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Processo n.º 419/08
 
 2ª Secção
 Relator: Conselheiro Joaquim de Sousa Ribeiro
 
 
 
          Acordam, em conferência, na 2ª secção do Tribunal Constitucional
 
             
 I - Relatório   
 
  
 
 1. Nos presentes autos de fiscalização concreta da constitucionalidade, vindos 
 do Supremo Tribunal de Justiça, em que é recorrente A. e recorrida B., S.A., o 
 relator proferiu decisão sumária de não conhecimento do objecto do recurso, com 
 os seguintes fundamentos:
 
 «[…] 3. Cumpre, antes de mais, lembrar que, como repetidamente o Tribunal 
 Constitucional tem salientado, não cabe a este Tribunal controlar a correcção ou 
 justeza do juízo de determinação do direito infraconstitucional feito pela 
 decisão recorrida. A interpretação do direito ordinário é um dado adquirido, a 
 partir do qual o Tribunal emite um juízo de conformidade ou desconformidade 
 constitucional.
 São pressupostos do recurso de fiscalização concreta de constitucionalidade, 
 interposto ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC, 
 designadamente, que a decisão recorrida tenha aplicado, como sua ratio 
 decidendi, norma arguida de inconstitucional, pelo recorrente, durante o 
 processo.
 No caso vertente, estes pressupostos não estão verificados, o que justifica a 
 prolação de decisão sumária, ao abrigo do artigo 78.º-A, n.º 1, da LTC.
 
 4. A primeira questão suscitada no presente recurso refere-se à interpretação 
 dos artigos 120.º, alínea a), 122.º, alínea e), e 441.º, n.º 2, alínea b), do 
 Código do Trabalho, alegadamente acolhida na decisão recorrida, que a recorrente 
 identifica da forma seguinte: «saber se, tendo a Ré atribuído à A. e ora 
 recorrente o “trabalho” de separar e organizar Diários da República, os quais se 
 encontravam guardados em caixotes, colocando-a num gabinete de estagiários, a 
 questão que se coloca, repete-se, é a de saber se respeita a Constituição 
 considerar que tal não ofende o dever/ direito de ocupação efectiva da autora 
 como trabalhadora, uma vez que o STJ considerou que a resolução do contrato de 
 trabalho operada por aquela, com esse fundamento (entre outros) carece de justa 
 causa (!)».
 Independentemente de se saber se esta questão foi invocada de forma adequada, ou 
 seja, como questão de inconstitucionalidade normativa (dissociável das 
 particularidades do caso concreto), o certo é que, contrariamente ao afirmado na 
 parte final do requerimento de interposição do recurso, a recorrente não a 
 colocou perante o tribunal recorrido.
 Nas alegações de recurso que apresentou junto do Supremo Tribunal de Justiça e, 
 especificamente, nas respectivas conclusões, a recorrente não fez qualquer 
 alusão à inconstitucionalidade daqueles preceitos do Código do Trabalho, em 
 qualquer das suas dimensões normativas.
 Ora, nos termos do artigo 72.º, n.º 2, da LTC, é pressuposto do recurso de 
 constitucionalidade que a parte tenha suscitado a questão de 
 inconstitucionalidade perante o tribunal que proferiu a decisão recorrida, em 
 termos de este estar obrigado a dela conhecer. Este ónus de suscitação 
 justifica-se atenta a natureza da intervenção do Tribunal Constitucional nos 
 processos de fiscalização concreta, que se limita ao reexame ou reapreciação de 
 questões de constitucionalidade que o tribunal a quo pudesse e devesse ter 
 apreciado.
 Assim, não pode conhecer-se do objecto do recurso nesta parte.
 
 5. A segunda questão de constitucionalidade respeita ao artigo 443.º, n.º 1, do 
 Código do Trabalho, quando «interpretado restritivamente de modo a permitir que 
 os danos não patrimoniais possam ser autonomizados, desde que se justifiquem», 
 por violação dos princípios da igualdade e da justa indemnização, consagrados 
 nos artigos 2.º, 13.º e 53.º da Constituição.
 Verifica-se, contudo, que a decisão recorrida (o acórdão do Supremo Tribunal de 
 Justiça de 17.04.2008) não fez efectiva aplicação da norma em causa.
 Tendo o tribunal a quo decidido que a resolução do contrato de trabalho, operada 
 pela autora e aqui recorrente, carecia de justa causa, determinou, em 
 conformidade, que não lhe podia ser reconhecido «o direito indemnizatório 
 previsto no artigo 443.º do Código do Trabalho». E, consequentemente, julgou 
 prejudicada a questão colocada no recurso da ré, referente à interpretação do 
 citado n.º 1 do artigo 443.º (cfr. ponto 5. do acórdão).
 Por este motivo, também não pode conhecer-se do objecto do recurso, nesta parte. 
 
