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Processo n.º 516/05
 
 3.ª Secção
 Relator: Conselheiro Gil Galvão
 
  
 
  
 Acordam, em conferência, na 3.ª Secção do Tribunal Constitucional
 
  
 
  
 I – Relatório
 
  
 
 1. O A., ora recorrente, intentou contra B. e outros, acção declarativa pedindo 
 a declaração de nulidade do registo de uma hipoteca a favor dos RR, incidente 
 sobre fracções autónomas de prédio urbano, identificado nos autos, anteriormente 
 adquiridas pelo A. Por decisão do Tribunal de Círculo do Barreiro, de 15 de 
 Setembro de 1997, foi a acção julgada improcedente e, em consequência, foram os 
 RR absolvidos do pedido.
 
  
 
 2. Inconformado com esta decisão o A. recorreu dela para o Tribunal da Relação 
 de Lisboa que, por acórdão de 27 de Maio de 1999, julgou o recurso improcedente.
 
  
 
 3. Novamente inconformado o A. recorreu para o Supremo Tribunal de Justiça que, 
 por acórdão de 17 de Fevereiro de 2000, considerando que, “na pendência desta 
 acção, foi proferido acórdão uniformizador de jurisprudência em sentido 
 contrário ao que baseou as decisões das instâncias”, estabeleceu que “no caso de 
 não se ter por existente má fé, prevalece o registo da hipoteca, porque 
 efectuado antes do registo de aquisição das fracções autónomas pela autora. No 
 caso contrário, ficará afectada a hipoteca, na parte que abrange as referidas 
 fracções.” Assim sendo, concedeu, em parte, provimento à revista, ordenando a 
 
 “remessa dos autos à Relação para ampliação da matéria de facto no que diz 
 respeito à questão suscitada pelo autor, de má fé na celebração da hipoteca e 
 consequente registo”.
 
  
 
 4. Em cumprimento deste acórdão, o Tribunal da Relação de Lisboa, considerando 
 que o apuramento da matéria em causa “pressupunha a necessária produção de 
 prova”, da competência da 1ª instância, para aí ordenou a remessa dos autos. 
 Foi, então, elaborado o respectivo quesito, que obteve resposta negativa, vindo 
 a acção a ser novamente improcedente, por decisão de 3 de Janeiro de 2002.
 
  
 
 5. Mais uma vez inconformado o A. recorreu para o Tribunal da Relação de Lisboa 
 que, por acórdão de 20 de Janeiro de 2004, voltou a julgar a apelação 
 improcedente.
 
  
 
 6. Desta decisão foi interposto recurso de revista. Já no Supremo Tribunal de 
 Justiça, o relator do processo, considerando não ser possível conhecer do 
 objecto do recurso proferiu parecer nesse sentido. Na parte ora relevante, é o 
 seguinte o seu teor:
 
 “[...] Por este STJ foi proferido acórdão em que foi ordenada a ampliação da 
 matéria de facto, com expressa indicação do concreto ponto a indagar e da 
 finalidade do suprimento da insuficiência, bem como da definição do direito e 
 solução jurídica a adoptar consoante ficasse ou não demonstrado o facto cuja 
 apreciação fora omitida.
 Tratou-se da situação contemplada e excepcionalmente admitida e regulada nos 
 arts. 729°-3 e 730°-1 C PC - o Supremo está em condições de definir já o direito 
 aplicável, por a matéria de para tanto se revelar suficiente, apesar da 
 deficiência, mas o apuramento do facto omitido mostra-se necessário à 
 concretização decisória.
 No caso, decidido que a pretensão do A. procederia se se viesse a provar a má fé 
 e improcederia no caso contrário só haveria que apurar esse facto e declará-lo 
 em conformidade nas instâncias.
 Quando tal hipótese se verifica o julgamento da causa 'resultará, a final, da 
 combinação dos arestos dos tribunais de revista e de apelação ou da decisão da 
 
 1.ª instância. Na perspectiva da finalidade do recurso, é o sistema intermédio o 
 concretizado (AMÂNCIO FERREIRA, 'Manual dos Recursos...” 4ª ed., 257).
 Cumprida pelas Instâncias a ampliação da matéria de facto e aplicado o regime 
 jurídico definitivamente fixado pelo Supremo, a decisão da Relação não admite 
 recurso, como resulta do disposto no art. 730° citado e é facilmente 
 compreensível.
 Consequentemente, à luz do regime invocado, que é o aplicável, o recurso 
 interposto não é admissível.
 
 3. - Ocorre, porém, que o Recorrente funda a pretensão recursiva na violação da 
 lei substantiva, enquanto fixa a força probatória da confissão como meio de 
 prova, colocando-se, desse modo, a coberto da excepção prevista no último 
 segmento do n.º 2 do art. 722° CPC, que, por regra, veda ao STJ a intromissão na 
 matéria de facto quanto à sua fixação e à valoração das provas.
 Cabe, então, averiguar se, por isso, excepcionando a limitação acolhida pelo 
 art. 730°, o recurso deve ser admitido.
 Entende-se que a resposta continua a ser negativa.
 A lógica e coerência do sistema não comportam outra solução.
 Na verdade, o acórdão que julgou a revista e mandou averiguar o concurso da má 
 fé pelas instâncias fê-lo - e apenas o poderia ter feito - por não dispor o STJ 
 do facto omitido, quer no elenco do factos assentes pela Relação, quer 
 demonstrado por documento ou outro meio de prova com força probatória plena.
 Por isso, e apenas por isso, deferiu às instâncias o respectivo apuramento, 
 cabendo à Relação a última palavra na valoração das provas e fixação dos factos 
 em função das mesmas (arts. 722° e 729°).
 O Recorrente alegara já, naquele recurso para o Supremo, o concurso do requisito 
 má fé, justamente a extrair dos factos articulados e dos documentos - em termos 
 próximos dos que ora vem repor - e, subsidiariamente, a ampliação da matéria de 
 facto 'com a consequente prova', ou seja, para sobre ela ser produzida a 
 necessária prova.
 O STJ. acolheu esta pretensão subsidiária, do mesmo passo que afastou a 
 principal - a de se poder ter por demonstrada a má fé com base no alegado nos 
 articulados e nos documentos não impugnados ( a invocada confissão) -, como se 
 colhe da circunstância de ter considerado que a má fé atribuída pelo A. aos RR. 
 
 «é contrariada na contestação» para, de seguida, na procedência parcial das 
 conclusões, ordenar a ampliação que, doutro modo, seria de todo desnecessária.
 A mesma linha, sem impugnação, seguiu o acórdão da Relação ao julgar a 
 averiguação do facto omitido à produção de prova em julgamento da matéria de 
 facto na 1ª instância.
 E, ainda no seguimento do caminho traçado pelo próprio Recorrente, foi elaborado 
 um quesito, coisa que a lei proíbe quando o facto a que o mesmo se reporta 
 esteja provado por documento ou por confissão. Se o facto já estava provado (o 
 que fora rejeitado) não poderia ser quesitado nem respondido, o que vale por 
 dizer que não poderia ser submetido à prova e julgamento (arts. 508°~A-1-e), 
 
 511°-1 e 646°-4, todos do CPC). 
 Nunca antes, nomeadamente até ao referido acórdão deste Supremo, suscitou o 
 Recorrente a desconsideração nas decisões de mérito de 'factos provados por 
 documentos ou por confissão reduzida a escrito' em violação do imperativo 
 dirigido ao julgador pelo n.º 3 do art. 659° C PC. 
 Não houve, entretanto, qualquer alteração da causa de pedir ou do pedido no 
 sentido da apreciação da invalidade (anulabilidade) do negócio hipotecário - 
 que, salvo melhor opinião, consistiria em eventual ineficácia em relação ao 
 representado (arts. 268° e 269° C. Civil) - e da subsequente invalidade e 
 cancelamento do registo.
 
 4. - Consequentemente, tem de concluir-se que as questões suscitadas não escapam 
 ao objecto e limites do que ficou definitivamente decidido pelo acórdão deste 
 Tribunal de 17/2/2000, encontrando-se completamente precludido o conhecimento de 
 questões nele não expressa, porque já excepcionalmente definidas.
 Porque novas e extravagantes relativamente aos contornos fixados por aquele 
 aresto ou porque nele decididas - como sucede com o afastamento, da tese da 
 aquisição do facto má fé dos RR. com base no alegado na contestação e nos 
 documentos que a instruem -, as questões suscitadas no recurso ora em apreciação 
 já se encontram decididas ou são inidóneas para afastar a regra mencionada regra 
 da inadmissibilidade de novo recurso para o STJ, ficando, nessa medida, um tal 
 recurso sem objecto.
 De igual modo, enquanto fundamento acessório, a apreciação de nulidades, seja 
 qual for a espécie de recurso, só pode ter lugar se este for admissível - arts. 
 
