 Imprimir acórdão
 Imprimir acórdão   
			
Processo n.º 820/05 
 
 1.ª Secção
 Relator: Conselheiro Pamplona de Oliveira
 
  
 
  
 
  
 ACORDAM NO TRIBUNAL CONSTITUCIONAL
 
  
 
  
 
  
 
 1.    MARIA ODETE TEIXEIRA SEGURO SANCHES ALEXANDRE, mandatária da lista de 
 candidatos do Partido Socialista aos órgãos autárquicos de Almada para as 
 eleições de 9 de Outubro de 2005, recorre para este Tribunal nos seguintes 
 termos: 
 
  
 Venerandos Juizes Conselheiros,
 
  
 O Partido Socialista aqui apresentado por Maria Odete Teixeira Seguro Sanches 
 Alexandre, mandatária da lista de candidatos do Partido Socialista dos Órgãos 
 Autárquicos de Almada, residente na Rua Trindade Coelho, n.º 6-1° Esq., 2800-297 
 Almada, VEM interpor recurso da decisão da Assembleia de apuramento Geral, nos 
 termos e com os seguintes fundamentos:
 I. Legitimidade e tempestividade do recurso:
 A aqui recorrente é mandatária do Partido Socialista para o processo eleitoral, 
 conforme procuração junta ao respectivo processo eleitoral. Foi, além disso, 
 candidata nas listas à Assembleia da Municipal e à Assembleia de Freguesia de 
 Cacilhas, conforme consta da acta de apuramento geral aos respectivos órgãos que 
 aqui se dá como reproduzido.
 O edital da Acta foi afixado às 14 horas do dia 17 de Outubro de 2005, tendo a 
 acta definitiva, solicitada pelo Partido socialista sido entregue pelas 10.30 
 horas do dia 18 do corrente, na sequência da cópia não assinada, facultada no 
 dia 17 e para a qual remetemos as indicações da presente fundamentação.
 II. Fundamentação de facto e de direito
 
 1. Constituição da assembleia de Apuramento Geral
 A constituição da Mesa de Apuramento Geral é claramente ilegal porque violou o 
 preceituado no artigo 142°, alínea d) da lei Orgânica o n.º 1/2001 de 14 de 
 Agosto. Ou seja, não houve sorteio dos elementos - quatro presidentes de mesa 
 que integram a Assembleia Geral de Apuramento. Estes foram apenas designados 
 pela Presidente da Câmara Municipal de Almada e Candidata da CDU que, 
 presume-se, os terá indicado ao ilustre Presidente da Assembleia de Apuramento, 
 sem a precedência de qualquer sorteio e sem a convocação dos diferentes 
 mandatários das forças políticas, concorrentes às eleições.
 Quanto à constituição da mesa, o Bloco de Esquerda apresentou o seu protesto, 
 doc. (G), anexo à acta e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido e o 
 Partido Socialista apresentou, igualmente, em devido tempo, o seu protesto, doc. 
 
 (K) anexo à Acta cujo teor se dá aqui por inteiramente reproduzido.
 A constituição imparcial e plural da assembleia de apuramento Geral é uma das 
 garantias de isenção e imparcialidade que se exige em todo o processo eleitoral. 
 Estando, deste modo, essa imparcialidade em causa por se indicarem quatro 
 presidentes de mesa todos afectos à mesma força política.
 Ora, os quatro presidentes de mesa devem ser designados por sorteio, o que neste 
 caso manifestamente não aconteceu.
 
 2. O edital de constituição da Mesa não tem data nem hora
 A falta de transparência é evidente quando nos confrontamos com um edital de que 
 o Partido Socialista, constatou na Assembleia Geral de Apuramento, cujo teor se 
 dá aqui por integralmente reproduzido, o qual publicita os elementos da mesa, 
 sem indicação da data e hora, contrariamente ao estatuído na Lei Eleitoral.
 
 3. Afixação dos Editais
 O Partido Socialista constatou Editais que não foram colocadas no Edifício onde 
 funcionou a Assembleia de Voto. Estes factos ocorreram em todas as Assembleias 
 de voto da Escola Conde Ferreira, em Almada e na Costa da Caparica (em todas as 
 mesas de voto) o que contraria o instituído na Lei n.º1/2001, 14 de Agosto, art. 
 