 […]»
 
  
 
 2. Notificada da decisão, a recorrente veio reclamar para a conferência, ao 
 abrigo do artigo 78.º-A, n.º 3, da LTC, invocando o seguinte:
 
 «A)
 Dignos Conselheiros 
 Não ignora a Recorrente que, para conhecer-se deste tipo de recurso, torna-se 
 necessário, além do esgotamento dos recursos ordinários e de que a norma 
 impugnada tenha sido aplicada como ratio decidendi pelo tribunal recorrido, que 
 a inconstitucionalidade desta tenha sido suscitada durante o processo. 
 E este requisito deve ser entendido, segundo a melhor jurisprudência do T. C. 
 
 (veja-se por ex., o Acórdão n.º 352/94, in DR II Série, de 6 de Setembro de 
 
 1994), “não num sentido meramente formal (tal que a inconstitucionalidade 
 pudesse ser suscitada até à extinção da instância), mas “num sentido funcional”, 
 de tal modo “que essa invocação haverá de ter sido feita em momento em que o 
 tribunal a quo ainda pudesse conhecer da questão “, “antes de esgotado o poder 
 jurisdicional do juiz sobre a matéria a que (a mesma questão de 
 constitucionalidade) respeita”, por ser este o sentido que é exigido pelo facto 
 de a intervenção do Tribunal Constitucional se efectuar em via de recurso, para 
 reapreciação ou reexame, portanto, de uma questão que o tribunal recorrido 
 pudesse e devesse ter apreciado (ver ainda, por ex., o Ac. 560/94, DR, II Série, 
 de 20 de Junho de 1995). 
 Só que, tal entendimento sofre restrições, como bem se salientou naquele Ac. n.º 
 
 352/94, em situações excepcionais ou anómalas, nas quais o interessado não 
 dispôs de oportunidade processual para suscitar a questão de constitucionalidade 
 antes proferida ou não era exigível que o fizesse, designadamente por o tribunal 
 a quo ter efectuado uma aplicação insólita e imprevisível. 
 
 É, manifestamente, o caso em apreço, porquanto a decisão do STJ não lembra ao 
 careca, perdoe-se-nos o desabafo. 
 Mais: salvo o devido respeito, a decisão não só é insólita e imprevisível, mas 
 também chocante, por repugnar sobremaneira ao Direito! 
 Então a Recorrente (que é licenciada e quadro superior da Ré há mais de 6 anos, 
 onde exercia funções de Direcção) quando regressa ao trabalho após licença de 
 maternidade, constata que no seu lugar está outra pessoa, sentada na sua 
 secretária, é colocada (mediante ordens por escrito), a separar e organizar 
 
 “Diários da República” num gabinete de estagiários e tal “trabalho” é conforme a 
 Constituição, não viola direitos fundamentais enquanto cidadã e trabalhadora, 
 nomeadamente o direito de ocupação efectiva? 
 
  
 Caramba, Dignos Conselheiros, se a decisão do STJ é normal e previsível, então, 
 não imaginamos o que possa ser considerado uma aplicação da Lei insólita e 
 imprevisível... 
 B)
 Atente-se no seguinte, na parte que interessa, relativamente à matéria de facto 
 dada como provada pelas instâncias: 
 
 […]
 
  
 C)
 Dignos Conselheiros 
 A 1ª questão que se coloca nestes autos é, primordialmente, a de saber se, tendo 
 a Ré atribuído à A. e ora Recorrente o “trabalho” de separar e organizar Diários 
 da República, os quais se encontravam guardados em caixotes, colocando-a num 
 gabinete de estagiários, a questão que se coloca, repete-se, é a de saber se 
 respeita a Constituição considerar que, tal não ofende o dever / direito de 
 ocupação efectiva da autora como trabalhadora, uma vez que o STJ considerou que 
 a resolução do contrato de trabalho operada por aquela, com esse fundamento 
 
