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Processo n.º 595/06 
 
 
 Plenário 
 
 
 Relator: Conselheiro Vítor Gomes 
 
 
 Acordam, em Plenário, no Tribunal Constitucional 
 
 
 I ? RELATÓRIO 
 
 
 
 1. Um grupo de deputados à Assembleia da República requereu, ao abrigo do artigo 
 
 281.º, n.º 2, alínea f), da Constituição da República Portuguesa (CRP) e dos 
 artigos 51.º, n.º 1 e 62.º, n.º 1, da Lei da Organização, Funcionamento e 
 Processo do Tribunal Constitucional (LTC), a declaração da inconstitucionalidade, 
 com força obrigatória geral, das normas contidas no artigo 98.º, n.ºs 9 e 11, do 
 Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (CIRC) e no artigo 
 
 44.º, n.ºs 5 e 6, da Lei n.º 60-A/2005, de 30 de Dezembro (Lei do Orçamento de 
 Estado para 2006 ? LOE-06), preceitos relativos ao pagamento especial por conta 
 
 (PEC) por parte de pessoas colectivas isentas de tributação em IRC. 
 
 
 As normas em causa dispõem da seguinte forma: 
 
 
 
 ?Artigo 98.º 
 
 
 
 (Pagamento especial por conta) 
 
 
 
 (?) 
 
 
 
 9 - O pagamento especial por conta a efectuar pelos sujeitos passivos de IRC que, 
 no exercício anterior àquele a que o mesmo respeita, apenas tenham auferido 
 rendimentos isentos corresponde ao montante mínimo previsto no n.º 2, sem 
 prejuízo do disposto no n.º 3. 
 
 
 
 (?) 
 
 
 
 11 - Ficam dispensados de efectuar o pagamento especial por conta: 
 
 
 a) Os sujeitos passivos totalmente isentos de IRC nos termos dos artigos 9º e 10º 
 do Código do IRC e do Estatuto Fiscal Cooperativo; 
 
 
 b) Os sujeitos passivos que se encontrem com processos no âmbito do Código dos 
 Processos Especiais de Recuperação da Empresa e de Falência, aprovado pelo 
 Decreto-Lei nº 132/93,de 23 de Abril, a partir da data de instauração desse 
 processo; 
 
 
 
 
 Artigo 44.º 
 
 
 
 (Imposto sobre o rendimento das pessoas colectivas) 
 
 
 
 (?) 
 
 
 
 5 - O disposto no n.º 9 do artigo 98.º do Código do IRC, na redacção dada pela 
 presente lei, é aplicável aos pagamentos especiais por conta efectuados ou 
 devidos pelos sujeitos passivos nele referidos nos períodos de tributação 
 iniciados em 2005. 
 
 
 
 6 - A entrega até 31 de Janeiro de 2006 do montante do pagamento especial por 
 conta resultante do disposto no n.º 9 do artigo 98.º do Código do IRC, na 
 redacção dada pela presente lei, pelos sujeitos passivos nele referidos extingue 
 os procedimentos contra?ordenacionais respeitantes à falta da sua entrega.? 
 
 
 Apesar de não impugnadas, importa ter presentes as disposições contidas nos 
 artigos 9.º e 10.º do CIRC, pois só assim será possível ter uma ideia exacta do 
 alcance das medidas legislativas objecto do presente controlo de 
 constitucionalidade: 
 
 
 
 ?Artigo 9.º 
 
 
 Estado, Regiões Autónomas, autarquias locais, suas associações de direito 
 público e federações e instituições de segurança social 
 
 
 
 1 - Estão isentos de IRC: 
 
 
 a) O Estado, as Regiões Autónomas e as autarquias locais, bem como qualquer dos 
 seus serviços, estabelecimentos e organismos, ainda que personalizados, 
 compreendidos os institutos públicos, com excepção das entidades públicas com 
 natureza empresarial; 
 
 
 b) As associações e federações de municípios e as associações de freguesia que 
 não exerçam actividades comerciais, industriais ou agrícolas; 
 
 
 c) As instituições de segurança social e previdência a que se referem os artigos 
 
 87º e 114º da Lei n.º 17/2000, de 8 de Agosto; 
 
 
 d) Os fundos de capitalização administrados pelas instituições de segurança 
 social. 
 
 
 
 2 - Sem prejuízo do disposto no n.º 4 do presente artigo, a isenção prevista nas 
 alíneas a) a c) do número anterior não compreende os rendimentos de capitais tal 
 como são definidos para efeitos de IRS. 
 
 
 
 3 - Não são abrangidos pela isenção prevista no n.º 1 os rendimentos dos 
 estabelecimentos fabris das Forças Armadas provenientes de actividades não 
 relacionadas com a defesa e segurança nacionais. 
 
 
 
 4 - O Estado, actuando através do Instituto de Gestão do Crédito Público, está 
 isento de IRC no que respeita a rendimentos de capitais decorrentes de operações 
 de swap e de operações cambiais a prazo, tal como são definidos para efeitos de 
 IRS.? 
 
 
 
 ?Artigo 10.º 
 
 
 Pessoas colectivas de utilidade pública e de solidariedade social 
 
 
 
 1 - Estão isentas de IRC: 
 
 
 a) As pessoas colectivas de utilidade pública administrativa; 
 
 
 b) As instituições particulares de solidariedade social e entidades anexas, bem 
 como as pessoas colectivas àquelas legalmente equiparadas; 
 
 
 c) As pessoas colectivas de mera utilidade pública que prossigam, exclusiva ou 
 predominantemente, fins científicos ou culturais, de caridade, assistência, 
 beneficência, solidariedade social ou defesa do meio ambiente. 
 
 
 
 2 - A isenção prevista na alínea c) do número anterior carece de reconhecimento 
 pelo Ministro de Estado e das Finanças, a requerimento dos interessados, 
 mediante despacho publicado no Diário da República, que define a respectiva 
 amplitude, de harmonia com os fins prosseguidos e as actividades desenvolvidas 
 para a sua realização, pelas entidades em causa e as informações dos serviços 
 competentes da Direcção-Geral dos Impostos e outras julgadas necessárias. 
 
 
 
 3 - A isenção prevista no n.º 1 não abrange os rendimentos empresariais 
 derivados do exercício das actividades comerciais ou industriais desenvolvidas 
 fora do âmbito dos fins estatutários, bem como os rendimentos de títulos ao 
 portador, não registados nem depositados, nos termos da legislação em vigor, e é 
 condicionada à observância continuada dos seguintes requisitos: 
 
 
 a) Exercício efectivo, a título exclusivo ou predominante, de actividades 
 dirigidas à prossecução dos fins que justificaram o respectivo reconhecimento da 
 qualidade de utilidade pública ou dos fins que justificaram a isenção, consoante 
 se trate, respectivamente, de entidades previstas nas alíneas a) e b) ou na 
 alínea c) do n.º 1; 
 
 
 b) Afectação aos fins referidos na alínea anterior de, pelo menos, 50% do 
 rendimento global líquido que seria sujeito a tributação nos termos gerais, até 
 ao fim do 4º exercício posterior àquele em que tenha sido obtido, salvo em caso 
 de justo impedimento no cumprimento do prazo de afectação, notificado ao 
 director-geral dos Impostos, acompanhado da respectiva fundamentação escrita, 
 até ao último dia útil do 1º mês subsequente ao termo do referido prazo; 
 
 
 c) Inexistência de qualquer interesse directo ou indirecto dos membros dos 
 
 órgãos estatutários, por si mesmos ou por interposta pessoa, nos resultados da 
 exploração das actividades económicas por elas prosseguidas. 
 
