estão em causa, não pode o juízo de constitucionalidade sobre as normas 
 objecto do pedido ser diferente.
 
       Se tal fosse a hipótese, as normas regionais declaradas inconstitucionais 
 surgiriam como normas revogatórias ou modificativas, no respectivo círculo 
 hipotético, do regime consagrado nesse decreto-lei. Só que podendo, hoje, a 
 Assembleia Legislativa concretizar ou densificar o regime de transferência de 
 competências para os municípios constante da Lei n.º 159/99, conforme 
 explicitamente admite o acórdão, haveria de concluir-se não lhe estar aquilo 
 vedado. 
 
 É que as normas integrantes do “estatuto das autarquias locais”, abrangido pela 
 reserva relativa de competência da Assembleia da República, constante da alínea 
 q) do art.º 165º da Constituição, são apenas as normas constantes da Lei n.º 
 
 159/99 que regulam a possibilidade de atribuição, por transferência, das 
 competências relativas às matérias em causa (ou às outras matérias nela 
 mencionadas que não vêm ao caso) e os critérios a seguir nessa transferência, 
 não comungando dessa mesma natureza as normas do decreto-lei concretizadoras do 
 quanto, quando e quomodo das atribuições e competências que podem ser 
 transferidas. Uma coisa é a definição, em abstracto, da possibilidade da 
 titularidade das atribuições e competências relativas às matérias em causa caber 
 aos municípios – essa, sim, cabendo na reserva relativa da Assembleia da 
 República – outra coisa diferente é concretização ou operacionalização dessa 
 possibilidade legal.
 O acórdão acabou por fazer comungar o Decreto-Lei n.º 7/2003 da mesma natureza 
 da Lei n.º 159/99, ao impor uma irrevogabilidade, ao legislador actualmente 
 competente, do regime jurídico densificador da Lei-quadro antes definido pelo 
 legislador, ao tempo, competente, sob pena de inconstitucionalidade. 
 
       
 Benjamim Rodrigues
 
  
 
  
 DECLARAÇÃO DE VOTO
 
  
 
  
 Votei vencida, quer quanto à decisão de conhecer do pedido, quer quanto à 
 decisão sobre a questão de fundo, no essencial, pelas seguintes razões:
 
  
 
 1. Em primeiro lugar, porque entendo que o pedido é extemporâneo, já que foi 
 entregue no Tribunal Constitucional depois de encerrada ao público a respectiva 
 secretaria, ou seja, depois da hora legalmente definida para o efeito.
 Discordo, pois, de que se considere tempestivamente apresentado um pedido de 
 fiscalização preventiva que, enviado por qualquer via – nomeadamente por 
 telecópia, como foi o caso –, dê entrada na secretaria do Tribunal 
 Constitucional depois daquela mesma hora do último dia do prazo.
 Note-se, desde logo, que não é aplicável a estes processos o regime definido 
 pelo Código de Processo Civil, e nomeadamente nos seus artigos 150º, n.º 1, 
 alínea c) e 143º, n.º 4, nem sequer subsidiariamente. 
 O acórdão considera tratar-se de um “lugar paralelo”. A verdade, todavia, é que 
 não creio que assim deva ser considerado. Tal como o Tribunal Constitucional já 
 inúmeras vezes observou em julgamentos de recursos em matéria eleitoral, também 
 
 “a celeridade” do processo de fiscalização preventiva, celeridade determinada 
 pela sua inserção no processo legislativo, “exige uma disciplina rigorosa no 
 cumprimento dos prazos legais, sob pena de se tornar impossível” (acórdão n.º 
 
 287/2002, Diário da República, II série, de 23 de Julho de 2002) o respeito pelo 
 prazo de decisão pelo Tribunal Constitucional, que a Constituição fixa em 25 
 dias, admitindo ainda que seja encurtado pelo Presidente da República por motivo 
 de urgência, (n.º 8 do artigo 278º). 
 Em consonância com este prazo máximo, a Lei nº 28/82, de 15 de Novembro marca 
 prazos curtos para todos os actos que se seguem à entrada do pedido. Referem-se, 
 a título de exemplo, o prazo de 1 dia a contar da entrada para a admissão do 
 pedido ou para a distribuição, de 3 dias para a resposta do autor da norma, ou 
 de 5 dias a contar da admissão para a elaboração do memorando pelo relator 
 