 (entre outros) carece de justa causa (!). 
 Como se sabe, a efectivação do trabalho corresponde sempre ao interesse do 
 trabalhador, pelo menos, moral. Se a inactividade constitui um factor de 
 desvalorização para o trabalhador que afecta a sua dignidade social e o seu 
 direito ao bom nome e reputação, mais gravosa é a situação do mesmo, quando 
 colocado em funções para si desprestigiantes, correspondentes a categorias 
 inferiores que qualquer trabalhador indiferenciado pode desempenhar. 
 Salvo melhor opinião, as tarefas ou o trabalho atribuído à autora não são 
 compatíveis com o seu estatuto (licenciada e quadro superior da Ré), 
 constituindo uma função de natureza burocrática, essencialmente diversa da 
 correspondente à sua categoria profissional, esvaziando-se, esta, na prática, 
 uma vez que, sendo o trabalho um meio de realização pessoal, e tendo em conta 
 que deve ser respeitada a dignidade da pessoa, para a entidade patronal surge um 
 verdadeiro dever de ocupação efectiva, que se traduz num dever de diligenciar 
 pela conservação do trabalhador condignamente ocupado. 
 Com muito interesse permitimo-nos transcrever o douto Ac. do STJ de 22/05/91, in 
 BMJ 407, pg 288, que reza assim: “- a Constituição da República Portuguesa dá 
 acolhimento ao dever de ocupação efectiva do empregador relativamente ao seu 
 trabalhador, o que tem, como correspondência, o direito deste a ser 
 efectivamente ocupado; - não tendo a empresa invocado qualquer razão específica, 
 nem justificativa para não distribuir ou não definir tarefas à A., sendo 
 insuficiente o facto de ter feito durante a sua ausência por baixa por doença, 
 uma reestruturação dos seus serviços administrativos, não fica isenta de 
 cumprimento do dever de efectiva ocupação da A. como sua trabalhadora”. 
 Aliás, como sabemos, o Supremo Tribunal de Justiça está vinculado à matéria de 
 facto descrita pelas instâncias e, também, às ilações que elas retiraram dessa 
 matéria. 
 Ora, o comportamento da Ré, ao atribuir à A. tarefas de separação e organização 
 dos Diários da República, objectivamente colocou em crise o cumprimento do dever 
 constitucionalmente garantido da efectiva ocupação daquela enquanto 
 trabalhadora, tão flagrantemente que não escapou ao olhar atento e experiente do 
 M° Juiz a quo, como bem resulta da douta sentença, pg. 16 e 17, a fls. 316 e 
 
 317, em passagem que é uma delícia de boa prosa e fina ironia e que não 
 resistimos em reproduzir, com a devida vénia: “Mas constituiu, sem dúvida, uma 
 tarefa humilhante para a Autora, que destruiu completamente o seu estatuto na 
 empresa. Não se vê como seria possível à Autora desempenhar tarefas de chefia 
 como as que havia desempenhado até então, sabendo os seus subordinados que a Ré 
 a havia presenteado, ainda que temporariamente, com tarefas que podiam ser 
 desempenhadas por qualquer trabalhador sem qualquer qualificação. 
 Não deixa de espantar que a Ré, com a candura própria dos inocentes de coração 
 puro, venha defender que a Autora tinha de aceitar tais tarefas e desempenhá-las 
 com zelo e dedicação, parecendo esquecer que a autora era a responsável pelo 
 Centro de Visitas, tinha sob as suas ordens diversos trabalhadores e tinha ao 
 seu dispor, para a auxiliar, uma técnica administrativa”. 
 Por seu turno, a Exm.ª Procuradora-Geral Adjunta, junto do STJ, refere “sem 
 papas na língua”, na pág. 12 do douto parecer, que: “a Autora teve, assim, a 
 percepção de que a Ré iria fazer uso do ditado popular “quem vai ao mar perde o 
 lugar “. E na verdade assim aconteceu”. 
 Mais à frente, na pág. 14 continua a Sr.ª Procuradora-Geral Adjunta, 
 referindo-se concretamente à tarefa que foi então atribuída à A. de separar e 
 organizar os Diários da República: “verifica-se assim, que a Ré destituiu à 
 Autora de todas as funções que ela exercia antes de entrar de baixa médica 
 motivada pela sua gravidez, seguida de licença de maternidade, funções essas que 
 consistiam em dirigir, orientar e fiscalizar o pessoal e o planeamento das 
 actividades do Centro de Visitas. E, a nosso ver, não existe qualquer 
 justificação para que a Ré tenha destituído a A. das funções que lhe estavam 
 cometidas” 
 Ao interpretar o art. 120.º, a), 122.°, e) e 441.°, n.º 2, b) como o fez, o STJ 
 deu cobertura, na prática, ao revogar o decidido pela 1.ª instância e pela 
 Relação, à violação da Ré do dever / direito de ocupação efectiva da A. como 
 trabalhadora. E, ao fazê-lo, o STJ violou assim a CRP, mormente os seus art.ºs 
 