 
 
 4 - O não cumprimento dos requisitos referidos nas alíneas a) e c) do número 
 anterior determina a perda da isenção, a partir do correspondente exercício, 
 inclusive. 
 
 
 
 5 - Em caso de incumprimento do requisito referido na alínea b) do nº 3, fica 
 sujeita a tributação, no 4º exercício posterior ao da obtenção do rendimento 
 global líquido, a parte desse rendimento que deveria ter sido afecta aos 
 respectivos fins.? 
 
 
 Importa ainda referir que o regime jurídico do PEC se encontra regulado, nos 
 seus aspectos essenciais, no artigo 98.º do CIRC, o qual está inserido no 
 Capítulo VI, relativo ao Pagamento, e, de forma mais específica, na Secção I, 
 sob a epígrafe ?Entidades que exerçam, a título principal, a actividade 
 comercial, industrial ou agrícola?. Além deste preceito, integram também o 
 regime do PEC os artigos 83.º, n.ºs 2 e 7 (relativos ao procedimento e forma de 
 liquidação ? o primeiro refere as várias deduções previstas e o segundo 
 estabelece que das deduções realizadas de acordo com o n.º 2 não pode resultar 
 um valor negativo) e 87.º (Pagamento especial por conta), ambos do CIRC. 
 
 
 Saliente-se, finalmente, que o regime jurídico do PEC tem de ser lido à luz de 
 outros preceitos infra-constitucionais, como é o caso dos artigos 33.º da Lei 
 Geral Tributária (LGT) e o artigo 114.º do Regime Geral das Infracções 
 Tributárias (RGIT): 
 
 
 
 ?Artigo 33.º LGT 
 
 
 
 ?As entregas pecuniárias antecipadas que sejam efectuadas pelos sujeitos 
 passivos no período de formação do facto tributário constituem pagamento por 
 conta do imposto devido a final?. 
 
 
 
 ?Artigo 114.º RGIT 
 
 
 
 ?1. A não entrega, total ou parcial, pelo período até 90 dias, ou por período 
 superior, desde que os factos não constituam crime, ao credor tributário, da 
 prestação tributária deduzida nos termos da lei é punível com coima variável 
 entre o valor da prestação em falta e o seu dobro, sem que possa ultrapassar o 
 limite máximo abstractamente estabelecido. 
 
 
 
 2. Se a conduta prevista no número anterior for imputável a título de 
 negligência, e ainda que o período da não entrega ultrapasse os 90 dias, será 
 aplicável coima variável entre 10% e metade do imposto em falta, sem que possa 
 ultrapassar o limite máximo abstractamente estabelecido. 
 
 
 
 (?) 
 
 
 
 5. Para efeitos contra-ordenacionais são puníveis como falta de entrega da 
 prestação tributária: 
 
 
 
 (?) 
 
 
 f) A falta de pagamento, total ou parcial, da prestação tributária devida a 
 título de pagamento por conta do imposto devido a final, incluindo as situações 
 de pagamento especial por conta. 
 
 
 
 (?)?. 
 
 
 
 2. Os requerentes motivam o pedido do seguinte modo: 
 
 
 A Administração Fiscal notificou, durante os meses de Outubro e Novembro de 2005, 
 um grande número de entidades licenciadas para operar no Centro Internacional de 
 Negócios da Madeira (CINM) no sentido de estas procederem ?ao pagamento de 
 coimas devidas pelo não pagamento do Pagamento Especial por Conta (PEC), 
 relativamente ao ano em causa? [2005]. O legislador veio dar cobertura a esta 
 actuação administrativa ilegal com as normas cuja fiscalização de 
 constitucionalidade se pretende. 
 
 
 Neste quadro e em síntese, os requerentes invocam a violação dos seguintes 
 princípios constitucionais: 
 
 
 a) A violação do princípio da legalidade da criação de impostos (artigo 103.º, n.º 
 
 2, CRP) decorrerá da circunstância de a exigência do PEC às entidades 
 licenciadas no CINM configurar o pagamento, pelas mesmas, de um imposto mínimo 
 ou de um empréstimo forçado. Com efeito, conforme se sustenta, ?o PEC não foi 
 concebido como um imposto, mas sim como um pagamento por conta de um imposto: o 
 IRC. Na verdade, o PEC é um mecanismo de liquidação provisória caucional de IRC?, 
 o qual pressupõe ?a existência de uma colecta de IRC?. Ora, ?o conjunto de 
 incentivos fiscais que caracteriza o CINM? consiste no seguinte: 
 
 
 
 1) ?para as entidades licenciadas até 31 de Dezembro de 2000, prevê-se um 
 conjunto de benefícios fiscais entre os quais ressalta a isenção, até 31 de 
 Dezembro de 2011, de IRC?; 
 
 
 
 2) ?para as entidades licenciadas a partir de 1 de Janeiro de 2003 e até 31 de 
 Dezembro de 2006, prevê-se um conjunto de benefícios fiscais entre os quais 
 avulta a baixa tributação em sede de IRC: 1% em 2003 e 2004, 2% em 2005 e 2006, 
 e 3% em 2007 e seguintes. Em ambos os casos foi desde o início aprovada a 
 produção de efeitos dos benefícios fiscais até 2011 (vide artigos 33.º e 34.º do 
 Estatuto dos Benefícios Fiscais)?. 
 
 
 Daqui decorre que parte das entidades licenciadas no CINM está isenta de 
 pagamento de IRC enquanto que outra está sujeita a uma tributação mínima, o que 
 
 é incompatível com a exigência do pagamento especial por conta. 
 
 
 b) A violação do princípio da tributação das empresas com base no rendimento 
 real (artigo 104.º, n.º 2, CRP) e, consequentemente, do princípio da capacidade 
 contributiva (artigo 103.º, n.º 3, CRP) resultará do facto de que, tal como 
 explicitado em a), entidades que gozam de benefícios fiscais ? estando os seus 
 rendimentos isentos de IRC ou sendo objecto de uma tributação mínima em sede de 
 IRC ? serem obrigadas a liquidar antecipadamente o imposto sobre uma colecta que 
 não existe, no primeiro caso, ou a liquidar antecipadamente um montante bastante 
 superior à quantia devida a final, no segundo (verificando-se, neste último caso, 
 uma desproporcionalidade clara). 
 
 
 c) A violação do princípio da não retroactividade da lei fiscal (artigo 103.º, n.º 
 
