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Processo n.º 140/09
 
 3ª Secção
 Relator: Conselheiro Vítor Gomes
 
 
 
             Acordam na 3ª Secção do Tribunal Constitucional
 
  
 I. Relatório
 
             
 
 1. A., arguido no processo de que emerge o presente recurso de 
 constitucionalidade, foi condenado, por sentença de 4 de Abril de 2002 do 
 Tribunal Judicial da Comarca de Esposende, na pena de 4 anos de prisão e 360 
 dias de multa. A audiência de julgamento e a leitura da sentença realizaram-se 
 sem a sua presença, ao abrigo do artigo 333.º do Código de Processo Penal. Não 
 foi notificado pessoalmente da sentença condenatória, por se ter ausentado do 
 lugar onde deveria residir de acordo com o termo de identidade e residência 
 prestado, para parte incerta do estrangeiro, sem comunicação ao tribunal. 
 O arguido interpôs recurso da sentença condenatória, através de mandatário 
 constituído. Por acórdão de 27 de Junho de 2002, o Supremo Tribunal de Justiça 
 negou provimento ao recurso, confirmando a sentença condenatória. Este acórdão 
 foi notificado ao mandatário do recorrido, mas não a este pessoalmente.
 Após várias diligências visando a captura do arguido para cumprimento da pena, 
 por despacho de 1 de Junho de 2005, sob promoção do Ministério Público, o juiz 
 daquele tribunal de 1.ª instância declarou verificada a 'irregularidade 
 processual' consistente na falta de notificação pessoal ao arguido da sentença 
 condenatória. E em 19 de Fevereiro de 2008 o arguido veio a ser pessoalmente 
 notificado dessa sentença.
 Após esta notificação, o arguido interpôs (novo) recurso da sentença 
 condenatória de 1.ª instância, agora para o Tribunal da Relação de Guimarães. 
 Por acórdão de 2 de Junho de 2008, a Relação rejeitou o recurso, entendendo que 
 se formara caso julgado material sobre o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça.
 O recorrente interpôs recurso do acórdão da Relação para o Supremo Tribunal de 
 Justiça, que lhe negou provimento por acórdão de 14 de Janeiro de 2009, mantendo 
 a rejeição do recurso, embora com fundamentação algo diferente.
 
  
 
             2. O arguido interpôs recurso deste acórdão para o Tribunal 
 Constitucional, ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei n.º 28/82, 
 de 15 de Novembro (LTC).        Após ter sido deferida reclamação contra parte 
 do despacho liminar do relator (acórdão n.º 215/09), o recurso prosseguiu para 
 alegações quanto a três das questões enunciadas no requerimento de interposição. 
 
 
 
  
 
             O recorrente apresentou alegações em que defende a 
 inconstitucionalidade das seguintes normas:
 
  
 
 'A) Da norma criada e que agora vem sendo generalizada nas instâncias, a qual 
 arrancando do disposto nos arts. 113.º, n.º 9, 332.º, 333.º, n.º 2 e 5 do C.P. 
 Penal e do art.º 673.º do C.P. Civil, e a qual se mostra exarada nos doutos 
 Acórdãos recorridos, no sentido de que, interposto recurso da decisão 
 condenatória pelo defensor do arguido, sem que antes se tenha verificado se o 
 mesmo foi, ou não, notificado pessoalmente da dita decisão – e em consequência 
 decidir, também pessoalmente, se quer ou não recorrer -, e sendo tal recurso 
 apreciado pelo Tribunal Superior, forma-se “caso julgado”, impedindo o arguido, 
 quando efectiva e pessoalmente é notificado e toma conhecimento pessoal da 
 decisão condenatória, de Recorrer da mesma quer relativamente à questão de 
 facto, quer relativamente à questão de direito.
 B) Da norma, igualmente exarada no douto Acórdão recorrido, de que em situações 
 como a presente, onde o arguido não foi notificado pessoalmente da decisão 
 condenatória proferida em 1ª instâncias, e também não foi pessoalmente 
 notificado da decisão condenatória proferida no Tribunal de Recurso, a 
 imperiosidade prevista no artº 113º nº 9 do C.P. Penal, de notificação pessoal 
 da sentença penal condenatória ao arguido, a par da notificação do seu advogado 
 ou defensor, só ocorre quanto às sentenças ou acórdãos proferidos pelos 
 tribunais da 1ª instância, já que, quanto aos tirados em sede de recurso estes 
 apenas são notificados aos recorrentes na pessoa dos seus mandatários ou 
 defensores;
 C) Da norma também criada e tirada do disposto nos artºs. 414º, nº 2 e 3 e 420º 
 nº 1 do C. P. Penal, exarada no douto Acórdão recorrido, segundo a qual tais 
 normativos permitem a destruição dos efeitos formais e substanciais decorrentes 
 da decisão que, conheceu e declarou a respectiva “irregularidade processual”, 
 proferida em 1ª instância e então não impugnada pela parte acusatória, e, em 
 consequência, veio agora declarar que afinal aquela “irregularidade processual” 
 
 – em razão da qual foi pessoalmente notificada ao arguido a Sentença 
 condenatória e aberta a efectiva possibilidade de avaliação pessoal da 
 necessidade e, ou conveniência, de interpor recurso da anterior decisão 
 condenatória – não podia ser conhecida e declarada e, em consequência, não 
 conheceu do recurso interposto e admitido em primeira instância.”
 
  
 
             3. O Ministério Público sustenta que o recorrente fracciona 
 indevidamente a questão de constitucionalidade que, reduzida ao essencial, é a 
 de saber se o arguido tinha de ser pessoalmente notificado da decisão proferida 
 em 1ª instância, quando não esteve presente na audiência de julgamento por se 
 ter furtado ao cumprimento aos seus deveres processuais, mas nela se defendeu e 
 interpôs recurso da decisão condenatória através de mandatário constituído, 
 vindo esse primeiro recurso a ser apreciado pelo Supremo Tribunal de Justiça que 
 lhe negou provimento. E conclui no sentido de que:
 
 “1. A norma que resulta das disposições conjugadas dos artigos 113.º, n.º 9, 
 
 332.º, 333.º e 334.º do Código de Processo Penal, interpretada no sentido de que 
 a decisão condenatória da 1ª Instância não tem de ser notificada ao arguido para 
 efeitos de interposição de recurso, quando não tendo ele estado presente na 
 audiência de julgamento nem da leitura da decisão em virtude do desrespeito, 
 pela sua parte, dos deveres decorrentes do termo de identidade e residência, foi 
 aí representado por mandatário constituído que interpôs recurso para o Supremo 
 Tribunal de Justiça, tendo-lhe sido negado provimento; não viola as garantias de 
 defesa (artigo 32.º, n.º 1, da Constituição)”
 
  
 II. Fundamentação
 
  
 
             4. Para melhor compreensão e definição das questões de 
 constitucionalidade colocadas, importa respigar os seguintes aspectos da 
 tramitação do processo que, aliás, o acórdão recorrido salienta e tomou em 
 consideração na aplicação do regime legal ao caso:
 
 “1 - O arguido A. foi constituído arguido e prestou termo de identidade e 
 residência, nos termos do artigo 196º do CPP, com a redacção do DL 320-C/00, de 
 
 15-12, em 5 de Fevereiro de 2001 - fls. 272 e vº. 
 
 2 - Em 19-07-2001 foi deduzida acusação, sendo nomeado defensor oficioso ao 
 arguido o Sr. Dr. B. - fls. 550 a 580. 
 
 3 - O defensor foi notificado da acusação - fls. 608. 
 
 4 - A notificação da acusação ao arguido foi solicitada à GNR de Barcelos, pelo 
 oficio n.º 1008/01, de 20-07-2001 - fls. 595/6. 
 