 58.°e 59.°. 
 D)
 Dignos Conselheiros 
 Igualmente, se questiona se, contrariamente ao decidido no Acórdão recorrido, o 
 n.º 1 do art. 443.º do Código do Trabalho deve ser interpretado restritivamente 
 de modo a permitir que os danos não patrimoniais possam ser autonomizados, desde 
 que se justifiquem, sob pena de violação dos princípios da igualdade e da justa 
 indemnização consagrados nos art.ºs 2.°, 13.° e 53.° da Constituição. 
 Atentemos no seguinte: 
 Se a cessação do contrato de trabalho for da iniciativa do empregador, e o 
 tribunal considerar que há justa causa, então, a lei manda indemnizar o 
 trabalhador por todos os danos, patrimoniais e não patrimoniais causados – art. 
 
 436.°, nº 1, a) do Código do Trabalho – sem prejuízo da indemnização de 
 antiguidade (art. 439.°, n.º 1 do Código do Trabalho,). 
 Se a cessação do contrato de trabalho for da iniciativa do trabalhador, e o 
 Tribunal considerar que há justa causa, então, não terá direito a uma 
 indemnização por danos morais, ou melhor, estes consideram-se incluídos na 
 indemnização fixada pelo tribunal – art. 443°, nº 1 do Código do Trabalho. 
 Dito de outro modo: quem se auto-despedir por comportamento culposo do 
 empregador receberá – por tudo – tanto quanto recebe quem se viu despedido, às 
 vezes “apenas” por um vício deforma ou por uma discutível ponderação da justa 
 causa. Não pode ser! 
 De facto, tal indemnização, se assim interpretada à letra fria e em mau 
 português do art. 443°, nº 1 do Código do Trabalho, conduz, na opinião de Albino 
 Mendes Baptista, “à adopção de uma solução que reputamos de absurda” – in A 
 Reforma do Código do Trabalho, Coimbra Almedina, pg. 540. 
 E porquê absurda? Por uma razão muito simples, de que o caso “sub iudice” é bem 
 um exemplo: à luz do novo Código do Trabalho, e sem uma interpretação restritiva 
 do art. 443.°, n.º 1, vale a pena a uma empresa violar deliberadamente os 
 direitos de um trabalhador e levá-lo a despedir-se, porque, mesmo que o Tribunal 
 lhe dê razão e fixe a indemnização no seu máximo legal (45 dias, como foi o 
 caso) o empregador faz sempre um bom “negócio”, porque acaba por se livrar de um 
 indesejado por relativamente pouco custo. Faz isto algum sentido? 
 Certamente que não, e é por isso que Albino Mendes Baptista propõe uma 
 interpretação restritiva do preceito, por forma a deixar de fora os danos não 
 patrimoniais, que, segundo aquele autor, “são insusceptíveis de sujeição a um 
 espartilho legislativo”. 
 Como muito bem refere aquele autor, resulta do art. 562.° do Código Civil, que a 
 indemnização se estende a todos os danos; o que, por aplicação do art. 798.°/ss 
 do Código Civil, de modo ai m se podem deixar de fora, os danos não patrimoniais 
 que se justifiquem. 
 Como se escreve no Ac. STJ de 02/12/98, in BMJ 482 – pg. 123/ss (que não perdeu 
 actualidade), são diferentes os direitos que se retiram dos mesmos factos: 
 
 “Esses direitos são distintos e autónomos (...). Essa indemnização (a da 
 antiguidade) não se opõe à indemnização por danos não patrimoniais (...). Se não 
 existirem outros danos indemnizáveis, então serão só os ditados pela antiguidade 
 que se tomarão em conta – se outros existirem, designadamente os danos não 
 patrimoniais, estes terão que ser atribuídos e acrescerão àqueloutra 
 indemnização”. 
 Finalmente, conclui Albino Mendes Baptista, a interpretação restritiva é imposta 
 pela Constituição, sob pena de violação do princípio da justa indemnização. 
 Estamos absolutamente convencidos que a resolução do contrato pelo trabalhador 
 
