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Processo n.º 599/09 
 
 
 
 1.ª Secção 
 
 
 Relator: Conselheiro José Borges Soeiro 
 
 
 Acordam, em conferência, na 1.ª Secção do Tribunal Constitucional: 
 
 
 I ? Relatório 
 
 
 
 1. A., inconformado com a decisão sumária proferida em 23 de Julho de 2009, pela 
 qual se determinou o não conhecimento do recurso de constitucionalidade que 
 previamente tinha tentado interpor, vem dela reclamar dizendo, no que ora 
 importa, o seguinte: 
 
 
 
 ?Vem a decisão sumária recorrida, douta aliás, rejeitar o presente recurso por 
 vício formal de desadequação recursiva advinda do facto de o recorrente ter 
 limitado o fundamento do recurso à simples invocação da inconstitucionalidade 
 interpretativa da norma dada pelo tribunal a quo na decisão reclamada ? (...) 
 sem curar de a especificar nos devidos termos de generalidade e abstracção 
 suficientemente destacados da concreta factualidade do caso que devem compor 
 qualquer trecho normativo (...) ? 
 
 
 Tendo mesmo ali sido efectuada transcrição dos termos dessa reclamação 
 apresentada ao Venerando Tribunal da Relação de Lisboa, porém amputada do seu 
 artigo 1.º. 
 
 
 Ora, neste se encontra a súmula da interpretação que o recorrente logrou 
 entender da sucintamente expressa na decisão reclamada, como se deixa transcrito 
 aqui: 
 
 
 
 ?Sustenta a decisão de rejeitar o recurso supra referido numa alegada falta de 
 legitimidade e interesse em agir por parte do assistente uma vez que está em 
 causa o pagamento de taxa de justiça cuja falta o não beneficiaria ou 
 prejudicaria, legitimidade exclusiva do Ministério Público em representação do 
 Estado.? 
 
 
 De uma forma clara e inequívoca ficou ali expresso que a interpretação tida por 
 incorrecta era a de que o pagamento da taxa de justiça por parte do funcionário 
 arguido, ou a sua declarada isenção, não beneficiaria ou prejudicaria o 
 assistente, logo não tinha ele legitimidade e interesse em agir, as quais cabiam 
 exclusivamente ao Ministério Público. 
 
 
 A amputação deste artigo na transcrição feita na decisão sumária reclamada é de 
 capital importância porquanto contém ela a súmula da tese controvertida que no 
 capítulo ?Fundamentação? vem exigida e serve de sustento à decisão consequente. 
 
 
 Perfilando-se assim um notório e grosseiro erro na apreciação dos elementos a 
 apreciar que urge sanar declarando a perfeição formal do requerimento recursivo 
 para a sua apreciação e decisão. 
 
 
 Termos em que se requer a sanação da irregularidade assim detectada e bem 
 patente, para os ulteriores termos processuais com o respectivo julgamento em 
 conferência, como de lei.? 
 
 
 
 2. O Exmo. Representante do Ministério Público junto deste Tribunal, veio 
 responder à reclamação, manifestando-se no sentido da sua improcedência. O 
 Reclamado B. pronunciou-se igualmente no sentido da improcedência da reclamação 
 reduzida. Já o Reclamado Tiago Lopes Freire nada veio dizer. 
 
 
 
 3. A decisão reclamada, e no que ora importa, tem o seguinte teor: 
 
 
 
 ?4. É de proferir decisão sumária nos termos do artigo 78.º-A, n.º 1 da LTC por 
 não se verificar requisito essencial ao conhecimento do recurso. Como resulta do 
 artigo 280.º, n.º 1, alínea b), da Constituição bem como do artigo 70.º, n.º 1, 
 alínea b), da LTC, para que se possa lançar mão do recurso de fiscalização 
 concreta da constitucionalidade ali previsto é necessária a suscitação de uma 
 questão de inconstitucionalidade normativa. Tal suscitação deve ocorrer, nos 
 termos do artigo 72.º, n.º 2, da LTC, de modo processualmente adequado perante o 
 tribunal que proferiu a decisão recorrida. Ora, sempre que se pretenda 
 questionar a conformidade com a Constituição de uma norma numa determinada 
 dimensão ou interpretação, deve a mesma ser expressamente identificada e 
 enunciada pela parte interessada. Este ónus de especificação justifica-se pelo 
 facto de que compete ao recorrente constitucional, em recursos do tipo que ora 
 apreciamos, a delimitação do objecto do recurso. 
 