 3, CRP) derivará de a Lei n.º 60-A/2005 ?determinar que o pagamento de um PEC 
 mínimo é aplicável aos períodos de tributação iniciados em 2005?. 
 
 
 d) A violação dos princípios da proporcionalidade e da confiança legítimas ?inerentes 
 a um Estado de Direito Democrático (artigo 2.º CRP)? decorrerá do facto de que a 
 
 ?exigência do PEC às entidades licenciadas no CINM constitui um acto imprevisto, 
 que põe em causa um regime paracontratual de incentivos fiscais de natureza 
 estrutural, aprovado pelo próprio Estado, destinado a vigorar até 31 de Dezembro 
 de 2011, e autorizado como tal pela Comissão Europeia. Viola, assim, os direitos 
 e as legítimas expectativas dos operadores protegidos pela noção de Estado de 
 Direito e consagrados no artigo 10.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais?. Mais 
 ainda, a ?alteração do regime jurídico?fiscal do CINM, efectuada através da Lei 
 n.º 60-A/2005, com a consequente quebra dos direitos adquiridos pelas entidades 
 licenciadas para operar no CINM e a diminuição desses incentivos, por passar a 
 existir um ?imposto? não previsto no regime, constitui não uma medida de 
 rentabilização ou de aprofundamento da competitividade internacional do CINM, 
 mas antes um atentado àquele regime, com a sua descaracterização antes do fim do 
 prazo (31 de Dezembro de 2011) negociado e aprovado entre a União Europeia e a 
 República Portuguesa, e garantido por esta aos operadores licenciados ou aos 
 agentes económicos que solicitassem o licenciamento nos prazos legalmente 
 previstos?. 
 
 
 e) A violação do princípio da autonomia regional, ?na vertente do 
 desenvolvimento económico-social? (artigo 225.º, n.º 2, CRP), decorrerá do facto 
 de os preceitos em análise comprometerem o sucesso de um mecanismo fiscal que 
 visa lutar contra ?os constrangimentos económico-sociais de uma pequena ilha 
 ultraperiférica?. Efectivamente, o ?CINM configura-se como um regime de auxílios 
 de Estado sob a forma fiscal com objectivos de desenvolvimento regional, que tem 
 vindo a ser sucessivamente aprovado pelo Estado português e pela Comissão 
 Europeia desde 1980?. ?Os factos descritos põem em causa o normal funcionamento 
 de um dos principais instrumentos do programa de desenvolvimento da Região 
 Autónoma da Madeira em que se consubstancia o regime de incentivos fiscais do 
 CINM, consagrados no EBF para as entidades licenciadas no CINM, com a 
 defraudação das expectativas e direitos por ela adquiridos, bem como a alteração 
 do mesmo quadro legal antes do fim do prazo desses incentivos, o que tudo 
 frustra a estável e regular execução daquele programa político-económico junto 
 dos agentes económicos e dos mercados e, «rectius», a prossecução da política de 
 desenvolvimento económico e social delineada desde a década de 1980 para a 
 Região, violando, assim, igualmente, o n.º 2 do artigo 225.º da CRP?. 
 
 
 
 3. Notificado, nos termos e para os efeitos dos artigos 54.º e 55.º, n.º 3, da 
 Lei do Tribunal Constitucional, o Presidente da Assembleia da República veio 
 oferecer o merecimento dos autos, remetendo para os trabalhos preparatórios da 
 lei o esclarecimento de eventuais dúvidas. 
 
 
 
 4. Discutido em plenário o memorando apresentado pelo Presidente do Tribunal, 
 nos termos do artigo 63.º da Lei do Tribunal Constitucional, cumpre formular a 
 decisão em conformidade com a orientação que fez vencimento. 
 
 
 II ? FUNDAMENTAÇÃO 
 
 
 
 5. Delimitação do pedido 
 
 
 Os requerentes solicitam a declaração de inconstitucionalidade de um conjunto 
 normativo integrado por quatro disposições legais ? o artigo 98.º, n.ºs 9 e 11, 
 do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas e o artigo 44.º, 
 n.ºs 5 e 6, da Lei nº 60-A/2005, de 30 de Dezembro ?, todas relativas ao regime 
 do pagamento especial por conta, a partir de uma argumentação que só em parte se 
 concentra no seu teor normativo. Em boa medida, a fundamentação do pedido atinge 
 alguns dos actos de aplicação dessas disposições por parte da Administração 
 Fiscal que não compete ao Tribunal apreciar. Importa assim proceder à 
 delimitação do objecto do pedido. 
 
 
 Neste objecto insere-se, sem sombra de dúvida, o n.º 9 do artigo 98.º do CIRC, 
 tomado no sentido de que impõe o pagamento especial por conta a sujeitos 
 passivos que no exercício a que o mesmo respeita apenas tenham auferido 
 rendimentos isentos. Os requerentes entendem que esta norma viola o principio da 
 tributação das empresas com base no rendimento real e, consequentemente, o 
 princípio da capacidade contributiva, que retiram, respectivamente, do artigo 
 
 104.º, n.º 2 e do artigo 103.º, nº 3 da Constituição. E à arguição desta 
 específica inconstitucionalidade devem ser reconduzidas as referências, 
 constantes do pedido, à exigência do PEC às entidades licenciadas no Centro 
 Internacional de Negócios da Madeira. Na verdade, além de no presente processo 
 de fiscalização abstracta sucessiva não poder estar em causa a aplicação 
 concreta do artigo 98.º do CIRC a quaisquer empresas, sempre a genérica 
 inconstitucionalidade da norma em que a exigência do PEC a tais empresas se 
 baseia consumiria a questão particular da sua aplicação a essas empresas. 
 
 
 O mesmo se diga da norma do n.º 5 do artigo 44.º da Lei nº 60-A/2005, de 30 de 
 Dezembro, que dispõe sobre o âmbito de aplicação do referido n.º 9 do artigo 98.º 
 do CIRC, na medida em que inclui nesse âmbito de aplicação ?os pagamentos 
 especiais por conta efectuados ou devidos pelos sujeitos passivos nele referidos 
 nos períodos de tributação iniciados em 2005?, o que, no entender dos 
 requerentes, contraria o princípio da não retroactividade da lei fiscal, 
 igualmente previsto no artigo 103.º, n.º 3, da Constituição. 
 
 
 Algo diverso ocorre com a norma do n.º 11 do artigo 98.º da CIRC que elenca os 
 sujeitos passivos dispensados de efectuar o pagamento especial por conta. Os 
 requerentes não aduzem qualquer argumento no sentido da inconstitucionalidade 
 desta norma, tal como ela se encontra formulada, podendo quando muito retirar-se 
 da argumentação globalmente expendida que também às empresas licenciadas no CINM 
 deveria ser reconhecida idêntica dispensa. No entanto, essa circunstância 
 poderia, quando muito, ser um argumento no sentido da ilegalidade dos actos 
 tributários que vieram exigir o pagamento do PEC a tais empresas, sem com isso 
 fundar a inconstitucionalidade da enumeração presentemente constante do n.º 11 
 do artigo 98.º do CINM. Na verdade, além de o pedido não permitir entender em 
 que termos assaca a inconstitucionalidade a este preceito, a encontrar-se ela 
 numa ausência de referência, na referida disposição, às empresas licenciadas no 
 CINM, sempre tal circunstância careceria de relevo se, como parece resultar da 
 argumentação dos requerentes, outros lugares do sistema jurídico implicam o 
 reconhecimento às empresas licenciadas no CINM do tratamento previsto no n.º 11 
 do artigo 98.º do CIRC. A ser assim, repete-se, o que poderia estar em causa 
 seria a ilegalidade dos actos de exigência de pagamento especial por conta a 
 estas empresas (de que aqui não há manifestamente que curar) e não a eventual 
 inconstitucionalidade do referido n.º 11 daquele artigo. 
 
