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Processo n.º 827/08
 
 2.ª Secção
 Relator: Conselheiro João Cura Mariano
 
 
 
           Acordam, em conferência, no Tribunal Constitucional
 
 
 Relatório
 No âmbito do processo penal comum, que iniciou os seus termos, sob o n.º 
 
 121/05.3 JDLSB, na 9.ª Vara Criminal de Lisboa, e que actualmente se encontra 
 redistribuído pela 4.ª Vara Criminal de Lisboa, foi proferido acórdão, em 
 primeira instância, que condenou, inter alia, os arguidos A. e B., em cúmulo 
 jurídico, respectivamente nas penas de 8 e 6 anos de prisão.
 
  
 Na sequência de recursos interpostos pelos referidos arguidos tais condenações 
 viriam a ser integralmente confirmadas por acórdão do Tribunal da Relação de 
 Lisboa, proferido em 14 de Setembro de 2007. 
 
  
 Os arguidos em questão reagiram também contra esta decisão através da 
 interposição de recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, que, mediante 
 acórdão proferido em 12 de Junho de 2008, manteve as respectivas condenações nos 
 termos anteriormente decididos.
 
                                                     
 Ambos os arguidos interpuseram então recurso de constitucionalidade desta última 
 decisão para o Tribunal Constitucional.
 
  
 O arguido A. apresentou requerimento de interposição de recurso com o seguinte 
 teor:
 
 “…A)
 Consta da decisão recorrida: 
 
 “São as questões atinentes à omissão de pronúncia do acórdão recorrido (da 
 Relação) pois não se pronunciou sobre grande parte das conclusões formuladas 
 pelo recorrente o que determina o reenvio do processo ao Tribunal da Relação 
 para, em novo acórdão, conhecer de todas as questões submetidas à sua 
 apreciação; à violação pelo Tribunal da Relação, do artigo 412º n.º 3 do CPP 
 pois proferiu decisão sem convidar o recorrente ao aperfeiçoamento das suas 
 conclusões de forma a poder conhecer do objecto do recurso, – sendo 
 inconstitucional a interpretação que a Relação fez daquele preceito – o que 
 constitui nulidade (que agora é arguida) pois deixou de conhecer e decidir 
 sobre questões que podia e devia conhecer (artigo 379º n.º 1 do CPP) o que 
 acarreta a nulidade do julgamento realizado pela Relação; à existência do vício 
 previsto no artigo 410º n.º 2-a) do CPP: insuficiência para a decisão da matéria 
 de facto provada; à existência do vício previsto no artigo 410º n.º 2-c) do CPP; 
 erro notório na apreciação da prova; à nulidade do acórdão da Relação, ainda 
 por omissão de pronúncia (artigo 379º-l do CPP) pois não se pronunciou sobre a 
 nulidade das perícias feitas aos documentos constantes dos computadores.” 
 A interpretação acolhida pelo Tribunal “a quo” segundo a qual no caso de 
 recurso, quando o recorrente não cumpra o disposto no artigo 412º n.º 3 do CPP 
 pode ser proferida decisão, sem o convidar ao aperfeiçoamento das suas 
 conclusões de forma a poder conhecer do objecto do recurso, é inconstitucional 
 por violação do disposto no nº 1 do art. 32 da CRP. 
 B) 
 No recurso anteriormente interposto o ora recorrente, no seu art.7º suscitou e 
 arguiu a inconstitucionalidade do acórdão recorrido ao estribar a condenação do 
 recorrente com base num depoimento indirecto (art. 129º do CPP), em clara 
 directa e flagrante violação do princípio do contraditório, constitucionalmente 
 consagrado no art. 32 nº 5 da CRP.
 Mais concretamente, no depoimento da testemunha C., que referiu ter conhecimento 
 da propriedade dos veículos automóveis, porque o D. lhe havia dito que eram do 
 A., e bem assim, do depoimento do Inspector E. que também ele lhe afirmou que os 
 veículos de Telheiras eram do A.,
 Ora não tendo a 1ª instância decidido ao abrigo do disposto no nº 1 do artº 340 
 do CPP convocar o tal D., afim de infirmar/confirmar o depoimento da testemunha 
 jamais o mesmo poderia sustentar a condenação do recorrente, 
 Nem se diga, como faz o tribunal da relação, decisão mantida pelo tribunal “a 
 quo” que tal acto seria desnecessário, para além de afirmar que de modo algum as 
 declarações do D. foram tidas em consideração, pois resulta do texto da decisão 
 da 1ª instância precisamente o contrário. 
 Ora, tal depoimento configura ser prova ilegal/ilícita, por violar o disposto no 
 art. 129º do CPP e 32º nº 1 e 5º do CRP. 
 O n.º 5 do art.º 32º da CRP impõe a subordinação da audiência ao princípio do 
 contraditório; como dizem Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da 
 República Portuguesa Anotada, 3ª edição, pág. 206, este principio abrange “em 
 particular, o direito do arguido de intervir no processo e de se pronunciar e 
 contraditar todos os testemunhos, depoimentos ou outros elementos de prova ou 
 argumentos jurídicos trazidos ao processo, o que impõe designadamente que ele 
 seja o último a intervir no processo”. 
 Este principio garante as posições relativas entre as partes de um processo, por 
 forma a que qualquer delas não tenha menos direitos ou possibilidades de 
 actuação do que a parte contrária. 
 O direito de defesa implica também que se não prescinda da possibilidade de se 
 efectivar a sua intervenção processual de acordo com outra garantia essencial do 
 processo penal – o princípio do contraditório. 
 Sendo a essência deste princípio, como escreve Germano Marques da Silva, Curso 
 de Processo Penal, Vol. III, pg. 229, “...a dialéctica que se consubstancia no 
 poder que é dado à acusação e à defesa de aduzir as suas razões de facto e de 
 direito, de oferecer as suas provas, de controlar as provas contra si oferecidas 
 e de discretear sobre o resultado de uma e outras...”, releva aqui a assinalada 
 possibilidade de controlar as provas contra si oferecidas – ou, como se disse na 
 passagem atrás transcrita de Gomes Canotilho e Vital Moreira, de “contraditar 
 todos os testemunhos, depoimentos ou outros elementos de prova”. 
 Esta faculdade não se limita à possibilidade de um arguido procurar infirmar, 
 através de instâncias, ainda que feitas por interposição do juiz, o que uma 
 testemunha tiver dito; pode ter também lugar através do oferecimento e produção 
 de provas que ponham em dúvida ou destruam a versão dessa testemunha; mas o 
 contra-interrogatório, não sendo o único modo de contraditar prova contrária, 
 aparece como um meio que poderá ser, em concreto, o único possível e, de 
 qualquer modo, para tanto indispensável e sempre imprescindível. 
 A interpretação segundo a qual o depoimento prestado nestas condições pode ser, 
 como efectivamente foi, valorado é inconstitucional por violação do art. 32º nº 
 l e 5º do CRP. 
 C)
 O douto acórdão de que se recorre considerou que as intercepções telefónicas 
 feitas nos presentes autos eram válidas não enfermando por isso de qualquer 
 vício, mormente ao que para o presente interessa, de qualquer 
 inconstitucionalidade. 
 Para o efeito interpretou o art. 188º nº 3 do CPP, no sentido de possibilitar a 
 desmagnetização das escutas telefónicas antes do arguido poder ter acesso às 
 mesmas, e sem que se possa ter pronunciado sobre a sua relevância, e ainda, na 
 medida em que a desmagnetização de tais escutas assumiam relevância própria para 
 esclarecer ou contextualizar o sentido das passagens seleccionadas pela acusação 
 e bem assim, requerer, também, cópias dos elementos referidos (art. 188º nº 5 
 CPP) 
 Ora tal interpretação viola o direito de defesa do arguido, consubstanciado, 
 inclusive nos arts. 11º nº 1 da Declaração Universal dos Direitos do Homem e do 
 art. 32º nº 1, 2 e 5 da CRP. 
 Consequentemente, deveriam ser declaradas inválidas as intercepções e todos os 
 actos que possam depender das mesmas, conforme os arts. 122º e 189º do CPP. 
 