 721°-2,722°-1 e 754° CPC.
 Do que se deixa exposto manifesta-se o entendimento de que não é possível 
 conhecer do objecto do recurso, por vedado pelo art. 730°- 1 e 2, a contrario.”
 
  
 
 7. Notificadas as partes para, querendo, se pronunciarem sobre o conteúdo deste 
 parecer, disse o ora recorrente, para o que agora importa, o seguinte:
 
 “1. A questão prévia, suscitada no citado despacho, da impossibilidade de 
 conhecimento do objecto do recurso de revista ora interposto pelo A., de modo 
 
 àquele ser julgado findo, sem mais, conforme previsto na 2ª parte da alínea e) 
 do n.º1 do art. 700° do mesmo Código, merece - só pode merecer, conforme razões 
 que se alinharão infra - a mais profunda discordância e censura da parte do 
 Recorrente, para mais, competindo, como compete aos Tribunais, administrar a 
 justiça (art. 156° do CPC); 
 
 [...]
 
 10.Chegados aqui, passemos, então, a elencar as razões que nos fazem discordar, 
 total e absolutamente, do entendimento manifestado no despacho, de v. Exa., de 
 
 2005.01.12, 'de que não é possível conhecer do objecto do recurso, por vedado 
 pelo art. 730°- 1 e 2, a contrario', ou seja, da 2ª revista;
 
 11. Com efeito, não é verdade, afirmar-se, como se afirma, no citado despacho, 
 dever 'concluir-se que as questões suscitadas não escapam ao objecto e limites 
 do que ficou definitivamente decidido pelo acórdão deste tribunal de 17/2/2000, 
 encontrando-se completamente precludido o conhecimento de questões nele não 
 expressa(s), porque já excepcionalmente definidas' e 'Porque novas e 
 extravagantes relativamente aos contornos fixados por aquele aresto ou porque 
 nele decididas - como sucede com o afastamento da tese da aquisição do facto má 
 fé dos RR. com base no alegado na contestação e nos documentos que a instruem -, 
 as questões suscitadas no recurso ora em apreciação já se encontram decididas ou 
 são inidóneas para afastar a regra mencionada regra da inadmissibilidade de novo 
 recurso para o STJ, ficando, nessa medida, um recurso sem objecto'.
 
 12. Senão vejamos!;
 
 13. Salvo o devido respeito, esquece-se v. Exa., Senhor Juiz Conselheiro, que as 
 aludidas questões suscitadas, alegadamente já decididas e precludidas, nunca 
 poderiam encontrar-se já decididas e muito menos precludidas pela simples razão 
 de que até ser proferido o acórdão de 2000.02.17 - que constituiu o ponto de 
 viragem no presente processo, ao ordenar, com base no Acórdão uniformizador de 
 jurisprudência n° 3/99, entretanto, publicado, que fosse tomada em linha de 
 conta a boa ou má fé dos RR./Recorridos, daí mandar ampliar a matéria de facto e 
 definir o novo regime jurídico aplicável -, a boa ou má fé, pura e simplesmente, 
 não relevavam;
 
 14. Por outras palavras, só a partir da referida data é que o pleito prosseguiu 
 com a selecção da matéria de facto atinente à má fé, com a consequente prova, 
 sendo aquela, até então, impertinente;
 
 15. Depois, lendo 'de fio a pavio', quer a sentença de 2002.01.03 quer o acórdão 
 de 2004.01.20, facilmente se constata que, seja uma seja a outra instâncias, 
 nenhuma se pronuncia sobre as questões suscitadas, apesar de a isso estarem 
 obrigadas, por força do novo direito mandado aplicar, razão pela qual estamos 
 perante uma situação de omissão de pronúncia;
 
 16. Importa esclarecer ainda que não é pelo facto de só nas alegações produzidas 
 no âmbito da presente revista se mencionar, expressamente, o conceito jurídico 
 de confissão, que as questões que a consubstanciam e já anteriormente suscitadas 
 se convolam em questões novas, extravagantes e inidóneas;
 
 17. De facto, relevantes são os factos ou questões suscitados e não a 
 qualificação jurídica que lhes damos;
 
 18. Nos autos, o A. sempre suscitou, oportunamente, as questões, e procedendo, 
 agora, à sua classificação, recorrendo ao conceito de direito adequado;
 
 19. Como é óbvio, tal classificação, feita pelo Recorrente, é facultativa e 
 nunca obrigatória!
 
 20. Tudo isto para dizer que é ao julgador que cabe rotular, em última análise, 
 a modalidade de prova em que assenta um determinado facto, pelo que a afirmação 
 produzida, por V. Exa., de que 'Nunca antes, ..., suscitou o recorrente a 
 desconsideração nas decisões de mérito de 'factos provados por documentos ou por 
 confissão reduzida a escrito', vale o que vale;
 
 21. Por seu turno, é, também, inequívoco que a opção feita por esse Supremo 
 Tribunal de Justiça no sentido de mandar ampliar, como mandou, a matéria de 
 facto em nada pode afectar o Recorrente, sendo certo que tal solução até foi 
 requerida, pelo mesmo, a título subsidiário (cfr. pontos 3 e 4 supra);
 
 22. Com efeito, uma vez elaborado o quesito, depois de ter sido ordenada a 
 ampliação da matéria de facto, importava, isso, sim, que o tribunal tivesse 
 apreciado devidamente as provas, confrontando-as, fazendo prevalecer, no caso em 
 apreço, aquela que tem força probatória plena;
 
 23. Por tal não ter acontecido, ou seja, com base em erro notório na apreciação 
 das provas, foi interposta a presente revista, ao abrigo do n.º 2 do art. 722° 
 do CPC;
 
 24. Com efeito, não tivesse sido esquecida a matéria alegada, pelos 2°s RR., nos 
 n.ºs 1, 2 e 3 da sua contestação, assim como os documentos que a instruem, seja 
 pela 1 a, seja pela 2a instâncias e teria sido dado como provado o quesito 
 
 único;
 
 25. É que tal alegação, acompanhada dos referidos documentos, considerando que 
 não houve impugnação, constitui uma confissão judicial escrita, que, por ser 
 desfavorável aos confitentes (2°s RR., ora Recorridos), tem força probatória 
 plena contra os mesmos, nos termos dos n.ºs 1 e 2 do art. 358° do Código Civil;
 
 26. Trata-se de factos articulados e de documentos oferecidos pelos 2°s RR que 
 não foram impugnados, pelo que, por força do disposto nos arts. 264°, 515° e 
 
 664° do CPC, deviam ter sido tomados em consideração e devidamente apreciados 
 pelo tribunal e que, pura e simplesmente, o não foram (cfr. ponto 8 supra);
 
 27. Conforme consta do último parágrafo da decisão sobre a matéria de facto, o 
 próprio tribunal ainda divaga sobre a não existência daqueles documentos: 
 
 '...dos restantes documentos juntos aos autos não se retira qualquer declaração 
 confessória por parte dos RR. C. e D.' (sublinhado nosso);
 
 28. Em relação ao articulado pelos 2°s RR. nos n.ºs 1, 2 e 3 da contestação que 
 ofereceram, então, o tribunal, nem divagar, divaga. Esquece-se totalmente da 
 matéria ali articulada;
 
 29. Em suma, com base na aludida confissão judicial escrita e documental, a má 
 fé dos 2°s RR., ora Recorridos, resulta inevitavelmente provada;
 
 30. Por tudo o que antecede, não restam dúvidas que o recurso de revista 
 integra-se, pois, no n.º 2 do art. 722° do CPC, pelo que é admissível;
 
 31. E que, o seu fundamento radica em erro da decisão sobre a matéria de facto, 
 ao não ter tido em conta o alegado na contestação, assim como documentos juntos 
 
 à mesma;
 
 32. Do que se recorre é da decisão de considerar não provado o quesito em causa 
 
 - aliás, único;
 
 33. O que V. Exa. defende, salvo o devido respeito e melhor opinião, teria 
 cabimento se o recurso tivesse sido interposto sobre a aplicação do direito face 
 
 à matéria provada. Efectivamente, tendo sido definido, pelo STJ, o regime 
 jurídico aplicável, a decisão da Relação não admitiria recurso, como resulta do 
 disposto no art. 730° do CPC e, de resto, é facilmente compreensível - vide 
 Fernando Amâncio Ferreira, 'Manual dos Recursos em Processo Civil', 3ª Edição, 
 Revista, Actualizada e Ampliada, pág. 256. Mas não ... . O recurso, em questão, 
 
 é interposto sobre a decisão que recaiu quanto à matéria constante do aludido 
 quesito, razão pela qual o art. 730° do CPC não está em causa;
 
 34. Consequentemente, os arts. 722° e 730° do CPC, na interpretação que lhes é 
 dada por V. Exa., violam, nomeadamente, os princípios constitucionais da 
 confiança, ínsito no princípio do estado democrático e do acesso ao direito.
 Termos em que deve improceder a questão prévia da impossibilidade de 
 conhecimento do objecto do recurso de revista e, consequentemente, admitido, ao 
 abrigo do n.º 2 do art. 722° do CPC, seguindo-se os demais termos até final”.
 
