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Processo nº 467/98 Conselheiro Messias Bento
Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional:
Recorrente(s): J... e M... Recorrido(s): C... I. Relatório:
1. Os recorrentes reclamam para a conferência da decisão sumária, de 16 de Junho de 1998, que não conheceu do recurso por eles interposto, com fundamento na inverificação dos respectivos pressupostos.
Alegam que, 'ao longo do processo, designadamente através do requerimento de fls. 245 e seguintes, suscitaram os recorrentes a inconstitucionalidade quer da norma contida no nº 1 do artigo 655º do Código de Processo Civil, quer da norma contida no artigo 349º do Código Civil, sendo tanto uma como outra das normas abordadas e aplicadas pelo acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Administrativo [...]'.
Respondeu a recorrida, dizendo que a decisão sumária deve ser confirmada.
2. Cumpre decidir.
II. Fundamentos:
3. A decisão sumária reclamada é do teor seguinte:
'O recurso vem interposto dos acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo, de 6 e Novembro de 1996, e de 18 de Fevereiro de 1998.
'O acórdão de 6 de Novembro de 1996 negou provimento ao recurso que tinha sido interposto do acórdão do Tribunal Tributário de 2ª Instância, que havia confirmado a sentença da 1ª Instância, que, por sua vez, julgara improcedente a oposição à execução fiscal, movida pela C... contra os recorrentes, para cobrança da quantia de 5.200.000$00, acrescida de juros de mora vencidos e vincendos.
'O acórdão de 18 de Fevereiro de 1998 recusou, em parte, o pedido de aclaração daquele aresto.
'Pretendem os recorrentes que, no recurso, interposto ao abrigo da alínea b) do nº 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional, o Tribunal aprecie a constitucionalidade das 'normas contidas no nº 1 do artigo 655º do Código de Processo Civil, quer no artigo 349º do Código Civil, as quais foram aplicadas nos doutos acórdãos proferidos nos autos' e que 'estão feridas de inconstitucionalidade, porquanto, e ao menos na interpretação que ali lhes foi dada, violam os seguintes princípios e preceitos consagrados na Constituição da República Portuguesa:
1). o da igualdade perante a lei - cf. artigo 13º, nº 1;
2). o da aplicação do direito democrático - cf. artigo 16º; e
3). o da garantia ao acesso ao direito e aos tribunais - cf. artigo 20º, nº 1'.
'O Tribunal só poderia conhecer do recurso, se os recorrentes tivessem suscitado a inconstitucionalidade de uma determinada interpretação das normas que se contêm nos artigos 655º, nº 1, do Código de Processo Civil e 349º do Código Civil, que pretendem ver apreciadas, em tempo e em termos de o tribunal recorrido poder decidir essa questão.
'Tal exigia que tal questão tivesse sido suscitada antes de proferido o acórdão de 6 de Novembro de 1996, uma vez que - tem-no este Tribunal dito repetidamente
- o pedido de aclaração já não é momento processualmente adequado para tanto. E, questionando-se, como se questiona, a inconstitucionalidade de uma determinada interpretação dos referidos preceitos legais, exigia, bem assim, que os recorrentes a tivessem enunciado, de forma clara e perceptível, de modo a que, se essa interpretação viesse a ser julgada inconstitucional, o Tribunal a pudesse enunciar, na sua decisão, como o sentido com que tais preceitos não podiam ser aplicados.