 135º.
 
 4. Envelopes Abertos
 O Ilustre Presidente da Assembleia de Apuramento Geral procedeu a uma triagem 
 dos materiais das 156 mesas de voto efectuando correcções de colocação de 
 documentos, sem deixar lavrado documento das referidas operações (anexo B) junto 
 
 à Acta cujo teor se dá aqui para inteiramente reproduzido, procedendo, 
 posteriormente, ao seu fecho.
 Porém, acontece que muitos envelopes, documentados no anexo à Acta, (doc. 
 constante da última pagina dos anexos), refere a existência de envelopes sem 
 lacre ou com o mesmo violado, sem actas, sem votos nulos, o que só por si 
 deveria dar origem a uma recontagem de todos os votos e que mais tarde, após 
 busca nas instalações da Câmara Municipal, viriam a ser encontrados. Estes 
 factos vêm profusamente documentados na Acta de Apuramento geral.
 Apesar disso, a Assembleia de Apuramento Geral entendeu não dever efectuar a 
 recontagem de todos os votos dos envelopes abertos, considerando o Ilustre 
 Presidente da assembleia de Apuramento não estar perante factos ilícitos muito 
 graves, limitando-se a dar-lhes uma conotação meramente política, quando na 
 realidade, se podem ter violado, de forma grave, preceitos da Lei Eleitoral.
 
 5. Enumeração exemplificativa de factos detectados ao longo dos trabalhos de 
 Apuramento Eleitoral Geral e que o P.S. tempestivamente protestou, como 
 abundantemente decorre da acta de Apuramento geral que se junta e dá por 
 reproduzida:
 a) As actas de votação e apuramento que não estavam dentro dos envelopes:
 
 - Mesa: 10 - Charneca
 
 - Mesa 9 - Costa da Caparica
 
 - Mesa 10 - Costa da Caparica
 Aparecem posteriormente noutros locais, não concretizados, alguns em 
 departamentos da Câmara que não estavam afectos à Assembleia Geral de 
 Apuramento.
 b) Votos nulos que não se encontravam dentro de envelopes e que foram 
 posteriormente encontrados em locais sem qualquer explicação credível:
 
 - Mesa 6 - da freguesia de Caparica
 
 - Mesa 11 - da freguesia de Caparica 
 
 - Mesa 16 - da freguesia de Caparica
 
 - Mesa 3 - da freguesia da Charneca de Caparica 
 
 - Mesa 4 - da freguesia da Charneca de Caparica 
 
 - Mesa 10 - da freguesia da Charneca de Caparica 
 
 - Mesa 13 - da freguesia da Charneca de Caparica
 
 - Mesa 3 - da freguesia da Costa da Caparica
 
 - Mesa 5 - da freguesia da Costa da Caparica
 
 - Mesa 9 - da freguesia da Costa da Caparica
 
 - Mesa 8 - da freguesia da Cova da Piedade
 
 - Mesa 14 - da freguesia da Cova da Piedade
 
 - Mesa 1 - da freguesia da Trafaria
 c) Mesas de voto em que os votos nulos não estavam de acordo com o mencionado na 
 Acta
 Mesa 2 de Freguesia do Feijó
 Mesa 3 de Freguesia do Feijó
 Mesa 4 de Freguesia do Feijó
 Mesa 13 de Freguesia do Feijó
 Mesa 9 de Freguesia da Sobreda
 Mesa 7 de Freguesia do Feijó - havia divergências entre o Edital e a Acta em 
 relação aos votos do PS para a Assembleia de Freguesia
 d) O envelope relativo à mesa de Voto n.º 10 da Freguesia da Costa da Caparica - 
 