  
 
 8. Por parte do Ex.mo Conselheiro Relator do processo no Supremo Tribunal de 
 Justiça foi, então, proferido despacho com o seguinte teor:
 
 “O A. Recorrente veio insistir na admissibilidade da revista com fundamento em 
 que o recurso foi interposto «com base em erro notório na apreciação das provas, 
 ao abrigo do n.º 2 do art. 722° do CPC», por ter «por ter sido esquecida a 
 matéria alegada pelos 2°s RR., nos n.º 1, 2 e 3 da sua contestação, assim como 
 os documentos que a instruem (...)», concluindo que o recurso «é interposto 
 sobre a decisão que recaiu quanto á matéria constante do aludido quesito (o 
 quesito aditado, em ampliação, para indagar da má fé), razão pela qual o art. 
 
 730° não está em causa».
 A objecção do Recorrente encontra resposta directa e, ao que se crê, clara e 
 completa, no ponto 3. do despacho parecer.
 Para evitar inúteis e fastidiosas repetições, remete-se para o que aí se deixou 
 escrito, dando-o aqui por reproduzido.
 Apesar disso, sempre se insiste na reafirmação de que, ao mandar ampliar a 
 matéria de facto, mediante a elaboração de quesito complementar, com sujeição à 
 produção de prova testemunhal, entenderam os Tribunais, e designadamente o STJ, 
 que o facto não estava confessado nem provado, quer nos articulados quer pelos 
 documentos juntos ao processo.
 De contrário, repete-se, ter-se-ia agido contra legem pois que não podem ser 
 elaborados quesitos sobre factos já provados por confissão ou documentalmente, 
 nem a eles dadas respostas (arts. 508°-A-l-e), 511°-1 e 646°-4 CPC). 
 Daí que, nessa perspectiva, se encontre vedada, por precludida, qualquer censura 
 ao juízo de necessidade de ampliação da matéria de facto pelas instâncias feito 
 pelo acórdão deste Supremo que fixou o direito aplicável.
 No mais, como expressamente se prevê no n.º 2 do art. 722°, o erro na apreciação 
 das provas e na fixação dos factos materiais da causa não pode ser objecto do 
 recurso de revista, sendo que, como conclui o Recorrente, o que está em causa é 
 apenas a resposta a um quesito ao qual, como nota a Relação ao apreciar o pedido 
 de alteração, foi produzida prova oralmente, sem que exista ou se indique 
 documento com força probatória plena ou não impugnado que imponha resposta 
 diversa.
 
 - Termos em que, em conformidade com o disposto nos arts.701°, 730°-1 e 2 e 
 
 700°- 1-e), todos do CPC, por inadmissibilidade do recurso, não se conhece do 
 seu objecto e se julga extinta a respectiva instância”.
 
  
 
 9. Novamente inconformado, o recorrente veio, ao abrigo do n.º 3 do artigo 700º 
 do Código de Processo Civil, requerer que sobre aquele despacho recaísse um 
 acórdão.
 
  
 
 10. Por parte do Supremo Tribunal de Justiça foi então proferido, em 19 de Abril 
 de 2005, acórdão com o seguinte teor:
 
 “[...] A decisão impugnada fundou-se na circunstância de o recurso de revista se 
 encontrar vedado pela norma do n.º 2 do art. 730° CPC, em virtude de, em 
 conformidade com o n.º l do mesmo preceito e n.º 3 do art. 729°, no anterior 
 acórdão, o STJ ter definido o direito aplicável consoante se apurasse a boa ou 
 má fé dos RR.- recorridos e ordenado a ampliação da matéria de facto para tal 
 apuramento.
 Insiste o Recorrente no facto de terem sido desconsiderados factos alegados e 
 confessados pelos RR., bem como outros resultantes de documentos juntos por 
 estes na contestação.
 Como já se deixou anteriormente dito, ao definir, como definiu, o regime 
 jurídico e ao mandar ampliar a matéria de facto mediante a elaboração de quesito 
 complementar, com a inerente sujeição prova testemunhal, entendeu o STJ que o 
 facto não estava confessado nem documentalmente provado.
 A actuação das Instâncias ficou, assim, limitada ao cumprimento do acórdão deste 
 Supremo e, para sempre, arredado novo recurso de revista.
 Consequentemente, e remetendo ainda para os mais desenvolvidos fundamentos 
 constantes do despacho reclamado, indefere-se a pretensão do Requerente e 
 mantém-se o nele decidido”.
 
  
 
 11. Desta decisão foi interposto recurso para este Tribunal, através de um 
 requerimento que tem o seguinte teor:
 
 “1. O presente recurso é interposto ao abrigo das disposições conjugadas da 
 alínea b) do n.º1 do art. 70° e dos nºs 1 e 2 do art. 75°- A, ambos da citada 
 Lei n° 28/82, de 15 de Novembro com a redacção introduzida pelas Leis nºs 85/89 
 e 13-A/98, de 7 de Setembro e 26 de Fevereiro, assim como da alínea b) do n.º1 
 do art. 280° da Constituição da República Portuguesa, de 2 de Abril de 1976, na 
 redacção que lhe foi dada pelas Leis Constitucionais n.ºs 1/82, de 30 de 
 Setembro, 1/89, de 8 de Julho, 1/92, de 25 de Novembro, 1/97, de 20 de Setembro, 
 
 1/2001, de 12 de Dezembro e 1/2004, de 24 de Julho;
 
 2. Em causa no presente recurso está, por um lado, a omissão de pronúncia do 
 Tribunal da Relação de Lisboa sobre matéria que, inequivocamente, lhe competia 
 apreciar, acrescida do não uso, pelo mesmo, da faculdade que lhe é conferida 
 pela alínea b) do n.º1 do art. 712° do Cód. de Processo Civil - e que se impunha 
 no caso sub judice -, por se traduzir numa clara violação do princípio da 
 confiança, ínsito nos princípios do Estado de direito democrático, para além do 
 princípio da segurança jurídica, inerente à função judicial, consagrados nos 
 arts. 2° e 9°, alínea b) da C.R.P.;
 
 3. E, por outro lado, os arts. 700°, n.º1, alínea c), 701°,704°,722°,729° e 
 
 730°, todos do C.P.C., na interpretação que lhes é dada na decisão recorrida, 
 por violar, também, o princípio da confiança, ínsito nos princípios do Estado de 
 direito democrático, bem como o do acesso ao direito, previsto no art. 20° da 
 C.R.P.;
 
 4. Ora, as referidas inconstitucionalidades foram suscitadas pelo Recorrente, 
 respectivamente, nas Alegações que produziu em sede de recurso de Revista, 
 entregues em 2004.05.10 - cfr. n.º 20 das respectivas Conclusões - e na sua 
 pronúncia, ao abrigo do n.º1 do art. 704° do Código de Processo Civil, 
 apresentada em 2005.01.31 vide n.º 34 da mesma;
 
 5. Aquilo que o Recorrente ataca é o tratamento (ou melhor, ausência de 
 tratamento) e interpretação dados, no Acórdão impugnado, aos referidos preceitos 
 legais;
 
 6. Por outras palavras, aquilo que o Recorrente pretende é ver apreciada a 
 constitucionalidade dos citados normativos legais, com base no tratamento e 
 interpretação conferidos aos mesmos na decisão recorrida;
 
 7. O presente recurso é viável, considerando que tem sido entendido doutrinária 
 e jurisprudencialmente que invocar a inconstitucionalidade de uma dada 
 interpretação de certa norma jurídica é invocar a inconstitucionalidade da 
 própria norma, nessa interpretação - só se fechando a via do recurso previsto na 
 alínea b ) do n.º1 do art. 70° da Lei 28/82 quando o mesmo tem por objecto a 
 impugnação da decisão propriamente dita (cfr. Acórdão n° 633/85, publicado no 
 DR, 2ª Série, de 24 de Abril de 1996, o qual remete ainda para os Acórdãos, no 
 mesmo sentido, n.ºs 102/84, publicado nos Acórdãos do Tribunal Constitucional, 
 
 4° Vol., págs. 293 e segs. e 388/87, 141/92, 228/94 e 612/94, publicados no DR, 
 
 2ª Série, de 15 de Dezembro de 1987, 21 de Agosto de 1992, 28 de Julho de 1994 e 
 
 11 de Janeiro de 1995, respectivamente, e para a doutrina, igualmente no mesmo 
 sentido, J. J. Gomes Canotilho e Vital Moreira em 'Fundamentos da Constituição', 
 Coimbra, 1991, pág. 258, J.M. Cardoso da Costa, na ' A Jurisdição Constitucional 
 em Portugal', 1992, pág. 50 e Armindo Ribeiro Mendes, em 'Recursos em Processo 
 Civil', 2ª ed., Lisboa, 1994, pág. 327);[...]”.
 