'Ora, sucede que os recorrentes, nas alegações para o Supremo Tribunal Administrativo, limitaram-se a dizer que 'o julgador violou o disposto no artigo
349º do Código Civil, ao inferir de um facto conhecido - o simples reconhecimento notarial por semelhança - um facto desconhecido, e inseguro, não resultante daquele, e que é o saber-se quem foi o autor das assinaturas'. Apenas no pedido de aclaração disseram que, 'para efeitos de eventual recurso sobre a inconstitucionalidade das normas quer do nº 1 do artigo 655º do Código de Processo Civil, quer do artigo 349º do Código Civil, vem-se suscitar as respectivas inconstitucionalidades (de tais normas assim interpretadas no acórdão)'. E fizeram esta afirmação, depois de dizerem que esse acórdão interpretou o nº 1 do citado artigo 655º, em termos de entender que 'o tribunal pode efectuar a indagação factual, inclusivé ordenar oficiosamente a diligência do exame à letra ou grafia relativamente ao dito documento'; e interpretou o dito artigo 349º, no sentido de que ele 'permite que sejam tiradas ilações de certos factos'.
'Por conseguinte, os recorrentes só suscitaram a inconstitucionalidade das indicadas interpretações dos mencionados preceitos legais, em momento processualmente inidóneo, pois que o tribunal recorrido já tinha utilizado os ditos normativos na decisão do caso.
'Acresce que o artigo 655º, nº 1, do Código de Processo Civil nem sequer foi aplicado com o sentido que os recorrentes sustentam ser incompatível com a Constituição.
'Na verdade, como se diz no acórdão de 18 de Fevereiro de 1998, o acórdão de 6 de Novembro de 1996 'não distraíu a legalidade da decisão da realização do exame da assinatura dos documentos do nº 1 do artigo 655º do Código de Processo Civil. Ele inferiu-a do princípio da liberdade inquisitória do juiz plasmado, no domínio do processo civil, no nº 3 do artigo 264º do Código de Processo Civil
(redacção do tempo) e, no do processo tributário, nos artigos 40º, nº 1, do Código de Processo Tributário e 39º do Código de Processo das Contribuições e Impostos. O uso do poder-dever contemplado no nº 1 do artigo 655º do Código de Processo Civil não foi invocado para fundamentar a legalidade da iniciativa ou da decisão de ordenar a realização do exame mas para estribar a legalidade da apreciação feita quanto ao apuramento dos factos em função do seu resultado e para cuja manifestação ele fora considerado meio de prova idóneo segundo o critério do artigo 349º do Código Civil'.
'Por último, anota-se que o acórdão de 18 de Fevereiro de 1998 não se pronunciou, sequer, sobre a questão de constitucionalidade dos mencionados artigos 655º, nº 1, do Código de Processo Civil e 349º do Código Civil, justamente porque - escreveu-se aí - 'os recorrentes não suscitaram quaisquer questões de inconstitucionalidade atinentes aos mencionados preceitos nas suas alegações de recurso que este tribunal devesse ter apreciado'; e, 'proferida a decisão ficou esgotado o seu poder jurisdicional, não lhe cabendo pronunciar-se sobre as suas próprias decisões fora dos casos referidos na lei e este não cabe nestes'.
'A questão de constitucionalidade não foi, assim, suscitada durante o processo, como a lei exige. Ao que acresce que o artigo 655º, nº 1, do Código de Processo Civil não foi aplicado com o sentido que vem acusado de inconstitucional.
'Por isso, não se verificam os pressupostos do recurso interposto.
'Pelos fundamentos expostos, nos termos do disposto no artigo 78º-A, nºs 1 e 2, da Lei do Tribunal Constitucional, decido não conhecer do recurso.
4. A reclamação dos recorrentes em nada contraria o que se escreveu na decisão acabada de transcrever, pois o requerimento de fls. 245 e seguintes, onde os ora reclamantes dizem ter suscitado a inconstitucionalidade é, justamente, o pedido de aclaração nela referenciado.
Há, assim, que concluir, como se fez na referida decisão, que se não verificam os pressupostos do recurso interposto, por isso que dele se não podia, nem pode conhecer.
III. Decisão: Pelos fundamentos expostos, decide-se:
(a). manter a decisão sumária de não conhecimento do recurso;
(b). condenar os reclamantes nas custas, com taxa de justiça que se fixa em dez unidades de conta. Lisboa, 15 de Julho de 1998 Messias Bento José de Sousa e Brito Luis Nunes de Almeida