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Processo n.º 803/05
 Plenário
 Relatora: Conselheira Maria dos Prazeres Pizarro Beleza
 
  
 
  
 
  
 Acordam, em plenário, no Tribunal Constitucional:
 
  
 
  
 
             1. Por requerimento enviado por telecópia e entrado no Tribunal 
 Constitucional pelas 17h25m do dia 14 de Outubro de 2005, registado com data de 
 
 17 de Outubro, DOMINGOS DA SILVA CHAMBEL, mandatário das candidaturas do Partido 
 Social Democrata – PPD/PSD às eleições autárquicas no concelho de Abrantes, 
 distrito de Santarém, veio interpor recurso “da deliberação tomada em onze e 
 doze de Outubro de 2005 pela Assembleia de Apuramento Geral da Eleição dos 
 
 Órgãos das Autarquias Locais do concelho de Abrantes, ocorrida em 9 de Outubro 
 de 2005”.
 
             Pretende a anulação da votação realizada na secção de voto n.º 1 da 
 Assembleia de Voto da Freguesia de S. João, concelho de Abrantes.
 
  
 
             Do requerimento de interposição de recurso constam as seguintes 
 conclusões:
 
 “I
 No dia 9 de Outubro de 2005, na secção de voto n.º 1 da Assembleia de voto de 
 São João da freguesia de São João do concelho de Abrantes, do distrito de 
 Santarém, durante o acto eleitoral para a eleição dos órgãos das Autarquias 
 Locais, verificou-se a presença de um cidadão que não era membro da mesa nem 
 delegado.
 
  
 
  
 
  
 II
 O cidadão em causa, de nome Elísio de Moura, é membro da Junta cessante da 
 referida freguesia de São João e novamente candidato pelo PARTIDO SOCIALISTA.
 
  
 III
 O cidadão Elísio de Moura praticou actos materiais que são da exclusiva 
 competência e responsabilidade dos membros da mesa.
 
  
 IV
 Fê-lo com a conivência total e pública da presidente da mesa.
 
  
 V
 Manteve-se no interior da Secção de Voto n.º 1 apesar dos insistentes pedidos 
 das delegadas do PPD /PSD para que abandonasse o local.
 
  
 VI
 Quando se colocou à porta da secção de voto, passou a abordar e cumprimentar 
 todas as pessoas que entravam para votar.
 VII
 Cerca das 12.00 horas foi-lhe entregue uma credencial pelo presidente da Junta 
 de freguesia de São João, da qual não constava o número da mesa.
 
  
 VIII
 Dessa hora em diante, o cidadão Elísio de Moura passou a circular entre as duas 
 secções de voto da freguesia de São João.
 
  
 IX
 Com a sua presença e com a sua conduta, o cidadão Elísio de Moura exerceu 
 influência reverencial sobre os eleitores com os quais foi contactando no 
 interior e à porta da secção da Assembleia de voto de São João.
 
  
 X
 Com essa influência, o cidadão Elísio de Moura quis favorecer a votação no 
 Partido Socialista, pelo qual concorre mais uma vez na qualidade de candidato à 
 Assembleia de freguesia de São João.
 
  
 XI
 O seu comportamento e a influência que exerceu constituem ilegalidades graves 
 susceptíveis de influir no resultado geral da eleição dos vários órgãos 
 autárquicos, nomeadamente da Câmara Municipal atendendo a que mais oito votos na 
 lista do PPD/PSD significam mais um vereador para esta candidatura e menos um 
 vereador para o PS.
 
  
 XII
 Os factos constantes dos protestos apresentados mostram-se documentalmente 
 provados, pelo teor dos mesmos e pelo conteúdo das deliberações que sobre eles 
 foram tomadas, pela Mesa, não os rebatendo, antes os aceitando, na sua 
 materialidade, pelo que não pode admitir-se, salvo o devido respeito, o 
 entendimento adoptado pela Assembleia Geral de Apuramento, segundo o qual esses 
 factos não estariam provados.
 
  
 XIII
 Nessa medida, a votação da Secção de Voto n.º 1 da Assembleia de São João, 
 freguesia de São João do concelho de Abrantes, do distrito de Santarém, deve ser 
 julgada nula e como tal ser declarada, nos termos do n.º 1 do artigo 160° da 
 LEOAL.
 
  
 XIV
 Consequentemente, deverá ser ordenada a repetição do respectivo acto eleitoral, 
 nos termos do disposto no n.º 2 do artigo 160° da LEOAL.
 
  
 Assim se fazendo JUSTIÇA!”
 
  
 Juntou certidão da acta da Assembleia de Apuramento Geral, emitida pela Divisão 
 Administrativa da Câmara Municipal de Abrantes, em 12 de Outubro de 2005, na 
 qual se refere a sua qualidade de mandatário do referido Partido.
 
