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Processo nº 967/08
 
 1ª Secção
 Relatora: Conselheira Maria João Antunes
 
 
 Acordam, em conferência, na 1ª secção do Tribunal Constitucional
 
  
 I. Relatório
 
 1. Nos presentes autos, vindos do Supremo Tribunal de Justiça, em que é 
 reclamante A. e são reclamados o Ministério Público e outros, vem o primeiro 
 reclamar, ao abrigo do nº 4 do artigo 76º da Lei da Organização, Funcionamento e 
 Processo do Tribunal Constitucional (LTC), do despacho de 30 de Outubro de 2008 
 que não admitiu recurso interposto para o Tribunal Constitucional.
 
  
 
 2. O reclamante foi condenado em primeira instância na pena única de catorze 
 anos de prisão. Interposto recurso para o Tribunal da Relação de Évora, foi 
 negado provimento ao mesmo. Recorreu então para o Supremo Tribunal de Justiça 
 que, por acórdão de 25 de Setembro de 2008, não concedeu provimento ao recurso, 
 confirmando integralmente a decisão recorrida.
 Notificado desta decisão, o reclamante recorreu para o Tribunal Constitucional, 
 ao abrigo da alínea b) do nº 1 do artigo 70º da LTC, mediante requerimento, onde 
 se lê, para o que agora releva o seguinte:
 
  
 
 «Quanto a não ter sido considerado como inconstitucional o entendimento do douto 
 acórdão do Tribunal de Cuba no sentido de que a actuação dos militares da Guarda 
 Nacional Republicana respeita o disposto nas regras processuais penais - art. 
 
 55º, nº 2, art. 249, nº 1 e n° 2, alíneas h) e c), e art. 250º, nº 8 -, foi 
 correcta, quando não procederam à constituição do recorrente como arguido, 
 quando já havia fortes indícios de que o suspeito fosse o autor do crime, e 
 procedendo ao seu interrogatório sob detenção e ameaça de arma. 
 Por entender que tal constitui violação do disposto no art.º 59, nº 1 do CPP, 
 ressalvado pelo 250 nº 8 do mesmo diploma legal, que deve ser tida como nulidade 
 insanável, enquadrável na alínea d) do art.º 119 do CPP. 
 Logo a interpretação e a aplicação de todas essas normas invocadas pelo douto 
 acórdão do Tribunal de Cuba; è manifestamente ilegal e inconstitucional, 
 violando os mais básicos direitos do arguido consagrados no CPP e cobertos pelo 
 disposto no artº 32º da CRP. 
 
  Pretende igualmente ver apreciada a inconstitucionalidade da aplicação do 
 princípio do in dubio pro réu nos termos defendidos pelo STJ, que considera que 
 apenas nos casos em que o Tribunal fique na dúvida em relação a determinados 
 factos e decida contra o arguido, tem essa dúvida de resultar inequivocamente do 
 texto da decisão e não também quando a decisão não seja devidamente fundamentada 
 e da mesma resulta a violação desse princípio e uma diminuição das garantias de 
 defesa do arguido com a consequente violação do disposto no artº 32 da 
 Constituição da República».
 
  
 
 3. O requerente foi então notificado para:
 
  
 
 «(…) indicar a norma ou princípio constitucional ou legal que considera 
 violados, e ainda dizer qual a peça processual em que suscitou a 
 inconstitucionalidade.
 Tudo, sob pena de o recurso ser logo julgado deserto».
 
  
 Respondeu nos seguintes termos:
 
  
 
 «Pretende ver apreciada a constitucionalidade do entendimento sufragado pelo 
 STJ, no sentido de considerar lícita a actuação das forças de segurança, ao 
 abrigo das normas constantes nos art.° 59, n° 1, 64, 126.° 171.° a 177.°, 249, 
 n° 1 e n° 2 b) e 250 nº 8, todos dos CPP, aos casos em que existem fortes 
 indícios de um suspeito ser autor do crime.
 No entendimento do recorrente, sempre que estes indícios existam, deve o 
 suspeito de imediato ser constituído arguido e informado dos seus direitos, o 
 que não sucedeu, tendo sido violado, além as supra citadas disposições legais os 
 princípios constitucionais de garantia dos direitos do arguido expressos no 
 art.° 32 da CRP.
 A questão da inconstitucionalidade da aplicação dessas normas, da não 
 consideração da actuação dos militares como nulidade insanável por constituírem 
 uma violação das garantias do arguido e do princípio constitucional do art.° 32 
 da CRP, foi suscitada no tribunal de primeira instância, aquando do julgamento, 
 no recurso intentado para o Tribunal da Relação de Évora e também no recurso 
 intentado para o Supremo Tribunal de Justiça».
 
  
 
 4. Foi então proferido o despacho agora reclamado, com o seguinte teor: 
 
  
 
 «Não admito o recurso interposto para o Tribunal Constitucional, pois o 
 recorrente não explicita, nem nunca o explicitou, o sentido em que as instâncias 
 ou este Tribunal interpretou as normas do Código de Processo Penal que diz 
 violadas e de que forma essa interpretação, a ter ocorrido, violaria princípios 
 ou normas constitucionais, nomeadamente o artº 32º da CRP».
 