  
 
 12. Na sequência, foi proferida pelo Relator do processo neste Tribunal, ao 
 abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 78º-A da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, 
 na redacção que lhe foi dada pela Lei n.º 13-A/98, de 26 de Fevereiro, decisão 
 sumária no sentido do não conhecimento do objecto do recurso. É o seguinte, na 
 parte relevante, o seu teor:
 
 “12. Importa, antes de mais, decidir se pode conhecer-se do objecto do recurso, 
 uma vez que a decisão que o admitiu não vincula o Tribunal Constitucional (cfr. 
 art. 76º, n.º 3, da LTC).
 
 12.1. No ponto 2. do requerimento de interposição do recurso, peça processual 
 que delimita o respectivo objecto, começa o recorrente por referir que “em causa 
 
 [...] está, por um lado, a omissão de pronúncia do Tribunal da Relação de Lisboa 
 sobre a matéria que, inequivocamente, lhe competia apreciar, acrescida do não 
 uso, pelo mesmo, da faculdade que lhe é conferida pela alínea b) do n.º1 do art. 
 
 712° do Cód. de Processo Civil”, situação que, no seu entendimento, traduz uma 
 
 “clara violação do princípio da confiança, ínsito nos princípios do Estado de 
 direito democrático, para além do princípio da segurança jurídica, inerente à 
 função judicial, consagrados nos arts. 2º e 9º, alínea b) da CRP”.
 Como é, porém, patente e manifesto, tal afirmação não representa, sequer, a 
 colocação pelo recorrente de uma qualquer questão de constitucionalidade 
 normativa, mas, quando muito, de um problema de constitucionalidade de uma 
 decisão, que nem é, tão pouco, a recorrida. Com efeito, é a uma decisão – e não 
 a normas por esta aplicadas – que o recorrente imputa o vício de 
 constitucionalidade e, sendo assim, como claramente é, apenas há que concluir, 
 desde já, que não pode, neste ponto, conhecer-se do objecto do recurso. É que, 
 como o Tribunal tem sistematicamente afirmado, o recurso previsto na al. b) do 
 n.º 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional, visa submeter à 
 apreciação do Tribunal Constitucional a constitucionalidade de norma(s) 
 aplicada(s) pela decisão recorrida. É, por isso, jurisprudência pacífica e 
 sucessivamente reiterada que, estando em causa a própria decisão em si mesma 
 considerada, não há lugar ao recurso de fiscalização concreta de 
 constitucionalidade vigente em Portugal. 
 Em face do exposto, e sem necessidade de maiores considerações, torna-se 
 evidente que não pode, no que se refere à questão suscitada no ponto 2. do 
 requerimento de interposição do recurso, conhecer-se do objecto do recurso.
 
 12.2. Já no ponto 3. daquele  requerimento refere o recorrente pretender ver 
 apreciada a constitucionalidade dos artigos “700°, n.º 1, alínea c), 701°, 704°, 
 
 722°, 729° e 730°, todos do C.P.C., na interpretação que lhes é dada na decisão 
 recorrida”, por violar, também, o princípio da confiança, ínsito nos princípios 
 do Estado de direito democrático, bem como o do acesso ao direito, previsto no 
 art. 20° da C.R.P”. Esclarece, ainda, no ponto 4. do mesmo requerimento, que 
 teria suscitado a questão de constitucionalidade destes preceitos “em sede de 
 recurso de Revista, entregues em 2004.05.10 - cfr. n.º 20 das respectivas 
 Conclusões - e na sua pronúncia, ao abrigo do n.º1 do art. 704° do Código de 
 Processo Civil, apresentada em 2005.01.31 - vide n.º 34 da mesma”.
 A verdade, contudo, é que, compulsados os autos, designadamente nas partes 
 referidas pelo recorrente, verifica-se que não foi assim. Desde logo, nas 
 conclusões indicadas pelo recorrente, nunca este imputou qualquer questão de 
 constitucionalidade aos artigos 700°, n.º 1, alínea c), 701°, 704° e 729º do 
 Código de Processo Civil, bastando, para o demonstrar, recordar o teor daquelas 
 conclusões. Assim, na conclusão 20ª do recurso de revista entregue em 10 de Maio 
 de 2004, afirma: “Por fim, face à omissão de pronúncia do Tribunal da Relação 
 sobre matéria que, inequivocamente, lhe competia apreciar, acrescida do não uso, 
 pelo mesmo, da faculdade que lhe é conferida pela alínea b) do n.º1 do art. 712° 
 do Cód. de Processo Civil - e que se impunha no caso sub judice -, cumpre 
 suscitar a violação do princípio da confiança, ínsito nos princípios do Estado 
 de direito democrático, consagrados constitucionalmente”. Por sua vez, na 
 conclusão 34ª da sua pronúncia, ao abrigo do n.º1 do art. 704° do Código de 
 Processo Civil, diz: “Consequentemente, os arts. 722° e 730° do CPC, na 
 interpretação que lhes é dada por V. Exa., violam, nomeadamente, os princípios 
 constitucionais da confiança, ínsito no princípio do estado democrático e do 
 acesso ao direito”.
 Ora, como este Tribunal tem reiteradamente afirmado e resulta expressamente do 
 disposto no n.º 2 do artigo 72º da Lei n.º 28/82, o recurso previsto na alínea 
 b) do n.º 1 do artigo 70º daquele diploma, “só pode ser interposto pela parte 
 que haja suscitado a questão de constitucionalidade [...] perante o tribunal que 
 proferiu a decisão recorrida”, o que, manifestamente, no caso dos autos, não 
 aconteceu em relação aos artigos 700°, n.º 1, alínea c), 701°, 704° e 729º do 
 Código de Processo Civil. 
 Em face do exposto, apenas resta concluir que também não é possível, nesta 
 parte, conhecer do objecto do recurso.
 
 12.3. Resta, finalmente, verificar se pode conhecer-se do objecto do recurso, na 
 parte em que vem solicitada a apreciação da constitucionalidade dos artigos 722º 
 e 730º do Código de Processo Civil, “na interpretação que lhes é dada na decisão 
 recorrida”.
 
 É certo, como nota o recorrente, que este Tribunal tem, repetidamente, afirmado 
 que nada obsta a que seja questionada apenas uma certa interpretação ou dimensão 
 normativa de um determinado preceito. Porém, nesses casos, tem também sempre 
 acrescentado que recai sobre o recorrente o ónus de indicar (durante o processo 
 e no requerimento de interposição do recurso), de forma clara e perceptível, o 
 exacto sentido normativo do preceito que considera ser inconstitucional. Como se 
 disse, por exemplo, no Acórdão n.º 178/95 (Acórdãos do Tribunal Constitucional, 
 
 30º vol., p.1118.), e em inúmeros outros que o antecederam e se lhe seguiram, 
 
 “tendo a questão de constitucionalidade que ser suscitada de forma clara e 
 perceptível (cfr., entre outros, o Acórdão n.º 269/94, Diário da República, II 
 Série, de 18 de Junho de 1994), impõe-se que, quando se questiona apenas uma 
 certa interpretação de determinada norma legal, se indique esse sentido (essa 
 interpretação) em termos que, se este Tribunal o vier a julgar desconforme com a 
 Constituição, o possa enunciar na decisão que proferir, por forma a que o 
 tribunal recorrido que houver de reformar a sua decisão, os outros destinatários 
 daquela e os operadores jurídicos em geral, saibam qual o sentido da norma em 
 causa que não pode ser adoptado, por ser incompatível com a Lei Fundamental”.
 Verifica-se, porém, que nem no requerimento de interposição do recurso - onde se 
 limita a remeter para a “ interpretação que lhes é dada na decisão recorrida” - 
 nem, durante o processo, concretamente na conclusão 34ª supra referida, onde se 
 refere à “interpretação que lhes é dada por V. Exa.”, referindo-se ao despacho 
 do Conselheiro Relator do processo no Supremo Tribunal de Justiça - o recorrente 
 identifica, ao menos nos termos claros e perceptíveis que vêm sendo exigidos por 
 este Tribunal, e que supra já descrevemos, qual o exacto sentido normativo dos 
 artigos 722º e 730º do Código de Processo Civil que considera inconstitucional. 
 E daí que, não tendo sido colocada pelo recorrente, de modo processualmente 
 adequado, uma questão de constitucionalidade, em termos de o Supremo Tribunal de 
 Justiça dela estar obrigado a conhecer, este não tenha, sequer, sem que lhe 
 fosse imputada qualquer omissão de pronúncia, referido qualquer problema de 
 inconstitucionalidade.
 Ora, o não cumprimento daquele ónus obsta a que se possa, também nesta parte, 
 conhecer-se do objecto do recurso. Até porque a não identificação pelo 
 recorrente, de forma clara e perceptível, da exacta dimensão normativa dos 
 preceitos cuja constitucionalidade pretende ver apreciada, obsta a que o 
 Tribunal possa verificar se encontram preenchidos outros pressupostos de 
 admissibilidade do recurso que pretendeu interpor (o previsto na alínea b) do 
 n.º 1 do art. 70º da LTC), nomeadamente saber se a decisão recorrida utilizou, 
 como ratio decidendi, a precisa dimensão normativa cuja inconstitucionalidade o 
 recorrente pretende ver apreciada.
 