 
 Finalmente também se encontra fora do objecto possível do pedido a norma do n.º 
 
 6 do artigo 44.º da Lei nº 60-A/2005. Esta disposição destina-se a prever a 
 extinção dos procedimentos contra-ordenacionais respeitantes à falta de 
 pagamento devido nos termos do n.º 9 do artigo 98.º do CIRC, caso a falta tenha 
 sido suprida até 31 de Janeiro de 2006. E sobre ela nada diz o pedido que possa 
 fundar a pretensa inconstitucionalidade, sendo de todo imprestáveis para o 
 efeito os parâmetros constitucionais que invoca. A mera circunstância de este 
 preceito, como aliás os dois anteriormente referidos, se encontrar numa relação 
 de acessoriedade em relação ao artigo 98.º do CIRC não permite inclui-lo no 
 objecto do pedido sem alegação de fundamentos específicos de 
 inconstitucionalidade, quando a um tal resultado não é possível chegar através 
 dos parâmetros constitucionais em geral invocados e cuja pertinência se limita à 
 apreciação do n.º 9 do artigo 98.º do CIRC e, num caso (o do princípio da não 
 retroactividade da lei fiscal: artigo 103.º, n.º 3, da Constituição), do n.º 5 
 do artigo 44.º da Lei nº 60-A/2005. 
 
 
 Deste modo, porque a circunstância de uma eventual inconstitucionalidade do 
 referido nº 9 privar consequencialmente de sentido as demais disposições 
 indicadas pelos requerentes não dispensa estes de fundamentar especificamente o 
 seu pedido de declaração de inconstitucionalidade quanto ao n.º 11 do artigo 98.º 
 do CIRC e quanto ao n.º 6 do artigo 44.º da Lei nº 60-A/2005, há que considerar 
 o objecto do presente pedido de declaração de inconstitucionalidade 
 exclusivamente integrado pelas disposições constantes do n.º 9 do artigo 98.º do 
 CIRC e do n.º 5 do artigo 44.º da Lei nº 60-A/2005. 
 
 
 
 6. Da Inconstitucionalidade do nº 9 do artigo 98.º do CIRC 
 
 
 
 6.1. Não são descabidas dúvidas de interpretação quanto a saber se do n.º 9 do 
 art.º 98.º do CIRC resulta a vinculação de entidades totalmente isentas de IRC 
 ao pagamento especial por conta, ou se o preceito se limita a prever o modo de 
 cálculo do pagamento exigível às empresas que, tendo beneficiado de isenção 
 total no exercício anterior, no exercício a que respeita o pagamento passem a 
 ficar sujeitas a IRC (por cessação da isenção ou acumulação de actividades 
 isentas com actividades não abrangidas pela isenção). 
 
 
 Efectivamente, durante os primeiros anos de aplicação do PEC, este não era 
 exigido às entidades isentas de pagamento de IRC, solução que era aceite 
 pacificamente. Assumia-se que, por definição, tais entidades estando isentas de 
 imposto, estariam dispensadas de qualquer pagamento por conta, normal ou 
 especial. 
 
 
 A Lei n.º 30-G/2000, de 29 de Dezembro (Lei do Orçamento de Estado para 2001), 
 veio a exceptuar do pagamento do PEC, de forma expressa, os sujeitos passivos 
 abrangidos pelo regime simplificado de tributação previsto no CIRC. 
 
 
 A Lei n.º 107-B/2003, de 31 de Dezembro (Lei do Orçamento de Estado para 2004), 
 estabeleceu, também de forma expressa, uma dispensa selectiva de pagamento do 
 PEC, cujos destinatários são os ?sujeitos passivos totalmente isentos de IRC nos 
 termos dos artigos 9.º e 10.º do Código do IRC e do Estatuto Fiscal Cooperativo? 
 e, de igual modo, os ?sujeitos passivos que se encontrem com processos no âmbito 
 do Código dos Processos Especiais de Recuperação da Empresa e de Falência, (?), 
 a partir da data da instauração desse processo?. 
 
 
 A Lei n.º 60-A/2005, de 30 de Dezembro (Lei do Orçamento de Estado para 2006), 
 viria a consagrar expressamente o pagamento de um PEC de montante mínimo ?aos 
 sujeitos passivos de IRC que, no exercício anterior àquele a que o mesmo 
 respeita, apenas tenham auferido rendimentos isentos?. 
 
 
 Verifica-se, assim, que do regime originário do PEC não decorria que a ele 
 estivessem obrigadas as entidades isentas de IRC. Na LOE para 2001 excepcionaram-se 
 do pagamento do PEC os sujeitos passivos abrangidos pelo regime simplificado 
 previsto no CIRC, sem que isso tenha gerado a ideia de que os sujeitos isentos 
 de IRC estivessem obrigados ao respectivo regime, não havendo notícia de que a 
 Administração Fiscal lhes tenha exigido qualquer pagamento. A dúvida só surgiu 
 com a LOE para 2004, em que o legislador estabeleceu uma dispensa selectiva em 
 relação ao pagamento do PEC, que incluía alguns sujeitos isentos de IRC. O então 
 introduzido n.º 10 do artigo 98.º do CIRC (actual n.º 11, na sequência das 
 alterações resultantes da LOE para 2006), ao contemplar, numa norma que, pelo 
 teor literal e inserção sistemática, parece pretender esgotar as hipóteses de ?dispensa? 
 de pagamento especial por conta, abriu a porta a uma interpretação a contrario 
 no sentido de que as demais entidades isentas de IRC aí não referidas ? na 
 prática, as empresas privadas que beneficiem de isenção total, nomeadamente as 
 que se encontrem nas condições e apenas aufiram os rendimentos previstos no 
 artigo 33.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais ? ficavam obrigadas ao PEC. 
 