 (com justa causa e, portanto, baseado em comportamento culposo e ilícito da 
 entidade patronal) é normalmente uma fonte de danos não patrimoniais de relevo, 
 até superiores aos resultantes de um despedimento ilícito. Isto porque, na 
 resolução, são os próprios comportamentos danosos que impõem a ruptura 
 contratual, ao passo que no despedimento o dano não patrimonial surge 
 normalmente causado pela ruptura em si. 
 Os valores jurídicos tutelados em ambas as situações são os mesmos, e 
 consequentemente “valores sociais eminentes” e constitucionalmente tutelados 
 
 (art. 2.°, 13.° e 53.° da CRP), e que foram, na interpretação literal que lhes 
 deu o douto Acórdão Recorrido, violados, salvo melhor opinião. 
 E)
 Dignos Conselheiros 
 
 É certo que, tendo o tribunal a quo decidido que a resolução do contrato de 
 trabalho operada pela Recorrente carecia de justa causa, determinou que não lhe 
 podia ser reconhecido “o direito indemnizatório previsto no art. 443.° do Código 
 do Trabalho”. E, consequentemente, julgou prejudicada a questão colocada no 
 recurso da Recorrente referente à interpretação do n.º 1 do art. 443.º – cfr. 
 ponto 5 do Acórdão. 
 Por este motivo, concluiu o Ex.mo Juiz Conselheiro-Relator “não pode conhecer-se 
 do objecto de recurso, nesta parte”. 
 
 É verdade. 
 Como também é verdade que, sendo o recurso admitido e logrando a Recorrente 
 obter ganho de causa em sede constitucional, naturalmente que este Alto Tribunal 
 terá que conhecer do objecto do recurso relativamente à questão suscitada, isto 
 
 é, se respeita à Constituição a interpretação do art. 443.º, n.º 1 do Código do 
 Trabalho, feita pelo STJ, que não permitiu que os danos não patrimoniais possam 
 ser autonomizados, desde que se justifiquem. 
 F)
 
 - De qualquer modo, e contrariamente ao decidido pelo digno Juiz Conselheiro- 
 Relator, achamos que a Recorrente suscitou as presentes inconstitucionalidades, 
 para além do mais, na petição inicial (art. 55°), e nos recursos subordinados 
 
 (quer perante a Relação, quer perante o Supremo) nos termos do disposto no art. 
 
 72.º, n.º 2 e no art. 75.°-A, n.º 2 da LTC. 
 Vejamos o que se alegou no art. 55.º da p.i.: 
 
 “De Chefe de Departamento passou a Chefe de coisa nenhuma... em violação clara 
 do direito à ocupação efectiva, garantido pelo art. 122.°, b) do Código do 
 Trabalho e art. 53.º, 58.°, n.º 1 e 59.°, n.º 1, b) e n.º 2, c) da Constituição 
 da República Portuguesa”. 
 Vejamos o que se alegou nas conclusões dos recursos subordinados, quer perante a 
 Relação quer perante o Supremo: 
 
 - “Deve o art. 453.°, n.º 1 do Código do Trabalho sofrer uma interpretação 
 restritiva, de modo a permitir que os danos não patrimoniais possam ser 
 autonomizados desde que se justifiquem”. 
 
 - “De facto, se o que se pretende é que a indemnização obedeça ao mesmo 
 critério, quer se trate da resolução pelo trabalhador, quer se trate do 
 despedimento ilícito por parte do empregador, então, a interpretação restritiva 
 do art.° 453.°, n.° 1 do Código do Trabalho, é a única que é conforme à 
 Constituição, sob pena de violação do princípio da justa indemnização”. 
 
 - “Violou, pois, a douta sentença, por erro de interpretação o disposto no art.° 
 
 453.°, n.° 1 do Código do Trabalho, e os princípios de igualdade e da justa 
 indemnização previstos, nos art°s 2.°, 13.° e 53.° da CRP”. 
 G)
 Dignos Conselheiros 
 Sobre a questão da suscitação da inconstitucionalidade subscrevemos inteiramente 
 o disposto no Ac. do TC n.° 618/98 (disponível em 
 
 www.tribunalconstitucional.pt/) que diz o seguinte: 
 
 “É certo que não existem fórmulas sacramentais para formulação dos pedidos, nem 
 sequer para suscitação da questão de constitucionalidade. (§) Esta tem, porém, 
 de ocorrer de forma que deixe claro que se põe em causa a conformidade à 
 Constituição de uma norma ou de uma sua interpretação (...)”. 
 Salvo melhor opinião, julgamos que estes criteria exigíveis foram cumpridos no 
 caso sub iudice.[...]»
 