  não continha a respectiva acta.
 A comparação dos votos contados, por contraponto com o respectivo edital, deu 
 resultados totalmente díspares, conforme resulta das folhas da Acta de 
 Apuramento Geral.
 A recontagem dos votos resultados da mesa 10 da Costa da Caparica, cujo envelope 
 tinha sido violado, detectou a falta de 3 boletins de voto nulos.
 Procedeu-se à recontagem dos boletins e foram detectados 56 votos incluídos numa 
 determinada força partidária, mas pertencendo a outras forças políticas.
 Este facto só por si é significativamente indiciador da falta de transparência e 
 indicia a eventual e hipotética adulteração dos resultados eleitorais passíveis 
 de integrarem o conceito de ilícito criminal.
 Nada nos garante que o mesmo não tenha ocorrido noutras mesas de voto, atento o 
 facto de os envelopes estarem abertos o que pode indiciar o adulteramento das 
 actas, dos boletins, dos Editais, sendo que alguns não foram colocados, outros o 
 foram tardiamente e outros, ainda, estavam rasurados.
 Devendo, nestas condições, em concreto, repetir-se o acto eleitoral com a 
 consequente determinação da nulidade do presente acto eleitoral.
 e) Actas incompletas:
 mesa nº 7 - da Freguesia de Cacilhas
 mesa nº 8 - da Freguesia da Caparica
 mesa nº 1 - da Freguesia da Charneca estava errada
 mesa nº 2 - da Freguesia da Charneca estava errada 
 mesa nº 7 - da Freguesia da Sobreda (não menciona os votos do CDS na Assembleia 
 Municipal.
 f) Actas em branco mas assinadas
 Mesa - 1 da Freguesia da Trafaria
 Mesa - 7 da Freguesia da Trafaria
 Mesa - 6 da Freguesia do Feijó
 g) Actas assinadas por dois delegados da CDU em todas as mesas de voto do 
 Laranjeiro;
 h) As actas que não foram confrontadas com os editais respectivos;
 i) Existência de Editais rasurados.
 
 6. Votos Nulos
 Relativamente aos votos nulos, que a Assembleia de Apuramento Geral entendeu 
 manter e de acordo com o preceituado na Lei n.º 1/2001, de 14 de Agosto, art. 
 
 133.º, que considera válidos os votos quando a cruz está para fora do quadrado 
 mas assinala inequivocamente a vontade do eleitor 
 Manifestamos a nossa discordância relativamente à leitura dos votos nulos em 
 virtude de atentarmos no pormenor de apenas os boletins de voto nos quais o 
 eleitor expressa a sua vontade inequívoca, pertencerem em grande parte e quase 
 exclusivamente ao Partido Socialista.
 O que só por si significa que a existência de dualidade de critérios aquando da 
 separação dos boletins de voto.
 Apenas uma recontagem com a adopção de critério uniforme permitiria ultrapassar 
 dúvidas e cumprir a Lei.
 Assim não entendeu a Mesa de Apuramento Geral contra a qual apresentámos em 
 devido tempo o nosso protesto, o que se encontra na acta que juntamos e cujo 
 teor se dá aqui por integralmente reproduzida.
 Na mesma ordem de ideias, fundamentamos o nosso protesto, ainda, no facto de 
 existirem eleitores com fraca acuidade visual que poderiam nem ver o quadrado, 
 pequeno e pouco legível.
 Noutras situações é nítido ser o eleitor portador de qualquer tipo de 
 deficiência mais ou menos incapacitante, ou até, quiçá, de idade mais avançada.
 Constatamos a inexistência considerável de boletins de voto de outras forças 
 partidárias, nomeadamente da CDU - o que nos cria uma forte convicção de que os 
 boletins de voto na mesma situação foram considerados válidos, significando uma 
 dualidade de critérios.
 Apenas a recontagem de votos pode eliminar estas dúvidas que são no mínimo 
 atendíveis e de modificar os respectivos resultados eleitorais.
 Estas questões foram levantadas aquando do protesto em anexo à Acta com a letra 
 
 (E) e (F) cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.
 De realçar, ainda a discordância observada no apuramento “à boca da urna” por 
 membros da mesa de voto e aqueles apurados na Assembleia de Apuramento Geral, 
 nomeadamente na mesa de voto n.º 6 (mais nove votos na CDU) e nº 20 da Cova da 
 Piedade (mais setenta votos na CDU) e na mesa n.º1 em Almada (os nulos não 
 corresponderam aos efectivamente apurados pela Assembleia de Apuramento Geral), 
 conforme documentos que se juntam em anexo e cujo teor se dá aqui por 
 integralmente reproduzido.
 Conclusões
 
 - Requer-se a alteração dos quatro presidentes de mesa que integram a Assembleia 
 de Apuramento Geral, os quais devem ser designados por sorteio de acordo com o 
 que expressamente estabelece a lei no artigo 142.º da Lei Orgânica n.º 1/2001 de 
 
 14 de Agosto, devendo, para o efeito, serem convocados os mandatários das 
 diferentes candidaturas concorrentes ao acto eleitoral.
 
