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Processo n.º 865/08
 
 2.ª Secção
 Relator: Conselheiro João Cura Mariano
 
 
 
      Acordam, em conferência, no Tribunal Constitucional
 
 
 Relatório
 
  
 A. e B. intentaram contra C., S.A., acção com processo ordinário (processo n.º 
 
 1850/06.0TVPRT, da 1º Secção da 9ª Vara Cível do Porto), pedindo a condenação da 
 Ré a pagar-lhes € 35.000 e € 25.000, respectivamente, acrescidos de juros de 
 mora.
 Alegaram terem sofrido danos não patrimoniais causados por notícias publicadas 
 no “…”, de que a Ré é proprietária.
 
  
 Após realização de audiência de julgamento foi proferida sentença em 20-08-2007 
 que julgou a acção parcialmente procedente, tendo condenado a Ré a pagar ao 
 Autor a quantia de € 25.000, acrescida de juros, absolvendo-a do demais 
 peticionado.
 
  
 A Ré recorreu desta sentença para o Tribunal da Relação do Porto que, por 
 acórdão proferido em 29-1-2008, julgou improcedente o recurso.
 
  
 A Ré recorreu para o Supremo Tribunal de Justiça que, por acórdão proferido em 
 
 10-7-2008, negou provimento ao recurso.
 
  
 A requerimento da Ré, o Supremo Tribunal de Justiça, por acórdão proferido em 
 
 16-10-2008, aclarou o acórdão anteriormente proferido.
 
  
 A Ré recorreu então para o Tribunal Constitucional, nos seguintes termos:
 
 “C. SA., vem nos termos do disposto na al. b) do nº 1 do art 70º da LTC dele 
 interpor recurso para o Tribunal Constitucional nos termos e com os fundamentos 
 seguintes.
 
 1. O presente recurso visa pedir e provocar uma apreciação de não conformidade 
 constitucional da interpretação e aplicação feitas pelo Tribunal recorrido das 
 normas constantes dos artigos 335º, 483º e 434º do CC à luz das normas e 
 princípios constitucionais do princípio da concordância prática em sede de 
 colisão do direito à informação e do direito ao bom nome, da liberdade de 
 expressão e de informação, e das normas e princípios previstos dos arts. 1º, 
 
 2º, 3º, 12º, 13º, 18º, 37º e 38º da CRP. Assim, o presente recurso é interposto 
 ao abrigo do disposto na al. b) do n 1 do art 70º da Lei do TC, tendo a questão 
 da inconstitucionalidade sido suscitada pelo menos a fls., nas alegações de 
 recurso para o STJ.
 
 2. O recurso tem por objecto a apreciação da conformidade constitucional dos 
 referidos artigos da lei civil, em dimensões interpretativas que a Recorrente 
 considera terem sido perfilhadas pelo STJ e que constituíram a ratio decidendi 
 do acórdão recorrido.
 As dimensões interpretativas constantes do acórdão recorrido, e questionadas 
 pela recorrente, com fundamento em violação das normas e princípios 
 constitucionais do principio da concordância prática em sede de colisão do 
 direito à informação e do direito ao bom nome, da liberdade de expressão e de 
 informação, e das normas e princípios previstos dos arts. 1º, 2º, 3º, 12º, 13º, 
 
 18º, 37º e 38º, da CRP, são as seguintes:
 a) a consideração da verificação de todos os pressupostos da responsabilidade 
 civil extra contratual, mormente da ilicitude e da culpa, ainda que o causante 
 se mova dentro dos limites da liberdade de expressão e do direito à informação, 
 e por causa dele;
 b) a desconsideração da inexistência de animus injuriandi, de divulgação de 
 facto que já era público como causas que, à luz da liberdade de informação, 
 tornam licita a ofensa ao bom nome;
 c) a consideração de que a divulgação do nome de uma pessoa, arguida em 
 processo crime, é em si mesma uma conduta ilícita, sem justificação, excluindo 
 o concurso e efeitos de qualquer clausula de exclusão da ilicitude, mormente a 
 existência de colisão de direitos;
 d) a consideração de que a mera invocação do segredo de justiça, ou da falta de 
 publicidade, torna automaticamente ilícita a divulgação do nome de pessoa que 
 está referenciada num processo criminal;
 e) A consideração de que o exercício do direito constitucional à informação 
 fica, ou é, condicionado por um suposto direito potestativo do visado que, 
 opondo-se à publicidade do processo criminal, impede qualquer divulgação 
 informativa sobre os factos;
 f) A consideração de que não existe exclusão da ilicitude nem justificação 
 quando
 
 • O artigo jornalístico se contém dentro dos limites consentidos pela liberdade 
 de expressão e do direito à informação;
 
 • Os factos são verdadeiros;
 
 • O agente estava convencido de que o teor do que afirmou era verdadeiro e, em 
 boa fé, tinha razões para acreditar nisso;
 
 • O agente não tinha qualquer razão para supor que os factos narrados poderiam 
 ser inexactos, falsos ou conter inverdades;
 
 • O agente não tinha qualquer intenção de ofender;
 
 • O agente apenas pretendeu levar ao conhecimento da opinião pública factos que 
 lhe pareceram fundamentais no exercício democrático da liberdade de expressão.
 
 • O direito à informação obedeceu ao seu triplo limite: o valor socialmente 
 relevante da notícia; a moderação da forma de a veicular; e a verdade, medida 
 esta pela objectividade, pela seriedade das fontes, pela isenção e pela 
 imparcialidade do autor, evitando manipulações que a deontologia profissional 
 condena.”
 