 (versão anterior por ter sido nesse âmbito que a destruição das escutas foi 
 ordenada). 
 Por vários acórdãos proferidos por este tribunal foi declarada a 
 inconstitucionalidade da destruição das escutas, sem objecto de contraditório 
 por parte dos arguidos, ex vi, Acórdão nº 451/2007, Processo nº 457/2007 – 3ª 
 Secção e Acórdão 660/2006 de 28 de Novembro de 2006 e Acórdão 426/2005. 
 Razão pela qual o legislador, na alteração do Código do Processo Penal revogou o 
 art. 188 nº 3 que previa a possibilidade de destruição das mesmas, que 
 anteriormente se poderia considerar uma nulidade insanável. 
 Pelo que Vªs Exªs devem julgar inconstitucional, por violação das disposições 
 conjugadas dos artigos 32º, n.º 8 e 18º, n.º 2, da Constituição da República 
 Portuguesa, a norma constante do n.º 3 do artigo 188º quando interpretada no 
 sentido de possibilitar a desmagnetização das escutas telefónicas antes do 
 arguido poder ter acesso às mesmas…”.
 
  
 Por seu turno, o arguido B. apresentou requerimento de interposição de recurso 
 com o seguinte teor:
 
 «… 1 - Damos aqui por reproduzido o nosso requerimento/ reclamação do douto 
 despacho da Relação de Lisboa que não admitiu o recurso para o STJ em especial o 
 que consta de          fls. 4, 5, 6 e 7 desse requerimento.
 
 2 - Todo o direito penal português, e a C.R. Portuguesa, estabelecem como seus 
 princípios mais nobres, mais caracterizadores e inarredáveis tudo o que redunde 
 em benefício do arguido.
 O artº 50º do C.Penal actualmente em vigor, traduz-se numa clara e evidente 
 hipótese de benefício para o arguido.
 Ainda no Jornal de grande circulação, Correio da Manhã, de 3 de Outubro 
 corrente, a página 21, se encontra uma notícia de que o S.T.J. suspendeu a pena 
 a um abusador sexual com base em tal disposição. 
 Como o requerente não cometeu nenhum crime contra as pessoas, por maioria de 
 razão merece também usufruir de tal benefício, ainda que antecipadamente deva 
 baixar-se-lhe a pena em que foi condenado, para medida não superior a 5 anos. 
 Não procedendo dessa forma, a douta decisão, ora em recurso, feriu de 
 inconstitucionalidade, o citado artº 50º do C.Penal em vigor…”. 
 
