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Processo n.º 807/05
 Plenário
 Relatora: Conselheira Maria João Antunes
 
  
 
                                                      
 
  
 Acordam, em plenário, no Tribunal Constitucional
 
  
 
  
 
 1. Manuel Matos Gandarez, na qualidade de mandatário da candidatura do Partido 
 Socialista às eleições autárquicas em Oliveira do Hospital apresentou recurso 
 contencioso das irregularidades ocorridas no decurso da votação e nos 
 consequentes apuramentos, com os seguintes fundamentos:
 
  
 
 «I) Um voto no Partido Socialista foi considerado nulo pela mesa de apuramento 
 local, da freguesia de santa Ovaia, concelho de Oliveira do Hospital;
 II) Número de boletins de voto para um dos órgãos autárquicos (Assembleia de 
 Freguesia) ser de 466 e votantes apurados ser de 465».
 
  
 Concluiu pedindo que seja “declarado válido o voto que a Assembleia de 
 apuramento local considerou nulo e ao qual a Assembleia de Apuramento Geral não 
 se pronunciou” e que seja “declarada a ilegalidade pela existência de um voto a 
 mais entre o número de boletins de voto e o número de votantes apurados para a 
 Assembleia de Freguesia e já não também para a Câmara Municipal e Assembleia 
 Municipal (onde ambos os números coincidiram) sendo que daí resultou uma 
 influência no resultado geral da eleição daquele órgão autárquico”.
 Juntou certidão da acta da reunião da Assembleia de Apuramento Geral dos 
 resultados da eleição dos órgãos das autarquias locais do município de Oliveira 
 do Hospital.
 
  
 
 2. Notificados os representantes dos partidos políticos, coligações e grupos de 
 cidadãos intervenientes na eleição, nos termos e para os efeitos previstos no 
 n.º 3 do artigo 159.º da Lei Orgânica n.º 1/2001, de 14 de Agosto, respondeu 
 apenas o PPD/PSD – Partido Social Democrata, que refere que as “decisões 
 deliberadas em Assembleia de Apuramento Geral são de considerar” e conclui que 
 se considera feita justiça sobre este acto eleitoral.
 
  
 
 3. O Tribunal requisitou, em 17 de Outubro, cópia do edital que publicou os 
 resultados do apuramento geral da eleição dos órgãos das autarquias locais do 
 Município de Oliveira do Hospital, a qual foi junta aos autos em 18 de Outubro. 
 Analisado o respectivo teor, verifica-se que o referido edital foi afixado no 
 dia 13 de Outubro de 2005.
 
  
 
 4. Nos termos do disposto no artigo 158.º da Lei Orgânica n.º 1/2001, “o recurso 
 contencioso é interposto perante o Tribunal Constitucional no dia seguinte ao da 
 afixação do edital contendo os resultados do apuramento”. Por seu turno, o n.º 2 
 do artigo 229.º da mesma Lei estabelece que “quando qualquer acto processual 
 previsto na presente lei envolva a intervenção de entidades ou serviços 
 públicos, o termo dos prazos respectivos considera-se referido ao termo do 
 horário normal dos competentes serviços ou repartições”.
 No caso vertente, sendo certo que o edital foi afixado no dia 13 de Outubro, o 
 recurso veio a dar entrada neste Tribunal, por telecópia, entre as 16h21 e as 
 
 16h25 do dia 14 de Outubro, sendo registado no livro de entradas apenas no dia 
 
 17 corrente (segunda-feira).
 Segundo jurisprudência deste Tribunal (assim, Acórdãos nºs 540/05, 542/05 e 
 
 543/05, ainda inéditos), neste tipo de recursos, ainda que os mesmos possam ser 
 interpostos via telecópia, esta não pode deixar de dar entrada no Tribunal até 
 ao “termo do horário normal” da secretaria judicial, do dia seguinte à afixação 
 do edital (ou seja, até às 16h00 – artigo 122.º, n.ºs 1 e 3 da Lei n.º 3/99, de 
 
 13 de Janeiro –, in casu, do dia 14 de Outubro).
 Importa, pois, concluir que o recurso é extemporâneo, o que impõe o seu não 
 conhecimento.
 
  
 
 5. Pelo exposto, decide-se não tomar conhecimento do recurso.
 
  
 Lisboa, 20 de Outubro de 2005
 
  
 Maria João Antunes
 Vítor Gomes
 Benjamim Rodrigues
 Gil Galvão
 Bravo Serra
 Paulo Mota Pinto
 Maria Fernanda Palma (vencida, seguindo no essencial a orientação
 do Acórdão n.º  414/2004).
 Mário José de Araújo Torres (Vencido, nos termos da declaração de
 voto junta)
 Rui Manuel Moura Ramos
 
  
 
  
 
  
 
  
 DECLARAÇÃO DE VOTO
 
  
 
                         Não votei o não conhecimento do recurso com fundamento 
 na extemporaneidade da sua interposição, pois entendo que o recurso foi 
 tempestivamente apresentado, por razões similares às expostas nos votos de 
 vencido que apus aos Acórdãos n.ºs 414/2004, 540/2005, 542/2005, 543/2005 e 
 
 550/2005.
 