  
 Foi proferida em 18-11-2008 decisão sumária de não conhecimento do recurso 
 interposto, com a seguinte fundamentação:
 
 “No sistema português de fiscalização de constitucionalidade, a competência 
 atribuída ao Tribunal Constitucional cinge‑se ao controlo da 
 inconstitucionalidade normativa, ou seja, das questões de desconformidade 
 constitucional imputada a normas jurídicas ou a interpretações normativas, e já 
 não das questões de inconstitucionalidade imputadas directamente a decisões 
 judiciais, em si mesmas consideradas. A distinção entre os casos em que a 
 inconstitucionalidade é imputada a interpretação normativa daqueles em que é 
 imputada directamente a decisão judicial radica em que na primeira hipótese é 
 discernível na decisão recorrida a adopção de um critério normativo, ao qual 
 depois se subsume o caso concreto em apreço, com carácter de generalidade, e, 
 por isso, susceptível de aplicação a outras situações, enquanto na segunda 
 hipótese está em causa a aplicação dos critérios normativos tidos por 
 relevantes às particularidades do caso concreto.
 
           Por outro lado, tratando‑se de recurso interposto ao abrigo da alínea 
 b), do n.º 1, do artigo 70.º, da LTC – como ocorre no presente caso –, a sua 
 admissibilidade depende da verificação cumulativa dos requisitos de a questão 
 de inconstitucionalidade haver sido suscitada «durante o processo», «de modo 
 processualmente adequado perante o tribunal que proferiu a decisão 
 recorrida, em termos de este estar obrigado a dela conhecer» (n.º 2 do artigo 
 
 72.º da LTC), e de a decisão recorrida ter feito aplicação, como sua ratio 
 decidendi, das dimensões normativas arguidas de inconstitucionais pelo 
 recorrente. Aquele primeiro requisito (suscitação da questão de 
 inconstitucionalidade perante o tribunal recorrido, antes de proferida a 
 decisão impugnada) só se considera dispensável nas situações especiais em que, 
 por força de uma norma legal específica, o poder jurisdicional se não esgota 
 com a prolação da decisão recorrida, ou naquelas situações, de todo 
 excepcionais ou anómalas, em que o recorrente não dispôs de oportunidade 
 processual para suscitar a questão de constitucionalidade antes de proferida a 
 decisão recorrida ou em que, tendo essa oportunidade, não lhe era exigível que 
 suscitasse então a questão de constitucionalidade.
 O acórdão recorrido apreciou um recurso de decisão do Tribunal da Relação do 
 Porto que havia confirmado sentença da 1ª instância, na qual a recorrente havia 
 sido condenada a pagar uma indemnização, por danos causados por notícia 
 publicada em periódico. 
 Tendo o recorrente questionado, além do mais, a ilicitude e o nexo de imputação 
 da sua conduta, o acórdão recorrido deduziu a seguinte argumentação para 
 sustentar a improcedência do recurso:
 
 “Quanto à existência de ilícito no facto noticioso
 
 À data da última notícia, o processo continuava ainda em segredo de justiça a 
 pedido dos A.A.
 
 “Contudo, os factos relatados na noticia de 2003.12.15 já eram conhecidos, pois 
 que anunciados nas notícias anteriores de 2000 e 2002, e, o seu conteúdo, está 
 de acordo com o teor da acusação do M.° P.°.
 Não pode portanto afirmar-se que houve nesta notícia violação directa do segredo 
 de justiça. Mas continuou a existir violação indirecta, uma vez que continuou a 
 difundir o que, embora já conhecido pela difusão das anteriores noticias, 
 continuava ainda em segredo de Justiça. Na verdade, ao aludir à acusação do M.° 
 P.° a Ré mostrou, insofismavelmente, que o conhecimento dos factos lhe adviera 
 do acesso ao processo ou a informações de quem a ele tinha ou tivera acesso.
 Estando o processo em segredo de justiça, a Ré não poderia voltar a levar ao 
 conhecimento público ou a continuar a difundir aquilo a que só poderia ter 
 acesso através da violação do segredo.
 
 É certo que a notícia em causa, imputando ao A. a qualidade de gestor da 
 empresa que colaborara a nível de prestação de serviços e onde se dizia que, 
 segundo a acusação do M.° P.°, estaria associada às fraudes, com margem de 
 lucros escandalosos, não era falsa nem se mostrava deformada, pois que 
 efectivamente o A. e a empresa que geria estava acusado nesses precisos termos.
 De referir também que a matéria versada na notícia era de enorme relevância 
 social, pois dizia respeito a fraudes com dinheiros públicos, ou seja, dinheiros 
 de todos os contribuintes, sendo o montante das fraudes, segundo a acusação do 
 M.° P.°, de cerca de três centenas de milhares de contos.
 Além disso, os factos não eram novos, pois a Ré já os havia relatado antes, 
 comportando-se agora, nesta última notícia, mais como uma câmara de ressonância 
 das primeiras.
 Entendemos no entanto que na sua nobre função de informar, não havia razões 
 objectivas para associar ou continuar a associar o nome do A. à gestão corrente 
 da empresa onde, segundo a acusação do Ministério Público, se tinham detectado 
 as alegadas irregularidades ou fraudes.
 Na verdade, as acusações em processo penal assentam em indícios, e não em 
 certezas, e, associar desde logo a uma notícia de fraudes o nome e profissão do 
 A. (inconfundível com qualquer outro nome profissional, pois cada profissional 
 da advocacia tem o seu nome irrepetível) como indiciado, acusado ou arguido, sem 
 que esteja sequer pronunciado, corresponde para a opinião pública a um 
 julgamento e condenação antecipado, lançando desde logo sobre ele um labéu sem 
 remissão que deixa feridas profundas que não mais cicatrizam, por mais remédios 
 que sobre elas se apliquem, ainda que mais tarde venham a ser ilibados por 
 ausência ou insuficiência de indícios ou provas, mesmo que sejam efectuados 
 desmentidos nos mesmos meios de comunicação social.
 A notícia em causa obteria o mesmo objectivo junto da opinião pública sem que 
 fosse necessária a necessidade da revelação mórbida do inconfundível nome e 
 profissão da pessoa acusada, não atendendo a Ré que, nos termos constitucionais, 
 toda a pessoa se presume inocente antes da existência de condenação judicial 
 transitada em julgado, e que cabe em exclusivo aos tribunais a função de julgar 
 em nome do povo.
 Antes da condenação, a Ré, mesmo sabendo quem estava acusado, estando o processo 
 em segredo de justiça, tinha a obrigação de evitar a divulgação do nome do A..
 O dever e a liberdade de informar não precisava de identificar o A. pelo nome e 
 profissão desempenhada, expondo-o desde logo ao julgamento popular, sem conhecer 
 a força dos indícios em que assentava a acusação. Deveria, também por isso, 
 ceder perante o direito à honra e ao bom nome, tendo em conta que, quando se 
 reporta aos fundamentos da soberania da República, esta assenta, em primeiro 
 lugar, na dignidade da pessoa humana
 Concluímos assim que, apesar da noticia versar sobre factos relevantes e ser 
 intrinsecamente verdadeira no conteúdo objectivamente expresso, houve, por um 
 lado, um ilícito na reiteração da notícia violadora do sigilo, mantendo-se, por 
 outro lado, um excesso desnecessário quanto à divulgada e repetida indicação do 
 nome da pessoa acusada e sua identificação profissional, que determinava com que 
 grande parte da opinião pública o julgasse logo como culpado ou condenado.
 O valor da honorabilidade não foi preservado quando poderia e deveria sê-lo, sem 
 que com isso não ficasse prejudicada a divulgação da notícia.
 Daí que, também por esse lado, a notícia em causa se tenha revelado, neste 
 segmento, como um acto ilícito.
 Foram violados, portanto, ilicitamente, as disposições conjugadas dos arts. 1º, 
 
