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Processo n.º 902/08
 
 3ª Secção
 Relatora: Conselheira Ana Guerra Martins
 
  
 Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional
 
  
 I – RELATÓRIO
 
  
 
 1. Nos presentes autos, vindos do Supremo Tribunal de Justiça, em que é 
 recorrente A.  e recorridos B., S.A., C., S.A., CMVM – Comissão de Mercado de 
 Valores Mobiliários, Banco D., S.A., E., S.A. e F., foi proferida a seguinte 
 decisão sumária, em 15 de Dezembro de 2008:
 
  
 
 «I – RELATÓRIO
 
  
 
 1. Nos presentes autos, em que é recorrente A. e recorridos B., S.A., C., S.A., 
 CMVM – Comissão de Mercado de Valores Mobiliários, Banco D. S.A., E., S.A. e F., 
 foi interposto recurso, ao abrigo do artigo 280º, n.º 1, alínea b) da CRP e do 
 artigo 70º, n.º 1, alínea b) da LTC, do acórdão da 7ª Secção do Supremo Tribunal 
 de Justiça, proferido em 22 de Abril de 2008 (fls. 604 a 608), posteriormente 
 complementado pelo acórdão da mesma Secção, proferido em 11 de Setembro de 2008 
 
 (fls. 650 e 651-verso), que rejeitou o requerimento de arguição de nulidades 
 deduzido pelo recorrente (fls. 630 a 637).
 
  
 O recorrente pretende que seja apreciada a alegada inconstitucionalidade das 
 seguintes normas extraídas:
 
  
 i)                          “dos artigos 660º, n.º 2, e 668º, nº 1, alínea d), 
 do CPC”, visto que, no seu entendimento, “tais normas violam o disposto na 
 Constituição e os princípios nela consignados, designadamente nos seus artigos 
 
 2º, 18º, nº 1, 20º, nºs 1 e 4, e 202º, nº 2” (fls. 666);
 
  
 ii)                        “do artigo 713º, n.º 5, do CPP”, visto que, no seu 
 entendimento, “tal norma infringe o disposto na Constituição e os princípios 
 nela consignados, designadamente nos seus artigos 2º, 20º, n.ºs 1 e 4, 202º, nº 
 
 2, e 205º, nº 1” (fls. 666).
 
  
 Mais se regista que o recorrente optou por não recorrer de qualquer 
 interpretação normativa extraída do artigo 490º do Código das Sociedades 
 Comerciais (CSC), por entender que “a concreta dimensão normativa do disposto no 
 artigo 490º do CSC, arguida de inconstitucionalidade na petição inicial, será, 
 eventualmente, apreciada em recurso a interpor das decisões que venham a ser 
 proferidas no processo principal” (fls. 667).
 
  
 
                         Cumpre, então, apreciar e decidir.
 
  
 
  
 II – FUNDAMENTAÇÃO
 
  
 
 2. Mesmo tendo o recurso sido admitido por despacho do tribunal “a quo” (cfr. 
 fls. 673), com fundamento no n.º 1 do artigo 76º da LTC, essa decisão não 
 vincula o Tribunal Constitucional, conforme resulta do n.º 3 do mesmo preceito 
 legal, pelo que se deve começar por apreciar se estão preenchidos todos os 
 pressupostos de admissibilidade do recurso previstos nos artigos 75º-A e 76º, nº 
 
 2, da LTC.
 
  
 Se o Relator verificar que não foram preenchidos alguns desses pressupostos, 
 pode proferir decisão sumária de não conhecimento, conforme resulta do n.º 1 do 
 artigo 78º-A da LTC.
 
  
 
 3. Antes de mais, deve notar-se que o recorrente não identifica expressamente 
 qual o sentido normativo que entende ter sido aplicado pela decisão recorrida, 
 tendo-se limitado a afirmar, de modo genérico, a propósito dos artigos 660º, n.º 
 
 2 e 668º, n.º 1, alínea d), ambos do CPC, a “inconstitucionalidade de tais 
 normas com o sentido resultante daquele texto” (fls. 666), ou seja, com o 
 sentido extraído do seguinte trecho da decisão recorrida: “urge decidir que o 
 acórdão deste Supremo de fls 604 a 608, não padece das invocadas 
 inconstitucionalidades, pois apreciou e decidiu as questões pertinentes, não 
 ocorrendo a omissão de pronúncia” (fls. 651-verso). Porém, em momento algum, 
 esclarece o recorrente qual, afinal, seria o sentido por si extraído de tal 
 trecho decisório.
 