 - Requer-se a recontagem de todos os votos inseridos nos envelopes, abertos, já 
 que, tal como a acta de Apuramento Geral confirma, muitos dos quais não 
 continham as actas, nem votos nulos, e cujo teor pode ter sido adulterado, 
 nomeadamente nas mesas de voto seguintes:
 Freguesia da Costa da Caparica - mesa de voto n.º 3, mesa de voto n.º 4, mesa de 
 voto n.º 7 e mesa de voto nº 11 (nas mesas de voto nº 9 e nº 10 foram efectuadas 
 as recontagens);
 Freguesia da Cova da Piedade - mesa de voto n.º2, mesa de voto n.º 3, mesa de 
 voto n.º 6, mesa de voto n.º 7, mesa de voto n.º 8, mesa de voto n.º 11, mesa de 
 voto n.º 12, mesa de voto n.º 14, mesa de voto n.º 15, mesa de voto n.º 16 e 
 mesa devoto n.º 18;
 Freguesia do Feijó - mesa de voto n.º 2, mesa de voto n.º 5 e mesa de voto n.º 
 
 7;
 Freguesia do Laranjeiro - mesa de voto n.º 1, mesa de voto n.º 8, mesa de voto 
 n.º 9, mesa de voto n.º 13, mesa de voto n.º 17 e mesa de voto n.º 18;
 Freguesia da Sobreda - mesa de voto n.º1, mesa de voto n.º 4 e mesa de voto n.º 
 
 8;
 
 -Requer-se que sejam validados os boletins de voto devidamente protestados pelo 
 PS e apresentados ao longo dos trabalhos de apuramento geral, que indicam 
 inequivocamente a vontade do cidadão eleitor nos termos da lei n.º 1/2001, de 14 
 de Agosto, art. 133.º, conforme protesto apresentado sob o doc. (N) anexo à Acta 
 e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido, juntando-se em anexo cópia 
 dos mesmos.
 Nestes Termos e nos mais de direito que V/ Exa. (s) doutamente suprirão, 
 requer-se que seja dado provimento ao presente recurso nos termos acima 
 expressos.
 Ou seja, deverá alterar-se a Assembleia Geral de Apuramento, conformando-a com a 
 lei e procedendo-se recontagem completa e total dos votos constantes dos 
 envelopes abertos, adoptando-se o critério legal e uniforme na contagem dos 
 votos nulos e, ordenando a repetição de eleições na freguesia da Costa da 
 Caparica face às infracções legais graves detectada na Mesa nº 10 e que, 
 eventualmente, poderiam existir noutros casos se tivesse procedido à recontagem 
 dos votos inseridos em envelopes abertos.
 
  
 
  
 Os mandatários das candidaturas concorrentes foram notificados do pedido mas não 
 responderam.
 
  
 
 2.     Começa a recorrente por impugnar a composição da assembleia de apuramento 
 geral, na parte que é composta por 'quatro presidentes de assembleia de voto, 
 designados por sorteio efectuado pelo presidente da câmara' (alínea d) do artigo 
 
 142º da LEOAL). A recorrente alega, porém, que os quatro presidentes de 
 assembleia de voto que efectivamente integraram a assembleia de apuramento geral 
 de Almada foram escolhidos pela presidente da câmara sem qualquer sorteio. 
 Pretende, por essa razão, obter 'a alteração dos quatro presidentes de mesa que 
 integram a Assembleia de Apuramento Geral, os quais devem ser designados por 
 sorteio de acordo com o que expressamente estabelece a lei no artigo 142.º da 
 Lei Orgânica n.º 1/2001 de 14 de Agosto, devendo, para o efeito, serem 
 convocados os mandatários das diferentes candidaturas concorrentes ao acto 
 eleitoral'.
 