 25.º-1, 26.-1, 32.° da Constituição da República Portuguesa (versão de 2001, 
 aplicável então), art. 70.°-1 do CC., art. 12.° da Declaração Universal dos 
 Direitos do Homem, a Lei de Imprensa (arts. 3.° e 9.° da Lei 2/99, de 13/01), o 
 Estatuto dos Jornalistas (art. 8.º-3 e 14.°-c) da então Lei 1/99, de 13/01) e o 
 próprio Código Deontológico do Jornalista.
 Quanto ao dolo ou culpa
 Não se pode dizer que a notícia em causa tivesse como objectivo directo e 
 imediato ofender a honra e a consideração do A.
 Os termos em que a notícia foi dada visava essencialmente chamar a atenção para 
 as fraudes com dinheiro dos contribuintes no seio do CICCOPN.
 Está assim afastado o dolo directo.
 No entanto, está verificado dolo eventual da Ré, na medida em que as instâncias 
 deram como provado que “a Ré sabia que a sua conduta iria necessariamente 
 provocar danos na esfera jurídica dos AA., afectando o seu bom nome, honra e 
 consideração e de modo evitável, e que a notícia valeria por si, sem necessidade 
 de identificação dos advogados arguidos ou da Empresa de prestação de serviços 
 
 “ (resposta ao quesito 19.0 da base instrutória).
 Ora, para o exercício da liberdade de expressão, a Ré não resistiu à tentação de 
 associar a essas fraudes de dinheiros públicos o toque apimentado da denúncia de 
 fraudes com dinheiros públicos indicando como implicado nelas o nome do A., 
 
 “pessoa amplamente conhecida nos meios sociais, advogado bem sucedido, com 
 estatuto de competência, prestígio, credibilidade e honorabilidade conquistado 
 ao longo dos anos, junto da sua clientela, bem como de colegas” (resposta ao 
 quesito 9.° da base instrutória), trazendo à lembrança dos leitores, - mais uma 
 vez, e sempre sem necessidade para notícia objectiva -, factos desonrosos que o 
 M.° P.° lhes atribuíra em fase ainda secreta do processo, quando os factos são 
 ainda considerados como meramente judiciários, ou seja, não validados por 
 pronúncia, nem muito menos considerados verificados ou considerados consistentes 
 por despacho transitado em julgado.
 A relevância da notícia ficou portanto irremediavelmente maculada ao divulgar o 
 nome do A. como acusado, sem necessidade de o fazer, e sem atender ao risco de 
 a acusação não vir a ser recebida pela fragilidade dos imputados indícios, 
 sabendo que a simples notícia desse facto o iria lesar na sua honra e 
 respeitabilidade, ainda que não fosse essa a mais directa intenção do meio de 
 comunicação social em causa (…)…”.
 No acórdão subsequente do Supremo Tribunal de Justiça que aclarou o inicialmente 
 proferido, acrescentou-se o seguinte:
 
 “Na fundamentação foram indicadas logo as causas para a não divulgação do nome 
 do A.:
 A primeira, porque estando o processo ainda em segredo de justiça, não se podia 
 revelar o que dele constava, mesmo que a montante já alguém tivesse efectuado 
 ilegalmente a revelação desse segredo.
 A segunda, porque a notícia de existência de fraudes com o caso CICCOPN, mesmo 
 fora do âmbito de aplicação do segredo de justiça, podia perfeitamente ser dada 
 sem a ela associar desde logo o nome e a profissão do A., por na actividade em 
 causa ser único e inconfundível.
 Na verdade, uma acusação não é uma pronúncia, muito menos uma condenação e o 
 simples facto de se revelar ou indicar na comunicação social que uma pessoa que 
 não exerça funções no Estado ou numa entidade pública para-estatal — como era o 
 caso é acusada num processo, transmite desde logo à opinião pública que se está 
 perante uma pessoa desonesta, criminosa, quando nessa fase processual se deve 
 ainda presumir a inocência da pessoa visada.
 A expressão utilizada “inexistência de razões objectivas” para a divulgação dos 
 factos prende-se com a identificação concreta do nome e profissão do A., que o 
 tornavam imediatamente identificável, e não propriamente com o conteúdo do resto 
 da notícia, se, ressalvada sempre - quanto a esta parte - , a situação da não 
 violação do segredo.
 O jornalismo de investigação é desejável, sendo uma forma sadia para o 
 funcionamento da democracia e a dissuasão para a prática de actos ou omissões 
 social ou criminalmente censuráveis, mas o jornalista deve conformar-se à lei 
 que nos rege, pelo que não podia invocar, sem violação do segredo de justiça, 
 dados obtidos em processos judiciais quando eles se encontram ainda na fase de 
 segredo de justiça ou eles lhe tenham sido fornecidos ilegalmente.
 No caso o processo estava ainda em segredo de justiça, a requerimento do A.
 Mesmo que não estivesse em segredo de justiça e o conhecimento dos factos fosse 
 fruto de jornalismo de investigação própria, não deveria mesmo assim o 
 jornalista indicar a identificação concreta e inconfundível das pessoas que 
 pensava ou lhe tivessem sido indicados como podendo estar envolvidas na indicada 
 fraude, pelas repercussões e danos irreparáveis que daí poderiam vir a resultar 
 para os visados, caso se não viessem a confirmar os dados avançados no que toca 
 ao envolvimento destes.
 