  
 Foi proferida decisão sumária em 11-11-2008 de não conhecimento de ambos os 
 recursos, com a seguinte fundamentação:
 
 “1. Pressupostos do recurso de constitucionalidade
 No sistema português de fiscalização de constitucionalidade, a competência 
 atribuída ao Tribunal Constitucional cinge‑se ao controlo da 
 inconstitucionalidade normativa, ou seja, das questões de desconformidade 
 constitucional imputada a normas jurídicas ou a interpretações normativas, e já 
 não das questões de inconstitucionalidade imputadas directamente a decisões 
 judiciais, em si mesmas consideradas. 
 A distinção entre os casos em que a inconstitucionalidade é imputada a 
 interpretação normativa daqueles em que é imputada directamente a decisão 
 judicial radica em que na primeira hipótese é discernível na decisão recorrida 
 a adopção de um critério normativo (ao qual depois se subsume o caso concreto 
 em apreço), com carácter de generalidade, e, por isso, susceptível de 
 aplicação a outras situações, enquanto na segunda hipótese está em causa a 
 aplicação dos critérios normativos tidos por relevantes às particularidades do 
 caso concreto.
 Por outro lado, tratando‑se de recurso interposto ao abrigo da alínea b), do n.º 
 
 1, do artigo 70.º, da LTC – como ocorre no presente caso –, a sua 
 admissibilidade depende da verificação cumulativa dos requisitos de a questão de 
 inconstitucionalidade haver sido suscitada «durante o processo», «de modo 
 processualmente adequado perante o tribunal que proferiu a decisão 
 recorrida, em termos de este estar obrigado a dela conhecer» (n.º 2, do artigo 
 
 72.º, da LTC), e de a decisão recorrida ter feito aplicação, como sua ratio 
 decidendi, das dimensões normativas arguidas de inconstitucionais pelo 
 recorrente.
 
 2. Do recurso de constitucionalidade interposto pelo arguido A.
 
 2.1. Da questão da inconstitucionalidade da interpretação normativa do art. 
 
 412.º, n.º 3, do Código de Processo Penal
 O recorrente pretende que seja fiscalizada a constitucionalidade material da 
 norma constante do art. 412.º, n.º 3, do Código de Processo Penal, na 
 interpretação segundo a qual, não sendo cumpridas as especificações ali 
 previstas, o tribunal ad quem pode proferir decisão sem convidar previamente o 
 recorrente a aperfeiçoar as respectivas conclusões de forma a poder conhecer do 
 objecto do recurso. 
 Na óptica do recorrente, tal interpretação normativa, na medida em que impediu o 
 conhecimento da totalidade das questões suscitadas no recurso sobre matéria de 
 facto, viola o disposto n.º 1, do artigo 32.º, da Constituição, nomeadamente o 
 direito do arguido ao segundo grau de jurisdição em matéria de facto.
 Assim configurada esta questão de inconstitucionalidade, importa afirmar, desde 
 já, que a mesma não pode ser conhecida, na medida em que a referida 
 interpretação normativa não foi adoptada como ratio decidendi pelo tribunal 
 recorrido.
 Veja-se o que foi efectivamente expendido pelo Supremo Tribunal de Justiça, na 
 parte respeitante à questão controvertida do cumprimento do disposto no n.º 3, 
 do artigo 412.º do CPP:
 
 “Da análise da motivação do recurso interposto pelo recorrente para o Tribunal 
 da Relação – supra transcrita – é manifesto que não cumpriu de forma rigorosa o 
 estatuído no citado artigo 412 do CPP. 
 E também é verdade que não foi convidado a suprir tal “deficiência”. 
 Todavia, apesar disso, o Tribunal da Relação aceitou o recurso e a motivação 
 apresentada, pelo que se deve entender que considerou aquela motivação 
 suficiente (embora sem observância escrupulosa do citado comando legal). 
 E, na sequência desse entendimento, conheceu das questões suscitadas pelo 
 recorrente.
 Sendo assim, não há violação do artigo 417º-3 do CPP: o tribunal entendeu que a 
 motivação apresentada, satisfazia o citado artigo 412º, embora sem o rigor que 
 seria exigível. 
 E terá havido omissão de pronúncia? 
 Entendemos que não. Na verdade, analisando cuidadosamente o acórdão recorrido, 
 constata-se que o mesmo conheceu de todas as questões suscitadas pelo 
 recorrente, maxime nas conclusões apresentadas. 
 Na realidade, o acórdão recorrido apreciou a questão da eventual valoração do 
 depoimento indirecto, tendo concluído que a decisão não se alicerçara em nenhum 
 depoimento desse tipo (pelo que, obviamente, inexiste qualquer “efeito à 
 distância”, como alega o recorrente); apreciou a questão da nulidade das escutas 
 e das intercepções, tendo concluído que as mesmas se mostram conformes à lei; 
 apreciou as questões atinentes aos alegados vícios do artigo 410º do CPP, 
 concluindo que não se verificavam; apreciou a questão atinente á figura do crime 
 de burla de valor consideravelmente elevado; a questão das perícias efectuadas 
 aos computadores apreendidos, tendo-as considerado válidas (como o próprio 
 recorrente reconhece e refere a fls. 5659 destes autos); e a questão da 
 necessidade e oportunidade da realização de diligências de prova que o 
 recorrente entende que deveriam ter sido feitas e não foram (o principio da 
 investigação oficiosa no processo penal, decorrente dos artigos 323º-a) e 
 
 340º-1, do CPP tem os seus limites na lei e está condicionado pelo principio da 
 necessidade) sendo que o juízo de oportunidade de realização dessas diligências 
 de prova não vinculada, constitui questão de facto que não se subsume à previsão 
 do artigo 410º-2 e 3, do CPP e, por isso, não pode ser sindicada pelo tribunal 
 superior. 
 Ou seja: a Relação conheceu aprofundadamente das questões postas. 
 Inexiste, portanto, omissão de pronúncia. 
 Inexiste, portanto qualquer nulidade daí decorrente (cfr. artigo 379º- 1-c) e 3, 
 do CPP)…”
 Resulta à saciedade do trecho da decisão recorrida acabado de transcrever que o 
 Supremo Tribunal de Justiça não aplicou a aludida interpretação normativa do n.º 
 