                         Na verdade, nos termos do artigo 158.º da Lei que regula 
 a eleição dos titulares dos órgãos das autarquias locais, aprovada pela Lei 
 Orgânica n.º 1/2001, de 14 de Agosto (doravante designada por LEOAL), o recurso 
 contencioso tendo por objecto as irregularidades ocorridas no decurso da votação 
 e no apuramento local ou geral ou as decisões sobre as reclamações, protestos 
 ou contraprotestos apresentados contra essas irregularidades “é interposto 
 perante o Tribunal Constitucional no dia seguinte ao da afixação do edital 
 contendo os resultados do apuramento”. Trata‑se, assim, do prazo de um dia (e 
 não de 24 horas), a contar da data da afixação do edital contendo os resultados 
 do apuramento geral. No cômputo dos prazos são aplicáveis, salvo disposição 
 especial, as regras do artigo 279.º do Código Civil, das quais deriva que nessa 
 contagem não se inclui o dia em que ocorrer o evento a partir do qual o prazo 
 começa a correr e que o prazo termina às 24 horas do último dia do prazo 
 
 (alíneas b) e c) desse preceito, sendo entendimento corrente o de que a regra 
 desta última alínea também se aplica aos prazos fixados em dias). Isto é: o 
 prazo de um dia para a interposição do recurso para o Tribunal Constitucional 
 começa a correr no início do dia seguinte ao do da afixação do edital e termina 
 
 às 24 horas desse dia.
 
                         Entendeu‑se, porém, no precedente acórdão que ao caso 
 era aplicável a regra do n.º 2 do artigo 229.º da LEOAL, nos termos do qual: 
 
 “Quando qualquer acto processual previsto na presente lei envolva a intervenção 
 de entidades ou serviços públicos, o termo dos prazos respectivos considera‑se 
 referido ao termo do horário normal dos competentes serviços ou repartições”.
 
                         A formulação literal do preceito – que não utiliza as 
 fórmulas habituais de o acto ter de ser praticado em juízo (alínea e) do artigo 
 
 279.º do Código Civil) ou perante o serviço público (alínea c) do n.º 1 do 
 artigo 72.º do Código do Procedimento Administrativo – CPA) –, ao aludir 
 explicitamente à circunstância de o acto em causa implicar o envolvimento de 
 entidades ou serviços públicos através de uma intervenção dessas entidades ou 
 serviços, logo inculca que se pretendeu contemplar as situações em que a prática 
 do acto determina o desenvolvimento de uma actividade desses entes públicos, e 
 não já os casos em que os serviços funcionam como mera instância de recepção 
 de documentos. Daqui deriva, pois, a não aplicabilidade da regra do citado 
 artigo 229.º, n.º 2, ao presente caso.
 
                         Sendo “aplicável ao contencioso da votação e do 
 apuramento o disposto no Código de Processo Civil”, como expressamente dispõe o 
 n.º 5 do artigo 159.º da LEOAL, é, hoje em dia, inequívoco não só que “as partes 
 podem praticar os actos processuais através de telecópia ou por correio 
 electrónico, em qualquer dia e independentemente da hora da abertura e do 
 encerramento dos tribunais” (artigo 143.º, n.º 4, do Código de Processo Civil 
 
 (CPC), aditado pelo Decreto‑Lei n.º 183/2000, de 10 de Agosto), como também que 
 quando o acto é praticado por “envio através de telecópia, [vale] como data da 
 prática do acto processual a da expedição” (artigo 150.º, n.º 1, alínea c), do 
 CPC, na redacção do Decreto‑Lei n.º 324/2003, de 27 de Dezembro).
 
                         Em face do exposto, terminando às 24 horas do dia 14 de 
 Outubro de 2004 o prazo de interposição de recurso para o Tribunal 
 Constitucional e sendo incontroversa a admissibilidade do envio por telecópia 
 da respectiva petição, independentemente do “horário de funcionamento” do 
 serviço destinatário, o envio efectuado entre as 16h21 e as 16h25 desse dia 14 
 de Outubro não pode deixar de ser considerado como tempestivo, sendo inaplicável 
 a regra do artigo 229.º, n.º 2, da LEOAL, por o acto praticado não “envolver a 
 intervenção” (na acepção atrás assinalada) de entidades ou serviços públicos, 
 mas a mera recepção, por qualquer meio, de um documento transmissível por 
 telecópia, recepção essa que não exige a presença física de qualquer 
 funcionário.
 
                         O prazo de um dia é, por definição, sempre superior ao 
 prazo de 24 horas, pois despreza o tempo decorrido no dia em que ocorreu o 
 evento que desencadeia o início do prazo e termina às 24 horas do dia seguinte. 
 A tese que fez vencimento – considerando que o prazo termina às 16 horas desse 
 dia – tem o efeito (a meu ver inadmissível) de poder transformar um prazo de um 
 dia em prazo inferior a 24 horas, o que ocorrerá sempre que o edital contendo os 
 resultados do apuramento geral seja afixado depois das 16 horas (no caso dos 
 presentes autos, não consta a hora de afixação do edital, mas resulta da acta da 
 assembleia de apuramento geral que esta terminou às 19h00 de 13 de Outubro de 
 
 2005).
 
                         Entendendo que o fundamento da extemporaneidade não era 
 idóneo a fundar o não conhecimento do recurso, resta-me constatar que o processo 
 não contém ainda os elementos necessários para poder, em consciência, tomar 
 posição quer quanto à eventual existência de outros obstáculos a esse 
 conhecimento, quer quanto ao mérito do recurso.
 
  
 Mário José de Araújo Torres