 12.4. Pelo exposto, sem necessidade de mais considerações, desnecessárias no 
 presente contexto, há que concluir que se não pode conhecer do recurso que o 
 recorrente pretendeu interpor para este Tribunal, por manifesta falta dos seus 
 pressupostos de admissibilidade.
 
 13. O que se acaba de concluir impede igualmente que o Tribunal se possa 
 pronunciar sobre um eventual carácter manifestamente infundado do recurso. Com 
 efeito, relacionando-se as questões de constitucionalidade que vêm colocadas com 
 uma determinada interpretação normativa - não claramente identificada - de 
 preceitos (os artigos 722º e 730º) que delimitam os termos em que é admissível 
 recurso de revista, por alegada violação do disposto no artigo 20º da 
 Constituição, cabe recordar que, sobre esta matéria (direito ao recurso em 
 processo civil), o Tribunal Constitucional tem reiteradamente afirmado (cfr., 
 por último o Acórdão n.º 302/05, desta 3ª secção), que, da garantia de acesso de 
 acesso ao direito e aos tribunais, consagrada no artigo 20º, n.º 1, da 
 Constituição, não decorre a garantia generalizada de um duplo grau de 
 jurisdição. E, seguramente, em caso algum, de um triplo. Como se ponderou, por 
 exemplo, no Acórdão n.º 261/2002 (todos os acórdãos citados estão disponíveis na 
 página Internet do Tribunal Constitucional em 
 http://www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/), reiterando anterior 
 jurisprudência deste Tribunal, designadamente a constante dos Acórdãos n.ºs 
 
 451/2002 e 202/99, este último tirado em plenário:
 
 “[...] O artigo 20º, n.º 1, da Constituição assegura a todos “o acesso ao 
 direito e aos tribunais para defesa dos seus direitos e interesses legalmente 
 protegidos, não podendo a justiça ser denegada por insuficiência de meios 
 económicos”. Tal direito consiste no direito a ver solucionados os conflitos, 
 segundo a lei aplicável, por um órgão que ofereça garantias de imparcialidade e 
 independência, e face ao qual as partes se encontrem em condições de plena 
 igualdade no que diz respeito à defesa dos respectivos pontos de vista 
 
 (designadamente sem que a insuficiência de meios económicos possa prejudicar tal 
 possibilidade). Ao fim e ao cabo, este direito é ele próprio uma garantia geral 
 de todos os restantes direitos e interesses legalmente protegidos. Mas terá de 
 ser assegurado em mais de um grau de jurisdição, incluindo-se nele também a 
 garantia de recurso? Ou bastará um grau de jurisdição?
 A Constituição não contém preceito expresso que consagre o direito ao recurso 
 para um outro tribunal, nem em processo administrativo, nem em processo civil; 
 e, em processo penal, só após a última revisão constitucional (constante da Lei 
 Constitucional n.º 1/97, de 20 de Setembro), passou a incluir, no artigo 32º, a 
 menção expressa ao recurso, incluído nas garantias de defesa, assim consagrando, 
 aliás, a jurisprudência constitucional anterior a esta revisão, e segundo a qual 
 a Constituição consagra o duplo grau de jurisdição em matéria penal, na medida 
 
 (mas só na medida) em que o direito ao recurso integra esse núcleo essencial das 
 garantias de defesa previstas naquele artigo 32º [...].
 Em relação aos restantes casos, todavia, o legislador apenas não poderá suprimir 
 ou inviabilizar globalmente a faculdade de recorrer”. [...]
 Como a Lei Fundamental prevê expressamente os tribunais de recurso, pode 
 concluir-se que o legislador está impedido de eliminar pura e simplesmente a 
 faculdade de recorrer em todo e qualquer caso, ou de a inviabilizar na prática. 
 Já não está, porém, impedido de regular, com larga margem de liberdade, a 
 existência dos recursos e a recorribilidade das decisões (cfr. os citados 
 Acórdãos n.º 31/87, 65/88, e ainda 178/88 (Acórdãos do Tribunal Constitucional, 
 vol. 12, pág. 569); sobre o direito à tutela jurisdicional, ainda Acórdãos n.º 
 
 359/86, (Acórdãos do Tribunal Constitucional, vol. 8, pág. 605), n.º 24/88, 
 
 (Acórdãos do Tribunal Constitucional, vol. 11, pág. 525), e n.º 450/89, 
 
 (Acórdãos do Tribunal Constitucional, vol. 13, pág. 1307). [...]”. (Sublinhados 
 aditados).
 A impossibilidade de conhecer do objecto do recurso, impede, porém, que se 
 decida sobre a eventual aplicabilidade desta jurisprudência à situação que é 
 objecto dos presentes autos.”
 
  
 
 13. É desta decisão que vem interposta, ao abrigo do disposto no art. 78º-A, n.º 
 
 3 da LTC, a presente reclamação para a Conferência, que o reclamante fundamenta 
 nos seguintes termos:
 
 “[...], Recorrente nos autos à margem identificados, notificado da douta decisão 
 sumária proferida, pelo Exmo. Juiz Conselheiro Relator, nos termos do n.º1 do 
 art. 78°-A da Lei n° 28/82, de 15 de Novembro (Lei sobre Organização, 
 Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional), na redacção introduzida 
 pela Lei n° 13-A/l98, de 26 de Fevereiro, vem reclamar para a conferência, ao 
 abrigo do n.º 3 do citado preceito legal, o que faz nos termos e com os 
 fundamentos seguintes:
 
 1. Reclama-se da decisão de não tomar conhecimento do recurso quando aí se 
 decide, como decide e com os seguintes fundamentos:
 
 - que a questão suscitada no ponto 2 do requerimento de interposição do recurso 
 traduz-se num problema de constitucionalidade de uma decisão e não numa questão 
 de constitucionalidade normativa;
 
 - que o Recorrente nunca imputou durante o processo e perante o tribunal que 
 proferiu a decisão recorrida qualquer questão de constitucionalidade em relação 
 aos arts. 700°, nº1, alínea c), 701°,704° e 729° do Código de Processo Civil; e
 
 - que, nem durante o processo nem no requerimento de interposição do recurso, o 
 Recorrente não identificou, nos termos claros e perceptíveis que vêm sendo 
 exigidos pelo Tribunal Constitucional, qual o exacto sentido ou interpretação, 
 dados na decisão recorrida, aos arts. 722° e 730° do citado Código e que 
 considera inconstitucional.
 
 2. Estabelece o art. 75°-A da citada Lei do Tribunal Constitucional, nos seus 
 nºs 1 e 2, quais os requisitos que devem ser satisfeitos, pelo Recorrente, no 
 requerimento de recurso interposto nomeadamente ao abrigo da alínea b) do n° 1 
 do art. 70° da mesma Lei, ou seja, o dos autos.
 Assim, para que o requerimento de interposição do referido recurso obtenha 
 deferimento, necessário se toma que sejam indicados, por um lado, a norma cuja 
 inconstitucionalidade ou ilegalidade se pretende que o tribunal aprecie, por 
 outro lado, aquela alínea do n° 1 do art. 70° e, por outro lado ainda, a norma 
 ou princípio constitucional ou legal que se considera violado, assim como a peça 
 processual em que o Recorrente suscitou a questão da inconstitucionalidade ou 
 ilegalidade.
 Ora, tudo elementos constantes, a propósito das questões suscitadas no n.° 2 do 
 requerimento, dos autos, de interposição do recurso, do respectivos nºs 1, 2 
 
 (naturalmente), 4, 1ª parte (até 'Conclusões', inclusive e daí o uso, nesse 
 número, do termo 'respectivamente') e 5 e 6.
 Concretizando, no n° 1 do aludido requerimento é mencionada expressamente a 
 alínea b) do n° 1 do art. 70° da Lei do Tribunal Constitucional, ao abrigo da 
 qual é interposto o recurso e no n° 2 - o qual transcrevemos na íntegra - que 
 