 (artigos 51º e segs. em especial 57º e segs.).
 Assim, também aqui “é especialmente justificada a exigência de que só possa ser 
 considerada a data em que o acto foi praticado se tiver dado entrada no Tribunal 
 
  dentro do horário de funcionamento da secretaria”, como igualmente se escreveu, 
 sempre para o processo eleitoral, no citado acórdão n.º 287/2002 e se reiterou 
 nos acórdãos n.ºs 356/2002 (disponível, tal como os outros acórdãos, em 
 
 www.tribunalconstitucional.pt) ou 41/2005 (Diário da República, II série, de 14 
 de Fevereiro de 2005).
 E, de qualquer forma, como igualmente se entendeu no mesmos acórdãos, “o que 
 aquele n.º 4 [do artigo 143º do Código de Processo Civil] estabelece é que os 
 actos podem ser praticados a qualquer hora, se for utilizado o correio 
 electrónico ou a telecópia; não regula a questão de saber quando se consideram 
 entrados os actos, nomeadamente os abrangidos pelo n.º 3 do mesmo artigo 143º, 
 segundo o qual, se forem actos que «impliquem a recepção pelas secretarias 
 judiciais de quaisquer articulados, requerimentos ou documentos devem ser 
 praticados durante as horas de expediente dos serviços»”(acórdão n.º 287/2002).
 
  
 
 2. Em segundo lugar, porque considero que o pedido apresentado ao Tribunal  não 
 se encontra, nem definido, nem fundamentado em termos de poder ser apreciado, já 
 que o Tribunal Constitucional não tem competência consultiva.
 Desde logo, pelas razões que apontei na declaração de voto que juntei ao acórdão 
 n.º 232/2003  (Diário da República, I Série A, de 17 de Junho de 2003), que, 
 agora, me levaram a votar no sentido da inadmissibilidade do pedido, e que, por 
 comodidade, transcrevo: “(...) em meu entender, não basta a simples manifestação 
 de dúvidas de constitucionalidade para que se justifique a intervenção do 
 Tribunal Constitucional, mesmo em processo de fiscalização preventiva, no 
 essencial, pelas seguintes razões:
 
 1. A fiscalização preventiva não é uma função consultiva, não é uma função 
 auxiliar do veto. É uma função jurisdicional do Tribunal Constitucional, ao 
 mesmo título que as demais funções de fiscalização.
 
 2. Se o Tribunal Constitucional não se pronuncia pela inconstitucionalidade, o 
 poder de veto fica intacto e pode ser exercido livremente. Se, diferentemente, o 
 Tribunal Constitucional se pronuncia pela inconstitucionalidade, o poder de veto 
 muda de natureza, passando a exercer apenas uma função subordinada de execução 
 da decisão do Tribunal (veto obrigatório).
 O Ministro da República (neste caso) não é, portanto, um órgão consulente, mas 
 antes um órgão requerente ou de iniciativa, que pode também vir a ser um órgão 
 executor.
 
 3. No sistema português, que reconhece aos tribunais poderes muito amplos de 
 fiscalização sucessiva, a fiscalização preventiva do Tribunal Constitucional não 
 constitui um modo normal de fiscalização da constitucionalidade das leis. No 
 espírito da Constituição, a fiscalização preventiva serve apenas o objectivo de 
 evitar a entrada em vigor de textos legais feridos de uma inconstitucionalidade 
 particularmente nítida e clara. Se se fosse mais longe, fazendo intervir o 
 Tribunal Constitucional sempre que um argumento de inconstitucionalidade pudesse 
 ser configurado, o peso do sistema deslocar-se-ia para a fiscalização 
 preventiva, com prejuízo, pelo menos, da fiscalização sucessiva difusa.
 