 3, do art. 412.º, do CPP, sobretudo na dimensão negativa atribuída pelo arguido 
 que se traduz no aproveitamento pelo tribunal de recurso das deficiências da 
 motivação para efeito de abstenção do conhecimento da totalidade das questões 
 suscitadas pelo recorrente sobre matéria de facto. 
 Na verdade, ao contrário do referido pelo recorrente, o acórdão recorrido 
 entendeu que apesar da falta de cumprimento do estatuído nas diferentes alíneas 
 do n.º 3, do artigo 412.º, do CPP, o Tribunal da Relação tinha conhecido de 
 todas as questões suscitadas pelo recorrente no recurso interposto para esse 
 Tribunal, não tendo relevado a inobservância daqueles requisitos.
 Nos termos do disposto no artigo 280.º, n.º 1, alínea b), da Constituição da 
 República Portuguesa (CRP), e no artigo 70.º, n.º 1, alínea b), da LTC, cabe 
 recurso para o Tribunal Constitucional das decisões dos tribunais que 'apliquem 
 norma cuja inconstitucionalidade haja sido suscitada durante o processo'.
 Tem sido entendido que a norma é efectivamente aplicada quando a mesma constitui 
 a verdadeira ratio decidendi e não um mero obiter dictum da decisão recorrida.
 E em conformidade com este controlo concreto ou incidental, afirma-se que o 
 recurso de constitucionalidade tem uma função meramente instrumental aferida 
 pela susceptibilidade de repercussão útil no processo concreto de que emerge, 
 não servindo, assim, para dirimir questões meramente teóricas ou académicas.
 Uma vez que a aludida interpretação normativa não constituiu a verdadeira ratio 
 decidendi adoptada pelo Supremo Tribunal de Justiça, o presente recurso de 
 constitucionalidade não seria dotado de qualquer repercussão útil no processo 
 concreto de que emerge.
 Não se mostrando satisfeito o aludido requisito específico do recurso de 
 constitucionalidade, o Tribunal Constitucional não pode conhecer do recurso 
 nesta parte, devendo ser proferida decisão sumária nesse sentido, nos termos do 
 artigo 78.º-A, n.º 1, da LTC.                 
 
 2.2. Da questão da inconstitucionalidade da interpretação normativa do art. 
 
 129.º do Código de Processo Penal
 O recorrente pretende também que seja fiscalizada a constitucionalidade material 
 da norma constante do art. 129.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, na 
 interpretação segundo a qual o depoimento indirecto pode ser valorado como meio 
 de prova.  
 Na óptica do recorrente, tal interpretação normativa, na medida em que permitiu 
 que fossem valorados depoimentos de duas testemunhas resultantes do que ouviram 
 dizer a uma pessoa determinada que não foi chamada a depor em julgamento, viola 
 o disposto nos n.os 1 e 5, do artigo 32.º, da CRP, nomeadamente o princípio do 
 contraditório.
 Assim configurada esta questão de inconstitucionalidade, importa afirmar, mais 
 uma vez, que a mesma não pode ser conhecida, na medida em que a referida 
 interpretação normativa também não foi adoptada como ratio decidendi pelo 
 tribunal recorrido.
 Atente-se no que foi efectivamente decidido pelo Supremo Tribunal Justiça, na 
 parte respeitante à questão controvertida da valoração indevida dos depoimentos 
 indirectos:
 
 “…Sustenta o recorrente a inconstitucionalidade do acórdão recorrido porque 
 estribou a condenação num depoimento indirecto e também por violação do 
 princípio “in dubio pro reo”.
 Terá sido assim? 
 O depoimento indirecto a que o recorrente se refere é o da testemunha D..
 
 [...]
 Quanto a esta questão, concluímos, como o Exmº Magistrado do MºPº junto do 
 tribunal da Relação de Lisboa, que se trata de uma questão ficcionada, que não 
 tem qualquer correspondência na realidade dos autos.
 Na verdade, analisando quer a matéria provada, quer a fundamentação da mesma, 
 não vemos (ao contrário do recorrente) que aquele – ou qualquer outro depoimento 
 indirecto – tenha servido de fundamento para a condenação do arguido/recorrente.
 Tal como, aliás, também concluiu o acórdão recorrido quando apreciou tal 
 questão, dizendo expressamente: “...Aliás, neste aspecto, assume particular 
 relevância a alusão feita pelo mesmo ao facto de pretensamente se ter tido em 
 conta o depoimento indirecto da testemunha D., em sede de inquérito, a qual não 
 foi ouvida na audiência de julgamento, por exclusiva responsabilidade da Polícia 
 Judiciária e do Tribunal de Instrução Criminal.
 Referindo, ainda, ele que todas as acusações e provas se baseiam no testemunho 
 inicial desse indivíduo que fez despontar a investigação e tem sido usado para 
 fazer prova em sede de julgamento contra o ora recorrente A.
 Todavia, compulsado o acórdão em causa, não se vislumbra que, em parte alguma, 
 se tenha relevado o depoimento prestado, no inquérito, pelo já supra mencionado 
 D., conforme inequivocamente decorre do mero compulsar da respectiva 
 fundamentação da matéria de facto dada por provada.
 Por outro lado, nem ao menos se consegue alcançar que a circunstância de tal 
 testemunha não ter sido ouvida em julgamento possa, de alguma forma, caber à 
 Polícia Judiciária ou ao Tribunal de Instrução Criminal.
 E, muito menos, que tenha sido ela a fazer despoletar a investigação levada a 
 cabo, servindo, ainda, o seu testemunho inicial como base a todas as acusações e 
 meio de prova, em sede de julgamento, contra o arguido A. 
 Nesta conformidade, e depois de analisada toda a prova produzida, torna-se 
 manifestamente insustentável a pretensão de que se haja feito qualquer valoração 
 indevida de depoimentos indirectos, isto até pelo simples facto de que não se 
 nos afigura sequer que tenham ocorrido in casu. 
 O que, assim, obsta, mais uma vez, a que se tenha verificado a existência de 
 violação do já supra aludido princípio constitucional in dubio pro reo (cfr. 
 Art. 32º, n.º 2 da C.R.P.) ...'.
 Não se verifica, portanto aplicação do artigo 129º do CPP nem violação do 
 princípio “in dubio pro reo”.
 Tanto basta para que aquela questão não proceda.”
 Como facilmente se alcança desta transcrição, o Supremo Tribunal de Justiça, 
 não só considerou que não tinha sido relevado qualquer depoimento indirecto, 
 como até referiu que se lhe afigurava que nenhum depoimento deste tipo tinha 
 sido prestado, pelo que não sustentou a interpretação normativa questionada.
 Uma vez que a aludida interpretação normativa não serviu de todo como ratio 
 decidendi do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, o presente recurso de 
 constitucionalidade também não seria dotado de qualquer repercussão útil no 
 processo concreto de que emerge.
 Não se mostrando, mais uma vez, satisfeito o aludido requisito específico do 
 recurso de constitucionalidade, o Tribunal Constitucional não pode conhecer do 
 recurso nesta parte, devendo ser proferida decisão sumária nesse sentido, nos 
 termos do art. 78.º-A, n.º 1, da LTC.
 