  
 A apontada irregularidade teria ocorrido no decurso do processo eleitoral, mas 
 antes do acto de votação; é, por isso, certo que deixou de poder ser invocada a 
 partir do momento em que ocorreu o acto eleitoral de 9 de outubro de 2005. 
 Com efeito, todo o processo eleitoral decorre segundo um sistema faseado em 
 cascata ficando sanadas eventuais irregularidades ocorridas numa fase anterior e 
 que não hajam sido tempestivamente impugnadas (princípio da aquisição 
 progressiva dos actos do processo eleitoral). E, na verdade, a constituição da 
 assembleia de apuramento geral ficou estabelecida até à antevéspera do dia da 
 realização da eleição, tendo o seu presidente, conforme impõe o artigo 144º da 
 LEOAL, conferido imediatamente publicidade à composição da assembleia, através 
 de edital afixado à porta da câmara municipal. Sendo a composição da assembleia 
 de apuramento geral um acto de administração eleitoral, e não prescrevendo a 
 LEOAL um prazo específico de impugnação desse acto, é de 1 dia esse prazo, 
 conforme dispõe o n.º 2 do artigo 102.º-B da Lei n.º 28/82 de 15 de Novembro. O 
 problema fica, assim, definitivamente resolvido antes da realização da eleição. 
 Nada nos autos indica, nem a recorrente tal alega, que o presidente da 
 assembleia de apuramento geral tenha procedido de forma irregular, pelo que se 
 deve aceitar que tendo ficado concluída a constituição da assembleia 'até à 
 antevéspera do dia da realização da eleição' e que foi dada imediata publicidade 
 a esse acto através de afixação do correspondente edital à porta do edifício 
 camarário, se mostra esgotado o prazo para impugnar essa composição quando a 
 recorrente suscitou a questão, perante a própria assembleia, no dia 13 de 
 Outubro de 2005 (doc. K, a fls. 72). De resto, a circunstância de a recorrente 
 ter constatado existir um edital 'sem indicação da data e hora' não contraria o 
 que acaba de se afirmar, pois a própria recorrente não alega que a assembleia 
 não haja sido constituída no momento legalmente oportuno e não lhe tenha sido 
 dada a publicidade requerida. 
 Não pode, portanto, o Tribunal tomar conhecimento desta alegada irregularidade.
 
  
 
 3.       Pretende, seguidamente, a recorrente denunciar várias situações que, em 
 seu entender, constituem irregularidades eleitorais. Os factos são apresentados 
 sem a sequência típica de uma alegação jurídica e, sobretudo, sem qualquer 
 adequação às normas jurídicas invocadas em favor da pretensão. O problema ganha 
 relevo uma vez que a lei permite ao Tribunal o conhecimento das irregularidades 
 ocorridas 'desde que hajam sido objecto de reclamação ou protesto apresentado no 
 acto em que se verificaram', e 'sem prejuízo da interposição de recurso gracioso 
 perante a assembleia de apuramento geral' – artigo 156º nºs 1 e 2 da LEOAL. 
 Em todo o caso, a votação só pode julgada nula 'quando se hajam verificado 
 ilegalidades que possam influir no resultado geral da eleição do respectivo 
 
 órgão autárquico' – n.º 1 do artigo 160º da LEOAL.
 Ora, poderá desde já afastar-se o conhecimento das irregularidades alegadas a 
 propósito dos editais, que, mesmo que hajam ocorrido, são insusceptíveis de 
 influenciar o resultado da votação.
 
  
 
 4.       O que, depois, verdadeiramente a recorrente impugna tem a ver com duas 
 deliberações da assembleia geral de apuramento; a primeira reporta-se à 
 pretendida recontagem dos votos encontrados em envelopes abertos, e a segunda 
 aos votos nulos.
 Quanto à primeira, a assembleia, tendo em atenção o requerimento do 
 representante do PS para que fossem recontados todos os votos, em todas as 
 secções de voto, e em todo o círculo eleitoral, tomou por unanimidade a 
 seguinte:
 
  
 Deliberação
 Indeferir o requerimento do PS de recontagem dos votos de todo círculo 
 eleitoral, por se afigurar não existirem suspeitas fundadas em indícios ou 
 factos concretos que justifiquem afastar o princípio do respeito pela contagem 
 dos votos das assembleias de apuramento local, face à circunstância, de acordo 
 com o art. 14º da Lei Orgânica nº 1/2001, de 14 de Agosto, o apuramento se haver 
 de fazer, em princípio, com base nas actas, cadernos de recenseamento e demais 
 documentos que as acompanham.
 