 5 - Em 25-07-2001 é lavrada certidão negativa, junta a fls. 640, fazendo a GNR 
 constar que o notificando se encontra “ausente para parte incerta da Suíça, 
 declarando seu Pai C., que o mesmo só regressa a Portugal pela altura do Natal”. 
 
 
 
 6 - Em 15-10-2001, o arguido faz juntar ao inquérito procuração constituindo 
 mandatária a Dra. D., constando como data da emissão da procuração o dia 
 
 09-02-2001 - fls. 769 e 770. 
 
 7 - Entretanto foi aberta instrução requerida por outros três co-arguidos. 
 
 8 - O debate instrutório tem lugar em 07-12-2001 e a leitura da decisão 
 instrutória de pronúncia em 17-12-2001, estando presente nos dois actos a 
 Advogada Dra. D., conforme acta de fls. 895/8, maxime fls. 897, e de fls. 933/4. 
 
 
 
 9 - No final da decisão instrutória, constante de fls. 899 a 932, a Exma. Juíza, 
 tendo em conta, para além do mais, existir perigo de fuga por o arguido ora 
 recorrente se ter ausentado para parte incerta de França sem qualquer 
 autorização, consentimento ou comunicação ao Tribunal (como de resto constava já 
 da acusação), determinou a prisão preventiva do mesmo - fls. 930/1. 
 
 10 - O arguido não foi notificado da abertura de instrução, conforme fls. 781 e 
 certidão negativa de fls. 941/4, do 4º volume, datada de 31-10-2001, sendo 
 consignado “ausente para parte incerta da Suiça, segundo declarações de seus 
 familiares, bem como desconhecem seu regresso”. 
 
 11 - Não foi notificado igualmente para o debate instrutório, conforme fls. 947 
 e 948, merecendo certidão negativa, sendo de consignar que, como se referiu, não 
 era requerente da instrução. 
 
 12 - Em 19-12-2001 é emitido ofício a solicitar à GNR de Barcelos a notificação 
 da decisão instrutória e remetidos mandados de detenção para prisão preventiva - 
 fls. 949. 
 
 13 - Os quais não foram cumpridos, conforme fls. 1111 a 1113, por ter emigrado 
 para parte incerta da Suíça. 
 
 14 - Por despacho de 28-12-2001, foi designado para audiência de julgamento o 
 dia 28‑02‑2002, e como segunda data, o dia 21-03-2002 - fls. 955. 
 
 15 - Desse despacho foi notificada a Advogada Dra. D. - fls. 961. 
 
 16 - O arguido foi notificado por via postal simples com prova de depósito em 
 
 24‑01‑2002 - fls. 1101. 
 
 17 - Em 29-01-2002 o arguido fez juntar contestação e rol de 3 testemunhas, a 
 apresentar - fls. 1114 - admitidas por despacho de fls. 1157. 
 
 18 - À audiência de julgamento de 28-02-2002, faltaram três arguidos, sendo um 
 deles E., que autorizara a realização do julgamento na sua ausência; face às 
 faltas dos outros dois, por haverem prestado termo de identidade e residência, 
 foi considerado o seguinte: “Embora os arguidos A. e F. não se encontrem 
 presentes, proceder-se-á à realização da audiência de discussão e julgamento, 
 nos termos do artigo 333º, n.º 2 do C. P. Penal, sem prejuízo do disposto no n.º 
 
 3 do referido normativo legal, procedendo-se à documentação da prova a 
 produzir”, condenando-se em multa os dois arguidos faltosos, sendo ouvidos 10 
 arguidos e 5 testemunhas e marcando-se para continuação o dia 15-03-2002 (acta 
 de julgamento de fls. 1282 a 1293, do 5° volume). 
 
 19 - A Advogada constituída pelo arguido, Dra. D., esteve presente nas sessões 
 de 28 de Fevereiro de 2002, de 15 de Março (acta de fls. 1325 a 1330) e de 2l de 
 Março (acta de fls. 1352 a 1362) aqui pedindo (fls. 1353) a substituição das 
 testemunhas arroladas, o que foi deferido, sendo as mesmas ouvidas, como consta 
 de fls. 1360, estando ainda presente na audiência de leitura do acórdão (acta de 
 fls. 1426 e 1427). 
 
 20 - O acórdão foi lido em 4 de Abril de 2002 e depositado na mesma data - fls. 
 
 1435, do 50 volume. 
 
 21 - O arguido recorreu para o STJ em 22-04-2002, limitando o recurso à questão 
 da fixação concreta da medida da pena - fls. 1486 a 1490. 
 
 22 - A taxa de justiça devida pela interposição do recurso, no montante de € 
 
 79,81, foi paga em 30-04-2002, conforme fls. 1499. 
 
 23 - Após a confirmação da condenação pelo STJ, foi ordenada a passagem de 
 mandados de captura, merecendo certidão negativa mais uma vez, com a informação 
 de que o arguido emigrara para parte incerta da Suíça - fls. 1785/7. 
 
 24 - Por despacho de 23-10-2002 (fls. 1856) foi ordenada a notificação nos 
 termos do artigo 335º, ex vi do artigo 476º do CPP e a emissão de novos mandados 
 de condução ao estabelecimento prisional e remessa aos Comandos Gerais da GNR, 
 PSP, PJ, SEF e Gabinete Nacional da Interpol. 
 
 25 - Sob promoção do M° P°, em despacho de 17-01-2003, de fls. 1992/6, o arguido 
 ora recorrente foi declarado contumaz, bem como o co-arguido F., com emissão de 
 novos mandados de condução ao estabelecimento prisional, nos termos dos artigos 
 
 337º, n.º 1 e 476º do CPP. 
 
 26 - Lavrada certidão negativa do mandado, sendo consignado uma vez mais que o 
 arguido se encontra ausente em parte incerta na Suíça - fls. 2180 v.º, do volume 
 
 8º. 
 
 27 - Após novos pedidos de informação sobre o paradeiro, em 6-11-2003, foram 
 emitidos novos mandados de detenção para efeitos de cumprimento de pena, atento 
 o eventual regresso na época natalícia que se avizinhava – fls. 2313. 
 
 28 - Sucederam-se as certidões negativas em 11-12-2003, 27-05-2004 e 19-07-2004 
 
 - fls. 2358 v.º, 2486 v.º e 2542 v.º. 
 
 29 - Sob promoção do MºPº foi ordenada emissão de mandados de detenção europeu 
 
 (MDE) em 15-11-2004 – fls. 2611. 
 
 30 - Por despacho de 24-05-2005 foi o MDE restrito ao Gabinete Nacional Sirene e 
 Interpol, uma vez que ficam sem efeito os dirigidos às autoridades por se 
 desconhecer o paradeiro do arguido. 
 
 31 - Segue-se posição do MºP° seguida pela Sra. Juíza no sentido de declarar 
 
 “irregularidade processual” (despacho de 01-06-2005) e o demais supra 
 referenciado. 
 
 32 - Os autos continuaram a aguardar pelo conhecimento do paradeiro do arguido – 
 despacho de 22-6-2006. 
 
 33 - Por despacho de 21-11-2007 (fls. 3598) foi ordenada a notificação da 
 sentença ao arguido, por meio de carta rogatória, por se ter apurado que residia 
 na Suíça, agora casado. 
 
 34 - Em 28-02-2008 foi junta pelo arguido recorrente procuração emitida em 
 
 22‑02‑2008, em que constitui Mandatário, pedindo a confiança do processo e cópia 
 integral das cassetes, que foram entregues em 03-03-2008 - fls. 3629 e 3638. 
 
 35 - O arguido foi pessoalmente notificado, na Suíça, em 19 de Fevereiro de 
 
 2008, do acórdão de 4 de Abril de 2002 (fls. 3733, do 12º volume) 
 
 36 - O recurso foi apresentado em 05-03-2008 (fls. 3641 e 3696).” 
 