 
 Esta interpretação, que terá levado à actuação da Administração Fiscal que os 
 requerentes referem, ganhou alento com a introdução dos normativos agora em 
 apreciação pela Lei n.º 60-A/2005 (LOE para 2006), cujo teor literal não exclui, 
 antes pressupõe, o entendimento de que entidades que no exercício a que o PEC 
 respeita apenas auferiram rendimentos isentos estão, apesar disso, a ele 
 sujeitas. Com efeito, o legislador não ignorava a controvérsia. A questão da 
 sujeição ao PEC de entidades isentas de IRC, outras que não as referidas no n.º 
 
 11 do artigo 98.º, foi expressamente abordada na discussão parlamentar na 
 especialidade da LOE para 2006, centrando-se a discussão na situação das 
 empresas sedeadas no CINM, com expressa referência ao entendimento da 
 Administração Fiscal (Diário da Assembleia da República, I Série, n.º 62, de 30 
 de Novembro de 2005, p. 2929 a 2938). Nesse contexto e com esta história (a 
 ocasio legis) das medidas legislativas em causa, a leitura conjugada dos nºs 9 
 do artigo 98.º do CIRC e dos n.ºs 5 e 6 do artigo 44.º da Lei n.º 60-A/2005 
 consente a interpretação de que, naquele primeiro preceito, se quis contemplar ? 
 a par da situação de empresas que anteriormente apenas auferiam rendimentos 
 isentos e perderam a isenção no exercício a que o pagamento se refere ou nele 
 acumularam actividades isentas com actividades não isentas ? também as entidades 
 que no período em causa apenas aufiram rendimentos isentos de IRC e que a 
 Administração Fiscal entendeu obrigadas ao PEC [Na opinião manifestada no debate 
 pelo Deputado Victor Baptista ( PS), as medidas em apreço trazem ?um tratamento 
 que nos parece mais equitativo para empresas que, aparente ou teoricamente, não 
 terão imposto a pagar. Daí a tributação mínima?]. A verdadeira motivação das 
 medidas legislativas em causa parece ser, como se sustenta num dos pareceres 
 jurídicos juntos pelos requerentes, a de efectuar uma interpretação autêntica do 
 
 âmbito subjectivo do PEC, no sentido de que a ele estão submetidos, ainda que 
 por um montante mínimo, sem qualquer dispensa, os sujeitos passivos de IRC que 'apenas 
 tenham auferido rendimentos isentos', ou seja, os casos de sujeitos passivos 
 totalmente isentos de IRC. 
 
 
 Assim, correspondendo a interpretação normativa que é objecto do presente pedido 
 de fiscalização abstracta sucessiva à pretensão aplicativa da Administração 
 Fiscal, sendo, por isso, susceptível de gerar litigiosidade continuada ? como, 
 aliás, voltou a ser afirmado na discussão parlamentar da Lei do Orçamento de 
 Estado para 2007 (Diário da Assembleia da República, I Série, n.º 16, de 23 de 
 Novembro de 2007, p. 64-66) ? e não sendo frontalmente repelida pelos cânones 
 hermenêuticos correntes, não deve rejeitar-se o controlo de constitucionalidade 
 proposto. 
 
 
 
 6.2. O PEC é um instrumento tributário que configura uma obrigação fiscal do 
 contribuinte, ao qual é exigido que pague antecipadamente um montante legalmente 
 determinado relativo a um imposto antes do seu apuramento definitivo. No caso em 
 análise, trata-se de um imposto periódico sobre o rendimento, o Imposto sobre o 
 Rendimento das Pessoas Colectivas (IRC). 
 
 
 A finalidade dos pagamentos por conta (do PEC mas, do mesmo modo, do pagamento 
 normal por conta ? PNC) é a de, concretizando a máxima ?pay as you earn?, 
 aproximar a data do pagamento, neste caso, do IRC, da data da produção ou 
 obtenção dos rendimentos, sendo certo que a obrigação tributária apenas estará 
 efectivamente definida e quantificada no final do respectivo período de 
 imposição, por referência aos factos tributários que fundam a emergência da 
 obrigação do imposto. Imposições deste género correspondem juridicamente, numa 
 perspectiva estrutural, a actos tributários provisórios e, funcionalmente, a 
 actos cautelares ou caucionais. 
 
 
 Sem prejuízo do reconhecimento de uma certa autonomia do pagamento antecipado da 
 dívida tributária, é necessário que se verifique uma relação de 
 instrumentalidade entre o pagamento especial por conta (o seu nascimento e 
 quantificação) e o facto tributário gerador da obrigação fiscal. Essa relação de 
 instrumentalidade é sustentada, entre outros, por Avillez Ogando (?A 
 constitucionalidade do regime do pagamento especial por conta?, in Revista da 
 Ordem dos Advogados, vol. 62, Tomo III, 2002, p. 811), o qual refere que, ?dada 
 a função instrumental do pagamento especial por conta de pagamento por conta da 
 colecta que se vier a apurar relativa ao mesmo exercício, não faria qualquer 
 sentido que para efeitos de determinação do quantitativo do pagamento especial 
 por conta fossem relevados proveitos expressamente desconsiderados pelo 
 Legislador para esse efeito?. Do mesmo modo, a doutrina estrangeira chama a 
 atenção para este requisito da instrumentalidade, para esta relação necessária 
 entre a obrigação tributária principal e o pagamento por conta e para a 
 exigência de que a antecipação do pagamento não seja arbitrária, devendo estar 
 justificada por uma relação de probabilidade com o pressuposto indicador da 
 capacidade contributiva em que se baseia o tributo (cfr. García CaracueL, Las 
 prestaciones tributarias a cuenta. Perspectivas de reforma, Granada, 2004, p. 
 
 169 e ss esp. 223 e 257 e ss, e Francesco Tesauro, Istituzioni di Diritto 
 Tributario, I, Torino, 2003, p. 244)?. 
 
 
 Não obstante essa matriz genérica, uma leitura do regime jurídico do PEC que 
 esteja atenta à sua génese e evolução leva a concluir que ele não obedece 
 prioritariamente à lógica típica de um pagamento por conta ? ou seja, 
 primariamente, a de assegurar ao erário público entradas regulares de tesouraria 
 e, em segunda linha, acautelar o Fisco contra variações de fortuna do devedor e 
 produzir uma certa 'anestesia' fiscal ?, antes estando indissociavelmente ligado 
 
 à luta contra a evasão e fraude fiscais. Há muito que havia suspeitas, desde 
 logo por parte da Administração Fiscal, relativamente aos rendimentos declarados 
 pelos sujeitos passivos de IRC; designadamente, questionava-se até que ponto 
 eles correspondiam ao rendimento tributável realmente auferido. Isso mesmo foi 
 evidenciado pela Lei n.º 52-C/96, de 27 de Dezembro (LOE para 1997), no seu 
 artigo 32.º (Disposições comuns), que continha a autorização legislativa ao 
 Governo para ?definir uma tributação mínima?e que marcaria a introdução no nosso 
 ordenamento tributário da figura do PEC. Na referida disposição, o instrumento 
 fiscal que então se consagrava foi apresentado como ?um novo tipo de pagamento 
 por conta? que visava alcançar ?uma maior justiça tributária e [a] uma maior 
 eficiência do sistema?, admitindo-se lançar mão, ?quando for o caso, de métodos 
 indiciários?. 
 