  
 Tal insuficiência poderia ser suprida mediante convite ao aperfeiçoamento, nos 
 termos do n.º 6 do artigo 75º-A da LTC, a que a Relatora nos presentes autos não 
 se furtaria, caso não tivesse detectado outros fundamentos que desde logo obstam 
 ao conhecimento do objecto do presente recurso, sem que possam ser ultrapassados 
 mediante aperfeiçoamento. Ora, subsistindo outros fundamentos de recusa de 
 conhecimento, o convite ao aperfeiçoamento constituiria um acto processual 
 inútil de que este Tribunal se deve abster.
 
  
 Por fim, quanto à norma extraída do n.º 5 do artigo 713º do CPC, o recorrente 
 apenas peticiona a apreciação da constitucionalidade daquela norma na sua 
 redacção literal, na medida em que não extrai dela qualquer interpretação 
 normativa efectivamente aplicada pela decisão recorrida.
 
  
 
 4. Começando pela parte do recurso relativa às normas extraídas dos artigos 
 
 660º, n.º 2 e 668º, n.º 1, alínea d), ambos do CPC, importa notar que, ao 
 contrário do afirmado pelo recorrente no requerimento de interposição de 
 recurso, da análise do requerimento de arguição de nulidades por ele apresentado 
 
 (fls. 630 a 637) não é possível extrair nenhuma suscitação processualmente 
 adequada de qualquer questão de inconstitucionalidade normativa. Senão, veja-se:
 
  
 
 “Tal pronúncia é obrigatória «ex vi» o disposto nos artigos 668º, nº 4, 716º, nº 
 
 1, 731º, nº 1 732º e 762º, nº 1, do CPC, e 20º, nºs 1 e 4, 202º, nº 2 e 203º da 
 Constituição.
 Por força do disposto nos artigos 660º, nº 2, e 668º, nº 1, al. d), do CPC, e 
 
 3º, nº 3, o acórdão ora impugnado é NULO/INVÁLIDO” (fls. 633, com sublinhado 
 nosso);
 
                         
 
 “Por força das disposições conjugadas dos artigos 660º, nº 2, 722º, nº 2, e 
 
 729º, nº 2, segundo segmento, do CPC, 20º nºs 1 e 4, 202º, nº 2 e 203º da 
 Constituição, a pronúncia sobre tais questões é obrigatória. E por força do 
 disposto no artigo 668º, nº 1, al. d), do CPC, e 3º, nº 3 da Constituição, a 
 violação daquelas disposições acarreta a NULIDADE/INVALIDADE do acórdão 
 impugnado” (fls. 637, com sublinhado nosso).
 
  
 Da análise destes trechos decorre que, em bom rigor, o recorrente nunca suscitou 
 qualquer incidente de inconstitucionalidade de uma específica norma jurídica. 
 Pelo contrário, o recorrente apenas invocou alguns preceitos constitucionais no 
 sentido de fundamentar a sua tese de nulidade do acórdão por omissão de 
 pronúncia. Aliás, o próprio recorrente afirma que a questão em causa assenta no 
 desrespeito dos artigos 660º, nº 2 e 668º, n.º 1, alínea d), ambos do CPC, que o 
 recorrente entende terem sido violados pelas decisões recorridas. A invocação de 
 normas e princípios constitucionais é feita apenas “ad latere”, enquanto 
 argumento de reforço da tese por si propugnada.
 
  
 De tudo isto resulta que o recorrente nunca suscitou efectivamente qualquer 
 questão de inconstitucionalidade das normas extraídas dos artigos 660º, nº 2 e 
 
 668º, n.º 1, alínea d), ambos do CPC, pelo que, por força do n.º 2 do artigo 72º 
 da LTC, este Tribunal não pode conhecer do objecto do presente recurso, na parte 
 que àquelas diz respeito.
 