 …
 A referência à prescrição dos efeitos jurídicos das notícias de 2000 e 2002, 
 encerrou a virtualidade de a Ré poder ser condenada por elas.
 No entanto, como na notícia actual voltou a visar-se o nome do A., na linha do 
 que já antes havia feito, a actuação da Ré reavivou junto do público, as 
 anteriores notícias.
 Ora isso não corresponde à utilização de efeitos jurídicos das primeiras 
 notícias — indemnização por elas, cujo direito estava prescrito -, mas sim à 
 consideração, como circunstância a ter em conta na avaliação da culpa e fixação 
 da indemnização, pela reiterada e continuada ligação.
 
 …
 Entendemos que não havia necessidade alguma de incluir na notícia a 
 identificação concreta, inconfundível, do nome do A..
 Se obtidas as informações por meios legítimos, a divulgação da notícia poderia 
 ser feita com o mesmo impacto, preservando a identificação concreta do visado.
 Deveria ter havido o necessário respeito pela honra e presunção de inocência da 
 pessoa indicada.
 Não é saudável a prática de jornalismo que lança para a fogueira da opinião 
 pública a imputação da prática ou a cumplicidade de ou em actos desonrosos a 
 alguém que se torna de imediato reconhecível, e cuja divulgação, produz 
 inevitavelmente danos na sua imagem e honorabilidade.
 O efeito pode tornar-se devastador. Assaz perguntar-se:
 
 - Que benefícios recolheu a opinião pública com a divulgação do nome do A. como 
 estando associado à indicada fraude?
 
 - Em nosso entender, nenhum.
 
 - Houve alguma mais valia para a comunidade, com a divulgação e identificação do 
 seu nome?
 
 - A resposta é a mesma.
 
 - E que repercussões teve?
 
 - Um muito considerável dano na esfera jurídica do A., por actos pelos quais não 
 chegou sequer a ser pronunciado.
 Se não é saudável essa actuação, deve qualificar-se como mórbida ou doentia a 
 preocupação do jornalista em tornar automática e perfeitamente identificado a 
 pessoa a quem atribuiu factos desonrosos nas notícias que dá.
 
 …
 A explicação para essa afirmação é simples:
 Quanto mais se insistir numa notícia ligando factos desonrosos a uma determinado 
 pessoa, mais convicção fica firmada na opinião pública de que esses factos são 
 verdadeiros.”
 As considerações acima transcritas dos dois acórdãos proferidos pelo Supremo 
 Tribunal de Justiça procuram fundamentar o juízo de ilicitude e de culpa da 
 conduta do Réu, na ponderação do conflito dos direitos de informação e da honra 
 na situação concreta.
 Se é certo que o acórdão recorrido concluiu que perante as circunstâncias do 
 caso concreto a ofensa à honra do Autor não se encontrava justificada pelo 
 direito de informar que assistia à Ré, em nenhum passo da fundamentação desta 
 conclusão sustentou, como sua ratio decidendi, com carácter geral e abstracto, 
 qualquer uma das interpretações indicadas pela Ré como objecto do presente 
 recurso.
 Além disso a Ré não cumpriu o requisito de suscitação das questões de 
 constitucionalidade propostas ao Tribunal Constitucional perante o tribunal 
 recorrido de modo adequado, isto é de forma a vincular esse tribunal ao seu 
 conhecimento.
 Ora, encontrando-se o objecto do recurso de revista delimitado pelo conteúdo 
 das conclusões das alegações de recurso, verifica-se que nas conclusões das 
 alegações apresentadas perante o tribunal que emitiu a decisão recorrida apenas 
 se suscitou a inconstitucionalidade do resultado da decisão aí recorrida, não 
 tendo sido arguida a inconstitucionalidade de qualquer uma das interpretações 
 normativas, cuja fiscalização agora se pretende.
 Estando ausentes dois requisitos essenciais ao conhecimento do recurso 
 interposto nos termos do artigo 70.º, n.º 1, b), da LTC – que as interpretações 
 normativas cuja fiscalização se pretende integrem a ratio decidendi da decisão 
 recorrida e que a sua inconstitucionalidade tenha sido suscitada 
 antecipadamente perante o tribunal recorrido – deve ser proferida decisão 
 sumária de não conhecimento, nos termos do artigo 78.º - A, n.º 1, da LTC.”
 
  
 A recorrente apresentou reclamação para a conferência nos seguintes termos:
 
 “1. O recurso para o TC foi interposto nos termos que se dão por reproduzidos. 
 
 2. O Senhor Conselheiro Relator decidiu não admitir, nos termos do nº 1 do artº 
 
 78º-A da LTC, o objecto do recurso, alegando, em síntese, que nas conclusões das 
 suas alegações de recorrente perante o STJ apenas suscitou a 
 inconstitucionalidade do resultado da decisão recorrida e não a 
 inconstitucionalidade de qualquer das interpretações normativas cuja 
 fiscalização agora pretende, e além disso (ou por causa disso) não cumpriu o 
 requisito de suscitação perante o tribunal recorrido de modo adequado. 
 
 3. Parece à recorrente que a decisão objecto da presente reclamação fez uma 
 leitura apressada do recurso. 
 
 4. Primeiro, a recorrente indicou concretamente, ou melhor, especificadamente, 
 quais foram as interpretações de normas jurídicas que, no decorrer do processo, 
 foram acusadas de inconstitucionais e, apesar disso, foram aplicadas na decisão 
 recorrida como ratio decidendi. 
 Basta reler o requerimento de interposição de recurso e requerimento de fls. 
 para se verificar que o recorrente suscitou perante este tribunal a impugnação 
 de interpretação feita de normas jurídicas da lei civil. Precisamente das 
 interpretações normativas feitas a partir dessas normas. 
 