 
 Diga-se que a doutrina nacional é unânime em afirmar a natureza de instrumento 
 de combate à evasão fiscal assinalada ao PEC. Neste sentido se pronunciaram 
 Teresa Gil, ?Pagamento especial por conta?, in Fisco, n.º 107-108, Ano XIV, 
 Março, 2003, p. 11); Luís Marques, ?O pagamento especial por conta no âmbito do 
 regime especial de tributação dos grupos de sociedades?, in Fisco, n.º 107-108, 
 Ano XIV, Março, 2003, p. 3); José João de Avillez Ogando, ?A constitucionalidade 
 do regime do pagamento especial por conta?, in Revista da Ordem dos Advogados, 
 vol. 62, Tomo III, 2002, pp. 806 e ainda 821); J. L. Saldanha Sanches e André 
 Salgado de Matos, ?O pagamento especial por conta de IRC: questões de 
 conformidade constitucional, in Revista de Direito e Gestão Fiscal, Julho, 2003, 
 p. 10. 
 
 
 Aliás, há evidência empírica que confere seriedade a tais suspeitas, se virmos 
 que as receitas de IRC se concentravam num número reduzido de sujeitos passivos 
 e que era elevadíssimo o número de empresas que declaravam, de forma continuada, 
 prejuízos fiscais. TERESA GIL, loc. cit., p. 20, dá notícia de que os dados 
 estatísticos disponíveis aquando da elaboração da Lei n.º 30-G/2000 indicavam 
 que, num universo de cerca de 240.000 sujeitos passivos de IRC, 5 contribuintes 
 eram responsáveis por 28% da receita total desse imposto, sendo que 52% da mesma 
 receita era proveniente de apenas 100 empresas e que 63% dos sujeitos passivos 
 não pagava IRC. 
 
 
 
 6.3. Os requerentes invocam a violação do princípio da legalidade na criação de 
 impostos, fundando a sua asserção na circunstância de, no seu entender, ?resulta[r] 
 de forma evidente que a exigência do PEC às entidades licenciadas no CINM 
 configura a criação de um imposto mínimo ou de um empréstimo forçado violando, 
 entre outros, o princípio da legalidade da criação dos impostos consagrado no 
 artigo 103.º, n.º 2 da Constituição da República Portuguesa CRP e no artigo 8.º 
 da Lei Geral Tributária. (?) Todavia, apesar da manifesta ilegalidade da 
 exigência do PEC às entidades licenciadas do CINM, a Lei n.º 60-A/2005, de 30 de 
 Dezembro, que aprovou o Orçamento do Estado para 2006, veio prever expressamente 
 tal obrigatoriedade, ao alterar para o efeito o artigo 98.º do CIRC e 
 inviabilizando qualquer interpretação da lei conforme à CRP. (?) Isto é, se, 
 numa primeira fase, assistimos a uma interpretação por parte da Administração 
 Fiscal do disposto no artigo 98.º do CIRC em desconformidade com a lei, 
 nomeadamente a constitucional, ao pretender subsumir na referida disposição 
 legal a exigência das liquidações do PEC às empresas licenciadas no CINM, 
 através da alteração introduzida pela Lei n.º 60-A/2005 a este normativo, parece 
 ter-se dado expressa cobertura legal a tal interpretação, ao determinar que o 
 pagamento de um PEC mínimo é aplicável aos períodos de tributação iniciados em 
 
 2005 ?. 
 
 
 Pode retirar-se, com segurança, destas afirmações que a alegada violação do 
 princípio da legalidade fiscal se consubstancia na exigência, por parte da 
 Administração Fiscal, do pagamento do PEC às empresas isentas de IRC em um 
 momento anterior à consagração legal dessa mesma exigência (como referem os 
 requerentes, na LOE de 2006). Em face disto, e tendo em consideração que a 
 apreciação deste Tribunal no âmbito da sua competência de controlo da 
 constitucionalidade tem por objecto actos normativos (com a excepção das 
 propostas de referendo), a mesma não poderá incidir sobre a concreta actuação da 
 Administração Fiscal. 
 
 
 
 6.4. A natureza cautelar do PEC relativamente à obrigação que resultará da 
 determinação definitiva do imposto, o facto de o legislador o conceber como 
 instrumento ou garantia de pagamento do tributo por conta do qual é exigido e 
 não como imposição a se, justifica que se comece a análise da conformidade 
 constitucional da norma do n.º 9 do artigo 98.º do CIRC que está em apreciação (relembra-se: 
 a exigência de PEC a entidades que no período em causa apenas aufiram 
 rendimentos isentos de IRC) pelo confronto com o princípio da proibição do 
 excesso, enquanto elemento do princípio do Estado de direito. O PEC é um meio 
 ordenado à efectividade da obrigação tributária e ao combate à evasão fiscal e, 
 num Estado de direito, os meios têm de ser adequados e proporcionados (recte, na 
 perspectiva ou processo de filtragem do órgão de controlo, não desadequados e 
 não desproporcionados) ao fim a atingir ou ao resultado a obter. 
 
 
 Trata-se de um princípio de aplicação transversal a qualquer actuação do Estado, 
 seja qual for a sua natureza, e não apenas nos domínios ou a propósito das 
 matérias relativamente às quais surge expressa e directamente referido no texto 
 da Constituição (p. ex., artigos 18.º, n.º 2, 19.º, n.º 4, 266.º, n.º 2 e 277.º, 
 n.º 2). Como diz Maria Lúcia Amaral (A Forma da República, p. 187), ?a sedes 
 materiae deste princípio encontra-se antes de mais no artigo 2.º da CRP. E 
 compreende-se bem porquê. Um Estado de direito não pode deixar de ser um ?estado 
 proporcional?: se se tolerasse que os encargos impostos pelas suas decisões aos 
 cidadãos fossem desmedidos, não justificados pelos seus fins específicos e ? por 
 isso mesmo ? levianos, dificilmente se conseguiria assegurar uma ideia segundo a 
 qual a actividade estadual deva surgir, para os seus destinatários como algo 
 sério, seguro ou confiável'. 
 
 
 Ora, a medida legislativa em apreço não passa no teste da proporcionalidade. E 
 não o passa seguramente em duas das suas três vertentes ou dimensões 
 concretizadoras (adequação, necessidade ou exigibilidade e proporcionalidade em 
 sentido estrito) em que o princípio se analisa. 
 
 
 Em primeiro lugar, é manifesto que não há uma adequação meio-fim, pois, ainda 
 que o respectivo fim seja legítimo e constitucionalmente valorado e tutelado ? 
 em último termo, a luta contra a evasão e fraude fiscais, como forma de realizar 
 a justiça e igualdade tributárias ?, a verdade é que a exigência de pagamento de 
 um montante mínimo de PEC a entidades isentas de IRC não se mostra adequada para 
 perseguir e alcançar esse fim. Com efeito, relativamente s entidades que 
 beneficiam de um regime de isenção de IRC não poderá colocar-se um problema de 
 evasão fiscal nesse imposto. As práticas de evasão fiscal em dada espécie 
 tributária, por ocultação de receitas ou empolamento de custos, só poderão 
 logicamente colocar-se em relação a entidades que estejam obrigadas ao pagamento 
 desse imposto. Visto ainda de um outro ângulo, as empresas isentas do pagamento 
 de IRC vão ter que pagar o PEC em nome da luta contra a evasão fiscal, sendo 
 certo que elas, em virtude de só exercerem actividades isentas de pagamento de 
 IRC, não contribuem para essa prática. 
 