 2.3. Da interpretação normativa do artigo 188.º, n.º 3, do Código de Processo 
 Penal (com a redacção anterior à Lei 48/2007, de 29 de Agosto)
 Pretende ainda o Recorrente que o Tribunal Constitucional leve a cabo a 
 fiscalização concreta da constitucionalidade material da norma constante do n.º 
 
 3, do artigo 188.º, do Código de Processo Penal, com a redacção anterior à Lei 
 
 48/2007, de 29 de Agosto, na interpretação segundo a qual a desmagnetização das 
 escutas telefónicas pode ocorrer antes de o arguido poder ter acesso às mesmas.
 Ora, importa referir, mais uma vez, que a referida interpretação normativa 
 também não foi adoptada pelo tribunal recorrido, uma vez que o mesmo, quanto a 
 esta matéria, se limitou a dizer:
 
  “…Invalidade das intercepções e de todos os actos dependentes das mesmas e a 
 nulidade das escutas por poderem ser desmagnetizadas antes do arguido poder ter 
 acesso às mesmas e sem poder pronunciar-se sobre a sua relevância (o que 
 acarreta a inconstitucionalidade do artigo 188º-3 do CPP) e por existirem 
 transcrições de telefonemas de advogadas sem nada de relevante para a 
 investigação. 
 Não temos dúvidas em afirmar que, também neste aspecto, não assiste razão ao 
 recorrente.
 
 (...)
 Finalmente, não basta dizer que as gravações podem ser destruídas sem que o 
 arguido tenha acesso às mesmas. É que, no caso em apreço, não se mostra que isso 
 tenha efectivamente sucedido. 
 Daí que não se verifique a invocada inconstitucionalidade…” 
 Na verdade, quanto a esta matéria, e logo no plano dos factos respeitantes à 
 tramitação processual da recolha de prova através de escutas telefónicas, o 
 Supremo Tribunal de Justiça nem sequer considerou demonstrado que as gravações 
 das escutas telefónicas tivessem sido destruídas sem que o arguido tivesse tido 
 acesso às mesmas, pelo que não defendeu a legalidade desse procedimento.
 Uma vez que interpretação normativa enunciada pelo Recorrente não constituiu 
 minimamente ratio decidendi da decisão do Supremo Tribunal de Justiça, o recurso 
 de constitucionalidade também não seria, nesta parte, dotado de qualquer 
 repercussão útil no processo concreto de que emerge.
 Ainda que assim não fosse, o recurso sempre seria improcedente, nesta parte, na 
 medida em que, no acórdão n.º 70/2008 (publicado no Diário da República, 2.ª 
 Série, de 7 de Julho de 2008), o Plenário do Tribunal Constitucional decidiu 
 não julgar inconstitucional a norma do artigo 188.º, n.º 3, do Código de 
 Processo Penal, na redacção anterior à Lei n.º 48/2007, de 29 de Agosto, quando 
 interpretada no sentido de que o juiz de instrução pode destruir o material 
 coligido através de escutas telefónicas, quando considerado não relevante, sem 
 que antes o arguido dele tenha conhecimento e possa pronunciar-se sobre o 
 eventual interesse para a sua defesa.”
 
 2.4. Conclusão
 Concluindo, o Tribunal Constitucional não pode apreciar nenhuma das questões de 
 inconstitucionalidade suscitadas pelo recorrente A., uma vez que nenhuma delas 
 constituía ratio decidendi da decisão recorrida, devendo ser proferida decisão 
 sumária nesse sentido, nos termos do artigo 78.º-A, n.º 1, da LTC.
 
 3. Do recurso de constitucionalidade interposto pelo arguido B.
 Conforme já se avançou acima, o recorrente B. apresentou requerimento de 
 interposição de recurso para o Tribunal Constitucional com o seguinte teor: 
 
           “…
 
           2 - Todo o direito penal português, e a C.R. Portuguesa, estabelecem 
 como seus princípios mais nobres, mais caracterizadores e inarredáveis tudo o 
 que redunde em benefício do arguido.
 
           O artº 50º do C.Penal actualmente em vigor, traduz-se numa clara e 
 evidente hipótese de beneficio para o arguido.
 
           Ainda no Jornal de grande circulação, Correio da Manhã, de 3 de 
 Outubro corrente, a página 21, se encontra uma notícia de que o S.T.J. 
 suspendeu a pena a um abusador sexual com base em tal disposição. 
 
           Como o requerente não cometeu nenhum crime contra as pessoas, por 
 maioria de razão merece também usufruir de tal benefício, ainda que 
 antecipadamente deva baixar-se-lhe a pena em que foi condenado, para medida não 
 superior a 5 anos. 
 