 5. Segundo, a inconstitucionalidade dessas normas, foi levantada durante o 
 processo, conforme decorre da leitura dos autos. 
 
 É manifesto da leitura das alegações que a recorrente suscitou no processo 
 várias questões de inconstitucionalidade normativa, pois que quer na alegação de 
 recurso interposto para a Relação do Porto e para o STJ, quer no requerimento de 
 interposição do presente recurso, dirigiu a sua crítica (e recurso) à 
 interpretação que o Tribunal recorrido fizera de várias normas, em especial das 
 estipulações normativas retiradas da interpretação de normas que constituíram a 
 razão de decidir da decisão. 
 Repare-se no que se alegou nas alegações de revista: 
 
 “O princípio da concordância prática visa a procura da solução do conflito no 
 quadro da unidade da Constituição e da lei ordinária, tentando harmonizar os 
 preceitos divergentes. Ora, parece-nos que é inconstitucional a 
 
 (des)harmonização defendida na decisão recorrida, pois que tem por consequência 
 prática... a total e completa supressão de um dos dois direitos em concurso. 
 Na prática, a tese recorrida defende como única harmonização possível a... 
 desarmonia do sistema constitucional: comprime-se, até à supressão, a liberdade 
 de expressão e o direito à informação. 
 Solução que, obviamente, é inconstitucional.” 
 
 “O princípio da proporcionalidade destina-se a distribuir com o equilíbrio 
 possível os custos do conflito; exige-se que cada um dos valores constitucionais 
 se salvaguarde reciprocamente. 
 Assim, a solução do problema passa por comprimir o menos possível cada um dos 
 valores em causa, de acordo com o seu peso na situação. 
 O que se não faz na sentença recorrida.... O tribunal recorrido afirma um 
 primado (inconstitucional e ilegal) do direito ao bom nome e reputação sobre o 
 direito à liberdade de expressão e de informação.” 
 
 “A notícia tem por objecto actos públicos relativos a dinheiros públicos de uma 
 empresa. 
 Reconheçamos que o texto em causa se move naquilo que é o legítimo exercício da 
 liberdade de expressão e do direito à informação, constitucionalmente 
 garantidos á Recorrente. 
 Também aqui a Ré mais não faz do que se mover no âmbito da liberdade de 
 expressão e de informação, cumprindo e participando na função para a qual o 
 estado garante a existência de órgãos de informação: garantia de formação 
 democrática da opinião pública.” 
 
 “Por outro lado, a nossa lei fundamental tem subjacente a representação de que 
 esta expressão da liberdade de informação tem por destinatário cidadãos adultos 
 e conscientes que são chamados a tomar posição no debate de ideias numa 
 sociedade democrática e livre e, portanto, são eles próprios capazes de julgar e 
 avaliar o que seja uma afirmação como a dos autos. 
 Por outro lado, como recorda Costa Andrade, “deve reconhecer-se uma presunção de 
 licitude às ofensas típicas que resultem da discussão de questões de interesse 
 comunitário”, como acontece nos autos, sendo que o acórdão recorrido parte 
 precisamente da presunção inversa, leitura que a lei não consente.” 
 
 “O Recorrente agiu exclusivamente motivado pelo exercício do direito à 
 informação, e dentro dos limites desta. 
 Não é solução constitucionalmente defensável – cremos – que o direito ao bom 
 nome do Recorrido assim exercido possa (deva) precludir os direitos 
 constitucionais do Recorrente. 
 
  “A decisão recorrida infra-gradua o direito do Recorrente à sua liberdade de 
 expressão quando os arts. 2º, 3º, 18º, 37º e 38º da CRP não consentem qualquer 
 infra-graduação da mesma. 
 
 “É bem manifesta e evidente a exclusão de ilicitude, traduzida na violação não 
 justificada do direito (constitucional) à informação. 
 
 • O artigo contém-se dentro dos limites consentidos pela liberdade de expressão 
 e do direito à informação; 
 
 • Os factos são verdadeiros; 
 
 • O Recorrente estava, como está, convencido de que o teor do que afirmou era 
 verdadeiro e, em boa fé, tinha razões para acreditar nisso; 
 
 • O Recorrente não tinha qualquer razão para supor que os factos narrados 
 poderiam ser inexactos, falsos ou conter inverdades; 
 
 • O Recorrente não teve qualquer intenção de ofender o Recorrido com a 
 elaboração do artigo em causa; 
 
 • O Recorrente apenas pretendeu levar ao conhecimento da opinião pública factos 
 que lhe pareceram fundamentais no exercício democrático da liberdade de 
 expressão e de crítica ao comportamento de figuras políticas.” 
 
 “O princípio da concordância prática visa a procura da solução do conflito no 
 quadro da unidade da Constituição e da lei ordinária, tentando harmonizar os 
 preceitos divergentes. Ora, parece-nos que é inconstitucional a 
 
 (des)harmonização defendida no acórdão recorrido, pois que tem por consequência 
 prática... a total e completa supressão de um dos dois direitos em concurso. 
 Na prática a tese recorrida defende como única harmonização possível a... 
 desarmonia do sistema constitucional: comprime-se, até à supressão, a liberdade 
 de expressão e o direito à crítica livre e de opinião para defesa do direito ao 
 bom nome e reputação. 
 Solução que, obviamente, é inconstitucional.” 
 
 “O princípio da proporcionalidade destina-se a distribuir com o equilíbrio 
 possível os custos do conflito; exige-se que cada um dos valores constitucionais 
 se salvaguarde reciprocamente. 
 Assim, a solução do problema passa por comprimir o menos possível cada um dos 
 valores em causa, de acordo com o seu peso na situação. 
 O que se não faz no acórdão recorrido..., O tribunal recorrido afirma um primado 
 
 (inconstitucional e ilegal) do direito ao bom nome e reputação sobre o direito à 
 liberdade de expressão. 
 