  
 
 5. Por último, quanto à alegada inconstitucionalidade da norma extraída do n.º 5 
 do artigo 713º do CPC, vem o recorrente reconhecer que não suscitou a sua 
 inconstitucionalidade, em momento prévio à prolação da decisão ora recorrida, 
 mas aduz, em favor da dispensa de prévia suscitação, a circunstância de a 
 aplicação daquela norma pelo acórdão proferido, em 22 de Abril de 2008, ter uma 
 natureza de decisão-surpresa. Com efeito, em abono deste entendimento, o 
 Tribunal Constitucional tem notado, sem oscilações, que – em casos excepcionais 
 
 – o recorrente pode ser dispensado daquele dever processual de prévia invocação 
 da inconstitucionalidade da norma que constitui objecto do recurso. Assim sucede 
 sempre que o recorrente não pudesse antecipar – de modo objectivo – o sentido 
 normativo acolhido pela decisão alvo de recurso. Nesta linha de pensamento, este 
 Tribunal tem entendido que:
 
  
 i)                           “A razão pela qual o Tribunal Constitucional tem 
 dispensado este ónus em casos excepcionais ou anómalos, como se refere na 
 decisão reclamada, é a de considerar não exigível antecipar um sentido 
 objectivamente inesperado, sobre o qual o recorrente não teve a oportunidade de 
 se pronunciar antes de proferida a decisão recorrida” (cfr. Acórdão n.º 
 
 394/2005)”;
 
  
 ii)                         “O Tribunal tem considerado até que cabe às partes 
 considerar antecipadamente as várias hipóteses de interpretação razoáveis das 
 normas em questão e suscitar antecipadamente as inconstitucionalidades daí 
 decorrentes antes de ser proferida a decisão” (cfr. Acórdão n.º 489/94);
 
  
 iii)                       “(…) não pode deixar de recair sobre as partes em 
 juízo o ónus de considerarem as várias possibilidades interpretativas das normas 
 de que se pretendem socorrer, e de adoptarem, em face delas, as necessárias 
 cautelas processuais (por outras palavras, o ónus de definirem e conduzirem uma 
 estratégia processual adequada). E isso – acrescentar-se-á – também logo mostra 
 como a simples «surpresa» com a interpretação dada judicialmente a certa norma 
 não será de molde (ao menos, certamente, em princípio) a configurar uma dessas 
 situações excepcionais (…) em que seria justificado dispensar os interessados da 
 exigência da invocação «prévia» da inconstitucionalidade perante o tribunal «a 
 quo».
 Mas – e agora em segundo lugar – se alguma vez tal for de admitir, então haverá 
 de sê-lo apenas numa hipótese em que a interpretação judicial seja tão insólita 
 e imprevisível, que seria de todo o ponto desrazoável a parte contar (também) 
 com ela” (cfr. Acórdão n.º 479/89).
 
  
 
                         Sucede, porém, que, nos presentes autos, não se afigura 
 como insólito ou inesperado que o Supremo Tribunal de Justiça haja recorrido ao 
 mecanismo previsto no n.º 5 do artigo 713º do CPC, aplicável ao recurso de 
 revista “ex vi” artigo 726º do CPC, na medida em que também aquele Tribunal 
 Superior pode negar provimento ao recurso, limitando-se a remeter para os 
 fundamentos da decisão impugnada. Não se vislumbra qual a surpresa do recorrente 
 perante a aplicação da norma extraída daquele preceito legal.
 
  
 
                         Invoca o recorrente que a circunstância de o acórdão 
 proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa (fls. 395 a 408) e posteriormente 
 complementado (fls. 426 a 428) ter sido alvo de dois requerimentos de arguição 
 de nulidade que, por sua vez, deram lugar aos acórdãos proferidos, em 12 de 
 Julho de 2007 (fls. 571 a 575), e, em 08 de Novembro de 2007 (fls. 582 a 585), 
 obrigaria a que o Supremo Tribunal de Justiça apreciasse e decidisse, mediante 
 fundamentação autónoma e “ex novo”, as alegadas nulidades. Ainda segundo o 
 recorrente, “a remissão para os fundamentos da decisão impugnada, sem que os 
 vícios dessa fundamentação tenham sido eliminados, consubstancia denegação de 
 justiça proibida pelos invocados preceitos constitucionais” (fls. 667). Vejamos 
 se o argumento é válido para efeitos de justificação da natureza surpreendente 
 da decisão de aplicação do n.º 5 do artigo 713º do CPC.
 