 
 Questão diferente, mas que não poderá colocar-se nesta sede, até porque não cabe 
 ao Tribunal Constitucional fazer esse juízo, é a de saber se a existência de um 
 regime de isenção de IRC a título de benefício fiscal facilita ou potencia o 
 fenómeno global da evasão fiscal. Nesse caso, o instrumento idóneo contra a 
 evasão fiscal em matéria de impostos sobre os rendimentos não será o de exigir 
 um montante mínimo de PEC a empresas isentas de IRC mas o de não isentar as 
 empresas do pagamento do imposto. 
 
 
 Também a dimensão da necessidade ou exigibilidade resulta desrespeitada. 
 Efectivamente, ainda que se demonstre que não está completamente posta de parte 
 a garantia do reembolso total do PEC, a verdade é que não tem razoabilidade 
 obrigar uma entidade a entregar um determinado montante a título de PEC, quando 
 se sabe, no momento em que o pagamento é exigido, que será ulteriormente 
 reembolsado na sua totalidade, desde que seja solicitada uma acção de inspecção 
 pelo sujeito passivo. Esta solução apresenta-se manifestamente desproporcionada, 
 consubstanciando uma medida excessiva, na medida em que é, certamente, demasiado 
 onerosa para o destinatário. Com efeito, não estando previsto um mecanismo 
 próprio para devolução do PEC nesta situação e não sendo, por definição (suposta 
 obviamente a continuidade da isenção), viável a dedução à colecta, só restará o 
 mecanismo de reembolso regulado no n.º 3 do artigo 87.º do CIRC. Ora, mesmo na 
 interpretação mais benévola para o contribuinte quanto ao prazo e aos requisitos 
 de reembolso na situação de isenção continuada, há sempre um inegável custo de 
 oportunidade e financeiro inerente à privação temporária do montante entregue ao 
 Estado. 
 
 
 Com a agravante de que o legislador exige que a situação que esteve na origem do 
 
 ?reembolso seja considerada justificada por acção de inspecção feita a pedido do 
 sujeito passivo?. É que, ao que tudo parece indicar, as acções de inspecção 
 realizadas a pedido do sujeito passivo estão, mesmo nesta hipótese, sujeitas ao 
 pagamento de uma taxa que não é de montante diminuto (ver J.J. Avillez Ogando, 
 ob. cit., p. 814; Teresa Gil, ob. cit., pp. 17 e 23). 
 
 
 Resumindo, a inexistência de uma relação de instrumentalidade entre o pagamento 
 do PEC e a obrigação tributária emergente ? a qual verdadeiramente não existe ? 
 não deixa margem para dúvidas quanto à conclusão de que a exigência do pagamento 
 de um montante a título de pagamento especial por conta às empresas que apenas 
 auferiram rendimentos isentos de IRC no período a que esse pagamento respeita 
 viola o princípio da proporcionalidade ínsito no princípio do Estado de Direito 
 democrático (artigo 2.º da CRP). 
 
 
 Fica, consequentemente, prejudicada a apreciação dos demais vícios de 
 constitucionalidade imputados à mesma norma, designadamente da violação dos 
 princípios da capacidade contributiva e da tributação das empresas 
 fundamentalmente segundo o seu rendimento real, bem como dos princípios da 
 confiança e da autonomia regional. 
 
 
 
 7. Da Inconstitucionalidade do n.º 5 do artigo 44.º da Lei nº 60-A/2005 
 
 
 Alcançada a conclusão anterior, torna-se inútil prosseguir a análise da questão 
 da inconstitucionalidade do n.º 5 do artigo 44.º da Lei nº 60-A/2005, pois que, 
 quanto às entidades que apenas aufiram rendimentos isentos, esta disposição não 
 tem sentido sem o n.º 9 do artigo 98º. 
 
 
 Mas, mesmo que se não perfilhasse o juízo proposto quanto a este último preceito, 
 sempre haveria que declarar inconstitucional o referido n.º 5 do artigo 44.º, 
 por violação do princípio da não retroactividade da lei fiscal. Na verdade, esta 
 norma dispõe claramente para o passado, ao determinar que a obrigação nela 
 contida vale não apenas para o ano de 2006 mas, outrossim, para os ?pagamentos 
 especiais por conta efectuados ou devidos pelos sujeitos passivos nele referidos 
 nos períodos de tributação iniciados em 2005?. Ora, impondo ela uma obrigação 
 tributária, não pode fixar efeitos retroactivos sob pena de violação do artigo 
 
 103.º, n.º 3, da CRP, o qual prescreve que ?ninguém pode ser obrigado a pagar 
 impostos que não hajam sido criados nos termos da Constituição, que tenham 
 natureza retroactiva ou cuja liquidação e cobrança se não façam nos termos da 
 lei? [itálico nosso]. 
 
 
 E não se diga que a atribuição de natureza tributária à norma em apreço poderá 
 ser posta em causa pelo facto de ela estar inserida na Lei de Orçamento do 
 Estado. Na verdade a inserção de normas não estritamente orçamentais, 
 designadamente as de natureza tributária, na LOE não suscita problemas de maior 
 
 (neste sentido, por exemplo, Casalta Nabais, O Dever Fundamental de Pagar 
 Impostos, Coimbra, 1997, pp. 349-50 e, ?Jurisprudência do Tribunal 
 Constitucional?, cit., pp. 405-7); Blanco de Morais, Curso de Direito 
 Constitucional, Tomo I (A lei e os actos normativos no ordenamento jurídico 
 português), Coimbra, 2008, pp. 374-5) e J.J. Gomes Canotilho, ?A lei do 
 orçamento na teoria da lei?, in Estudos em Homenagem ao Prof. Doutor J.J. 
 Teixeira Ribeiro, in BFDUC, Coimbra, 1979, pp. 548-9). 
 
 
 III ? Efeitos da declaração de inconstitucionalidade 
 
 
 
 8. O artigo 282.º, n.º 4 da Constituição confere ao Tribunal Constitucional a 
 possibilidade de fixar os efeitos da declaração de inconstitucionalidade com um 
 alcance mais restrito do que o resultante do n.º 1 do mesmo preceito, desde que 
 tal seja justificado por razões relacionadas com a segurança jurídica, equidade 
 ou interesse público de excepcional relevo. Ora, é patente que a fixação de 
 eficácia retroactiva da declaração de inconstitucionalidade, in casu, originaria 
 encargos administrativos bastante consideráveis, manifestamente 
 desproporcionados por confronto com os benefícios a colher por quem vier a 
 beneficiar da decisão que agora se adopta. Por este motivo, porque está em causa 
 um interesse público de excepcional relevo, deve este Tribunal determinar a 
 fixação de efeitos temporais meramente prospectivos (ex nunc), nos termos do n.º 
 
 4 do artigo 282.º da Constituição. 
 