           Não procedendo dessa forma, a douta decisão, ora em recurso, feriu de 
 inconstitucionalidade, o citado artº 50º do C.Penal em vigor…”
 O recorrente em questão foi condenado, em primeira instância, na pena única de 
 seis anos de prisão e, desde então, tem pugnado, nas várias instâncias de 
 recurso, pela aplicação da pena de suspensão de execução da prisão prevista no 
 artigo 50.º do Código Penal, na redacção introduzida pelo Decreto-lei n.º 
 
 59/2007, de 4 de Setembro.
 Perante o Supremo Tribunal de Justiça, o recorrente tinha suscitado a questão de 
 inconstitucionalidade nos seguintes termos:
 
 “…
 a) A Constituição da República Portuguesa estabelece como excepcional e como 
 
 última “escolha”, a efectiva prisão.
 b) Como se verifica por todas as disposições citadas e transcritas na sua 
 motivação e se alcança como bem revelado, pela simples leitura de toda a 
 legislação penal, inclusive e até, em especial, pela mais recente.
 c) Deu-se como provado na 1ª Instância e na Relação de Lisboa que o recorrente 
 não sofrera quaisquer antecedentes criminais e, ainda, verificar-se a sua total 
 inserção social, familiar e laboral. 
 d) O recorrente já cumpriu quase 40 anos de vida, só esteve detido, durante 
 cerca de 3 meses (de 15.06.2005 a 23.09.2005) – nº 20 a fls. 2 do acórdão em 
 recurso. 
 e) Após o regresso à liberdade, tem-se dedicado ao trabalho sem quebras, 
 ressarciu dois dos ofendidos (fls. 5437 e 5438) e está a frequentar um curso 
 superior, tentando valorizar-se. 
 f) Já passaram 2 anos sobre o seu regresso à liberdade e não consta que o 
 recorrente tenha recaído em qualquer ilícito, por mais insignificante. 
 g) O regresso do recorrente à prisão seria, pois, de todo, além de 
 desnecessário, decerto que só lesivo da sua vida familiar, mulher e filhos e do 
 seu trabalho. 
 h) O douto acórdão em recurso, ao dar preferência à prisão efectiva, violou, 
 pois, directa e frontalmente, os artigos 16º, 17º, 18º e 28º da Constituição da 
 República Portuguesa e, pela respectiva interpretação e consequente aplicação, 
 feriu também de inconstitucionalidade, os artigos 5º, 70º, 71º nº 2, 72º nº 1 e 
 
 72º nº 2, todos do Código Penal…”
 No recurso de constitucionalidade ora interposto para o Tribunal 
 Constitucional, o recorrente entende, mais limitadamente, que a decisão 
 recorrida feriu de inconstitucionalidade o art. 50.º do Código Penal em vigor 
 apenas e tão-só porque não reduziu a pena que lhe foi aplicada para medida não 
 superior a cinco anos de prisão para assim poder beneficiar da pena de suspensão 
 de execução da prisão.
 Assim configurada a questão da inconstitucionalidade, mostra-se manifesto que o 
 recorrente imputa uma pretensa inconstitucionalidade à própria decisão 
 recorrida, sendo certo que o Supremo Tribunal de Justiça não chegou sequer a 
 aplicar qualquer norma constante do artigo 50.º, do Código Penal, em virtude de 
 ter decidido não reduzir a medida da pena única de prisão aplicada ao 
 recorrente.
 Ora, as decisões jurisdicionais em si mesmas não podem ser objecto de controlo 
 da constitucionalidade pelo Tribunal Constitucional.
 A fiscalização sucessiva concreta da constitucionalidade apenas pode ter lugar, 
 conforme já se deixou escrito acima, a propósito da aplicação jurisdicional 
 efectiva de uma norma jurídica.
 Não se mostrando satisfeito o aludido requisito específico do recurso de 
 constitucionalidade, o Tribunal Constitucional não pode conhecer do presente 
 recurso, devendo ser proferida decisão sumária nesse sentido, nos termos do 
 artigo 78.º-A, n.º 1, da LTC.”
 
        
 O arguido A., reclamou para a conferência desta decisão, com os seguintes 
 fundamentos:
 
 “Nos presentes autos o recorrente interpôs recurso do acórdão proferido pelo 
 STJ, no qual arguiu várias inconstitucionalidades, o que fez ao abrigo do artigo 
 
 70º, n.º 1 al. b) da Lei nº. 28/82, de 15 de Novembro com as alterações que lhe 
 introduziu a Lei nº. 13-A/98, de 26 de Fevereiro. 
 O Exmo. Sr. Conselheiro relator proferiu decisão sumária resumida nos moldes 
 seguintes:
 
 “... Concluindo, o Tribunal Constitucional não pode apreciar nenhuma das 
 questões de inconstitucionalidade suscitadas pelo recorrente A., uma vez que 
 nenhuma delas constituía ratio decidendi da decisão recorrida, devendo ser 
 proferida decisão sumária nesse sentido, nos termos do artigo 78.º-A, n.º 1, da 
 LTC.” 
 O ora reclamante não pode concordar com tal argumentação dado que a mesma 
 carece, “in casu” de fundamento, conforme se alcança, facilmente, da análise da 
 motivação de recurso; 
 Senão vejamos, em resumo as diversas questões; 
 A)
 A interpretação acolhida pelo Tribunal “a quo” segundo a qual no caso de 
 recurso, quando o recorrente não cumpra o disposto no artigo 412º n.º 3 do CPP 
 pode ser proferida decisão, sem o convidar ao aperfeiçoamento das suas 
 conclusões de forma a poder conhecer do objecto do recurso, é inconstitucional 
 por violação do disposto no nº 1 do art. 32 da CRP. 
 B)
 A interpretação segundo o qual o depoimento prestado nestas condições pode ser, 
 como efectivamente foi, valorado e inconstitucional por violação do art. 32º nº 
 