  
 
                         Desde logo se nota que o Tribunal Constitucional não 
 dispõe de poderes, atribuídos pelo legislador constituinte, para sindicar a 
 justeza dos juízos interpretativos formulados pelas decisões recorridas, a 
 propósito da mera aplicação do Direito infra-constitucional. Ora, o que o 
 recorrente pretende é que o seu entendimento a propósito da arguição de nulidade 
 do acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa prevaleça, discordando 
 do entendimento já expresso por ambas as instâncias de recurso – Tribunal da 
 Relação (fls. 571 a 575 e 582 a 585) e Supremo Tribunal de Justiça (fls. 604 a 
 
 608). Não pode, contudo, este Tribunal substituir-se às instâncias recorridas, 
 quanto a tal questão.
 
  
 
                         E, quanto à apreciação das aludidas nulidades, o Supremo 
 Tribunal de Justiça apreciou e decidiu em sentido absolutamente idêntico ao do 
 já expresso pelo Tribunal da Relação de Lisboa (fls. 571 a 575 e 582 a 585). Não 
 corresponde, portanto, à verdade que o Supremo Tribunal de Justiça não tenha 
 apreciado as questões de nulidade aduzidas pelo recorrente perante a instância 
 imediatamente inferior àquele. Sucedeu apenas que o acórdão proferido, em 22 de 
 Abril de 2008, confirmou integralmente a decisão e a fundamentação constante nos 
 demais acórdãos do Tribunal da Relação de Lisboa, pelo que recorreu à 
 prerrogativa decorrente do n.º 5 do artigo 713º do CPC.
 
  
 
                         Ora, qualquer parte processual deve estar ciente de que, 
 nos termos da lei processual civil, o tribunal de recurso pode remeter a sua 
 fundamentação para a constante dos acórdãos recorridos, como determina o n.º 5 
 do artigo 713º do CPC, pelo que o recorrente deveria ter antecipado a 
 possibilidade de o tribunal de recurso negar provimento ao recurso, remetendo 
 apenas para a fundamentação constante dos acórdãos proferidos. Era, pois, no 
 momento da interposição de recurso para o Supremo Tribunal de Justiça que o 
 recorrente deveria ter invocado a eventual aplicação da norma constante do n.º 5 
 do artigo 713º do CPC, invocando a sua pretendida inconstitucionalidade.
 
  
 
                         Não o tendo feito, e porque a aplicação daquela norma 
 não se reveste de natureza insólita ou surpreendente, mais não resta do que 
 registar a falta de suscitação processualmente adequada da inconstitucionalidade 
 da norma extraída do n.º 5 do artigo 713º do CPC, pelo que não se afigura 
 admissível proceder ao conhecimento do objecto do presente recurso, quanto à 
 parte respeitante à supra referida norma.
 
  
 III – DECISÃO
 
  
 Nestes termos, ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 78º-A da Lei n.º 28/82, 
 de 15 de Novembro, na redacção que lhe foi dada pela Lei n.º 13-A/98, de 26 de 
 Fevereiro, e pelos fundamentos supra expostos, decide-se não conhecer do objecto 
 do presente recurso.
 
  
 Custas devidas pelo recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 7 UC´s, nos 
 termos do n.º 2 do artigo 6º do Decreto-Lei n.º 303/98, de 07 de Outubro.»
 
  
 
 2. Notificado da mesma, o recorrente veio apresentar um requerimento aos autos, 
 
 “ao abrigo dos artigos 201º, nº 1, 266º, nº 1, 667º, nº 1, e 668º, nº 3, do 
 Código de Processo Civil (CPC), e 78º-B, n.º 1, da Lei nº 28/82, de 15 de 
 Novembro” (fls. 699), através do qual formulou diversos pedidos desprovidos de 
 qualquer fundamento legal, sem que, porém, viesse expressamente reclamar da 
 referida decisão. Para além disso, juntou ainda aos autos um extenso 
 requerimento (fls. 702 a 719) dirigido ao Tribunal da Comarca de Lisboa, que 
 anexou ao referido requerimento.
 
