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Processo n.º 55/10
 
 2ª Secção
 Relator: Conselheiro Joaquim de Sousa Ribeiro
 
  
 
   Acordam, em conferência, na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional
 
             
 I - Relatório   
 
  
 
 1. Nos presentes autos de fiscalização concreta da constitucionalidade, vindos 
 do Tribunal da Relação do Porto, em que é recorrente A. e Cª. Lda. e recorridos 
 Imobiliária B., Lda. e C., o relator proferiu decisão sumária de não 
 conhecimento do objecto do recurso, nos seguintes termos:
 
 «[….] 2. Não obstante as omissões de que padece o requerimento de interposição 
 do recurso, verifica-se que não estão reunidos os pressupostos necessários ao 
 conhecimento do objecto do recurso, pelo que se revela inútil o convite ao 
 aperfeiçoamento e se impõe proferir decisão sumária, nos termos do disposto no 
 artigo 78.º-A da LTC.
 No que respeita ao recurso interposto ao abrigo da alínea a) do n.º 1 do artigo 
 
 70.º da LTC, constata-se que o tribunal recorrido não efectuou qualquer recusa 
 de aplicação de uma norma, com fundamento em inconstitucionalidade, nem tal é 
 sequer invocado pelo recorrente. Pelo que é manifesta a inadmissibilidade de tal 
 recurso.
 
 É igualmente evidente a inadmissibilidade do recurso interposto ao abrigo da 
 alínea c) do nº 1 do citado artigo 70.º, por não estar em causa, nem ter sido 
 invocada, qualquer recusa de aplicação de norma com fundamento na sua 
 ilegalidade por violação de lei com valor reforçado.
 Finalmente, não estão reunidos os pressupostos relativamente ao recurso 
 interposto ao abrigo da alínea b) do nº 1 do citado artigo 70.º, desde logo, 
 porque o recorrente não suscitou perante o tribunal recorrido qualquer questão 
 de inconstitucionalidade normativa, em termos de este estar obrigado a dela 
 conhecer (cfr. artigo 72.º, n.º 2, da LTC). O que se retira, de forma, 
 inequívoca, da simples leitura do requerimento de arguição de nulidade (fls. 115 
 e s.), mencionado no requerimento de interposição do recurso. Neste requerimento 
 
 – que, de qualquer forma, já não se mostraria o momento atempado para suscitar 
 uma questão de constitucionalidade – o recorrente limita-se a imputar, ao 
 despacho em si mesmo considerado, a violação de preceitos constitucionais.
 
 3. Pelo exposto, ao abrigo do n.º 1 do artigo 78.º-A da LTC, decide-se não 
 conhecer do objecto do recurso. […]»
 
  
 
 2. Notificado da decisão, a recorrente veio reclamar para a conferência, ao 
 abrigo do artigo 78.º-A, n.º 3, da LTC, nos seguintes termos:
 
 «[…] 1 — A recorrente interpôs o presente recurso ao abrigo do disposto nos 
 art.ºs 70, n.° 1, a), b), c), 72. n.°1, b), 75, n.°1 e 78, n.°1 todos da Lei n.° 
 
 28/82, de 15/11, 
 
 2 - invocando como normas violadas os art.ºs  12, 13, 20, 21 e 87 todos da CRP, 
 
 3 - e como princípios constitucionais violados os da universalidade, da 
 igualdade, do acesso ao direito e aos tribunais, do direito de resistência, da 
 legalidade e do contraditório. 
 
 4 - Tais questões foram invocadas e suscitadas pela recorrente aquando da 
 arguição de nulidade ocorrida no Douto Despacho que indeferiu a reclamação 
 apresentada pela recorrente. 
 
 5 - O que sucedeu nos autos foi o seguinte: 
 
 • e a recorrente interpôs recurso da totalidade da sentença da primeira 
 instância (vd. doc n.°1):
 
             • tal recurso foi parcialmente admitido (e, em consequência, 
 rejeitado parcialmente)
 
              - vd. doc. n.° 2; 
 
 • dessa rejeição, a recorrente apresentou reclamação para o Presidente da 
 Veneranda Relação do Porto, que, por sua vez, também foi rejeitada - vd. doc. 
 n.° 3; 
 
 • na reclamação apresentada perante o Presidente da Veneranda Relação do Porto, 
 a recorrente afirmou, uma vez mais e conforme sempre fez desde a primeira 
 instância, que o recurso interposto abrange a totalidade da douta sentença 
 recorrida, ao afirmar expressamente a recorrente que não se conformava com a 
 douta sentença da primeira instância - vd. docn° 3; 
 
 • mais suscitou a recorrente a nulidade por omissão de pronúncia da douta 
 sentença recorrida, por esta nem sequer apreciar o pedido indemnizatório 
 formulado pela A., 
 
 • e requereu a recorrente no mesmo requerimento a atribuição de efeito 
 suspensivo ao recurso, aludindo à circunstância de, sem o efeito suspensivo 
 requerido, os RR. passarem por um lado, à alienação (simulada ou não) do prédio 
 a favor de terceiros para o retirar da esfera jurídica da 1.ª R. (assim 
 esvaziando de efeito prático o pedido de anulação da venda) e, por outro lado, a 
 Massa Falida de Rivela Têxteis, Lda ficar sem qualquer activo, uma vez que o 
 numerário existente será distribuído, sem possibilidade prática e efectiva de 
 retorno, pelos credores (esvaziando de efeito prático à pedido indemnizatório 
 formulado e nem sequer julgado na douta sentença recorrida); 
 
 • porém, o douto despacho proferido pelo Presidente da Veneranda Relação do 
 Porto nada refere quanto a essa questão, afirmando não poder pronunciar-se sobre 
 um recurso que não foi interposto - vd. doc. n.° 4: 
 