  
 
 2. Realizadas as notificações previstas no n.º 3 do artigo 159º da Lei Eleitoral 
 dos Órgãos das Autarquias Locais, aprovada pela Lei Orgânica nº 1/2001, de 14 de 
 Agosto, o mandatário do Partido Socialista apresentou a sua resposta, concluindo 
 a final que “os factos alegados (dos quais não foi junta qualquer outra prova 
 para além da existência dos protestos) não são susceptíveis de originar a 
 declaração de nulidade relativamente à votação da secção de voto n.º 1 da 
 Assembleia de S. João, freguesia de S. João, concelho de Abrantes, distrito de 
 Santarém, pois entende-se que não foram violados os preceitos legais invocados 
 nem existiu qualquer ilegalidade na votação da mesa de voto em causa que possa 
 ter influído no resultado geral da eleição para a Câmara Municipal de Abrantes, 
 pelo que tal votação não poderá ser julgada nula”.
 
  
 
             3. Em 24 de Outubro de 2005, foi pela relatora do presente processo 
 proferido o seguinte despacho:
 
    “Solicite cópia do Edital contendo os resultados do apuramento geral da 
 eleição dos órgãos autárquicos do concelho de Abrantes e certificando a data da 
 respectiva afixação.”
 
  
 
             Em 25 de Outubro de 2005, foram enviados por telecópia ao Tribunal 
 Constitucional cópias autenticadas dos editais relativos aos resultados do 
 apuramento geral em causa, cujos originais entraram a 27 do mesmo mês, dos quais 
 consta a certificação de que os mesmos foram afixados a 13 de Outubro de 2005.
 
  
 
             4. Nos termos do disposto no artigo 158º da Lei Eleitoral citada, o 
 recurso em causa deveria ter sido interposto “no dia seguinte ao da afixação do 
 edital contendo os resultados do apuramento”, dentro do horário de funcionamento 
 normal da secretaria judicial, ou seja, até às 16 horas (artigos 229º, n.º 2 da 
 Lei Eleitoral e 122º, n.ºs 1 e 3 da Lei n.º 3/99, de 13 de Janeiro).
 
             Neste mesmo sentido se julgou já no recente acórdão n.º 543/2005, 
 cuja parte relevante se transcreve por ainda ser inédito:
 
             «4. Nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 156º da “Lei que 
 regula a eleição dos titulares dos órgãos das autarquias locais” (LEOAL), 
 aprovada pela Lei Orgânica n.º 1/2001, de 14 de Agosto, “as irregularidades 
 ocorridas no decurso da votação e no apuramento local ou geral podem ser 
 apreciadas em recurso contencioso, desde que hajam sido objecto de reclamação ou 
 protesto apresentado no acto em que se verificaram”. E o artigo 158º da mesma 
 lei acrescenta que “o recurso contencioso é interposto perante o Tribunal 
 Constitucional no dia seguinte ao da afixação do edital contendo os resultados 
 do apuramento”. Finalmente, o n.º 2 do artigo 229º da LEOAL estatui que, “quando 
 qualquer acto processual previsto na presente lei envolva a intervenção de 
 entidades ou serviços públicos, o termo dos prazos respectivos considera-se 
 referido ao termo do horário normal dos competentes serviços ou repartições.”
 
 (...)      
 Ora, entendendo-se que, neste tipo de recursos, ainda que os mesmos possam ser 
 interpostos via telecópia, a mesma não pode deixar de dar entrada até ao “termo 
 do horário normal” da secretaria judicial (no caso 16H00, cfr. n.ºs 1 e 3 do 
 artigo 122º da Lei n.º 3/99, de 13 de Janeiro) do dia seguinte à afixação do 
 edital, há que concluir que o recurso é extemporâneo, pelo que dele se não pode 
 conhecer.»
 
  
 
             É este entendimento que se reitera.
 Assim, tendo o recurso entrado no Tribunal Constitucional depois das 16 horas do 
 dia 14 de Outubro de 2005, é o mesmo extemporâneo. 
 
  
 Nestes termos, decide-se não conhecer do objecto do recurso.
 
  
 Lisboa, 28 de Outubro de 2005
 
  
 Maria dos Prazeres Pizarro Beleza
 Maria Helena Brito
 Paulo Mota Pinto
 Carlos Pamplona de Oliveira
 Maria João Antunes
 Vítor Gomes
 Benjamim Rodrigues
 Rui Manuel Moura Ramos
 Gil Galvão
 Bravo Serra
 Mário José de Araújo Torres (vencido, nos termos da declaração
 junta)
 Artur Maurício
 
  
 
  
 
  DECLARAÇÃO DE VOTO
 
                         Não votei o não conhecimento do recurso com fundamento 
 na extemporaneidade da sua interposição, pois entendo que o recurso foi 
 tempestivamente apresentado, por razões similares às expostas nos votos de 
 vencido que apus aos Acórdãos n.ºs 414/2004, 540/2005, 542/2005, 543/2005, 
 
 550/2005, 551/2005, 552/2005, 553/2005, 556/2005 e 566/2005.
 