 
 
 5. Esse ónus não foi, no entanto, cumprido pelo Recorrente que se limitou, na 
 reclamação constante de fls. 6 e seguintes, a aludir à ?interpretação assim dada 
 
 à norma do art. 401.º, n.º 1, al. b), do CPP, que estriba a decisão reclamada?, 
 sem curar de a especificar nos devidos termos de generalidade e abstracção 
 suficientemente destacados da concreta factualidade do caso que devem compor 
 qualquer trecho normativo sujeito à apreciação deste Tribunal Constitucional. Do 
 mesmo modo, ainda que se entendesse que tal desiderato veio a ser observado no 
 requerimento de interposição do recurso de constitucionalidade, tal surgiria, 
 ainda assim, de modo extemporâneo não podendo nunca relevar para o efeito em 
 apreço de cumprimento de ónus processual imprescindível ao conhecimento do 
 objecto do recurso.? 
 
 
 Cumpre apreciar e decidir. 
 
 
 II ? Fundamentação 
 
 
 
 4. A reclamação deduzida carece manifestamente de fundamento. Com efeito, a 
 argumentação do Reclamante em nada abala a fundamentação da decisão sumária 
 reclamada. Como se afirmou na decisão recorrida, quando se questiona a 
 conformidade com a Constituição de determinado preceito legal numa certa 
 interpretação, deve o [futuro] recorrente constitucional enunciar a questão 
 normativa que ali se encontra subjacente. Isso implica, como referiu Lopes do 
 Rego, que ?(?) quando se pretenda questionar a constitucionalidade de uma dada 
 interpretação normativa, é indispensável que a parte identifique expressamente 
 essa interpretação ou dimensão normativa, em termos de o Tribunal, no caso de a 
 vir a julgar inconstitucional, a poder enunciar na decisão, de modo a que os 
 respectivos destinatários e os operadores do direito em geral fiquem a saber que 
 essa norma não pode ser aplicada com tal sentido? (in O objecto idóneo dos 
 recursos de fiscalização concreta da constitucionalidade: as interpretações 
 normativas sindicáveis pelo Tribunal Constitucional, in Jurisprudência 
 Constitucional, n.º 3, Julho-Setembro de 2004, p. 8). 
 
 
 Ou, como se escreveu no acórdão n.º 401/2004 (disponível em www.tribunalconstitucional.pt), 
 
 ?colocar verdadeiramente uma questão de constitucionalidade reportada a um 
 determinado sentido normativo de um preceito é, muito mais do que isso, 
 identificar esse sentido normativo que se considera inconstitucional ? é 
 enunciar um critério normativo susceptível de generalização.? 
 
 
 Na perspectiva do ora Reclamante tal ónus teria sido satisfeito pela seguinte 
 fórmula: ?Sustenta a decisão de rejeitar o recurso supra referido numa alegada 
 falta de legitimidade e interesse em agir por parte do assistente uma vez que 
 está em causa o pagamento de taxa de justiça cuja falta o não beneficiaria ou 
 prejudicaria, legitimidade exclusiva do Ministério Público em representação do 
 Estado.? No entanto, ao contrário do que sustenta o Reclamante, não resulta aqui 
 satisfeito o ónus de especificar, relativamente ao preceito legal indicado [artigo 
 
 401.º, n.º 1, alínea b), do Código de Processo Penal], nos devidos termos de 
 generalidade e abstracção, a interpretação que, em seu entender, padecia de tal 
 inconstitucionalidade. Tal fórmula, com efeito, limita-se a descrever o 
 fundamento da decisão de rejeição do recurso ? falta de legitimidade do 
 assistente por não lhe assistir, em concreto, interesse em agir ? não enunciando 
 o critério normativo em causa em termos tais que, sendo o mesmo colocado à 
 apreciação do Tribunal Constitucional, pudesse este, caso concluísse pela 
 verificação da desconformidade, enunciá-lo na sua fórmula decisória. 
 
 
 III ? Decisão 
 
 
 
 5. Assim, e, sem necessidade de maiores considerações, acordam, em conferência, 
 indeferir a presente reclamação e, em consequência, confirmar a decisão 
 reclamada no sentido de não tomar conhecimento do recurso. 
 
 
 Custas pelo Reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20 (vinte) unidades de 
 conta. 
 
 
 Lisboa, 30 de Setembro de 2009 
 
 
 José Borges Soeiro 
 
 
 Gil Galvão 
 
 
 Rui Manuel Moura Ramos