 • como também nada refere o Presidente da Veneranda Relação do Porto sobre a 
 questão suscitada, em n.° 51 do requerimento de reforma apresentado pela 
 recorrente, quanto à questão da opção do tribunal recorrido quanto a um dos 
 recursos, questionando o tribunal recorrido quanto a ter optado por uma parte da 
 douta sentença recorrida e não ter optado pela outra parte, curiosamente a mais 
 relevante e concreta e especificamente abordada nó requerimento de interposição 
 de recurso, 
 
 6 - É este douto entendimento do Presidente da Veneranda Relação do Porto que 
 está em causa no presente recurso, 
 
 7 - pelo que, salvo o devido e merecido respeito, não podia a recorrente tê-lo 
 suscitado previamente à prolacção do douto despacho em que o mesmo 
 
 (entendimento) se encontra vertido. 
 
 8 - E esse douto entendimento consubstancia omissão de pronúncia geradora de 
 nulidade 
 
 9 - uma vez que o douto despacho em apreço abstém-se de decidir sobre uma 
 questão que foi submetida à sua apreciação, 
 
 10— violando até o princípio da recorribilidade dos actos jurisdicionais, 
 
 11 — referindo-se apenas à parte do recurso que foi admitida, 
 
 12 — e ignorando ou abstendo-se de apreciar a questão suscitada quanto à parte 
 do recurso que não foi admitida, 
 
 13 - o que até traduz um non liquet absolutamente proibido. 
 
 14— São estes doutos entendimentos contidos no douto despacho do Presidente da 
 Veneranda Relação do Porto que estão em causa no presente recurso, 
 
 15 - daí a tempestividade da sua dedução perante este Alto Tribunal, 
 
 16— sendo manifesta a violação dos arts. 13, 20,21 e 87 todos da CRP, 
 
 17 — e dos princípios constitucionais da igualdade, do acesso ao direito e aos 
 tribunais, do direito de resistência, da legalidade e do contraditório. 
 
 18 - A Douta Decisão sumária, salvo o devido respeito, parece considerar que a 
 recorrente deveria ter suscitado as questões em apreço em momento processual 
 anterior, 
 
 19- mas, in casu, resulta evidente que não o podia fazer, 
 
 20 - pois a recorrente está a reagir no momento processual imediatamente 
 seguinte,
 
 21 - não podendo ser onerada com o encargo processual que reagir contra um 
 entendimento que ainda não tinha sido incorporado no douto despacho do 
 Presidente da Veneranda Relação do Porto. 
 
 22 - De qualquer forma, sempre se dirá que o que está em causa nos presentes 
 autos é permitir à recorrente que o seu recurso (da total idade da douta 
 sentença de primeira instância) seja admitido, 
 
 23 - para mais quanto a recorrente trata-se de uma entidade que viu as suas 
 legítimas expectativas frustradas pelo próprio Estado numa venda judicial, 
 
 24 - em que o Estado anulou o que ele próprio vendeu e publicitou, 
 
 25 - pelo que a não admissão do recurso da recorrente poderá ser entendido 
 
 (ainda que indevida e imerecidamente) como a recusa do Estado em não discutir os 
 seus próprios actos. 
 
 26 — Todavia, ao não admitir o recurso apresentado pela reclamante, este Alto 
 Tribunal, adoptando um Douto Entendimento formalista, obsta a que as 
 inconstitucionalidades em que incorre o douto despacho do Presidente da 
 Veneranda Relação do Porto sejam apreciadas. 
 
 27 — apesar da recorrente ter dado cumprimento aos ónus processuais a cujo 
 cumprimento (a recorrente) está adstrita. 
 
 28— Parece, pois, que, salvo o devido respeito por opinião e entendimento 
 diversos, deverá ser considerado que a recorrente deu cumprimento aos ónus 
 processuais que sobre si impendia e que o recurso seja admitido.»
 
  
 
 3. Os recorridos não apresentaram resposta.
 
  
 Tudo visto, cumpre apreciar e decidir.
 
  
 II – Fundamentação
 
  
 
 4. A decisão sumária ora reclamada pronunciou-se pelo não conhecimento do 
 objecto do recurso, com fundamento, por um lado, na não verificação (nem sequer 
 alegação) das circunstâncias que permitem os recursos fundados nas alíneas a) e 
 c) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC; e, por outro lado, na não verificação dos 
 pressupostos relativamente ao recurso interposto ao abrigo da alínea b) do mesmo 
 preceito, por a recorrente não ter suscitado qualquer questão de 
 constitucionalidade normativa, tendo-se limitado antes a imputar a violação de 
 preceitos constitucionais à própria decisão recorrida.
 A presente reclamação em nada contraria o assim decidido, sendo ademais certo 
 que a reclamante continua a não identificar qualquer questão de 
 constitucionalidade normativa que possa constituir objecto de um recurso de 
 constitucionalidade.
 Na verdade, o próprio teor da presente reclamação confirma o fundamento de não 
 conhecimento constante da decisão recorrida, no sentido de que a recorrente, ora 
 reclamante, se limita a imputar, ao despacho recorrido em si mesmo, a violação 
 de preceitos constitucionais (cfr. pontos 6, 8, 10 e 16 da reclamação).
 O que equivale a dizer que não cumpriu o ónus que lhe incumbia de suscitação da 
 questão de constitucionalidade perante o tribunal recorrido.
 
  
 III. Decisão
 
  
 Pelo exposto, acordam em indeferir a presente reclamação.
 Custas pela reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20 (vinte) unidades de 
 conta.
 Lisboa, 14 de Abril de 2010
 Joaquim de Sousa Ribeiro
 Benjamim Rodrigues
 Rui Manuel Moura Ramos