 1 e 5º do CRP. 
 C)
 O douto acórdão de que se recorre considerou que as intercepções telefónicas 
 feitas nos presentes autos eram válidas não enfermando por isso de qualquer 
 vício, mormente ao que para o presente interessa, de qualquer 
 inconstitucionalidade. 
 Para o efeito interpretou o art. 188º nº 3 do CPP, no sentido de possibilitar a 
 desmagnetização das escutas telefónicas antes do arguido poder ter acesso às 
 mesmas, e sem que se possa ter pronunciado sobre a sua relevância, e ainda, na 
 medida em que a desmagnetização de tais escutas assumiam relevância própria para 
 esclarecer ou contextualizar o sentido das passagens selecciona das pela 
 acusação e bem assim, requerer, também, cópias dos elementos referidos (art. 
 
 188º nº 5 CPP) 
 Ora tal interpretação viola o direito de defesa do arguido, consubstanciado, 
 inclusive nos arts. 11º nº 1 da Declaração Universal dos Direitos do Homem e do 
 art. 32º nº 1, 2 e 5 da CRP.  
 Terminou pugnando pela declaração de inconstitucionalidade, por violação das 
 disposições conjugadas dos artigos 32º, n.º 8 e 18º, n.º 2, da Constituição da 
 República Portuguesa, a norma constante do n.º 3 do artigo 188º quando 
 interpretada no sentido de possibilitar a desmagnetização das escutas 
 telefónicas antes do arguido poder ter acesso às mesmas.” 
 Logo o recorrente ora reclamante cumpriu todos os requisitos de interposição de 
 recurso para o TC, debruçando-se o mesmo sobre a ratio decidendi da decisão 
 recorrida, motivo pelo qual o objecto do recurso deveria ter sido conhecido e 
 não, proferida decisão sumária.”
 
                                
 O arguido B. reclamou também para a conferência, da mesma decisão sumária, 
 invocando o seguinte:
 
 “Por requerimento de 07.10.08, o Recorrente interpôs para este Tribunal 
 Constitucional o competente recurso de constitucionalidade da interpretação 
 normativa efectuada pela decisão proferida pelo Supremo Tribunal de Justiça, no 
 qual foi confirmada a decisão anteriormente proferida e que o condenou na pena 
 
 única de 6 anos de prisão. 
 Por decisão sumária proferida nos presentes autos em 11.11.08, decidiu-se não se 
 conhecer do recurso interposto por se considerar que não se mostra satisfeito o 
 requisito específico de constitucionalidade, sendo, em consequência, proferida 
 decisão nos termos do art.º 78.º-A, n.º 1, da LTC. 
 De acordo com a fundamentação expendida na decisão ora reclamada, no âmbito da 
 
 “... fiscalização da constitucionalidade, a competência atribuída ao Tribunal 
 Constitucional cinge-se ao controlo da inconstitucionalidade normativa, ou seja, 
 das questões de desconformidade constitucional imputada a normas jurídicas ou a 
 interpretações normativas, e já não das questões de inconstitucionalidade 
 imputadas directamente a decisões judiciais, em si mesmo consideradas. 
 
 …
 tratando-se de recurso interposto ao abrigo da al. b) do n.º 1 do art.º 70.º, da 
 LTC, a sua admissibilidade depende da verificação cumulativa dos requisitos de a 
 questão de inconstitucionalidade haver sido suscitada «durante o processo», «de 
 modo processualmente adequado perante o tribunal que proferiu a decisão 
 recorrida, em termos de este estar obrigado a dela conhecer» (n.º 2 do art.º 
 