             
 
             5. A primeira questão enunciada pelo recorrente reconduz-se a saber 
 se viola os artigos 2.º, 20.º, 32.º, 202.º e 205.º da Constituição a norma que 
 resulta dos artigos 113.º, n.º 9, 332.º, 333.º, n.º 2 e 5 do Código de Processo 
 Penal e do artigo 673.º do Código de Processo Civil, quando interpretados no 
 sentido de que, tendo sido apreciado pelo tribunal superior um recurso 
 interposto da decisão condenatória pelo mandatário do arguido, sem que este, que 
 não esteve presente na audiência, tivesse sido pessoalmente notificado da 
 decisão aí proferida, o arguido fica impedido de interpor novo recurso quando 
 dela vem a ser pessoalmente notificado.
 
             
 
             Importa recordar que o recorrente não esteve presente na audiência 
 de julgamento, tendo sido julgado ao abrigo do artigo 333.º do Código de 
 Processo Penal. O n.º 5 deste artigo 333.º dispõe que, nessa hipótese, a 
 sentença é notificada ao arguido logo que seja detido ou se apresente e que o 
 prazo para interposição de recurso pelo arguido se conta a partir da notificação 
 da sentença. Apesar de não ter ocorrido tal notificação pessoal, foi interposto, 
 admitido e apreciado o recurso que o arguido interpôs, através da sua mandatária 
 constituída, tendo-lhe o Supremo Tribunal de Justiça negado provimento.  
 
             Não cabe no âmbito do presente recurso apreciar a regularidade de 
 tais procedimentos, seja no que toca à realização do julgamento na ausência do 
 arguido, seja no que respeita à admissão e conhecimento do recurso antes da 
 notificação pessoal da sentença ao arguido recorrente. Apenas cumpre decidir se 
 viola as normas e princípios constitucionais invocados o entendimento de que o 
 arguido fica impedido de interpor novo recurso, quando venha a ser pessoalmente 
 notificado da sentença condenatória, por efeito do caso julgado resultante de 
 acórdão que conheceu do recurso anteriormente interposto através do mandatário 
 constituído apesar de o arguido não ter sido pessoalmente notificado da 
 sentença.
 
             O Tribunal foi confrontado diversas vezes com questões de 
 constitucionalidade respeitantes à relação entre a notificação pessoal ao 
 arguido da sentença criminal condenatória e a garantia constitucional do direito 
 ao recurso em processo penal. Socorrendo-nos do elenco contido no acórdão n.º 
 
 545/2006, (disponível, como todos os demais acórdãos citados sem outra 
 referência, em www.tribunalconstitucional.pt) podem referir-se as seguintes 
 pronúncias do Tribunal de algum modo referentes a esta questão (todos estes 
 acórdãos estão disponíveis em www.tribunalconstitucional.pt):
 
             – o Acórdão n.º 75/99, que não julgou inconstitucional a norma do 
 artigo 411.º, n.º 1, do CPP, interpretado no sentido de que o prazo de 
 interposição de recurso se conta a partir da data em que a sentença foi 
 proferida na presença do arguido e do seu defensor, tendo nesse mesmo dia sido 
 depositada na secretaria, e não apenas da data em que posteriormente foi 
 notificada por via postal, pois desde aquela primeira data o arguido ficou em 
 posição de conhecer integralmente a sentença;
 
             – o Acórdão n.º 109/99, que não julgou inconstitucional a norma do 
 artigo 411.º, n.º 1, lido em conjugação com o artigo 113.º, n.º 5, do CPP, na 
 interpretação segundo a qual, com o depósito da sentença na secretaria do 
 tribunal, o arguido que, justificadamente, não esteve presente na audiência em 
 que se procedeu à leitura pública da mesma, deve considerar-se notificado do 
 seu teor, para o efeito de, a partir desse momento, se contar o prazo para 
 recorrer da sentença, se, nessa audiência, esteve presente o seu mandatário;
 
             – os Acórdãos n.ºs 148/2001 e 202/2001, que julgaram 
 inconstitucional a norma do artigo 411.º, n.º 1, do CPP, quando interpretado no 
 sentido de determinar a contagem do prazo de interposição do recurso da data do 
 depósito na secretaria da sentença manuscrita de modo ilegível, e não da data 
 em que o defensor do arguido é notificado da cópia da sentença dactilografada, 
 tempestivamente requerida, juízos de inconstitucionalidade que se fundaram no 
 entendimento de que “o direito ao recurso implica, naturalmente, que o 
 recorrente tenha a possibilidade de analisar e avaliar os fundamentos da 
 decisão recorrida, com vista ao exercício consciente, fundado e eficaz do seu 
 direito”, o que “pressupõe a plena estabilidade e inteligibilidade da decisão 
 recorrida”;
 
             – o Acórdão n.º 87/2003, que julgou inconstitucional a norma do 
 artigo 411.º, n.º 1, do CPP, na interpretação segundo a qual o prazo para 
 interpor recurso de acórdão de Tribunal da Relação, proferido em conferência, 
 nos termos do artigo 419.º, n.º 4, do CPP, e não em audiência (com prévia 
 convocação, para além de outros intervenientes, do defensor, de acordo com o 
 artigo 421.º, n.º 2, do mesmo Código), se conta a partir do depósito do acórdão 
 na secretaria, e não da respectiva notificação, tendo o Tribunal Constitucional 
 sublinhado que, uma vez que “nem o recorrente nem o seu defensor tinham sequer 
 conhecimento da data de realização da conferência, que não lhes foi comunicada”, 
 não lhes era exigível uma diligência que se traduziria no “controlo cego do 
 hipotético dia da tomada de decisão por parte do Tribunal da Relação”;
 
             – o Acórdão n.º 36/2004, que não julgou inconstitucional a norma do 
 artigo 411.º, n.º 1, do CPP, interpretado no sentido de que, quando os arguidos 
 e um defensor oficioso nomeado estão presentes à leitura da sentença, mas o 
 advogado constituído falta e é posteriormente notificado dela, o prazo de 
 interposição de recurso se conta a partir do depósito da sentença na 
 secretaria, efectuada no próprio dia da sua leitura, pois, em tal hipótese, os 
 arguidos tomaram conhecimento directo da decisão e tiveram oportunidade de, 
 actuando com a diligência exigível, esclarecer de imediato quaisquer dúvidas com 
 o advogado nomeado para o acto, tendo disposto de 15 dias para exame da sentença 
 com o seu advogado constituído, com quem lhes incumbia entrar em contacto;
 
             – o Acórdão n.º 186/2004, que julgou inconstitucional a norma do 
 artigo 411.º, n.º 1, do CPP, interpretado no sentido de que o prazo para 
 apresentação da motivação de recurso interposto por declaração na acta da 
 audiência onde foi proferida a sentença se conta a partir da data dessa 
 interposição, mesmo que a sentença só posteriormente haja sido depositada na 
 secretaria, tendo o Tribunal Constitucional considerado que “há que reconhecer 
 que «a mera leitura da sentença na presença do arguido e do seu defensor 
 oficioso no mínimo pode não permitir uma completa apreensão do teor da sentença 
 para efeito de motivação do recurso», pois «a interposição de um recurso 
 pressupõe uma análise minuciosa da decisão que se pretende impugnar, análise 
 essa que não é de todo possível realizar por mero apelo à memória da leitura do 
 texto da sentença», antes exige o acesso ao texto da sentença, o que apenas se 
 torna possível com o seu depósito na secretaria”; e
 
             – o Acórdão n.º 312/2005, que, ao abrigo do disposto no artigo 80.º, 
 n.º 3, da LTC, determinou que a norma do artigo 411.º, n.º 1, do CPP fosse 
 interpretada no sentido de que o prazo para interposição do recurso da decisão 
 condenatória do arguido ausente se conta a partir da notificação pessoal e não a 
 partir do depósito na secretaria, independentemente dos motivos que determinaram 
 tal ausência e se os mesmos são ou não justificáveis.
 