  
 
 3. Dessa feita, a Relatora proferiu o seguinte despacho, em 08 de Junho de 2009:
 
  
 
 “- Requerimento de rectificação e de arguição de nulidade processual (fls. 699 a 
 
 701)
 
  
 
 1. Os dois pedidos de rectificação da decisão sumária proferida nos autos são 
 manifestamente desprovidos de cobertura legal, na medida em que o artigo 667º do 
 CPC, aplicável “ex vi” artigo 69º da LTC, apenas permite a rectificação de 
 decisões jurisdicionais para rectificação de erros materiais. Não se verifica 
 qualquer erro material na decisão sumária proferida. Caso o recorrente dela 
 discorde – como transparece do referido requerimento –, mais não lhe resta que 
 reclamar para a conferência, nos termos do n.º 3 do artigo 78º-A da LTC.
 
  
 
 2. Quanto à alegada nulidade processual, regista-se que o recorrente persiste, 
 conforme tem vindo a ser habitual quer nos presentes, quer noutros autos, num 
 alegado dever de denúncia ao Ministério Público por parte de qualquer pessoa – 
 incluindo magistrados – que contactem com os autos.
 
  
 Para que fique bem claro, o dever de denúncia previsto na alínea b) do n.º 1 do 
 artigo 242º, do Código Penal, apenas recai sobre os “funcionários” nela 
 identificados quando estes se deparem com “crimes de que tomarem conhecimento no 
 exercício das suas funções e por causa destas”. Ora, a Relatora não tomou 
 conhecimento de qualquer “crime” no exercício das suas funções. As considerações 
 tecidas pelo recorrente quanto à alegada falsificação de um documento devem ser 
 por si provadas perante um tribunal criminal, não dispondo o Tribunal 
 Constitucional de poderes, atribuídos pela Constituição ou pela lei, para aferir 
 da responsabilidade penal de indivíduos ou de pessoas colectivas. A mera 
 afirmação pelo recorrente de que foi praticado um crime não é geradora de 
 qualquer dever de denúncia de factos alegadamente constitutivos de um 
 determinado tipo de crime. Bom seria que o recorrente levasse esse seu temerário 
 entendimento até às últimas consequências e apresentasse ele próprio a 
 respectiva queixa pela prática dos factos que (apenas) ele reputa de criminosos.
 
  
 Mais uma vez, constata-se não haver fundamento legal para a nulidade arguida. A 
 invocação do artigo 201º do CPC é, aliás, absurda, na medida em que aquele 
 preceito legal apenas se refere a omissões de actos processuais e não a deveres 
 externos ao processo. Como é evidente para qualquer destinatário diligente, o 
 dever de denúncia consagrado no artigo 242º do CPP configura um dever de 
 carácter pessoal que recai sobre o indivíduo que é momentaneamente titular do 
 título de “funcionário”, não sendo configurável como acto inserido em 
 determinado processo judicial, muito menos em sede de recurso de 
 constitucionalidade.
 
  
 Por outro lado, ainda que o artigo 201º do CPC seja aplicável “ex vi” artigo 69º 
 da LTC, é manifesto que nem a lei comina de nula a omissão daquele dever de 
 denúncia – que como já demonstrado não recai sobre a Relatora –, nem tão pouco 
 tal omissão pode influir sobre o exame do recurso de constitucionalidade 
 interposto nos presentes.
 
  
 Deste modo, não foi cometida qualquer nulidade processual, pelo que não se 
 verifica qualquer omissão a suprir.
 
  
 
 3. Quanto ao mais, adverte-se que, atenta a manifesta improcedência dos vários 
 pedidos formulados e a circunstância de o fundamento de tais pedidos residir, 
 tão-só, na discordância do recorrente face ao teor da decisão sumária – que deve 
 ser deduzida sob forma de reclamação, nos termos do n.º 4 do artigo 78º-A da LTC 
 
 –, este Tribunal não tolerará qualquer tentativa de protelamento do trânsito em 
 julgado dos presentes autos, conforme temido pelos recorridos.
 