  
 A recorrente conformou-se com esta deliberação, pois não opôs contra ela 
 qualquer reclamação, protesto ou recurso. E, de qualquer modo, a deliberação 
 adoptou um critério que o Tribunal Constitucional perfilha (v.g., Acórdão 
 
 198/98, in DR-II série de 9 de Abril de 1998) assente na razoabilidade dos 
 indícios recolhidos para aferir da influência que a irregularidade possa ter 
 tido no resultado eleitoral.
 
 É certo que, mais tarde, o representante do PS apresentou uma nova reclamação, 
 desta vez por escrito, e com um âmbito mais restrito, requerendo 'a recontagem 
 dos votos inseridos nos envelopes abertos', à qual a assembleia, também por 
 unanimidade, respondeu: 
 
  
 O Partido Socialista pretende ver recontados todos os votos das mesas cujos 
 envelopes chegaram a esta assembleia abertos, a apreciação dos votos nulos por 
 si protestados segundo um critério uniforme e a constituição desta assembleia de 
 acordo com o previsto na lei.
 Quanto à questão dos envelopes, esta assembleia considerou que o facto de muitos 
 deles trazerem o lacre partido, de outros, menos, virem fechados com fita-cola e 
 outros ainda, aqui já poucos, apenas se encontrarem fechados por dobragem do 
 papel, não constituiu irregularidade susceptível de impedir o apuramento com 
 base nas actas. Tanto mais que em alguns desses casos os votos foram recontados 
 por, outras razões, e nem por isso, pelo facto de não estarem devidamente 
 lacrados, se verificaram diferenças entre tais actas e as contagens. O que 
 afasta qualquer indício de associação entre envelopes mal fechados e actas 
 viciadas. Tratou-se, isso sim, na avaliação desta assembleia (aliás não 
 questionada pelos representantes dos partidos à medida que os envelopes iam 
 sendo abertos, sempre pelo presidente e à sua vista) de ocorrências normais de 
 qualquer processo de votação.
 Por isso considera esta assembleia não existir razão válida para proceder à 
 recontagem dos votos das mesas cujos envelopes chegaram a esta assembleia 
 indevidamente fechados.
 Quanto ao pedido de reapreciação dos votos que se consideraram nulos e sobre os 
 quais o Partido Socialista apresentou protesto, dir-se-á apenas que foi 
 precisamente com base num critério uniforme fixado previamente que se chegou a 
 essa decisão. Do que se trata não é, portanto, de os votos não terem sido 
 sujeitos a uma apreciação uniforme, porque o foram, mas sim de uma discordância 
 do Partido Socialista relativamente ao critério utilizado, que é coisa diferente 
 e sobre a qual já existe protesto.
 
  
 
  
 Esta deliberação recaiu, como se viu, em reclamação formulada pelo representante 
 do PS após a avaliação de todos os materiais eleitorais apreciados pela 
 assembleia de apuramento geral. Não custa, por isso, admitir que não tenha 
 ficado prejudicada a oportunidade de requerer novamente a recontagem dos votos 
 apesar de em anterior deliberação, não protestada, a assembleia haver deliberado 
 indeferir o pedido de recontagem, pois é de entender que novos factos, ocorridos 
 no decorrer das operações de apuramento, poderiam justificar uma nova avaliação. 
 
 
 Apesar disso, não procede o recurso nesta parte. Com efeito, a recorrente não 
 contesta as circunstâncias em que se fixou a assembleia para decidir, 
 considerando ser puramente acidental a causa de os envelopes apresentarem o 
 lacre partido, de outros se apresentarem fechados com fita-cola e outros se 
 mostrarem fechados por dobragem do papel, o que não constituiria irregularidade 
 susceptível de impedir o apuramento com base nas actas, uma vez que em alguns 
 desses casos os votos foram recontados e não se verificaram diferenças entre as 
 actas e as contagens. O que – no entender da assembleia – afastaria qualquer 
 indício de fraude. Na avaliação da assembleia (aliás não protestada) 
 tratar-se-ia de ocorrências normais de qualquer processo de votação, razão pela 
 qual se considerou não existir razão para proceder à recontagem dos votos das 
 mesas cujos envelopes chegaram à assembleia de apuramento geral indevidamente 
 fechados.
 Adoptou, portanto, um critério assente na razoabilidade da avaliação feita sobre 
 a ocorrência da irregularidade, que não merece censura.
 