 
 IV ? Decisão 
 
 
 
 9. Pelos fundamentos expostos, o Tribunal Constitucional decide: 
 
 
 a) Não conhecer do pedido quanto às normas constantes do n.º 11 do artigo 98.º 
 do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas e do n.º 6 do 
 artigo 44º da Lei nº 60-A/2005, de 30 de Dezembro; 
 
 
 b) Declarar a inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, com fundamento 
 na violação do princípio da proporcionalidade ínsito no princípio do Estado de 
 direito consagrado no artigo 2.º da Constituição, da norma contida no n.º 9 do 
 artigo 98.º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas, na 
 parte em que impõe que efectuem pagamento especial por conta entidades que, no 
 exercício a que o pagamento respeita, apenas aufiram rendimentos isentos de IRC; 
 
 
 c) Declarar a inconstitucionalidade consequencial e, ainda, por violação da 
 proibição de retroactividade constante do n.º 3 do artigo 103.º da Constituição, 
 da norma contida no n.º 5 do artigo 44º da Lei nº 60-A/2005, de 30 de Dezembro, 
 na parte em que se refere às mesmas entidades; 
 
 
 d) Ressalvar, nos termos do n.º 4 do artigo 282.º da Constituição, os efeitos 
 produzidos até à publicação deste acórdão pelas normas cuja declaração de 
 inconstitucionalidade agora se opera, sem prejuízo dos casos ainda susceptíveis 
 de impugnação contenciosa ou que dela se encontrem pendentes. 
 
 
 Lx. 29/9/2009 
 
 
 Vítor Gomes 
 
 
 Benjamim Rodrigues 
 
 
 Carlos Fernandes Cadilha 
 
 
 Ana Maria Guerra Martins 
 
 
 Maria Lúcia Amaral 
 
 
 José Borges Soeiro 
 
 
 João Cura Mariano 
 
 
 Maria João Antunes (vencida, por entender que o n.º 9 do artigo 98.º do CIRC se 
 limita a prever o modo de cálculo do pagamento exigível às empresas que, tendo 
 beneficiado de isenção total no exercício anterior, no exercício a que respeita 
 o pagamento passem a ficar sujeitos a IRC). 
 
 
 Carlos Pamplona de Oliveira ? vencido, conforme declaração. 
 
 
 Gil Galvão (vencido quanto à interpretação efectuada, no presente acórdão, da 
 norma constante do N.º 9 do artigo 98.º, conforme declaração) 
 
 
 Joaquim de Sousa Ribeiro (vencido, em parte, quanto à al. b) da decisão, pelas 
 razões constantes da declaração anexa) 
 
 
 Rui Manuel Moura Ramos 
 
 
 DECLARAÇÃO DE VOTO 
 
 
 Vencido. 
 
 
 Entendo, em primeiro lugar, que o Tribunal não deveria ter conhecido do pedido, 
 fundamentado, como está, em casos concretos relativos a beneficiários do regime 
 de benefícios fiscais especialmente criado para as entidades licenciadas para 
 operar no Centro Internacional de Negócios da Madeira. É que, em tais casos, o 
 resultado da aplicação concreta das normas impugnadas ? porventura desconforme 
 com a Constituição ? não decorre da exclusiva incidência dessas normas, mas da 
 sua conjugação com regras que disciplinam o regime fiscal especial de que 
 beneficiam aquelas entidades. 
 
 
 Por esse motivo, verificando que o sentido das normas impugnadas ? isoladamente 
 consideradas ? não consente a interpretação alegadamente inconstitucional aqui 
 invocada, entendo que, conhecendo do pedido, o Tribunal não poderia ter 
 declarado tais normas desconformes com a Constituição. 
 
 
 Carlos Pamplona de Oliveira 
 
 
 DECLARAÇÃO DE VOTO 
 
 
 Votei vencido quanto à interpretação da norma constante do n.º 9 do artigo 98º 
 do CIRC efectuada no presente acórdão. Na verdade, entendo não ser possível 
 utilizar um argumento «a contrario», retirado do n.º 11 do mesmo preceito, para 
 uma modificar a literalidade do referido n.º 9 e chegar, assim, a uma 
 interpretação obviamente inconstitucional. Considerando, ao invés, que o 
 referido n.º 9 se limita apenas a prever o modo de cálculo do pagamento exigível 
 
 às empresas que, tendo beneficiado de isenção total no exercício anterior, 
 passaram a ficar sujeitas a IRC no exercício seguinte (por cessação da isenção, 
 por acumulação de actividades isentas com não isentas ou por outro motivo), 
 nenhuma inconstitucionalidade posso encontrar na referida norma. 
 
 
 Gil Galvão 
 
 
 DECLARAÇÃO DE VOTO 
 
 
 
 1. O meu ponto de discordância com o acórdão tem a ver com a interpretação do n.º 
 
 9 do artigo 98.º do CIRC, em que ele assenta, no sentido de estarem abrangidos 
 pela previsão da norma os contribuintes que, no exercício a que o PEC respeita, 
 apenas auferiram rendimentos isentos. 
 
 
 Compreendo, de certo modo, essa interpretação, na medida em que ela é ?direito 
 vivente?, dada a actuação da Administração Fiscal relatada nos autos. 
 
 
 Mas há que preservar a fronteira entre a fiscalização abstracta, aqui exercitada, 
 e a concreta. Nesse âmbito, não sendo esse entendimento pressuposto pelo teor 
 literal da norma (contrariamente ao afirmado no acórdão) e contrariando ele 
 frontalmente a natureza e a função desde sempre atribuídas ao PEC, a sua 
 interpretação no sentido proposto só estaria justificada se existissem 
 indicações muito sólidas e conclusivas que a sustentassem. Pois, na verdade, ela 
 equivaleria a transformar o PEC, como liquidação provisória e fraccionada de 
 imposto devido a final, num tributo mínimo, de carácter autónomo e não 
 instrumental. Se assim fosse, a inconstitucionalidade da norma não ofereceria 
 dúvidas. 
 
 
 Mas não descortino elementos hermenêuticos suficientemente indicativos dessa 
 interpretação. Sendo assim, há que extrair da norma um sentido, literalmente 
 possível, em conformidade com a natureza e função do PEC. Nessa óptica, tendo a 
 considerar que ela só se aplica às empresas que, tendo estado isentas no 
 exercício anterior (pelo que não é possível retirar deste os dados habituais de 
 referência) não o estão no exercício a que o PEC respeita. 
 
 
 No caso de a Administração Fiscal, secundada pelas instâncias judiciais, aplicar 
 a interpretação contrária, que serviu de pressuposto ao acórdão, então caberá à 
 fiscalização concreta de constitucionalidade, se for caso disso, emitir a 
 correspondente censura constitucional. 
 
 
 
 2. Na sequência desta oposição, votei a inconstitucionalidade do n.º 5 do artigo 
 
 44.º da Lei n.º 60-A/2005, mas exclusivamente por violação da proibição de 
 retroactividade, não como inconstitucionalidade consequencial. 
 
 
 Joaquim de Sousa Ribeiro