  
 Caso o recorrente persista nesta conduta processual, que raia já o limite do 
 aceitável, forçoso será ponderar a sua condenação em litigância de má fé, nos 
 termos previstos nos n.ºs 6 e 7 do artigo 84º da LTC.
 
  
 
                         - Quanto ao requerimento de arguição de nulidades (fls. 
 
 702 a 719)
 
  
 
 4. O requerimento supra identificado encontra-se endereçado ao Tribunal da 
 Comarca de Lisboa, pelo que os pedidos nele formulados deverão ser por aquele 
 apreciados, logo que os autos baixem ao tribunal recorrido. Não se verifica 
 qualquer razão para a baixa imediata dos autos, na medida em que já foi 
 proferida decisão sumária que aguarda o seu célere trânsito em julgado.” (fls. 
 
 823 a 825)
 
  
 
             4. Notificado deste último despacho, o recorrente veio aos autos, em 
 
 23 de Junho de 2009, juntar novo requerimento – e, mais uma vez, não deduzindo 
 qualquer reclamação contra a decisão sumária proferida em 12 de Dezembro de 2008 
 
 (!) –, nos termos do qual, reitera questões já amplamente decididas e resolvidas 
 nos autos, persistindo no entendimento de que lhe assiste ainda o direito de, 
 posteriormente, vir a deduzir reclamação contra a referida decisão. Com efeito, 
 chega mesmo a afirmar:
 
  
 
 “5. Refere-se, o dito despacho, ao direito previsto no artigo 78º-A, n.º 4, da 
 LTC. Mas, no modesto entendimento do mandatário do Recorrente, tal direito só 
 deve ser exercido depois de exercidos os poderes conferidos ao Relator pelo 
 disposto no artigo 78º-B, nº 1, da mesma Lei, sendo certo que o cumprimento do 
 disposto no artigo 97º do CPC, e 245º do CPP, compete, em primeiro lugar, ao 
 Relator.” (fls. 841)
 
  
 
             
 Cumpre apreciar e decidir. 
 
  
 
  
 
  
 II – FUNDAMENTAÇÃO
 
  
 
 5. Apesar de dirigir expressamente o requerimento de fls. 840 e 841 à Relatora 
 dos presentes autos, afigura-se evidente que o recorrente apenas pretende 
 colocar em crise a própria decisão sumária proferida, persistindo num alegado 
 dever de denúncia que teria sido omitido na referida decisão e cuja inexistência 
 legal já se encontra por demais demonstrada nos autos, designadamente, através 
 de despacho proferido pela Relatora em 8 de Junho de 2009. Esta insistência do 
 recorrente aproxima – de modo quase definitivo – a sua intervenção processual da 
 litigância de má fé, começando a ser notório que o seu único propósito reside no 
 protelamento do trânsito em julgado da referida decisão sumária. De qualquer 
 modo, admitindo ainda que tal conduta possa vir a conformar-se com os limites 
 fixados pela lei, não se procederá, por ora, a qualquer apreciação de tal 
 conduta para efeitos de condenação em litigância de má fé.
 
  
 Diga-se que o n.º 3 do artigo 78º-A da LTC determina que o único meio admissível 
 de impugnação das decisões sumárias é a reclamação para a conferência. Tal não 
 significa que, nessa sede, os recorrentes não possam invocar quaisquer nulidades 
 que entendam ter sido praticadas pelo Relator, mas apenas que a apreciação de 
 tais fundamentos de impugnação deva ser julgada por um colectivo formado pelo 
 Relator, pelo Presidente ou Vice-Presidente e por outro juiz da respectiva 
 secção.
 
  
 Este tem sido, aliás, o entendimento unânime do Tribunal Constitucional que, 
 para além, de proceder, invariavelmente, à apreciação de alegadas nulidades, em 
 sede de reclamação (a título de exemplo, vejam-se os Acórdãos n.º 431/2000, n.º 
 
 135/2003, n.º 26/2004, n.º 67/2004, n.º 367/2004, n.º 65/2006, complementado 
 pelo Acórdão n.º 282/2006, e n.º 283/2006, disponíveis in 
 
 www.tribunalconstitucional.pt), já teve mesmo oportunidade de frisar que a sede 
 própria para discussão de alegadas nulidades de decisões sumárias proferidas é 
 precisamente a reclamação para a conferência, prevista no n.º 3 do artigo 78º-A, 
 da LTC (assim, ver Acórdãos n.º 541/06 e n.º 709/07, ambos disponíveis in 
 
 www.tribunalconstitucional.pt).
 