 72.º, da LTC), e de a decisão recorrida ter feito aplicação, como sua ratio 
 decidendi das dimensões normativas arguidas de inconstitucionais pelo 
 recorrente.” 
 Percorrendo a decisão proferida parece poder entender-se que o Ex.mo Juiz 
 Conselheiro que a proferiu considerou que no recurso de inconstitucionalidade 
 interposto pelo ora recorrente não se cumpriu este último requisito, porquanto, 
 como ali se refere, o recorrente “imputa uma pretensa inconstitucionalidade à 
 própria decisão recorrida” sendo que as decisões jurisdicionais não podem ser 
 elas próprias objecto de controlo da constitucionalidade pelo Tribunal 
 Constitucional”. 
 Mas, ressalvando o devido respeito, entendemos que não assiste razão ao Ex.mo 
 Juiz Conselheiro que proferiu a decisão reclamada pelas razões que se passam a 
 expor. 
 Nos termos do disposto no art.º 75.º-A, n.º 2 da LTC, sendo o recurso interposto 
 ao abrigo da al. b) do n.º 1 do art.º 70.º, do requerimento de interposição deve 
 constar a indicação da norma ou princípio constitucional ou legal que se 
 considera violado, bem como da peça processual em que o recorrente suscitou a 
 questão da inconstitucionalidade ou ilegalidade. 
 Por sua vez, nos termos do disposto no n.º 5 do mesmo normativo legal, se o 
 requerimento de interposição recurso não indicar algum dos elementos previstos 
 no presente artigo, o juiz convidará o requerente a prestar essa indicação no 
 prazo de 10 dias. 
 No caso concreto, o recorrente não indicou a peça processual em que suscitara 
 previamente a questão da inconstitucionalidade. 
 Tal omissão deveria, nos termos do disposto no n.º 5 do art.º 75.º-A da LTC, ter 
 determinado a notificação prévia do recorrente convidando-o a prestar aquela 
 indicação no prazo ali estabelecido, o que não se verificou. 
 Face ao exposto, o não cumprimento do disposto no n.º 5 do art.º 75.º-A da LTC, 
 só se pode aceitar caso o Ex.mo Juiz Conselheiro tenha compreendido 
 perfeitamente qual a peça processual em que a questão tinha sido suscitada, como 
 efectivamente compreendeu, porquanto na decisão de que se reclama, refere-se 
 expressamente que a questão já havia sido suscitada perante o Supremo Tribunal 
 de Justiça e os termos em que o foi, transcrevendo-se até as conclusões da 
 motivação do recurso então interposto. 
 Tal peça processual é, como se identifica na decisão reclamada, a motivação do 
 recurso perante o Supremo Tribunal de Justiça, na qual o recorrente suscitara a 
 questão da desconformidade constitucional da interpretação normativa efectuada 
 na decisão recorrida, das disposições conjugadas dos artigos 50.º, 70.º, 71.º 
 n.º 2, 72.º, n.º 1 e 72.º, n.º 2, todas do Código Penal, à luz do disposto nos 
 artigos 16.º, 17º, 18.º e 28.º da Constituição da República Portuguesa, 
 preceitos que considerou violados. 
 Questão que não foi apreciada por aquele Supremo Tribunal, ao menos na sua 
 formulação ali apresentada, o que suscitou a interposição de recurso para este 
 Tribunal Constitucional, para dela conhecer. 
 Como se infere do supra exposto, com o recurso interposto para este Tribunal 
 Constitucional, o recorrente não pretendeu que se apreciasse a 
 inconstitucionalidade da decisão recorrida, mas antes a desconformidade da 
 interpretação normativa efectuada por aquele Supremo Tribunal – na decisão que 
 proferiu –, dos dispositivos legais já ali referidos quando suscitou a questão 
 da inconstitucionalidade. 
 O recorrente concede que no requerimento de recurso pode não ter explicitado 
 devidamente, como efectivamente não o fez, todos os requisitos exigidos nos 
 termos do disposto no art.º 75.º-A, n.ºs 1 e 5 da LTC. 
 Contudo, salvo o merecido respeito, na dúvida – e porque estão em causa 
 direitos, liberdades e garantias do arguido – deveria este Tribunal 
 Constitucional ter determinado a notificação do recorrente para melhor 
 explicitar os fundamentos do seu pedido, cumprindo os requisitos exigidos pelo 
 disposto no artº 75.º-A, n.ºs 1 e 2 da LTC, e só após proferir decisão. 
 Ou, caso entendesse não ser necessária tal notificação, por ter compreendido o 
 alcance da questão de inconstitucionalidade suscitada – levada à motivação do 
 recurso interposto no Supremo Tribunal – tê-la apreciado na sua globalidade, 
 porquanto neste caso parece ser absolutamente claro que não se suscitou a 
 inconstitucionalidade da decisão mas sim da interpretação normativa ali 
 efectuada.”
 
  
 O Magistrado do Ministério Público respondeu, pronunciando-se pelo indeferimento 
 das reclamações apresentadas.
 
  
 
                                                     *
 Fundamentação
 
 1.                                                               Da reclamação 
 apresentada pelo recorrente A.
 A decisão reclamada não conheceu do recurso interposto por A., por ter entendido 
 que nenhuma das interpretações normativas questionadas integrava a ratio 
 decidendi do acórdão recorrido.
 Na reclamação apresentada o recorrente limita-se a apontar as mesmas acusações 
 de inconstitucionalidade, dizendo, sem fundamentar, que o recurso por si 
 interposto incide sobre a ratio decidendi do acórdão recorrido.
 Mas, como claramente se constata da leitura do acórdão recorrido, nomeadamente 
 dos excertos transcritos na decisão reclamada, o acórdão recorrido não assumiu 
 nenhuma das interpretações normativas que lhe foram imputadas pelo recorrente, 
 pelo que se revela correcta a decisão de não conhecer o recurso interposto por 
 A., devendo ser indeferida a reclamação apresentada por este.
 
  
 
 2. Da reclamação apresentada por B.
 A decisão reclamada não conheceu do recurso interposto por B., por ter entendido 
 que nele se questionava o sentido da própria decisão recorrida e não qualquer 
 interpretação normativa dotada de generalidade e abstracção suficiente para ser 
 aplicada noutros casos.
 Na reclamação apresentada o recorrente defende que suscitou a interpretação 
 efectuada pelo tribunal recorrido de determinadas normas e não o sentido da 
 decisão.
 Ora, conforme se constata da leitura do requerimento de interposição de recurso, 
 o recorrente imputa a inconstitucionalidade ao resultado da operação de 
 determinação da medida concreta da pena que lhe foi aplicada pelo tribunal 
 recorrido.
 O recorrente limita-se, pois, a questionar a aplicação dos critérios normativos 
 tidos por relevantes às particularidades do caso concreto, o que, no nosso 
 sistema, como é sabido, não é susceptível de recurso para o Tribunal 
 Constitucional.
 Revela-se, pois, correcta a decisão de não conhecer o recurso interposto por B., 
 devendo ser indeferida a reclamação apresentada por este.
 
  
 
                                                     *
 Decisão
 Pelo exposto, indeferem-se as reclamações apresentadas por A. e B., da decisão 
 sumária proferida nestes autos em 11-11-2008.
 
  
 
                                                     *
 Custas pelos reclamantes, fixando-se a taxa de justiça, para cada um dos 
 reclamantes, em 20 unidades de conta, ponderados os critérios referidos no 
 artigo 9.º, n.º 1, do D.L. n.º 303/98, de 7 de Outubro (artigo 7.º, do mesmo 
 diploma).
 Lisboa, 13 de Janeiro de 2009
 João Cura Mariano
 Mário José de Araújo Torres
 Rui Manuel Moura Ramos