  
 
 5.      Finalmente, pretende a recorrente obter uma recontagem geral dos votos 
 nulos. Note-se que o pedido começou por ser formulado como um pedido de 
 recontagem total dos votos, embora com fundamento num eventual erro ou 
 divergência do critério de classificação dos votos nulos. Com efeito, a 
 recorrente insurgia-se pelo facto de os votos nulos 'pertencerem em grande parte 
 e quase exclusivamente ao Partidos Socialista', conforme refere no requerimento 
 de recurso.
 Sobre isto há que ponderar o seguinte: o n.º 1 do artigo 149ºda LEOAL comete à 
 assembleia de apuramento geral a tarefa de verificar todos os boletins de votos 
 considerados nulos e, além disso, de julgar as reclamações ou protestos que 
 incidiram sobre determinados votos.
 Daqui decorre que, quanto aos votos válidos não protestados, a assembleia deve 
 acatar o juízo que sobre eles incidiu no apuramento local. E foi o que a 
 assembleia fez, verificando uns e outros. Começou mesmo por fixar um critério 
 geral de classificação de votos nulos que definiu da seguinte forma: 
 
  
 Para os efeitos previstos nos artigos 133° n.º 1 al. b) e n.º 2 e 149° da Lei 
 Orgânica n.º 1/01, adopta-se o seguinte critério geral uniforme de reapreciação 
 dos votos considerados nulos pelas assembleias de apuramento local: não serão 
 considerados nulos os boletins de voto em que não se verificando qualquer outra 
 causa de invalidação prevista na lei, tenha sido assinalada uma cruz, entendida 
 esta como o desenho que consista na intersecção de dois traços tendencialmente 
 rectilíneos, ou significando manifestamente esse sinal, ainda que 
 imperfeitamente desenhados ou excedendo em medida razoável os limites do 
 quadrado respectivo, desde que tal intersecção ocorra dentro do quadrado e 
 nenhum dos traços intersecte outro quadrado ou quaisquer caracteres ou símbolos 
 do boletim.
 
  
 Nenhum protesto ocorreu quanto a esta deliberação. Todavia, nas operações de 
 classificação individual dos votos nulos, o representante do Partido Socialista 
 protestou, conforme atesta a acta da reunião: 
 
  
 Na reapreciação dos votos nulos da eleição para a Assembleia Municipal da mesa 
 n° 15, as representantes do Partido Socialista e do Bloco de Esquerda 
 manifestaram-se contra a aplicação prática do critério geral uniforme acima 
 referido, fundamentalmente por entenderem que deverão ser considerados válidos 
 todos os votos em que se apresente uma cruz fora do respectivo quadrado, desde 
 que esta assinale inequivocamente a intenção de voto do eleitor, tendo 
 protestado juntar mais tarde declaração escrita nesse sentido. (Documentos 
 anexos sob letras D, E e F')
 O presidente, considerando que o facto de não ter havido protesto no momento da 
 definição do critério geral uniforme, não impede que cada partido manifeste caso 
 a caso discordância sobre a sua aplicação prática, sugeriu o seguinte 
 procedimento, que foi aceite: sem prejuízo da apresentação de protestos ou 
 reclamações por escrito, de cada vez que, em resultado da aplicação do critério 
 definido, a assembleia deliberar no sentido de considerar nulo qualquer voto que 
 algum dos representantes dos partidos manifeste expressamente o entendimento de 
 que deve ser considerado válido, tal voto objecto de protesto será anexo à acta, 
 rubricado e numerado sequencialmente.
 
  
 
 É assim que surgem protestados os votos cuja fotocópia se encontra anexada (fls. 
 
 91/171) à acta. Ora, na sua esmagadora maioria, tais votos apresentam 
 efectivamente o sinal aposto pelo eleitor fora do quadrado em que deve ser 
 expressa a vontade eleitoral. O critério da assembleia de voto recorrida 
 coincide com aquele que este Tribunal tem adoptado, nestes casos e referido, por 
 exemplo, no recente Acórdão nº 563/2005, aprovado em 24 de Outubro de 2005, que 
 se cita de seguida:
 
  
 
 «Encontra-se fixada a jurisprudência deste Tribunal sobre a validade de tais 
 expressões de voto, podendo consultar-se, entre outros, os acórdãos nºs 320/85, 
 
 326/85, 864/93, 725/97 e 734/97 (in Acórdãos do Tribunal Constitucional, 6º 
 vol., p. 1101 e 1045, 26º vol., p. 637, e 38º vol., p. 453 e 467, 
 respectivamente), 8/94 (in Diário da República, II Série, n.º 76, de 31 de Março 
 de 1994, p. 2952(54) e seguinte), 602/01 e 8/02 (in Diário da República, II 
 Série, n.º 44, de 21 de Fevereiro de 2002, p. 3447 e seguinte, e 3450, 
 respectivamente).
 