  
 Assim sendo, restaria saber, face ao uso indevido de um meio processual que não 
 se encontra previsto na lei que rege a tramitação dos recursos perante o 
 Tribunal Constitucional, se a Relatora deveria rejeitar liminarmente tal 
 requerimento – por manifesta ausência de previsão legal – ou se, pelo contrário, 
 tal acto processual poderia ser aproveitado, mediante convolação em reclamação 
 para a conferência prevista no n.º 3 do artigo 78º-A, da LTC.
 
  
 A este propósito, o Acórdão n.º 541/06 já afirmou a seguinte linha de raciocínio 
 que ora se retoma:
 
  
 
 “No caso dos presentes autos, optou‑se, em vez do não conhecimento do “falso 
 pedido de aclaração” com o consequente trânsito em julgado da decisão sumária, 
 pela qualificação do pretenso “pedido de esclarecimento” como “reclamação para a 
 conferência” da mesma decisão, o que ao Tribunal era lícito fazer, já que não 
 está condicionado pela qualificação jurídica feita dessa peça processual pela 
 parte apresentante, em manifesta desconformidade com a sua substância. Trata‑se, 
 no fundo, do cumprimento da regra, emergente do princípio da tutela 
 jurisdicional efectiva, constitucionalmente consagrado, que manda privilegiar as 
 decisões de mérito em detrimento das decisões de mera forma, e que corresponde 
 ao dever de os tribunais providenciarem oficiosamente pelo andamento regular e 
 célere do processo (artigo 265.º, n.º 1, do Código de Processo Civil – CPC), 
 determinando a prática dos actos que melhor se ajustem ao fim do processo 
 
 (artigo 265.º‑A do CPC), o que inclui a faculdade de convolação dos meios 
 processuais incorrectamente utilizados (cf., a título de exemplo, o disposto no 
 artigo 688.º, n.º 5, do CPC).
 
             Nesta mesma linha jurisprudencial se inserem, por último, o Acórdão 
 n.º 379/2006, que decidiu tratar como reclamação para a conferência um 
 
 “requerimento de aclaração” de decisão sumária no qual não se apontava nenhum 
 problema de interpretação desta, mas apenas se revelava discordância quanto à 
 afirmação, nela contida, de que não fora definida pelo recorrente qualquer 
 questão de inconstitucionalidade normativa, e o Acórdão n.º 427/2006, que 
 desatendeu arguição de nulidade do Acórdão n.º 362/2006, arguição fundada em 
 este Acórdão ter decidido como reclamação para a conferência um requerimento 
 designado por “arguição de nulidade” de decisão sumária, referindo o Tribunal 
 que, não obstante tal requerimento não ter sido formalmente designado pelo 
 requerente como “reclamação para a conferência”, a verdade é que, atento o seu 
 conteúdo, era esse o meio processual a que correspondia, sendo, por outro lado, 
 inquestionável, desde logo por força dos princípios da economia e da adequação 
 processuais, que o tribunal que proferiu certa decisão tem o poder‑dever de 
 corrigir a incorrecta qualificação jurídico‑processual de certa pretensão do 
 recorrente, tratando‑a nos quadros da reclamação para a conferência quando, em 
 termos substanciais, apesar de invocadas pretensas ou ficcionadas nulidades, o 
 que se pretende é a pura e simples impugnação da decisão sumária proferida.”
 
  
 Na linha da jurisprudência supra citada, reforça-se que a convolação do 
 requerimento apresentado em reclamação para a conferência insere-se precisamente 
 no pleno exercício dos poderes-deveres constitucionais que foram entregues a 
 este Tribunal e, em especial, do dever de respeito e de implementação do direito 
 de acesso a uma tutela jurisdicional efectiva, necessariamente célere (artigo 
 
 20º, n.ºs 1 e 4, da CRP) e que se traduz, no plano infra-constitucional, nos 
 artigos 2º, n.º 1, 265º, n.º 1 e 266º, n.º 1, todos do CPC, aplicáveis “ex vi” 
 artigo 69º da LTC. Deste modo, impõe-se que este Tribunal conheça da questão 
 colocada, mesmo que não tenha sido deduzida – de forma expressa – reclamação 
 para a conferência.
 