 É esta interpretação que é feita do art. 31º, nº 2, al. b) do CP que é, a nosso 
 ver, inconstitucional.” 
 
 “A responsabilidade (civil) pressupõe o facto, a ilicitude, a imputação do facto 
 ao lesante, o dano e um nexo de causalidade entre o facto e o dano. 
 Ora, a imputação considerada ofensiva da honra do Recorrido poder-se-á 
 justificar pelo direito à liberdade de expressão e informação, pela função 
 pública da imprensa, pela realização do interesse público legítimo? Pode.” 
 
 “Todos têm o direito de exprimir e divulgar livremente o seu pensamento, pela 
 palavra, pela imagem ou por qualquer outro meio, bem como o direito de informar, 
 de se informar e de ser informados, sem impedimentos nem discriminações – n.º 1, 
 do art. 37º, da CRPortuguesa. 
 
 É garantida a liberdade de imprensa que implica a liberdade de expressão e 
 criação dos jornalistas – al. a), do n.º 2, do art. 38.º, da CRPortuguesa. 
 A Lei de Imprensa formula idênticos princípios, ou valores (arts. 1º, 4º e 5º, 
 da Lei n.º 2/99, de 13/01). 
 
 “Importa saber como conjugar, em caso de conflito, estes dois direitos 
 fundamentais: o direito/dever de informação e o direito à honra e ao bom-nome. 
 Quer a Constituição, quer as leis ordinárias, não estabelecem qualquer regime 
 especial relativamente à ilicitude em matéria civil e, naturalmente, à 
 respectiva obrigação de indemnizar, quando ocorrer, por responsabilidade civil 
 extracontratual, limitando-se a remeter, expressa ou tacitamente, para os 
 princípios gerais e normas do Código Civil (arts. 37º, nº 4, da Constituição e, 
 
 24º, da Lei da Imprensa) 
 Será, pois, com base nas normas da sistemática civilística (designadamente arts. 
 
 70º, 483º, nº 1, 484º, 487º e 497º, nº 1, do CCiviI), que deve ser avaliada a 
 ilicitude (e, eventualmente, a culpa) como pressuposto da obrigação de 
 indemnizar fundamentada na responsabilidade civil extracontratual.” 
 
 “Se, por um lado, se reconhece ser direito fundamental dos jornalistas a 
 liberdade de criação, expressão e divulgação, a qual não está sujeita a 
 impedimentos ou discriminações, nem subordinada a qualquer forma de censura, 
 autorização, caução ou habilitação prévia e acesso às fontes (arts. 5º, 6º, 7º, 
 
 8º e 9º do Estatuto do Jornalista), certo é, também, constituir dever desses 
 profissionais respeitar os limites ao exercício da liberdade de imprensa nos 
 termos da Constituição e da Lei (citado art. 1º, nº 1, al. c), do mesmo 
 Estatuto). 
 O princípio norteador da informação jornalística deve ser o de causar o menor 
 mal possível, pelo que quando se ultrapassam os limites da necessidade ou quando 
 os processos são, de per si, injuriosos, a conduta é ilegítima.” 
 
 “O direito à informação comporta três limites: o valor socialmente relevante da 
 notícia; a moderação da forma de a veicular; e a verdade, medida esta pela 
 objectividade, pela seriedade das fontes, pela isenção e pela imparcialidade do 
 autor, evitando manipulações que a deontologia profissional, antes das leis do 
 Estado, condena.” 
 
 “Quando se refere a liberdade de informação, há que reportá-la a algo de 
 socialmente útil ou relevante. Nenhuma liberdade de comunicação justifica 
 notícias inverídicas, exigindo uma verdade pura, sem equívoco ou sem sombras. 
 Sendo os direitos de liberdade de informação e à honra e ao bom nome, de igual 
 hierarquia constitucional, o primeiro não pode, em princípio, atentar contra o 
 segundo, devendo procurar-se a harmonização ou concordância prática dos 
 interesses em jogo, por forma a atribuir a cada um deles a máxima eficácia 
 possível, em obediência ao princípio jurídico-constitucional da 
 proporcionalidade, vinculante em matéria de direitos fundamentais.” 
 
 “Nesta conflitualidade, sendo embora os dois direitos de igual hierarquia 
 constitucional, é indiscutível que o direito de liberdade de expressão e 
 informação, pelas restrições e limites a que está sujeito, não pode, ao menos em 
 princípio, atentar contra o bom nome e reputação de outrem, sem prejuízo, porém, 
 de em certos casos, ponderados os valores jurídicos em confronto, o princípio 
 da proporcionalidade conjugado com os ditames da necessidade e da adequação e 
 todo o circunstancialismo concorrente, tal direito poder prevalecer sobre o 
 direito ao bom nome e reputação. 
 Designadamente assim sucede nos casos em que estiver em causa um interesse 
 público que se sobreponha àqueles e a divulgação seja feita de forma a não 
 exceder o necessário a tal divulgação, sendo exigível que a informação veiculada 
 se cinja à estrita verdade dos factos. 
 Assim, o direito de expressão e informação exercido com respeito pela honra do 
 Recorrido e com a objectividade e a verdade que são características do jornal, e 
 que a lei exige, determina que as imputações putativamente ofensivas da honra do 
 Apelante estão justificadas pelo direito à liberdade de expressão e informação.” 
 