             Em todos estes casos o Tribunal apreciou a constitucionalidade de 
 normas relativas ao início do prazo para apresentação do requerimento de 
 interposição de recurso em processo penal. O critério seguido nessa 
 jurisprudência, como se lembrou no acórdão n.º 545/2006, tem sido o de que tal 
 prazo só pode iniciar-se quando o arguido (assistido pelo seu defensor), 
 actuando com a diligência devida, ficou em condições de ter acesso ao teor, 
 completo e inteligível, da decisão impugnanda, e, nos casos em que pretenda 
 recorrer também da decisão da matéria de facto e tenha havido registo da prova 
 produzida em audiência, a partir do momento em que teve (ou podia ter tido, 
 actuando diligentemente) acesso aos respectivos suportes, consoante o método de 
 registo utilizado (escrita comum, meios estenográficos ou estenotípicos, 
 gravação magnetofónica ou audio‑visual).
 
             Sucede que a questão que agora se aprecia, embora situada no 
 universo problemático das relações entre a notificação da sentença condenatória 
 ao arguido e o direito ao recurso, contém um elemento definidor que a diferencia 
 radicalmente daquelas que foram versadas na anterior jurisprudência do Tribunal. 
 Diversamente desses outros casos, em que os termos ou a falta de notificação da 
 sentença ao arguido tinham desembocado em situações de não admissão ou de 
 rejeição do recurso por extemporaneidade, ao ora recorrente foi admitido e 
 apreciado um recurso da sentença condenatória, interposto em seu nome e 
 representação pela respectiva mandatária constituída, apesar de ele ainda não 
 ter sido pessoalmente notificado da sentença. O que operou como ratio decidendi 
 da não admissão do (segundo) recurso agora interposto da sentença condenatória 
 foi, afinal, o caso julgado formado sobre o anterior acórdão que julgou o 
 
 (primeiro) recurso interposto, não qualquer problema relativo à contagem do 
 prazo de interposição do recurso, como sempre esteve presente na jurisprudência 
 citada.
 
             Assim, o que pode pertinente perguntar-se é se, nestas 
 circunstâncias, o efeito preclusivo inerente ao caso julgado viola as garantias 
 constitucionais de defesa, na vertente do direito ao recurso. O que reduz, quer 
 o elenco de preceitos legais indicados pelo recorrente, quer o espectro dos 
 parâmetros constitucionais relevantes. 
 
             Com efeito, o acórdão recorrido não nega que a notificação da 
 sentença de 1.ª instância teria de ser efectuada também pessoalmente ao arguido 
 
 (n.º 9 do artigo 113.º do CPP), que a presença do arguido na audiência seja, em 
 regra, obrigatória (artigo 332.º do CPP) ou quaisquer direitos ao arguido não 
 presente na audiência (n.º 2 do art.º 333.º do CPP), nem que, em caso de 
 ausência, o prazo de recurso por parte do arguido só começa a correr com a 
 notificação pessoal da sentença. Nesta perspectiva, apenas relevam para a 
 questão a decidir as normas do n.º 5 do artigo 333.º do Código de Processo Penal 
 e do artigo 673.º do Código de Processo Civil, na interpretação de que o 
 conhecimento do recurso interposto da decisão condenatória pelo defensor 
 constituído impede a interposição posterior de novo recurso da mesma decisão 
 quando o arguido vier a ser pessoalmente notificado.
 
             Por outro lado, o direito ao recurso por parte do arguido é objecto 
 de consagração expressa a partir da Lei Constitucional n.º 1/97, embora o 
 Tribunal já o considerasse integrante das garantias de defesa na redacção 
 anterior do n.º 1 do artigo 32.º da Constituição. Esta previsão constitucional 
 condensa e esgota o que para o mesmo efeito se poderia pretender extrair do 
 princípio do Estado de direito (artigo 2.º da CRP) ou da garantia de tutela 
 jurisdicional efectiva (artigo 20.º da CRP), sendo deslocado chamar normas ou 
 princípios mais gerais onde a Constituição oferece previsão específica. E também 
 não há pertinência na invocação dos artigos 202.º e 205.º da Constituição porque 
 nem o requerente diz nem se vislumbra em que pode a solução normativa em causa 
 colidir com qualquer das matérias reguladas nestes preceitos constitucionais. 
 
             O recorrente não esteve presente na audiência de julgamento, nem na 
 leitura da sentença condenatória, fazendo-se o julgamento na sua ausência, 
 solução que o n.º 6 do artigo 32.º da Constituição permite, desde que estejam 
 assegurados os direitos de defesa. O n.º 5 do artigo 333.º do Código de Processo 
 Penal, diferindo a contagem do prazo de interposição do recurso por parte do 
 arguido que não tenha estado presente na audiência de julgamento para o momento 
 em que vier a ser notificado da sentença, é uma das medidas que visa a 
 observância deste comando constitucional, articulando os valores justificativos 
 do julgamento na ausência do arguido com as condições inultrapassáveis do núcleo 
 irredutível do direito de defesa. Efectivamente, não satisfaria o princípio de 
 que o processo penal assegura todas as garantias de defesa um regime que se 
 traduzisse em dispensar a notificação da sentença condenatória ao arguido, 
 julgado na sua ausência, bastando-se com a notificação de tal decisão ao 
 respectivo defensor, e contando-se desta o prazo para a dedução dos subsequentes 
 meios impugnatórios. É doutrina que se retira dos acórdãos n.º 274/2003 e n.º 
 
 503/2003. 
 
             Porém, na perspectiva constitucional, uma coisa é preservar o prazo 
 para o exercício do direito processual, de modo a que não se extinga por falta 
 de interposição atempada do recurso, não considerando suficiente para iniciar a 
 contagem do prazo a notificação efectuada ao defensor quando o julgamento é 
 efectuado com o arguido ausente, e outra atender ao efeito preclusivo inerente 
 ao caso julgado que decorre do facto de o defensor ter exercido efectivamente o 
 direito de recorrer e o tribunal superior se ter pronunciado, confirmando (seria 
 o mesmo se modificasse) a decisão condenatória. Nesta hipótese, o direito ao 
 segundo grau de jurisdição quanto às decisões penais condenatórias foi exercido 
 e foi obtida a pronúncia por parte de um tribunal superior. Embora entre os fins 
 da exigência de comunicação pessoal da decisão condenatória ao arguido se 
 inscreva o de permitir-lhe que pondere, em conjunto e esclarecido pelo seu 
 defensor, as vantagens e desvantagens de interpor ou não recurso dessa decisão, 
 
 é sempre através do defensor constituído ou nomeado que o direito ao recurso se 
 exerce, porque essa é uma das fases processuais em que se torna indispensável o 
 saber profissional de um profissional do foro para tornar efectivos os direitos 
 materiais e processuais do arguido, sendo obrigatória a intervenção do defensor 
 