  
 
 3. A recorrida respondeu, pugnando pela improcedência da reclamação.
 
  
 Tudo visto, cumpre apreciar e decidir.
 
  
 II – Fundamentação
 
  
 
 4. A reclamação agora apresentada em nada abala os fundamentos da decisão 
 sumária.
 
  No que respeita à primeira questão − inconstitucionalidade das normas dos 
 artigos 120.º, alínea a), 122.º, alínea e), e 441.º, n.º 2, alínea b), do Código 
 do Trabalho, quando interpretadas no sentido de não haver ofensa do dever/ 
 direito de ocupação efectiva da trabalhadora (e consequentemente, não haver 
 justa causa para a resolução do contrato operada por esta) numa situação em que 
 lhe foi atribuído o “trabalho” de separar e organizar Diários da República, os 
 quais se encontravam guardados em caixotes, colocando-a num gabinete de 
 estagiários (quando anteriormente era responsável pelo Centro de Visitas)» − 
 considerou a decisão reclamada que (independentemente de se saber se está em 
 causa uma questão de inconstitucionalidade normativa, idónea a constituir 
 objecto do recurso de constitucionalidade) a recorrente não havia suscitado tal 
 questão perante o tribunal recorrido.
 A reclamante vem dizer que se tratou de uma situação excepcional e anómala, em 
 que não lhe era exigível antecipar a questão, “designadamente por o tribunal a 
 quo ter efectuado uma aplicação insólita e imprevisível” daquelas normas.
 Não tem razão a reclamante. 
 Ainda que a decisão do Supremo Tribunal de Justiça tenha invertido o sentido das 
 decisões anteriores, a verdade é que a interpretação em causa vinha sendo 
 discutida nos autos e defendida pela parte contrária, pelo que a recorrente 
 devia ter antecipado esta interpretação como uma das soluções possíveis 
 
 (independentemente do seu mérito) e, como tal, devia (e podia) ter suscitado a 
 questão de constitucionalidade, dando oportunidade ao tribunal recorrido de 
 sobre ela se pronunciar.
 Resta dizer que a breve referência feita no artigo 55.º da petição inicial – a 
 que se alude na alínea F) da reclamação − não só não constitui suscitação de uma 
 questão de constitucionalidade, como, de qualquer forma, não coloca a questão 
 perante o tribunal recorrido que, no caso, é o Supremo Tribunal de Justiça, e 
 não o tribunal de primeira instância.
 Conclui-se, assim, que a ora reclamante incumpriu o disposto no artigo 72.º, n.º 
 
 2, da LTC.
 Quanto à segunda questão − inconstitucionalidade da norma do artigo 443.º, n.º 
 
 1, do Código do Trabalho, quando «interpretado restritivamente de modo a 
 permitir que os danos não patrimoniais possam ser autonomizados, desde que se 
 justifiquem» − a reclamante não nega o fundamento da decisão reclamada, pois 
 admite que “tendo o tribunal a quo decidido que a resolução do contrato de 
 trabalho operada pela recorrente carecia de justa causa, determinou que não lhe 
 poda ser reconhecido o direito indemnizatório previsto no art. 443.º do Código 
 de Trabalho. E, consequentemente, julgou prejudicada a questão colocada no 
 recurso da recorrente referente à interpretação do n.º 1 do art. 443.º − cfr. 
 ponto 5 do Acórdão ”(cfr. alínea E) da reclamação).
 Não se percebe a razão da discordância da reclamante, uma vez que o presente 
 recurso vem interposto do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça que, como a 
 própria reclamante admite, não aplicou a norma do artigo 443.º do Código de 
 Trabalho. É, assim, evidente que falta o pressuposto necessário ao conhecimento 
 do recurso que tem por objecto a apreciação da inconstitucionalidade desta 
 norma.
 
             Por último, cumpre salientar, tal como já se fez na decisão 
 reclamada, que o recurso para o Tribunal Constitucional apenas pode ter por 
 objecto normas e não a decisão judicial em si mesma, não podendo este Tribunal 
 pronunciar-se sobre a correcção do juízo de aplicação do direito 
 infraconstitucional ao caso concreto.
 Termos em que se conclui pela improcedência da reclamação
 
  
 III. Decisão
 
  
 Pelo exposto, acordam em indeferir a presente reclamação.
 Custas pela reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20 (vinte) unidades de 
 conta.
 Lisboa, 10 de Dezembro de 2008
 Joaquim de Sousa Ribeiro
 Benjamim Rodrigues
 Rui Manuel Moura Ramos