  
 
 6. Posto isto, importa então fixar o objecto da presente reclamação.
 
  
 Através do requerimento de fls. 840 e 841, o reclamante limita-se a reiterar o 
 entendimento de que recai sobre a Relator do presente recurso um dever de 
 denúncia da prática de determinado crime, pelo que a decisão sumária padeceria 
 de nulidade, por tal dever não ter sido cumprido.
 
  
 Ora, conforme já inequivocamente demonstrado pelo despacho proferido pela 
 Relatora, em 08 de Junho de 2009, não recaía sobre ela qualquer dever de 
 denúncia:
 
  
 
 “Para que fique bem claro, o dever de denúncia previsto na alínea b) do n.º 1 do 
 artigo 242º, do Código Penal, apenas recai sobre os “funcionários” nela 
 identificados quando estes se deparem com “crimes de que tomarem conhecimento no 
 exercício das suas funções e por causa destas”. Ora, a Relatora não tomou 
 conhecimento de qualquer “crime” no exercício das suas funções. As considerações 
 tecidas pelo recorrente quanto à alegada falsificação de um documento devem ser 
 por si provadas perante um tribunal criminal, não dispondo o Tribunal 
 Constitucional de poderes, atribuídos pela Constituição ou pela lei, para aferir 
 da responsabilidade penal de indivíduos ou de pessoas colectivas. A mera 
 afirmação pelo recorrente de que foi praticado um crime não é geradora de 
 qualquer dever de denúncia de factos alegadamente constitutivos de um 
 determinado tipo de crime. Bom seria que o recorrente levasse esse seu temerário 
 entendimento até às últimas consequências e apresentasse ele próprio a 
 respectiva queixa pela prática dos factos que (apenas) ele reputa de criminosos.
 
  
 Mais uma vez, constata-se não haver fundamento legal para a nulidade arguida. A 
 invocação do artigo 201º do CPC é, aliás, absurda, na medida em que aquele 
 preceito legal apenas se refere a omissões de actos processuais e não a deveres 
 externos ao processo. Como é evidente para qualquer destinatário diligente, o 
 dever de denúncia consagrado no artigo 242º do CPP configura um dever de 
 carácter pessoal que recai sobre o indivíduo que é momentaneamente titular do 
 título de “funcionário”, não sendo configurável como acto inserido em 
 determinado processo judicial, muito menos em sede de recurso de 
 constitucionalidade.
 
  
 Por outro lado, ainda que o artigo 201º do CPC seja aplicável “ex vi” artigo 69º 
 da LTC, é manifesto que nem a lei comina de nula a omissão daquele dever de 
 denúncia – que como já demonstrado não recai sobre a Relatora –, nem tão pouco 
 tal omissão pode influir sobre o exame do recurso de constitucionalidade 
 interposto nos presentes.
 
  
 Deste modo, não foi cometida qualquer nulidade processual, pelo que não se 
 verifica qualquer omissão a suprir.”
 
  
 Ora, este Tribunal não tem nada mais a acrescentar ao referido despacho, 
 considerando que a decisão sumária ora reclamada não padece de qualquer 
 nulidade, por pretensa preterição de dever de denúncia por parte da Relatora, 
 devendo a mesma decisão ser plena e integralmente confirmada.
 
  
 
  
 III – DECISÃO
 
  
 Pelos fundamentos supra expostos, e ao abrigo do disposto no n.º 3 do artigo 
 
 78º-A da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, na redacção que lhe foi dada pela Lei 
 n.º 13-A/98, de 26 de Fevereiro, decide-se indeferir a presente reclamação.
 
  
 Custas devidas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20 UC’s, nos 
 termos do artigo 7º do Decreto-Lei n.º 303/98, de 07 de Outubro.
 
  
 Lisboa,  30 de Julho de 2009
 
  
 Ana Maria Guerra Martins
 Vítor Gomes
 Rui Manuel Moura Ramos