 (cfr. acórdão n.º 461/2004, no sentido da não inconstitucionalidade da exigência 
 de que a motivação do recurso seja subscrita pelo defensor ou mandatário). 
 Sobretudo o âmbito do recurso, a escolha das questões que é possível ou 
 conveniente suscitar perante o tribunal superior atendendo à realidade 
 processual e ao sistema de recursos disponíveis, é assunto que depende mais do 
 juízo técnico do defensor do que do arbítrio do arguido, não podendo dizer-se 
 que a não participação deste na elaboração das peças processuais correspondentes 
 afecte a eficaz defesa e uma adequada contraditoriedade relativamente à acusação 
 ou reacção esclarecida contra a sentença condenatória. Deste modo, há que 
 considerar que, interposto o recurso pelo defensor do arguido, em nome e 
 representação deste, o correspondente direito do arguido, enquanto sujeito 
 processual, fica exercido. 
 Alcançada a pronúncia por parte do tribunal superior, cujo âmbito objectivo 
 abrange o deduzido e o dedutível, o princípio da segurança jurídica inerente ao 
 Estado de direito exige que se respeite o caso julgado, que só pode ser afastado 
 se existirem circunstâncias imperiosas, como as que justificam a revisão de 
 sentença (cfr. artigo 449.º do CPP). O processo penal de um Estado de direito 
 há-de assegurar ao arguido as garantias necessárias para o proteger contra a 
 possibilidade de ser proferida uma sentença injusta, mas tem também de realizar 
 o jus puniendi do Estado que exige a estabilidade das decisões condenatórias 
 transitadas em julgado. A partir do momento em que transita em julgado a decisão 
 do tribunal superior que aprecia o recurso, a situação jurídico-penal do arguido 
 passa a ser definida por essa decisão, ficando precludida a arguição de 
 quaisquer vícios de que sofresse a sentença recorrida ou relativos à tramitação 
 processual anterior. Se o arguido – no caso, por sua opção, incumprindo os 
 deveres processuais inerentes ao seu estatuto (artigo 196.º, n.º 3, do Código de 
 Processo Penal) - se subtrai à notificação, mas o seu defensor interpõe recurso 
 da decisão, não pode considerar-se que haja no inerente efeito preclusivo um 
 encurtamento inadmissível das garantias de defesa. 
 
             Aliás, nas circunstâncias particulares do caso, o acórdão recorrido 
 extraiu dos factos que pôs em destaque que o recorrente manteve 'naturalmente 
 contactos com a sua Advogada' e que 'embora no presente recurso se refira o 
 
 «infeliz passo processual» que terá sido protagonizado pela Srª Advogada ao 
 interpor o recurso em 2002, a verdade é que a alegada ausência de conhecimento 
 do teor dos acórdãos por parte do recorrente é sempre reportada a falta de 
 notificação pessoal, no sentido de iniciativa do tribunal, jamais ousando 
 questionar directamente e com frontalidade o cumprimento do dever de comunicar 
 por parte da Srª Advogada constituída nos autos desde Fevereiro de 2001'. Pelo 
 que, mesmo que se entendesse dever estabelecer-se qualquer restrição ao 
 entendimento a que se chegou sobre a não inconstitucionalidade da norma que 
 considera precludido o direito de recorrer por efeito do recurso interposto pelo 
 defensor, nunca tal se justificaria na dimensão aplicativa que concretamente 
 está em causa. 
 
  
 
             6. Seguidamente, o recorrente submete à apreciação de 
 constitucionalidade a norma do n.º 9 do artigo 113.º do Código de Processo 
 Penal, interpretada no sentido de que a obrigatoriedade de notificação pessoal 
 da sentença penal condenatória ao arguido, a par da notificação do seu advogado 
 ou defensor, só ocorre quanto às sentenças ou acórdãos proferidos pelos 
 tribunais da 1ª instância, já que, quanto aos tirados em sede de recurso estes 
 apenas têm de ser notificados aos recorrentes na pessoa dos seus mandatários ou 
 defensores.
 Poder-se-ia duvidar da pertinência desta questão num caso em que não se pretende 
 reagir contra esse acórdão do tribunal superior, mas saber se o arguido pode 
 interpor novo recurso da mesma decisão de 1.ª instância que nele se apreciou. 
 Todavia, apreciar-se-á a questão de constitucionalidade a este propósito 
 suscitada, uma vez que o acórdão recorrido analisou a questão da suficiência da 
 notificação desse anterior acórdão e não pode dizer-se, com segurança, que tais 
 considerações constituam um obiter dictum.
 
             Sobre esta questão de saber se é constitucionalmente exigido que os 
 acórdãos dos tribunais superiores proferidos em via de recurso sejam notificados 
 pessoalmente ao arguido, ponderou-se no acórdão n.º 275/06, de 7 de Junho de 
 
 2006, o seguinte:
 
  
 
 “2.2. No Acórdão n.º 422/2005, desta 2.ª Secção, deu‑se conta das decisões 
 relevantes do Tribunal Constitucional sobre esta problemática, começando por 
 referir justamente o Acórdão n.º 59/99, no qual, embora se tenha decidido 
 
 “julgar inconstitucional, por violação do n.º 1 do artigo 32.º da Lei 
 Fundamental, a norma constante do n.º 5 [correspondente ao actual n.º 9] do 
 artigo 113.º do Código de Processo Penal, quando interpretada no sentido de que 
 a decisão condenatória proferida por um tribunal de recurso pode ser notificada 
 apenas ao defensor que ali foi nomeado para substituir o primitivo defensor 
 que, embora convocado, faltou à audiência, na qual também não esteve presente o 
 arguido em virtude de não ter sido, nem dever ser, para ela convocado”, se 
 desenvolveu fundamentação da qual claramente resultava que diferente seria o 
 sentido da decisão se se tratasse do primitivo defensor. Na verdade, lê‑se 
 nesse acórdão:
 
  
 
 “(...) são configuráveis várias hipóteses que apontam para que as garantias de 
 defesa de um arguido só serão plenamente adquiridas se ao mesmo for dado um 
 cabal conhecimento da decisão condenatória que a seu respeito foi tomada.
 Mas, entende este Tribunal, esse cabal conhecimento atinge‑se, sem violação das 
 garantias de defesa que o processo criminal deve comportar, desde que o seu 
 defensor – constituído ou nomeado oficiosamente –, contanto que se trate do 
 primitivo defensor, seja notificado da decisão condenatória tomada pelo tribunal 
 de recurso.
 Na verdade, os deveres funcionais e deontológicos que impendem sobre esse 
 defensor, na vertente do relacionamento entre ele e o arguido, apontam no 
 sentido de que o mesmo, que a seu cargo tomou a defesa daquele, lhe há‑de, com 
 propriedade, transmitir o resultado do julgamento levado a efeito no tribunal 
 superior.
 De harmonia com tais deveres, há‑de concluir-se que o arguido, por intermédio 
 do conhecimento que lhe é dado pelo seu defensor (aquele primitivo defensor) 
 ficará ciente dos motivos fácticos e jurídicos que o levaram a ser considerado 
 como agente de um ilícito criminal e da reacção, a nível de imposição de pena, 
 que lhe foi aplicada pelo Estado, ao exercitar o seu jus puniendi.
 Outrotanto, porém, se não passa se se tratar de um defensor meramente nomeado 
 para a audiência em substituição do defensor que, para ela notificado, não 
 compareceu.
 Aqui, esse defensor não estará vinculado a deveres funcionais e deontológicos 
 que lhe imponham a dação de conhecimento ao arguido do resultado do julgamento 
 realizado no tribunal superior, já que a sua intervenção processual se 
 
 «esgotou» na audiência e somente para tal intervenção foi nomeado.
 Numa tal situação, e só nessa, é que este Tribunal perfilha a óptica segundo a 
 qual norma constante do n.º 5 do artigo 113.º do Código de Processo Penal, desse 
 jeito interpretada, se revela contrária ao n.º 1 do artigo 32.º da Constituição, 
 por isso assim se não almejam as garantias que o processo criminal deve 
 assegurar ao arguido.”
 