 
 
 “Em Conclusão, 
 L. Ainda que assim não fosse, a conduta da Ré Recorrente é licita e justificada. 
 A peça jornalística foi publicada no exercício do direito de informar. 
 M. Foi publicada nas páginas de um jornal exclusivamente por causa de uma 
 notícia em causa, e enquadrada na questão: um processo que existia relativo a 
 uma questão de descaminho de dinheiros públicos, onde se encontrava envolvida 
 como arguida uma empresa, “cuja gestão corrente estava a cargo do advogado A.”. 
 N. Existe claramente interesse público na divulgação dos factos, uma vez que se 
 trata de assunto relacionado com o descaminho de dinheiros públicos. 
 O. Por outro lado, a notícia é redigida em termos razoáveis, contidos, não 
 especulativos, sem o recurso a passagens especulativas, de forma absolutamente 
 moderada e não ofensiva. 
 P. Inexiste qualquer animus injuriandi por parte da Ré. 
 Q. Por outro lado a notícia faz uma afirmação que já era, ao tempo, do 
 conhecimento público desde 2000. 
 R. O relatado na notícia era e é absolutamente rigoroso e verdadeiro. 
 S. Como tal nos termos do artigo 483º e 484º do CC, que foram violados pela 
 sentença recorrida, deve ser considerado que a notícia dos autos está escrita de 
 forma moderada e adequada, sem animus injuriandi, dentro dos limites do 
 exercício da liberdade de expressão e de informação, movendo-se precisamente 
 dentro desses limites, estando por essa via justificada a conduta da Ré, e 
 existindo interesse público na divulgação dos factos. 
 Existindo, assim, ausência de culpa e de ilicitude. 
 AC. Ainda assim não fosse, a sua eventual violação não se poderia reflectir na 
 ilicitude da divulgação do nome do arguido. O exercício do direito 
 constitucional à informação não pode ficar, ou estar, condicionado por um 
 suposto direito potestativo do visado que, opondo-se à publicidade do processo 
 criminal, impedira qualquer divulgação informativa sobre os factos. 
 AD. Não faz qualquer sentido ético-jurídico que esteja na disponibilidade de uma 
 parte poder unilateralmente decretar a resolução da colisão de direitos de igual 
 dignidade constitucional (direito à informação e direito ao bom nome) quando a 
 CRP, ela própria, elege como único critério de superação desse conflito o 
 princípio da concordância prática e não, como aparece previsto no acórdão 
 recorrido, a vontade do visado. 
 AE. O princípio da concordância prática visa a procura da solução do conflito no 
 quadro da unidade da Constituição e da lei ordinária, tentando harmonizar os 
 preceitos divergentes. Ora, parece-nos que é inconstitucional a 
 
 (des)harmonização defendida na decisão recorrida, pois que tem por consequência 
 prática... a total e completa supressão de um dos dois direitos em concurso. 
 Solução que, obviamente, é inconstitucional. 
 AF. A margem de tolerância da invasão dos direitos de personalidade do Recorrido 
 
 é bem maior no que diz respeito à esfera de afirmações sobre os actos públicos 
 do A. que sobre os seus actos privados, sendo que o texto em causa se move 
 naquilo que é o legítimo exercício da liberdade de expressão e do direito à 
 informação, constitucionalmente garantidos à Recorrente. 
 AG. A decisão recorrida infra-gradua o direito do Recorrente à sua liberdade de 
 expressão quando os arts. 2º 3º, 18º, 37º e 38º da CRP não consentem qualquer 
 infra-graduação da mesma. 
 AH. É bem manifesta e evidente a exclusão de ilicitude, traduzida na violação 
 não justificada do direito (constitucional) à informação. 
 
 • O artigo contém-se dentro dos limites consentidos pela liberdade de expressão 
 e do direito à informação; 
 
 • Os factos são verdadeiros; 
 
 • O Recorrente estava, como está, convencido de que o teor do que afirmou era 
 verdadeiro e, em boa fé, tinha razões para acreditar nisso; 
 
 • O Recorrente não tinha qualquer razão para supor que os factos narrados 
 poderiam ser inexactos, falsos ou conter inverdades; 
 
 • O Recorrente não teve qualquer intenção de ofender o Recorrido com a 
 elaboração do artigo em causa; 
 
 • O Recorrente apenas pretendeu levar ao conhecimento da opinião pública factos 
 que lhe pareceram fundamentais no exercício democrático da liberdade de 
 expressão e de crítica ao comportamento de figuras políticas. 
 AI. A imputação considerada ofensiva da honra do Recorrido poder-se-á justificar 
 pelo direito à liberdade de expressão e informação, pela função pública da 
 imprensa, pela realização do interesse público legítimo? Pode. 
 AJ. O direito à informação obedeceu ao seu triplo limite: o valor socialmente 
 relevante da notícia; a moderação da forma de a veicular; e a verdade, medida 
 esta pela objectividade, pela seriedade das fontes, pela isenção e pela 
 imparcialidade do autor, evitando manipulações que a deontologia profissional 
 condena. 
 AN. Não estando verificados os pressupostos de que depende a obrigação de 
 indemnizar por responsabilidade civil extra-contratual, o tribunal “a quo” 
 interpretou incorrectamente o disposto no art. 483º, do CPCivil, violando, deste 
 modo, com tal interpretação, os artigos 1º, 12º e 13º, da CRPortuguesa.” 
 
 6. As questões levantadas durante o processo dizem essencialmente respeito à 
 leitura do regime do art. 483º e segs. do CC, concretamente à leitura que dele 
 foi feita pela decisão recorrida e aos limites que esta mesma decisão lhe traçou 
 por cotejo com outros direitos de igual ou superior dignidade e acolhimento 
 legal e constitucional. 
 Ao longo do processo o recorrente, para além de atacar a decisão em si, atacou a 
 interpretação que o tribunal recorrido havia feito do sentido, alcance e limites 
 dos arts. 483º e seguintes do CC, precisamente em função da interpretação que se 
 impõe a esta norma em função de algumas normas e princípios constitucionais. 
 Isto é. 
 Para além de um ataque à decisão em si – que, reconheça-se, merece à evidências 
 sérios e graves reparos –, o recorrente não deixou de levantar a questão de 
 constitucionalidade normativa: a decisão recorrida não traça limites ao regime 
 do artº 483º do CC o que a CRP (crê o recorrente) não consente. 
 Mais. 
 Ficou claro que a questão discutida – e trazida a recurso – dizia respeito à 
 inconstitucionalidade de uma interpretação normativa que veio a constituir ratio 
 decidendi da decisão: a interpretação do regime da colisão de direitos com 
 acolhimento constitucional, como o direito à crítica, liberdade de expressão, e 
 o direito ao bom nome vs honra e consideração. 
 