 4. Não podendo o Tribunal Constitucional decidir da oportunidade da sua 
 intervenção, cabe necessariamente ao órgão requerente, enquanto órgão detentor 
 da iniciativa processual, o papel de seleccionar os casos em que se justifica a 
 fiscalização preventiva. Para que esta se exerça dentro do espírito da 
 Constituição, é necessário que exista aos olhos do órgão requerente mais do que 
 uma simples dúvida, ainda que razoável. O órgão requerente deverá estar ele 
 mesmo convicto da existência da inconstitucionalidade e sustentá-la em termos 
 afirmativos, não em termos meramente dubitativos e hipotéticos. Se o órgão 
 requerente não tiver essa convicção, não deverá suscitar a intervenção do 
 Tribunal Constitucional.
 No mesmo sentido aponta o facto de o juízo de não inconstitucionalidade ser 
 desprovido de quaisquer efeitos “preventivos”. É que a fiscalização preventiva 
 só produz efeitos úteis se conduzir a um juízo de inconstitucionalidade; não 
 pode, portanto, servir para afastar dúvidas, mas sim para afastar 
 inconstitucionalidades. Só deve, portanto, ser utilizada quando o órgão 
 requerente estiver convencido da existência da inconstitucionalidade, 
 desenvolvendo nesse sentido uma argumentação conclusiva.”
 Para além disso, no caso presente acresce que o requerente não define de forma 
 suficiente – ou seja, de modo a que o Tribunal Constitucional possa cumprir a 
 exigência de apenas se pronunciar sobre “normas cuja apreciação tenha sido 
 requerida”, como obriga o n.º 5 do artigo 51º da Lei nº 28/82 – o objecto do 
 pedido, antes transferindo para o Tribunal Constitucional a definição, quer do 
 regime em vigor, quer do sentido das alterações aprovadas.
 
  
 
 3. Em terceiro lugar, votei vencida quanto à alínea b) da decisão porque, em meu 
 entender, o Decreto-Lei n.º 7/2003, de 15 de Janeiro, não se aplica à Região 
 Autónoma dos Açores, uma vez que as competências que transfere da administração 
 central para as autarquias locais já se encontravam, à data da sua entrada em 
 vigor, transferidas para a Região pelo Decreto-Lei n.º 338/79, de 25 de Agosto 
 
 (alterado pelo Decreto-Lei n.º 503/79, de 24 de Dezembro).
 A esta conclusão não obsta, naturalmente, a sua qualificação como “lei geral da 
 República”, ou a menção de que foram “ouvidos os órgãos de governo próprio das 
 Regiões Autónomas”, elementos incapazes de ultrapassar a impossibilidade de 
 aplicação do respectivo regime à Região Autónoma dos Açores, por se tratar de 
 competências já regionalizadas.
 Basta, aliás, ler o articulado para concluir que o legislador não teve em mente 
 senão transferir competências da administração central para as autarquias. Assim 
 o revelam, quer a consideração global do regime definido pelo Decreto-Lei n.º 
 
 7/2003, que tem em conta (não só aparentemente, como se diz no acórdão) um 
 modelo dualista de administração, central e local, quer a leitura 
 individualizada de diversos preceitos. Veja-se, a título de exemplo e por serem 
 particularmente significativos, os que prevêem a colaboração entre as autarquias 
 e o Ministério da Educação (cfr. os artigos 19º, 20º, 24º ou 25º), a 
 transferência de património (artigo 26º) ou o regime definido para os recursos 
 financeiros (artigo 27º).
 Do próprio preâmbulo resulta que o legislador não teve em consideração as 
 competências que já tinham sido descentralizadas para as Regiões Autónomas; 
 aliás, a justificação nele apresentada seria manifestamente inadequada se outra 
 tivesse sido a intenção.
 Ora, de um diploma manifestamente pensado para transferir competências da 
 administração central para as autarquias não se pode retirar a transferência de 
 competências de que a administração central não é titular, desde logo tendo em 
 conta, pelo menos, as exigências do princípio da legalidade nesta matéria; nem, 
 tão pouco, se pode afirmar que a ponderação que há-de ter sido realizada para a 
 concretização das mesmas vale, de igual forma, para uma eventual transferências 
 de competências já regionalizadas – já descentralizadas, portanto, embora para 
 um nível diverso.
 
  
 
 4. De qualquer modo, e admitindo que assim não fosse, sempre acrescento que 
 nunca votaria a inconstitucionalidade das normas dos artigos 53º e 57º, desde 
 logo por não versarem matéria integrante da reserva definida pela alínea q) do 
 n.º 1 do artigo 165º da Constituição.
 
  
 Maria dos Prazeres Pizarro Beleza