 'Em causa no presente recurso está, por um lado, a omissão de pronúncia do 
 Tribunal da Relação de Lisboa sobre matéria que, inequivocamente, lhe competia 
 apreciar, acrescida do não uso, pelo mesmo, da faculdade que lhe é conferida 
 pela alínea b) do n° 1 do art. 712° do Cód. Processo Civil- e que se impunha no 
 caso sub judice -, por se traduzir numa clara violação do princípio da 
 confiança, ínsito nos princípios do Estado de direito democrático, para além do 
 princípio da segurança jurídica, inerente à função judicial, consagrados nos 
 arts. 2° e 9°, alínea b) da C.R.P .', isto é, depois de devidamente compaginado 
 com os respectivos nºs 5 e 6, as normas cuja inconstitucionalidade se pretende 
 que esse tribunal aprecie - arts. 668°, n° 1, alínea d), 1ª parte e 712°, n° 1, 
 ambos do Código Civil -, bem como os princípios constitucionais considerados 
 violados e aquilo que o Recorrente, efectivamente, ataca - '... o tratamento (ou 
 melhor, a ausência de tratamento)' dado no douto Acórdão, de 2005.04.19, do 
 Supremo Tribunal de Justiça aos citados preceitos legais - ou pretende  '... 
 ver apreciada a constitucionalidade dos citados normativos legais, com base no 
 tratamento ... conferido(s) aos mesmos na decisão recorrida'.
 Por seu turno, no já referenciado excerto do n° 4 do requerimento de 
 interposição do recurso é mencionada a peça processual onde o Recorrente 
 suscitou a competente inconstitucionalidade, a saber: '... nas Alegações que 
 produziu em sede de recurso de Revista, entregues em 2004.05.10 - cfr. n° 20 das 
 respectivas Conclusões - . . .'.
 Aliás, não constando do requerimento de interposição do recurso a indicação de 
 algum dos requisitos exigidos pelo art. 75°-A, impende sobre o juiz, primeiro, 
 do tribunal recorrido e, depois, do Tribunal Constitucional mandar notificar o 
 Recorrente para facultar o elemento em falta, sob pena de o recurso, interposto, 
 ser então julgado deserto (n.ºs 5 a 7 do art. 75°-A da Lei do Tribunal 
 Constitucional).
 O que não aconteceu no caso vertente, nem podia ter acontecido, dada a total e 
 escrupulosa observância, pelo Recorrente - conforme teve oportunidade de 
 demonstrar supra -, do que lhe era exigido para efeito de interposição de 
 recurso, ao abrigo da alínea b) do n° 1 do art. 70° da LTC.
 Depois, salvo o devido respeito, falece razão à decisão reclamada quando nela é 
 referido que é a uma decisão e não a normas por esta aplicadas que o Recorrente 
 imputa o vício de constitucionalidade. Efectivamente, se é certo não poder 
 suscitar-se a questão da inconstitucionalidade da decisão, ou seja, do acto de 
 aplicação do direito mas sim da norma que nela haja sido aplicada, não é menos 
 certo que o conteúdo do n° 2 do requerimento de interposição do recurso, ao 
 explicitar que 'Em causa está. . . , por um lado, a omissão de pronúncia do 
 Tribunal da Relação de Lisboa sobre matéria que, inequivocamente, lhe competia 
 apreciar, acrescida do não uso, pelo mesmo, da faculdade que lhe é conferida 
 pela alínea b) do n° 1 do art. 712° do Cód. Processo Civil - e que se impunha no 
 caso sub judice -, por se traduzir numa clara violação do princípio da 
 confiança, ínsito nos princípios do Estado de direito democrático, para além do 
 princípio da segurança jurídica, inerente à função judicial, consagrados nos 
 arts. 2° e 9°, alínea b) da C.R.P .', não se reconduz à respectiva decisão 
 judicial mas, sim, a normas adjectivas que deviam ter sido observadas e não 
 foram, resultando, justamente, dessa inobservância a denunciada 
 inconstitucionalidade.
 
 É que, a questão da inconstitucionalidade tanto pode ser suscitada a propósito 
 da interpretação ou sentido dados, no caso concreto, a determinada norma, como, 
 também, no caso de determinada norma ter sido, pura e simplesmente, ignorada, 
 tal como aconteceu com os arts. 668°, n° 1, alínea b), 1 o parte e 712°, n° 1, 
 alínea b) ambos do C.P.C.
 Pelo que, salvo melhor opinião, tanto podemos ter na génese da 
 inconstitucionalidade uma incorrecta interpretação da norma, assim como a sua 
 desaplicação, sem mais.
 Nesta conformidade e, pelo menos, no que a esta parte diz respeito, deve 
 conhecer-se do objecto do recurso.
 
 3. No que diz respeito ao outro fundamento em que assentou a decisão reclamada 
 de o Recorrente não ter imputado durante o processo e perante o tribunal que 
 proferiu a decisão recorrida qualquer questão de constitucionalidade em relação 
 aos arts. 700°, n° 1, alínea c), 701°,704° e 729° do Código de Processo Civil, 
 cumpre remeter para o regime do já citado art. 75°-A da Lei do Tribunal 
 Constitucional, na medida em que, a existir a alegada falta de indicação da 
 respectiva peça processual porque é disso e só disso que se trata, já que estão 
 reunidos todos os outros requisitos, previstos na lei -, competia ao tribunal 
 ter convidado o Recorrente a sanar essa falta, sob pena de o recurso ser logo 
 julgado deserto.
 Ora, tratando-se, como se trata, da omissão de uma formalidade prescrita no n° 6 
 do art. 75°-A da LTC com influência indiscutível na decisão da causa, mais não 
 seja por nos encontrarmos já na última instância e não tendo tal formalidade 
 sido observada, compete arguir, pois, para os devidos efeitos, a competente 
 nulidade da decisão reclamada, nos termos dos arts. 201° e 203° do Cód. Processo 
 Civil.
 
 4. Chegados aqui, chegamos ao último dos fundamentos invocados na douta decisão 
 reclamada ao concluir não poder conhecer-se do recurso por, nem durante o 
 processo nem no requerimento de interposição do recurso, o Recorrente não ter 
 identificado, nos termos claros e perceptíveis que vêm sendo exigidos pelo 
 Tribunal Constitucional, qual o exacto sentido dado na decisão recorrida aos 
 arts. 722° e 730° do citado Código e que considera inconstitucional.
 Ora, mais uma vez sem qualquer razão, como se passa a demonstrar!
 Com efeito, no 'Breviário de Direito Processual Constitucional (Recurso de 
 Constitucionalidade). Jurisprudência. Doutrina. Formulário', da Coimbra Editora, 
 
 1997 e da autoria de Guilherme da Fonseca e Inês Domingos, respectivamente, Juiz 
 Conselheiro a Assessora do Tribunal Constitucional consta, da respectiva Nota 
 Prévia, que 'Não sendo de estranhar que, primordialmente, se dirija aos 
 advogados, profissionais de tais matérias ( e daí a inserção de um formulário e 
 exemplos de reclamação e alegações), espera-se, contudo, que o livro venha a 
 revelar-se útil a outros profissionais do foro que com tal matéria terão de 
 lidar', da nota de rodapé n° 65 que 'Na Secção IV deste Capítulo indica-se um 
 modelo possível de formulário de requerimento de interposição de recurso, ao 
 abrigo da alínea b) do n° 1 do art. 70° da LTC, por ser um dos vários tipos de 
 recurso previstos naquele artigo que é mais utilizado' e, de págs. 79, a 
 respectiva minuta de requerimento de interposição de recurso.
 Isto para dizer que, tendo sido vertidos, pelo Recorrente, no requerimento do 
 recurso que interpôs, ao abrigo da alínea b) do n° 1 do art. 70° da LTC, todos 
 os requisitos exigidos pelos n.ºs 1 e 2 do art. 75°A da LTC, concretamente, no 
 seu n° 1, a menção expressa àquela alínea, no n° 3 os arts. 722° e 730° do 
 Código de Processo Civil, como normas cuja constitucionalidade pretende ver 
 apreciada na interpretação dada pelo Acórdão recorrido, o princípio da 
 confiança, ínsito nos princípios do Estado de direito democrático, bem como o do 
 acesso ao direito, previsto no art. 20° da CRP , como os princípios 
 constitucionais considerados violados e, no n° 4, 2ª parte, o n° 34 da sua 
 pronúncia, oferecida ao abrigo do n° 1 do art. 704° do Cód. Processo Civil e 
 apresentada em 2005.01.31, como peça processual onde o Recorrente suscitou a 
 questão da respectiva inconstitucionalidade - repare-se, desta feita, que a 2ª 
 parte do n° 4 do requerimento de interposição reporta-se ao n° 3 do mesmo 
 requerimento, daí a utilização, ali, do termo 'respectivamente - e coincidindo, 
 na íntegra, o conteúdo daquele requerimento com o do Formulário/Exemplos, 
 constante de fls. 79 da citada obra, afigura-se, no mínimo, estranho vir, agora, 
 dizer-se na decisão reclamada que, também nesta parte, não pode conhecer-se do 
 objecto do recurso.
 E não se argumente que a referida obra, por ser de 1997, se encontra entretanto 
 ultrapassada, isto pela simples razão de que os Acórdãos n° 178/95 e 269/94, 
 dados como exemplos, na decisão reclamada, da obrigatoriedade de indicar, 
 durante o processo e no requerimento de interposição do recurso, de forma clara 
 e perceptível, o exacto sentido normativo do preceito considerado 
 inconstitucional, são de 1994 e 1995, portanto, anteriores àquela.
 De resto, a clareza e perceptibilidade exigidas fazem essencialmente sentido em 
 sede de Alegações pois é justamente a partir daí que o tribunal tem que enunciar 
 na decisão que proferir o sentido (interpretação) de determinada norma legal, 
 caso venha a julgá-lo desconforme com a Constituição, por forma a que o tribunal 
 recorrido que houver de reformar a sua decisão, os outros destinatários daquela 
 e os operadores jurídicos em geral saibam qual o sentido em causa que não pode 
 ser adoptado, por ser incompatível com a Lei Fundamental.
 