 7. Mais. 
 Não foi só discutido o resultado. 
 Discute-se a interpretação normativa, também no prisma do resultado da sua 
 aplicação, que se traduz na declinação de um direito constitucionalmente 
 garantido da recorrente. 
 
 8. Parece evidente à recorrente que haveria outras (e seguramente melhores) 
 formulações a usar no exercício proposto. 
 Mas, mesmo que exista alguma debilidade na escrita do Mandatário, e sem qualquer 
 generosidade interpretativa do Tribunal, é de reconhecer que nas palavras do 
 Mandatário da recorrente existe pelo menos um mínimo: ainda que de modo 
 imperfeitamente expresso, a recorrente peticionou uma inconstitucionalidade 
 normativa. Que este Tribunal de recurso deve conhecer. 
 
 9. É certo que o recorrente poderia ter dito de forma mais clara ao que vinha. 
 Mas na essência disse tudo. 
 
 10. Ainda que assim não fosse, a verdade é que, ainda assim, este tribunal de 
 recurso deveria conhecer a questão. 
 Nessas alegações de recurso, relativamente a algumas questões não tratadas na 
 sentença de 2ª Instância, o recorrente apenas poderia suscitar a questão da 
 inconstitucionalidade por antecipação, isto é, para a hipótese do STJ não vir a 
 dar provimento ao recurso, o que parece ao reclamante constituir ónus processual 
 não previsto na lei. 
 Com efeito, parece ónus significativamente oneroso da parte dever antecipar e 
 suscitar, por antecipação, todas as questões de constitucionalidade que possam 
 vir a suscitar-se por um acórdão que, por definição, ainda não foi proferido. 
 Esse acórdão pode, em tese, vir a suscitar as mais diversas (em natureza e 
 extensão) questões de constitucionalidade pois nele pode ser feita a aplicação 
 de quaisquer normas jurídicas, de qualquer natureza, cuja interpretação pode não 
 vir a ser feita de acordo com as normas e princípios constitucionais. 
 Ora, ao decidir como decidiu, o douto despacho de fls. onera processualmente os 
 ora reclamantes em termos tais que, na prática, fica vedado o recurso a esse 
 Alto Tribunal e, por essa via, fica precludida esta instância jurisdicional. 
 Pretende o ora reclamante suscitar esta questão perante V. Excelências, não só 
 porque tem convicção no direito que lhes assiste mas porque acredita que esse 
 Alto Tribunal não deixará de ponderar que, tendo o reclamante sido, quanto a 
 diversos aspectos, apenas confrontados com a interpretação da norma havida por 
 inconstitucional quando lhes foi notificado o acórdão da Relação de Lisboa, «não 
 lhes era exigido, no caso concreto, um qualquer juízo de prognose relativo à sua 
 aplicação, em termos de se antecipar ao proferimento da decisão, suscitando logo 
 a questão de inconstitucionalidade» (Ac. TC nº 61/92, de 11.2.1992, Acs. TC, 21, 
 p. 761).”
 
  
 Respondeu o recorrido, pronunciando-se pelo indeferimento da reclamação 
 apresentada.
 
  
 
                                                     *
 Fundamentação
 A decisão reclamada não conheceu do recurso interposto com fundamento na não 
 verificação de dois requisitos essenciais do recurso interposto para o Tribunal 
 Constitucional ao abrigo do artigo 70.º, n.º 1, b), da LTC:
 
 - as interpretações normativas cuja inconstitucionalidade se apontava no 
 requerimento de interposição de recurso não integraram a ratio decidendi do 
 acórdão recorrido.
 
 - a inconstitucionalidade dessas interpretações não tinha sido suscitada pela 
 recorrente perante o Supremo Tribunal de Justiça de forma a vincular este 
 tribunal ao conhecimento dessa questão.
 Na reclamação apresentada a reclamante apenas fundamenta a sua discordância 
 relativamente à verificação deste segundo fundamento, uma vez que relativamente 
 ao primeiro limita-se a dizer de forma vaga e genérica, sem qualquer 
 demonstração, que as interpretações questionadas integraram a ratio decidendi da 
 decisão recorrida.
 Quanto ao requisito da suscitação adequada perante o tribunal recorrido da 
 questão de constitucionalidade que se pretende ver apreciada pelo Tribunal 
 Constitucional cumpre esclarecer o seguinte.
 Esta suscitação só cumpre as exigências legais se tiver sido efectuada pelo 
 recorrente perante o tribunal que proferiu a decisão recorrida de forma a 
 vincular este ao seu conhecimento, devendo para isso enunciar-se com precisão a 
 mesma questão de constitucionalidade que agora se pretende submeter ao veredicto 
 do Tribunal Constitucional.
 Ora, da leitura das alegações de recurso apresentadas perante o Supremo Tribunal 
 de Justiça, nomeadamente das suas conclusões que delimitam o objecto de 
 conhecimento pelo tribunal de recurso, verifica-se que apenas se invocou a 
 inconstitucionalidade da prevalência dada pelo Tribunal da Relação ao direito ao 
 bom nome relativamente à liberdade de imprensa, o que se reconduz ao sentido da 
 decisão, não se enunciando qualquer interpretação normativa cuja 
 inconstitucionalidade se mostre invocada nessa peça processual.
 Não se mostrando preenchidos os dois requisitos cuja falta se apontou na decisão 
 reclamada, deve a reclamação apresentada ser indeferida.
 
  
 Decisão
 Pelo exposto indefere-se a reclamação apresentada por C., S.A., da decisão 
 sumária proferida nestes autos em 18-11-2008.
 
  
 
                                                     *
 Custas pela reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20 unidades de conta, 
 ponderados os critérios referidos no artigo 9.º, do D.L. n.º 303/98, de 7 de 
 Outubro (artigo 7º, do mesmo diploma).
 Lisboa, 16 de Dezembro de 2008
 João Cura Mariano
 Mário Torres
 Rui Manuel Moura Ramos