                         Na verdade, nos termos do artigo 158.º da Lei que regula 
 a eleição dos titulares dos órgãos das autarquias locais, aprovada pela Lei 
 Orgânica n.º 1/2001, de 14 de Agosto (doravante designada por LEOAL), o recurso 
 contencioso tendo por objecto as irregularidades ocorridas no decurso da votação 
 e no apuramento local ou geral ou as decisões sobre as reclamações, protestos 
 ou contraprotestos apresentados contra essas irregularidades “é interposto 
 perante o Tribunal Constitucional no dia seguinte ao da afixação do edital 
 contendo os resultados do apuramento”. Trata‑se, assim, do prazo de um dia (e 
 não de 24 horas), a contar da data da afixação do edital contendo os resultados 
 do apuramento geral. No cômputo dos prazos são aplicáveis, salvo disposição 
 especial, as regras do artigo 279.º do Código Civil, das quais deriva que nessa 
 contagem não se inclui o dia em que ocorrer o evento a partir do qual o prazo 
 começa a correr e que o prazo termina às 24 horas do último dia do prazo 
 
 (alíneas b) e c) desse preceito, sendo entendimento corrente o de que a regra 
 desta última alínea também se aplica aos prazos fixados em dias). Isto é: o 
 prazo de um dia para a interposição do recurso para o Tribunal Constitucional 
 começa a correr no início do dia seguinte ao do da afixação do edital e termina 
 
 às 24 horas desse dia.
 
                         Entendeu‑se, porém, no precedente acórdão que ao caso 
 era aplicável a regra do n.º 2 do artigo 229.º da LEOAL, nos termos do qual: 
 
 “Quando qualquer acto processual previsto na presente lei envolva a intervenção 
 de entidades ou serviços públicos, o termo dos prazos respectivos considera‑se 
 referido ao termo do horário normal dos competentes serviços ou repartições”.
 
                         A formulação literal do preceito – que não utiliza as 
 fórmulas habituais de o acto ter de ser praticado em juízo (alínea e) do artigo 
 
 279.º do Código Civil) ou perante o serviço público (alínea c) do n.º 1 do 
 artigo 72.º do Código do Procedimento Administrativo – CPA) –, ao aludir 
 explicitamente à circunstância de o acto em causa implicar o envolvimento de 
 entidades ou serviços públicos através de uma intervenção dessas entidades ou 
 serviços, logo inculca que se pretendeu contemplar as situações em que a prática 
 do acto determina o desenvolvimento de uma actividade desses entes públicos, e 
 não já os casos em que os serviços funcionam como mera instância de recepção 
 de documentos. Daqui deriva, pois, a não aplicabilidade da regra do citado 
 artigo 229.º, n.º 2, ao presente caso.
 
                         Sendo “aplicável ao contencioso da votação e do 
 apuramento o disposto no Código de Processo Civil”, como expressamente dispõe o 
 n.º 5 do artigo 159.º da LEOAL, é, hoje em dia, inequívoco não só que “as partes 
 podem praticar os actos processuais através de telecópia ou por correio 
 electrónico, em qualquer dia e independentemente da hora da abertura e do 
 encerramento dos tribunais” (artigo 143.º, n.º 4, do Código de Processo Civil 
 
 (CPC), aditado pelo Decreto‑Lei n.º 183/2000, de 10 de Agosto), como também que 
 quando o acto é praticado por “envio através de telecópia, [vale] como data da 
 prática do acto processual a da expedição” (artigo 150.º, n.º 1, alínea c), do 
 CPC, na redacção do Decreto‑Lei n.º 324/2003, de 27 de Dezembro).
 
                         Em face do exposto, terminando às 24 horas do dia 14 de 
 Outubro de 2004 o prazo de interposição de recurso para o Tribunal 
 Constitucional e sendo incontroversa a admissibilidade do envio por telecópia 
 da respectiva petição, independentemente do “horário de funcionamento” do 
 serviço destinatário, o envio efectuado às 17h25 desse dia 14 de Outubro não 
 pode deixar de ser considerado como tempestivo, sendo inaplicável a regra do 
 artigo 229.º, n.º 2, da LEOAL, por o acto praticado não “envolver a intervenção” 
 
 (na acepção atrás assinalada) de entidades ou serviços públicos, mas a mera 
 recepção, por qualquer meio, de um documento transmissível por telecópia, 
 recepção essa que não exige a presença física de qualquer funcionário.
 
                         O prazo de um dia é, por definição, sempre superior ao 
 prazo de 24 horas, pois despreza o tempo decorrido no dia em que ocorreu o 
 evento que desencadeia o início do prazo e termina às 24 horas do dia seguinte. 
 A tese que fez vencimento – considerando que o prazo termina às 16 horas desse 
 dia – tem o efeito (a meu ver inadmissível) de poder transformar um prazo de um 
 dia em prazo inferior a 24 horas, o que ocorrerá sempre que o edital contendo os 
 resultados do apuramento geral seja afixado depois das 16 horas.
 Mário José de Araújo Torres