 É com as Alegações que importa estabelecer o alcance, condicionalismo e sentido 
 dado à norma porque só depois é que o tribunal irá decidir de mérito.
 De todo o modo, não é verdade que nas peças processuais da lavra do Recorrente 
 este não identifica, em termos claros e perceptíveis, qual o sentido normativo 
 dos arts. 722° e 730° do CPC que considera inconstitucional. Basta ler-se a 
 pronúncia que subscreveu ao abrigo do n° 1 do art. 704° do CPC e que ofereceu em 
 
 2005.01.31, assim como o requerimento que apresentou, em 2005.03.01, a requerer 
 que fosse proferido Acórdão, sendo que aquela é transcrita parcialmente na 
 decisão reclamada e este último objecto, aí, de uma mera referência - quiçá, a 
 mera referência àquele, aliada à transcrição dos dois despachos do Senhor Juiz 
 Conselheiro Relator do Supremo Tribunal de Justiça, de 2005.01.12 e 2005.02.10, 
 assim como do Acórdão entretanto proferido, em 2005.04.19, tenham contribuído 
 para o tribunal considerar o requerimento de interposição de recurso deficiente 
 
 ...
 Nesta medida, a decisão reclamada só pode ser substituída por outra que mande 
 conhecer o objecto do recurso, pelo menos, nesta parte.
 Sempre se acrescenta, no entanto, que mesmo que assim não se entenda - o que se 
 admite apenas por mera cautela e sem conceder -, a decisão reclamada enformaria 
 também, nesta parte, de nulidade.
 De facto, na eventualidade da falta de clareza e perceptibilidade exigíveis, 
 cabia igualmente aqui ao tribunal convidar o Recorrente para sanar o vício, nos 
 termos do art. 75°-A da LTC e nunca decidir, como decidiu, sem mais, pelo não 
 conhecimento do recurso. Tanto mais que a faculdade de que as partes dispunham, 
 nos termos do n° 1 do art. 78°-A, na redacção anterior à Lei n° 13-A/98, de 26 
 de Fevereiro, de modo a permitir que fosse suprida alguma deficiência na 
 interposição do recurso, perderam‑na.
 Termos em arguimos, também à cautela, mais esta nulidade, ao abrigo dos arts. 
 
 201° e 203° do CPC.
 Nestes termos, devem ser atendidas as arguidas nulidades, com as respectivas 
 consequências legais e/ou determinado o prosseguimento do recurso com a 
 notificação do Recorrente para produzir Alegações. [...]”
 
  
 Notificados os recorridos da presente reclamação, veio C. dizer que, “salvo 
 melhor opinião, carece em absoluto de fundamento o que vem alegado pelo A. 
 requerente, pelo que a sua pretensão deve ser indeferida.” Os restantes nada 
 disseram.
 
  
 Dispensados os vistos, cumpre decidir.
 
  
 
  
 III – Fundamentação
 
  
 
 14. Na decisão sumária reclamada concluiu-se no sentido da impossibilidade de 
 conhecer do objecto do recurso que o recorrente pretendeu interpor, por não 
 estarem cumulativamente reunidos, em relação a nenhuma das questões suscitadas 
 no respectivo requerimento de interposição, os pressupostos de admissibilidade 
 do mesmo. 
 
  
 Com a presente reclamação o reclamante vem contestar que assim seja. Porém, como 
 se verá já de seguida, sem qualquer razão.
 
  
 
 14.1. No ponto 2. do requerimento de interposição do recurso afirmava o 
 recorrente que: “em causa [...] está, por um lado, a omissão de pronúncia do 
 Tribunal da Relação de Lisboa sobre a matéria que, inequivocamente, lhe competia 
 apreciar, acrescida do não uso, pelo mesmo, da faculdade que lhe é conferida 
 pela alínea b) do n.º1 do art. 712° do Cód. de Processo Civil”, situação que, no 
 seu entendimento, traduziria uma “clara violação do princípio da confiança, 
 
 ínsito nos princípios do Estado de direito democrático, para além do princípio 
 da segurança jurídica, inerente à função judicial, consagrados nos arts. 2º e 
 
 9º, alínea b) da CRP”.
 
  
 Na decisão sumária reclamada considerou-se não estar ali colocada uma verdadeira 
 qualquer questão de constitucionalidade normativa, mas, quando muito, um 
 problema de constitucionalidade de uma decisão, o que, só por si, inviabiliza, 
 nesta parte, a admissibilidade do recurso.
 
  
 Contrapõe agora o reclamante que “o conteúdo do n.º 2 do requerimento de 
 interposição do recurso (…) não se reconduz à respectiva decisão judicial mas, 
 sim, a normas adjectivas que deviam ter sido observadas e não foram, resultando, 
 justamente, dessa inobservância a denunciada inconstitucionalidade”. E, 
 acrescenta ainda, a “inconstitucionalidade tanto pode ser suscitada a propósito 
 da interpretação ou sentido dados, no caso concreto, a determinada norma, como, 
 também, no caso de determinada norma ter sido, pura e simplesmente, ignorada, 
 tal como aconteceu com os arts. 668°, n° 1, alínea b), 1 o parte e 712°, n° 1, 
 alínea b) ambos do C.P.C. Pelo que, salvo melhor opinião, tanto podemos ter na 
 génese da inconstitucionalidade uma incorrecta interpretação da norma, assim 
 como a sua desaplicação, sem mais”.
 
  
 Mas, como a simples recordação do teor do ponto 2. do requerimento de 
 interposição do recurso traz à evidência, nada do que o reclamante agora alega 
 infirma a conclusão a que se chegou na decisão sumária reclamada e que 
 inviabilizou, nesta parte, o conhecimento do objecto do recurso. Com efeito, 
 ainda que fosse possível, num recurso interposto ao abrigo da alínea b) do n.º 1 
 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional, questionar a 
 constitucionalidade de normas alegadamente desaplicadas na decisão recorrida, é 
 efectivamente inquestionável que o recorrente não imputa ali, como agora alega, 
 a inconstitucionalidade a quaisquer normas adjectivas porventura desaplicadas – 
 ou a uma sua dimensão normativa – mas sim ao próprio acto de não aplicação, 
 i.e., à decisão judicial que, alegadamente, as não terá aplicado. Ora, sendo 
 assim, como efectivamente é, evidente se torna que, pelas razões já constantes 
 da decisão reclamada e que agora se reiteram, não podia efectivamente, nesta 
 parte, conhecer-se do objecto do recurso.
 
  
 
 14.2. Pretendia ainda o recorrente, nos termos do ponto 3. do requerimento de 
 interposição do recurso, ver apreciada a constitucionalidade dos artigos “700°, 
 n.º 1, alínea c), 701°, 704°, 722°, 729° e 730°, todos do C.P.C., na 
 interpretação que lhes é dada na decisão recorrida”, por violar, também, o 
 princípio da confiança, ínsito nos princípios do Estado de direito democrático, 
 bem como o do acesso ao direito, previsto no art. 20° da C.R.P”, esclarecendo, 
 no ponto 4. do mesmo requerimento, que teria suscitado a questão de 
 constitucionalidade destes preceitos “em sede de recurso de Revista, entregues 
 em 2004.05.10 - cfr. n.º 20 das respectivas Conclusões - e na sua pronúncia, ao 
 abrigo do n.º1 do art. 704° do Código de Processo Civil, apresentada em 
 
 2005.01.31 - vide n.º 34 da mesma”.
 
  
 Também nesta parte se concluiu na decisão sumária reclamada pela impossibilidade 
 de conhecer do objecto do recurso, agora com o fundamento, como então se 
 demonstrou, de o recorrente nunca ter suscitado, perante o tribunal que proferiu 
 a decisão recorrida, designadamente nas peças processuais por si indicadas, como 
 exige expressamente o artigo 72º, n.º 2, da LTC, qualquer questão de 
 constitucionalidade relativa aos artigos 700°, n.º 1, alínea c), 701°, 704° e 
 
 729º do Código de Processo Civil.
 
  
 O reclamante, sem contestar verdadeiramente esta conclusão, alega no entanto 
 que, termos do artigo 75º-A, n.º 6, da LTC “a existir a alegada falta de 
 indicação da respectiva peça processual - porque é disso e só disso que se 
 trata, já que estão reunidos todos os outros requisitos, previstos na lei -, 
 competia ao tribunal ter convidado o Recorrente a sanar essa falta, sob pena de 
 o recurso ser logo julgado deserto”, concluindo, a final, pela nulidade da 
 decisão reclamada, por omissão da formalidade prevista naquele artigo 75º-A, n.º 
 
 6, da LTC.
 