        Ao referido Acórdão foi aposto voto de vencido do respectivo Relator, 
 Cons. Bravo Serra, por entender ser constitucionalmente imposta a notificação 
 pessoal ao arguido das decisões condenatórias, sejam tomadas em primeira 
 instância ou em recurso, não havendo razão lógica para distinguir entre umas e 
 outras para efeitos da sua comunicação pessoal ao arguido, a fim de lhe 
 possibilitar saber dos motivos da condenação e eventualmente reagir contra ela; 
 e, por outro lado, embora reconhecendo a existência do dever deontológico de o 
 primitivo defensor (constituído ou nomeado) comunicar ao arguido o resultado do 
 decidido no tribunal de recurso, o certo é que, “se a comunicação não tiver 
 lugar, objectivamente ficam postergados os direitos de defesa do mesmo arguido, 
 o qual, numa tal situação, ficou no total desconhecimento dos motivos fácticos 
 ou jurídicos que o levaram a ser considerado como agente de um ilícito criminal 
 e da reacção, a nível de imposição de pena, que lhe foi imposta pelo Estado, ao 
 exercitar o seu jus puniendi”, pelo que, “perante essa e para essa 
 eventualidade, (...) em nome das garantias de defesa constitucionalmente 
 consagradas, a lei ordinária deve prescrever (ou nesse sentido deve ser 
 interpretada a norma, já existente, ora em apreciação) a notificação pessoal do 
 arguido da decisão condenatória tomada no tribunal de recurso”.
 No Acórdão n.º 109/99, o Tribunal Constitucional não julgou inconstitucional a 
 norma, extraída da leitura conjugada dos artigos 411.º, n.º 1, e 113.º, n.º 5 
 
 (correspondente ao actual n.º 9), do CPP, segundo a qual com o depósito da 
 sentença na secretaria do tribunal o arguido que, justificadamente, não esteve 
 presente na audiência em que se procedeu à leitura pública da mesma, deve 
 considerar‑se notificado do seu teor para o efeito de, a partir desse momento, 
 se contar o prazo para recorrer da sentença, se, nessa audiência, esteve 
 presente o seu mandatário. Segundo o entendimento do Tribunal, tal norma não 
 importava “um encurtamento inadmissível das possibilidades de defesa do 
 arguido”, porquanto:
 
  “De facto, estando o defensor do arguido presente na audiência, em que se 
 procede à leitura pública da sentença e ao seu depósito na secretaria do 
 tribunal, pode aí ficar ciente do seu conteúdo. E, de posse de uma cópia dessa 
 sentença – que a secretaria lhe deve entregar de imediato – pode, nos dias que 
 se seguirem, relê‑la, repensá‑la, reflectir, ponderar e decidir, juntamente com 
 o arguido, sobre a conveniência de interpor recurso da mesma.
 Assim sendo e tendo em conta que a decisão sobre a eventual utilidade ou 
 conveniência de interpor recurso, em regra, depende mais do conselho do defensor 
 do que, propriamente, de uma ponderação pessoal do arguido, há que concluir que 
 este pode decidir se deve ou não defender‑se, interpondo, se quiser, em prazo 
 contado da leitura da sentença que o condene, o respectivo recurso. E pode 
 tomar essa decisão com inteira liberdade, sem precipitações e sem estar 
 pressionado por qualquer urgência.
 O processo continua, pois, a ser a due process of law, a fair process.”
 
  Por seu turno, no Acórdão n.º 378/2003, o Tribunal Constitucional não julgou 
 inconstitucional a norma do artigo 373.º, n.º 3, conjugado como o artigo 113.º, 
 n.º 7 (correspondente ao actual n.º 9), do CPP, ambos na redacção dada pela Lei 
 n.º 59/98, de 25 de Agosto, interpretados no sentido de que o arguido, que 
 estivera presente na audiência de julgamento e fora notificado da data da 
 leitura da sentença, mas faltara a esta sessão de leitura, se considera 
 notificado com a leitura da sentença feita perante o primitivo defensor nomeado 
 ou perante advogado constituído. Nesse aresto, depois de se reproduzirem as 
 partes essenciais da fundamentação dos Acórdãos n.ºs 59/99 e 109/99 e de se 
 rebater alegação de violação do princípio da igualdade, consignou‑se:
 
 “8. Por fim, o argumento de que «o arguido não toma conhecimento pessoal em 
 momento algum da censura penal resultante da condenação e, designadamente, dos 
 termos condicionais em que lhe é concedido o perdão» só poderia valer se se 
 desconsiderassem os deveres funcionais e deontológicos que impendem sobre o 
 defensor do arguido, como, correctamente, se sublinhou nos citados Acórdãos n.ºs 
 
 59/99 e 109/99. E isto, acrescente‑se agora, apenas se se considerasse que o 
 arguido, ciente que estava de ter praticado um facto punível – de resto, no 
 caso concreto, confessado –, e de que a sentença seria proferida em data 
 determinada, revelava em relação a esta indiferença.
 Porém, mesmo somadas estas duas condições, ainda daí não resultaria uma violação 
 das garantias de defesa constitucionalmente consagradas, porque delas não 
 resulta que a inércia e a indiferença perante as decisões judiciais possam ser 
 transformadas em vantagens. Como escreveu o Ministério Público neste Tribunal:
 
  
 
 «É evidente que, no caso ora em apreciação, o arguido sabia perfeitamente em 
 que data exacta iria ocorrer a leitura da sentença, já que, no termo da 
 audiência de julgamento em que esteve presente, foi notificado da data em que 
 viria [a] ocorrer a leitura da sentença – ao contrário do que ocorre com a 
 leitura do acórdão no Tribunal Superior, em que (...) o arguido não tem (sem a 
 efectiva colaboração do defensor) conhecimento da data em que tal decisão é 
 publicitada.
 Ora, neste circunstancialismo, discorda‑se inteiramente da argumentação 
 expendida na decisão recorrida, já que o arguido dispôs de plena oportunidade 
 para ter acesso à decisão condenatória contra si proferida, bastando que 
 diligenciasse contactar, logo de seguida à data em que bem sabia que tal decisão 
 iria ser proferida, quer o seu defensor (que bem conhecia) quer a própria 
 secretaria judicial.
 O hipotético e eventual desconhecimento do exacto teor da sentença só poderá 
 radicar, neste circunstancialismo, numa grosseira negligência do próprio 
 arguido, que bem sabendo que, em certa data, ia ser publicitada (e lhe era 
 plenamente acessível) o teor de tal sentença, se desinteressou totalmente (e 
 injustificadamente) do sentido e conteúdo da mesma.»
 
  
 Ora esta eventual negligência e desinteresse não merece, certamente, tutela ao 
 abrigo das garantias de defesa reconhecidas ao arguido.”
 
  
 Já no Acórdão n.º 476/2004 o Tribunal Constitucional julgou inconstitucionais 
 os artigos 113.º, n.º 9, e 411.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, 
 interpretados no sentido de que a notificação de uma decisão condenatória 
 relevante para a contagem do prazo de interposição de recurso seria a 
 notificação ao defensor, independentemente, em qualquer caso, da notificação 
 pessoal ao arguido, sem exceptuar os casos em que este não tenha obtido 
 conhecimento pessoal da decisão condenatória. Para fundamentar esta decisão, 
 desenvolveu o referido Acórdão a seguinte fundamentação:
 
  
 