  
 
  
 
 5. Deste despacho reclamou o recorrente, para o que agora releva, com os 
 seguintes fundamentos:
 
  
 
 «(…) foi agora o recorrente notificado do despacho de não admissão de recurso 
 pelo facto do recorrente “não explicita, nem nunca o explicitou o sentido em que 
 as instâncias ou este Tribunal interpretou as normas do Código de Processo Penal 
 que diz violadas, e de que forma essa interpretação, a ter ocorrido, violaria 
 princípios ou normas constitucionais, nomeadamente o art.° 32 da CRP” 
 Salvo o devido respeito, que é muito, tal decisão é inadmissível, não se 
 compreendendo como podem ser assim violados os direitos de defesa do arguido, 
 transgredindo desta forma o dispostos no artigo 32.° n.° 1 da C.R.P. que 
 assegura ao arguido todos os direitos de defesa incluindo o direito ao recurso. 
 Desta forma, salvo melhor opinião entende o Recorrente que tal decisão se mostra 
 infundamentada, na medida em que quando é certo que do teor do respectivo 
 requerimento, se extrai, se não directa e expressamente, pelo menos de forma 
 facilmente apreensível, que o que o recorrente pretende é a apreciação da 
 constitucionalidade das normas constantes dos art.° 59, n° 1, 64, 126.° 171.° a 
 
 177.º, 249, nº 1 e n° 2 b) e 250 n° 8, todos dos CPP., na interpretação que lhe 
 foi dada na decisão do Supremo Tribunal de Justiça, que o recorrente reputa 
 inconstitucional».
 
  
 
 6. O representante do Ministério Público junto deste Tribunal considerou que a 
 presente reclamação carece manifestamente de fundamento:
 
  
 
 «já que o ora reclamante não explicita, em termos minimamente adequados, qual a 
 norma ou interpretação normativa que considera violadora da Constituição, 
 privando, deste modo, o recurso interposto para este Tribunal de objecto 
 idóneo».
 
  
 Dispensados os vistos, cumpre apreciar e decidir.
 
  
 II. Fundamentação
 O despacho que é objecto da presente reclamação não admitiu o recurso de 
 constitucionalidade interposto, ao abrigo da alínea b) do nº 1 do artigo 70º da 
 LTC, com fundamento, entre o mais, na falta de explicitação do sentido em que as 
 instâncias ou o Supremo Tribunal de Justiça interpretaram as normas do Código de 
 Processo Penal que o recorrente diz violadas.
 O reclamante sustenta que do requerimento de interposição de recurso se extrai, 
 se não directa e expressamente, pelo menos de forma facilmente apreensível, que 
 o que o recorrente pretende é a apreciação da constitucionalidade das normas 
 constantes dos artigos 59º, nº 1, 64º, 126º, 171º a 177º, 249º, nº 1, e nº 2, 
 alínea b), e 250º, nº 8, do Código de Processo Penal, na interpretação que lhe 
 foi dada na decisão do Supremo Tribunal de Justiça.
 Ainda que se extraísse do requerimento de interposição de recurso que o 
 recorrente pretendia a apreciação das normas constantes daqueles artigos do 
 Código de Processo Penal, na interpretação que lhe foi dada na decisão do 
 Supremo Tribunal de Justiça, não poderia dar-se como satisfeito o requisito da 
 parte final do nº 1 do artigo 75º-A da LTC. 
 
 É entendimento reiterado deste Tribunal que o recorrente pode requerer a 
 apreciação de uma norma, considerada esta na sua totalidade, em determinado 
 segmento ou segundo certa interpretação (cf., entre muitos, o Acórdão do 
 Tribunal Constitucional nº 232/2002, disponível em 
 
 www.tribunalconstitucional.pt). Mas neste último caso tem “o ónus de enunciar, 
 de forma clara e perceptível, o exacto sentido normativo do preceito que 
 considera inconstitucional” (Acórdão do Tribunal Constitucional nº 21/2006, 
 disponível em www.tribunalconstitucional.pt), uma vez que o objecto do recurso é 
 definido no requerimento de interposição de recurso (cf., entre outros, os 
 Acórdãos dos Tribunal Constitucional nºs 286/2000 e 293/2007, disponíveis em 
 
 www.tribunalconstitucional.pt).
 
   Como o recorrente não cumpriu o ónus de definir o objecto do recurso de 
 constitucionalidade, explicitando o sentido em que o Supremo Tribunal de Justiça 
 interpretou aquelas normas do Código de Processo Penal, justifica-se a decisão 
 de não admissão do mesmo.  
 
  
 Importa, por isso, confirmar o despacho reclamado.
 
  
 III. Decisão
 Pelo exposto, decide-se indeferir a presente reclamação.
 Custas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20 (vinte) unidades de 
 conta. 
 Lisboa, 13 de Janeiro de 2009
 Maria João Antunes
 Carlos Pamplona de Oliveira
 Gil Galvão