  
 Mas uma vez, porém, não tem qualquer razão.
 
  
 Com efeito, o convite previsto no n.º 6 do artigo 75º-A da LTC, como aliás 
 ressalta da jurisprudência deste Tribunal, nomeadamente dos acórdãos n.º 
 
 296/2004 e 205/05 (já disponíveis na página Internet do Tribunal Constitucional, 
 no endereço http://www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/), visa permitir 
 que um recorrente de boa fé, não tendo dado cumprimento, desde logo, como devia, 
 
 à exigência, contida no artigo 75º-A da LTC, de indicação dos elementos 
 previstos nos n.ºs 1 a 4 do mesmo artigo, venha suprir tal falta. Ponto 
 essencial, como facilmente se compreenderá, é, portanto, que se verifique a 
 situação prevista no n.º 5 do referido artigo 75º-A; isto é, que o requerimento 
 de recurso não indique algum dos elementos previstos no presente artigo. Ora, 
 como é patente, não é essa a situação dos autos. Com efeito, o recurso foi 
 interposto por meio de requerimento, no qual o ora reclamante indicou 
 expressamente as peças processuais onde teria alegadamente suscitado as questões 
 de constitucionalidade que pretendia ver apreciadas – cfr., ponto 4. do 
 requerimento de interposição do recurso. Não se trata, pois, de uma omissão de 
 indicação no requerimento de interposição do recurso das peças processuais onde 
 a questão de constitucionalidade teria sido suscitada, mas antes da constatação 
 de que, nessas peças processuais, designadamente nas partes indicadas pelo 
 recorrente, este não suscitou, ao contrário do que alegou, as questões de 
 constitucionalidade em causa.
 
  
 Em suma: a ratio decidendi da decisão reclamada não se encontra num vício do 
 requerimento de interposição do recurso, susceptível de ser corrigido na 
 sequência de um despacho de aperfeiçoamento, mas na falta de um pressuposto 
 processual de admissibilidade do recurso - a não suscitação, perante o tribunal 
 que proferiu a decisão recorrida, das questões de constitucionalidade que 
 pretendia ver apreciadas - logicamente insusceptível de ser ultrapassada por um 
 eventual aperfeiçoamento daquele requerimento.
 
  
 Não existe, assim, qualquer nulidade, continuando a ser evidente que, pelas 
 razões também constantes da decisão reclamada e que agora se reiteram, não 
 podia, igualmente nesta parte, conhecer-se do objecto do recurso.
 
  
 
 14.3. Finalmente, pretendia ainda o recorrente ver apreciada a 
 constitucionalidade dos artigos 722º e 730º do Código de Processo Civil, “na 
 interpretação que lhes é dada na decisão recorrida”. Esta pretensão foi 
 rejeitada pela decisão sumária reclamada com fundamento em que, durante o 
 processo, designadamente nas peça processuais indicadas pelo recorrente, o mesmo 
 não teria identificado, nos termos claros e perceptíveis que vêm sendo exigidos 
 por este Tribunal, a concreta interpretação normativa desses artigos do Código 
 de Processo Civil que pretendia ver apreciada, limitando-se sistematicamente a 
 remeter para a interpretação que lhe teria sido dada pela decisão recorrida.
 
  
 Para contestar esta conclusão o reclamante começa por invocar em sua defesa o 
 Breviário de Direito Processual Constitucional. Recurso de Constitucionalidade. 
 Jurisprudência. Doutrina. Formulário, de Guilherme da Fonseca e Inês Domingos. 
 Alega, em síntese, que se terá limitado a seguir o “modelo” de requerimento de 
 interposição do recurso constante da pág. 79 desse Breviário, que, no seu 
 entendimento, sugere a suficiência da remissão para “a interpretação com que [a 
 norma] foi aplicada pela decisão recorrida”. Esta invocação, porém, é 
 absolutamente improcedente.
 
  
 Mesmo abstraindo do facto de que uma obra doutrinária não é fonte de direito, a 
 verdade é que, mais uma vez, o ora reclamante confunde um vício do requerimento 
 de interposição do recurso com a falta de um pressuposto de admissibilidade do 
 mesmo, previsto no artigo 72º, n.º 2, da LTC. Reitera-se, por isso, que também 
 aqui a ratio decidendi não foi a falta de indicação no requerimento de 
 interposição do recurso da exacta interpretação normativa cuja 
 inconstitucionalidade o recorrente pretendia ver apreciada, mas a omissão de o 
 fazer perante o tribunal que proferiu a decisão recorrida.
 
  
 De qualquer forma, sempre se esclarece que, quando pretenda questionar apenas 
 uma determinada interpretação normativa de um preceito, o recorrente deve, 
 também no requerimento de interposição do recurso, indicar claramente essa 
 interpretação normativa. Isso mesmo tem sido reiterado pela jurisprudência 
 constitucional em inúmeras decisões e está também hoje já claro na 2ª ed. do 
 Breviário citado, publicada em 2002 (cfr. p. 101, nota 116). Há, por isso, neste 
 caso, também um vício do requerimento. Não obstante, não há, neste caso, lugar 
 ao convite a que se refere o artigo 75º-A, n.º 6, da LTC. É que, como se 
 recordou por último no Acórdão n.º 205/05, já citado, “o convite só será 
 efectuado no pressuposto de que tal suprimento é essencial para que se possa 
 decidir sobre o conhecimento do recurso, não devendo nem podendo ser utilizado 
 quando, nos termos do artigo 137º do Código de Processo Civil, configure um acto 
 inútil”. Ora, é precisamente o que ocorre nos presentes autos, uma vez que, como 
 já se evidenciou, faltando o pressuposto de admissibilidade do recurso exigido 
 constante do artigo 72º, n.º 2, da LTC, a superação do vício do requerimento não 
 poderia, manifestamente, levar a decisão diversa quanto à admissibilidade do 
 recurso.
 
  
 Alega ainda o recorrente que “a clareza e perceptibilidade exigidas fazem 
 essencialmente sentido em sede de Alegações”. Mais uma vez, porém, sem razão. 
 Não só porque essa clareza e perceptibilidade são essenciais para delimitar o 
 objecto do recurso interposto – que é função do requerimento de interposição do 
 mesmo, e não das alegações –, mas também porque tal clareza e perceptibilidade 
 são condição imprescindível da possibilidade de averiguar se os demais 
 pressupostos de admissibilidade do recurso estão reunidos, designadamente o de 
 saber se a norma em causa em causa foi efectivamente aplicada pela decisão 
 recorrida com o sentido que lhe imputa o recorrente.
 
  
 Alega, finalmente, que, de qualquer modo “não é verdade que nas peças 
 processuais da lavra do Recorrente este não identifica, em termos claros e 
 perceptíveis, qual o sentido normativo dos arts. 722° e 730° do CPC que 
 considera inconstitucional”, reiterando ainda que “na eventualidade da falta de 
 clareza e perceptibilidade exigíveis, cabia igualmente aqui ao tribunal convidar 
 o Recorrente para sanar o vício, nos termos do art. 75°-A da LTC e nunca 
 decidir, como decidiu, sem mais, pelo não conhecimento do recurso”. As questões 
 que, nesta parte, o reclamante coloca, já estão, contudo, suficientemente 
 respondidas. A primeira, na decisão sumária reclamada, onde - em termos que, por 
 merecerem a nossa inteira concordância, agora se reiteram - se evidenciou que o 
 recorrente nunca confrontou o Supremo Tribunal de Justiça com a questão da 
 inconstitucionalidade de uma perfeitamente identificada interpretação normativa 
 dos artigos 722º e 730º do Código de Processo Civil – o que, como então já se 
 disse, levou mesmo a que aquele Tribunal se não tivesse pronunciado sobre 
 qualquer questão de constitucionalidade reportada àqueles preceitos, sem que o 
 ora reclamante tenha invocado qualquer omissão de pronúncia. A segunda - mais 
 uma vez, a da alegada nulidade por omissão da formalidade prevista no artigo 
 
 75º-A, n.º 6, da LTC – na fundamentação supra, onde, por duas vezes, se concluiu 
 pela improcedência da alegação.
 
  
 Assim sendo, não existindo quaisquer nulidades e improcedendo na totalidade a 
 argumentação do reclamante, há que concluir pela improcedência da reclamação.
 
  
 
  
 III - Decisão
 
  
 Nestes termos, decide-se indeferir a presente reclamação e, em consequência, 
 confirmar a decisão reclamada no sentido do não conhecimento do objecto do 
 recurso.
 Sem custas.
 
  
 Lisboa, 25 de Outubro de 2005
 
  
 Gil Galvão
 Bravo Serra
 Artur Maurício