 “5.  Jurisprudência anterior sobre questão normativa muito próxima da que é 
 formulada neste processo foi definida, sobretudo, pelo Tribunal Constitucional 
 no Acórdão n.º 59/99 e, posteriormente, nos Acórdãos n.ºs 109/99 (Diário da 
 República, II Série, de 15 de Junho de 1999) e 378/2003 (disponível em 
 
 www.tribunalconstitucional.pt). Nesses arestos estava em causa a contagem do 
 prazo para a interposição do recurso a partir da notificação ao defensor do 
 arguido ou do depósito da sentença na secretaria do Tribunal, em situações em 
 que o arguido não assistira justificadamente à leitura pública da sentença.
 Os critérios decisórios desses arestos conjugaram duas perspectivas: a de que 
 uma garantia efectiva do direito ao recurso pressupõe que ao arguido seja dado 
 conhecimento da decisão que foi tomada (na medida em que o arguido deve ter 
 oportunidade de organizar a sua defesa); e a de que tal garantia não é posta em 
 causa pelo facto de a notificação da decisão ser feita na pessoa do defensor (ou 
 de este, estando presente na leitura da sentença, ter adquirido conhecimento do 
 conteúdo decisório), na medida em que, desse modo, são criadas as condições para 
 o defensor «ponderar e decidir, juntamente com o arguido, sobre a conveniência 
 de interpor recurso» (Acórdão n.º 109/99). 
 Assim, na linha de uma abundante jurisprudência anterior, o Tribunal 
 Constitucional tem reconhecido um princípio de «oportunidade» de acesso pessoal 
 do arguido ao conteúdo do que foi decidido, em ordem a poder organizar 
 posteriormente a sua defesa (sobre esta linha decisória, cf. o Acórdão n.º 
 
 199/86 – Diário da República, II Série, de 25 de Agosto de 1986, em que se 
 afirmou peremptoriamente «Dispensar a notificação de decisões condenatórias 
 ficticiamente publicadas sem que os réus delas tomem conhecimento, fazendo 
 correr o prazo de recurso sem que estes os suspeitassem sequer, eis o que a 
 todas as luzes se afigura incompatível com o princípio geral contido no n.º 1 
 do artigo 32.º da Constituição da República Portuguesa, pois os interessados 
 vêem‑se assim privados de lançarem mão de uma instância de recurso»; e ainda o 
 Acórdão n.º 41/96, de 23 de Janeiro, inédito, em que se realça que o direito ao 
 recurso exige uma oportunidade efectiva de este ser exercido).
 Em todos os casos precedentes, embora as decisões tenham sido ora de 
 inconstitucionalidade ora de não inconstitucionalidade, o Tribunal 
 Constitucional atendeu sempre à efectiva possibilidade de exercício do direito 
 ao recurso e ponderou o valor do conhecimento pessoal pelo arguido do conteúdo 
 decisório que o afecta na concretização dessa oportunidade.
 Se é verdade que, na jurisprudência deste Tribunal, se admitiu, por vezes, que 
 o conhecimento do defensor poderia ser bastante, também é certo que nesses casos 
 se entendeu sempre que a comunicação entre o defensor e o arguido seria meio 
 adequado e normal de o arguido tomar conhecimento do conteúdo decisório que lhe 
 respeitava e que, de todo o modo, não estava posta em causa, em concreto, a 
 referida oportunidade de o arguido poder, perante o conhecimento desse 
 conteúdo, decidir ponderadamente sobre o exercício do direito ao recurso.
 
 6.  A especialidade do presente processo resulta, porém, de ter sido colocada 
 perante o tribunal recorrido a questão da inconstitucionalidade do critério 
 normativo segundo o qual a garantia do direito ao recurso se basta sempre e só 
 com a contagem do prazo para a sua interposição a partir da notificação ao 
 defensor, mesmo que a comunicação entre defensor e arguido não tenha tido lugar.
 E, na verdade, os recorrentes alegam precisamente que não tiveram conhecimento 
 pessoal do acórdão de que pretendiam recorrer, na data da notificação ao seu 
 defensor, pois na reclamação para o Presidente do Supremo Tribunal de Justiça 
 do despacho de não recebimento do recurso do acórdão do Tribunal da Relação de 
 Guimarães, referem, precisamente, que apenas tomaram conhecimento do teor do 
 acórdão da Relação através de uma notificação recebida em data posterior (27 de 
 Outubro de 2003) e não na data da notificação à respectiva defensora.
 Ora, não compete ao Tribunal Constitucional pronunciar‑se sobre as 
 circunstâncias concretas do caso quanto à veracidade daquela alegação, nem 
 sequer sobre se o recorrente, segundo o Direito aplicável, teria o ónus de 
 provar uma tal alegação ou se, tendo‑o, o terá cumprido. Todavia, no plano das 
 suas competências próprias, o Tribunal Constitucional terá de decidir a questão 
 normativa suscitada, considerando a resposta dada à mesma pelo tribunal 
 recorrido.
 Assim, o Tribunal Constitucional entende que foi suscitada pelo arguido a 
 inconstitucionalidade de um critério de contagem do prazo do recurso a partir da 
 notificação do conteúdo decisório de um acórdão ao defensor sem o conhecimento, 
 no mesmo momento, pelo arguido do respectivo conteúdo e que, perante tal 
 questão, a resposta dada pelo despacho recorrido foi a de que tal conhecimento 
 efectivo pelo arguido seria irrelevante.
 O tribunal recorrido não definiu o Direito aplicado de acordo com critérios 
 relacionados com a pertinência da alegação do recorrente, mas entendeu como 
 bastante o critério normativo segundo o qual a comunicação ao defensor do 
 conteúdo decisório definiria o momento a partir do qual se contaria o prazo para 
 a interposição do recurso, sem quaisquer outras condições ou requisitos.
 Firmada esta interpretação do objecto do recurso, quer na óptica do recurso 
 interposto quer na perspectiva da decisão recorrida, o Tribunal Constitucional 
 considera que aquele critério, ao considerar irrelevante o efectivo 
 conhecimento pelo arguido do conteúdo decisório de uma decisão judicial, não 
 cumpre plenamente a garantia efectiva do direito ao recurso consagrada no 
 artigo 32.º, n.º 1, da Constituição. Assim, não pode ser indiferente para a 
 plenitude daquela garantia, constitucionalmente consagrada, que o recorrente 
 não tenha tido conhecimento pessoal do conteúdo decisório no momento a partir do 
 qual se iniciaria o prazo para ponderar o exercício do direito ao recurso.
 Não se pronuncia o Tribunal Constitucional sobre se, no presente caso, tal 
 situação efectivamente se verificou ou se o recorrente a provou cabalmente, mas 
 apenas sobre a afectação do direito ao recurso por um critério que considere 
 irrelevante a ponderação de circunstâncias que impeçam o recorrente de tomar 
 conhecimento pessoal do conteúdo decisório da decisão de que poderá recorrer e 
 que, assim, afaste a possibilidade de discutir a verificação das mesmas 
 circunstâncias. É, consequentemente, esse o plano em que o presente juízo de 
 constitucionalidade se situa e é também esse o critério que deverá presidir à 
 reforma da decisão recorrida, a qual deverá aplicar ao caso concreto, de acordo 
 com as suas circunstâncias, o presente juízo de inconstitucionalidade.”
 
        
 O entendimento sustentado no Acórdão n.º 476/2004 foi reiterado, por último, 
 pelo Acórdão n.º 418/2005, num caso em que fora “posta ao Tribunal 
 Constitucional a questão da inconstitucionalidade da norma segundo a qual a 
 garantia do direito ao recurso «se basta sempre e só com a contagem do prazo 
 para a sua interposição a partir da notificação ao defensor, mesmo que a 
 comunicação entre defensor e arguido não tenha tido lugar»”.
 Resulta da fundamentação dos Acórdãos n.ºs 59/99, 109/99 e 378/2003 que se deu 
 por adquirido um relacionamento normal e de efectivo acompanhamento entre 
 defensor oficioso (desde que se tratasse do defensor primitivo) ou mandatário 
 constituído e arguido, que tornavam segura a efectiva comunicação por aqueles a 
 este do conteúdo das decisões que lhes foram notificadas ou a cuja leitura 
 assistiram; quando a efectivação dessa comunicação foi posta em crise, como 
 ocorreu nos casos sobre que versaram os Acórdãos n.ºs 476/2004 e 418/2005, já 
 aquela notificação ou leitura perante o defensor ou mandatário não foi tida como 
 suficiente.
 