             Dela se extrai, desde logo, que se devem considerar nulos os votos 
 que contêm uma cruz fora do quadrado assinalado no boletim de voto na linha 
 correspondente a cada partido, coligação ou grupo de cidadãos; só se admite a 
 validade dos votos quando a intersecção dos traços que formam a cruz se inscreva 
 dentro do referido quadrado, desde que assinale inequivocamente a vontade do 
 eleitor.
 
             Este entendimento, que aqui se mantém, fundamenta-se no artigo 115º, 
 n.º 4, da L.E.O.A.L., enquanto impõe que o eleitor assinale com uma cruz, em 
 cada boletim de voto, “no quadrado correspondente à candidatura em que vota”.»
 
  
 Por isso, ao contrário do que pretende a recorrente, devem ser desqualificados, 
 como foram, os votos em que o escrito aposto no voto pelo eleitor se situa fora 
 da quadrícula. 
 E mesmo que se considere, em aplicação deste critério, e procedendo a uma 
 analise individual dos votos em causa, que três dos votos foram na verdade 
 validamente expressos no PS para a câmara municipal, que outros três se mostram 
 validamente expressos no PS para a assembleia municipal, que outros dois devem 
 ter-se por validamente expressos no PS para a assembleia de freguesia da 
 Charneca da Caparica, e, finalmente, um outro foi validamente expresso no PS 
 para a assembleia de freguesia da Cova da Piedade, a sua raridade não tem 
 manifestamente a virtualidade de poder influenciar o resultado eleitoral, face 
 aos resultados apurados na eleição. 
 Com efeito, na freguesia da Charneca da Caparica, em 8.257 votantes, o PS foi o 
 partido mais votado com 2.786 votos, sendo-lhe atribuído 5 mandatos, seguido da 
 CDU com 2.174 votos e 4 mandatos; na freguesia da Cova da Piedade, em 9.931 
 votantes, a CDU foi a força mais votada com 4.436 votos, sendo-lhe atribuído 9 
 mandatos, seguido do PS com 2.367 votos e 5 mandatos.  Para a assembleia 
 municipal de Almada, em 68.044 votantes, a CDU foi a força mais votada com 
 
 26.547 votos, sendo-lhe atribuído 14 mandatos, seguido do PS com 18.052 votos e 
 
 10 mandatos. E, finalmente, para a câmara municipal de Almada, em 68.039 
 votantes, a CDU foi a força mais votada com 28.799 votos, sendo-lhe atribuído 6 
 mandatos, seguido do PS com 17.438 votos e 3 mandatos.
 Ora, deve recordar-se que no contencioso eleitoral das eleições para os órgãos 
 das autarquias locais cabe a apreciação das irregularidades ocorridas no decurso 
 da votação e no apuramento local ou geral que possam influir no resultado geral 
 da eleição do respectivo órgão autárquico (artigo 160º n.º 1 da LEOAL aprovada 
 pela Lei Orgânica n.º 1/ 2001 de 14 de Agosto). 
 
  
 
 6.       Deve, portanto, ter-se por bem fundada a deliberação recorrida, também 
 nesta parte.
 
  
 Em consequência do exposto, decide-se negar provimento ao recurso.
 
  
 
  
 Lisboa, 28 de Outubro de 2005
 
  
 Carlos Pamplona de Oliveira
 Maria João Antunes
 Maria Fernanda Palma
 Mário José de Araújo Torres
 Vítor Gomes
 Benjamim Rodrigues
 Rui Manuel Moura Ramos
 Gil Galvão
 Bravo Serra
 Maria dos Prazeres Pizarro Beleza
 Maria Helena Brito
 Paulo Mota Pinto
 Artur Maurício