 2.3. No presente caso, é patente que não se verifica nenhuma daquelas situações 
 de dúvida fundada sobre a efectiva transmissão, pelo mandatário ou defensor do 
 arguido a este, da comunicação recebida do tribunal.
 Recorde‑se que o ora recorrente, insatisfeito com a actividade desenvolvida pela 
 sua anterior mandatária, revogou o mandato e constituiu novo mandatário, em 21 
 de Abril de 2003. Foi já a este mandatário que foi endereçada, em 22 de Abril de 
 
 2003, a carta registada de notificação do acórdão da Relação. E do requerimento 
 apresentado em 19 de Maio de 2003, inicialmente transcrito, resulta 
 expressamente que esse mandatário lhe deu conhecimento da prolação do acórdão da 
 Relação.
 Neste contexto – independentemente, repete‑se, da questão de saber se não seria 
 melhor direito a interpretação do n.º 9 do artigo 113.º do CPP no sentido de 
 que, tal como as sentenças de 1.ª instância, também os acórdãos dos tribunais 
 superiores deveriam ser pessoalmente notificados aos arguidos –, não se pode 
 considerar que o critério normativo seguido no acórdão recorrido viole, em 
 termos intoleráveis, as garantias de defesa do arguido e designadamente o seu 
 direito ao recurso. A notificação do acórdão condenatório ao seu mandatário 
 recém‑constituído, associado aos deveres deontológicos que sobre este recaem, 
 designadamente o de dar conhecimento ao seu constituinte do teor das 
 notificações recebidas e de acertar com ele os meios de reacção a utilizar, 
 surgem, à partida, como suficientes para assegurar tais garantias e direito. É 
 que o mandato, derivado de uma escolha do próprio arguido, assenta, em regra, 
 numa relação de confiança pessoal que nem sempre existe no caso de defensor 
 oficialmente nomeado e, muito menos, no caso de defensores ad hoc. E, por outro 
 lado, resulta do dito requerimento, de forma positiva, a constatação da 
 existência da comunicação, pelo mandatário ao arguido, da prolação do acórdão”.
 
  
 
             Estas considerações são transponíveis para a norma que agora se 
 aprecia. Com efeito, também no caso a notificação do acórdão de 27 de Junho de 
 
 2002 foi efectuada à mandatária constituída e o acórdão recorrido considerou que 
 não foi consistentemente posta em dúvida a comunicação por esta da prolação do 
 acórdão ao arguido. Com estes fundamentos não se julga inconstitucional a norma 
 em causa. 
 
             7. Resta apreciar a alegada inconstitucionalidade do disposto nos 
 artigos 414.º, n.ºs. 2 e 3 e 420.º n.º 1 do Código de Processo Penal 
 interpretados no sentido de que “permitem a destruição dos efeitos formais e 
 substanciais decorrentes da decisão que, conheceu e declarou a respectiva 
 
 “irregularidade processual”, proferida em 1ª instância e então não impugnada 
 pela parte acusatória, e, em consequência, veio agora declarar que afinal aquela 
 
 “irregularidade processual” – em razão da qual foi pessoalmente notificada ao 
 arguido a Sentença condenatória e aberta a efectiva possibilidade de avaliação 
 pessoal da necessidade e, ou conveniência, de interpor recurso da anterior 
 decisão condenatória – não podia ser conhecida e declarada e, em consequência, 
 não conheceu do recurso interposto e admitido em primeira instância.”
 
             Com este enunciado, pretende o recorrente ver apreciada a alegada 
 violação dos princípios constitucionais da segurança jurídica, da confiança, da 
 proporcionalidade e das garantias de defesa em processo penal que decorreria de 
 o tribunal superior, apesar de o tribunal a quo ter admitido um recurso, poder 
 rejeitá-lo com fundamento em caso julgado formado sobre o acórdão que apreciara 
 outro recurso anteriormente interposto. Dessa interpretação resultaria ser 
 desconsiderando o despacho, proferido em 1 de Junho de 2005 e não impugnado, que 
 declarara a irregularidade processual decorrente da falta de notificação pessoal 
 da sentença condenatória e ordenara que se efectuasse essa notificação.
 
             Trata-se de alegação manifestamente infundada. 
 
             O acórdão recorrido limitou-se a aplicar a regra de que a decisão 
 que admita o recurso não vincula o tribunal superior e a verificar que o 
 despacho que declarou a irregularidade processual e que desencadeou os actos que 
 conduziram à interposição do novo recurso tinha sido proferido com desrespeito 
 pelo caso julgado formado sobre a decisão do anterior recurso por acórdão do 
 Supremo Tribunal de Justiça de 27 de Junho de 2002, que o tribunal inferior 
 tinha o dever de acatar. Em substância, fez aplicação da regra de que, havendo 
 casos julgados contraditórios, se cumpre a decisão que passar em julgado em 
 primeiro lugar, regra esta que não viola, antes reafirma, os princípios da 
 segurança jurídica e da confiança, embora a favor de outro sujeito processual.
 
             É certo, como o Tribunal decidiu no acórdão n.º 44/2004 que o 
 princípio do Estado de direito impõe uma vinculação do Estado em todas as suas 
 manifestações, e portanto também dos tribunais, ao Direito criado ou determinado 
 anteriormente, de modo definitivo, não sendo legítimo que uma decisão ao abrigo 
 da qual se constitua uma faculdade de intervenção processual, ainda que baseada 
 numa eventual interpretação errónea do direito, venha a ser destruída, pondo em 
 causa o prosseguimento com boa fé da actividade processual do arguido, 
 nomeadamente o exercício normal do seu direito de defesa. Mas, como no mesmo 
 acórdão se ponderou, desde que tal decisão não seja arbitrária ou ela mesma 
 flagrantemente violadora de direitos. 
 Ora, não pode considerar-se legitimamente fundada a expectativa de que fossem 
 mantidos os efeitos de uma decisão judicial por não ter sido impugnada – aquela 
 que admitiu novo recurso da sentença condenatória – quando essa mesma decisão 
 afronta o efeito preclusivo resultante do caso julgado formado sobre decisão 
 anteriormente proferida no processo. Não se trata aqui, diversamente do que 
 sucedia nas dimensões aplicativas que foram apreciadas, entre outros, no já 
 referido acórdão n.º 44/2004 e nos acórdãos n.ºs 39/2004, 159/2004 e 722/2004, 
 de revogar uma anterior decisão do tribunal a quo, contra a qual nenhum outro 
 sujeito processual reagira. O que existe é a desconsideração dessa decisão, para 
 este efeito, por ela própria atentar contra a estabilização da situação 
 processual resultante de anterior decisão transitada em julgado e infringir o 
 dever de acatamento das decisões dos tribunais superiores proferidas em via de 
 recurso. 
 
             Assentando a expectativa do recorrente em reabrir as vias de recurso 
 da decisão da 1ª instância numa infracção a um princípio básico do ordenamento 
 processual, a sua frustração, em consequência da interpretação adoptada do n.º 1 
 do artigo 420.º do Código de Processo Penal, não pode considerar-se arbitrária 
 ou demasiado opressiva, pelo que também neste ponto o recurso improcede.
 
  
 II. Decisão
 
             Pelo exposto, decide-se negar provimento ao recurso e condenar o 
 recorrente nas custas, fixando a taxa de justiça em 25 (vinte e cinco) UC.
 Lx. 27/X/2009
 Vítor Gomes
 Carlos Fernandes Cadilha
 Ana Maria Guerra Martins
 Maria Lúcia Amaral
 Gil Galvão