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Processo n.º 719/2008 
 
 
 
 3.ª Secção 
 
 
 Relatora: Conselheira Maria Lúcia Amaral 
 
 
 Acordam na 3ª Secção do Tribunal Constitucional 
 
 
 A. propôs, junto do Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra, acção 
 administrativa especial contra o Ministério das Actividades Económicas e do 
 Trabalho e os contra-interessados particulares, pedindo a anulação do Despacho 
 da Secretária de Estado da Indústria datado de 4 de Março de 2004, com a 
 consequente revogação da lista de transição do pessoal do Quadro da Inspecção-Geral 
 das Actividades Económicas na parte respeitante à categoria de Inspector Técnico. 
 Mais pedia o autor a sua integração na carreira de Inspector Técnico 
 Especialista Principal e o recebimento dos montantes remuneratórios 
 correspondentes a essa categoria, que estariam em falta desde 1 de Julho de 2000. 
 
 
 Julgando parcialmente procedente a acção, o TAF de Coimbra, em acórdão de 27 de 
 Maio de 2008, recusou a aplicação das normas constantes do artigo 9º, nº 3, do 
 Decreto-Lei nº 112/01 do artigo 8º, nº3, do Decreto Regulamentar nº 48/02, em 
 conjugação com o disposto no artigo 10º, nº 2, do mesmo diploma. Fê-lo nos 
 seguintes termos: 
 
 
 
 (?) procede a invocada inconstitucionalidade material do artigo 9° n° 3 do DL nº 
 
 112/2001 e do artigo 8° n° 3 do Decreto Regulamentar n° 48/2002, conjugados com 
 o artigo 10º n° 2 deste Decreto Regulamentar por violação do Princípio da 
 Igualdade constitucionalmente acolhido nos artigos 59.° e 13.° da CRP, por 
 inversão das posições relativas dos funcionários ou agentes. 
 
 
 
 É que (?) o Princípio da não inversão das posições relativas dos funcionários ou 
 agentes (na vertente do Princípio da Igualdade consagrado nos artigos 13° e 59°, 
 n.° 1 alínea a) da CRP) constituí um limite objectivo à discricionariedade do 
 legislador, enquanto princípio da coerência e da equidade que presidem ao 
 sistema de carreiras, não exigindo o tratamento igual de todas as situações, mas, 
 antes, implica que sejam tratados igualmente os que se encontram em situações 
 iguais e tratados desigualmente os que se encontram em situações desiguais, de 
 maneira a não serem criadas discriminações arbitrárias e irrazoáveis, porque 
 carecidas de fundamento material bastante, não podendo admitir-se à face deste 
 princípio da não inversão das posições relativas de funcionários ou agentes que 
 por mero efeito da reestruturação de carreiras, por carência de justificação 
 objectiva e racional, que funcionários da mesma categoria profissional que 
 exercem funções num mesmo serviço público e transitem para uma mesma categoria 
 ou sejam promovidos a uma mesma categoria passem a auferir remunerações 
 diferentes por efeito apenas do momento em que ocorreu a transição ou promoção e, 
 designadamente, não será tolerável que, por mero efeito da reestruturação, passe 
 a ser auferida remuneração superior por funcionários com menor antiguidade na 
 mesma categoria e idêntica qualificação. 
 
 
 Por outras palavras, o princípio da igualdade consagrado no artigo 13.° da 
 Constituição da República Portuguesa assenta na ideia geral de proibição do 
 arbítrio, implicando fundamentalmente o tratamento igualitário em matéria de 
 direitos e deveres de todos os particulares em relação aos poderes públicos, não 
 podendo uns ser privilegiados em detrimento de outros, pelo que proíbe 
 benefícios no gozo de qualquer direito e prejuízo ou detrimento na privação de 
 qualquer direito. 
 
 
 
 (?) 
 
 
 Tendo isto presente, no presente caso, por efeito da previsão de uma regra 
 especial de transição que permite a intercomunicabilidade de carreiras, sem 
 justificação, desde logo em sede de requisitos de habilitação exigidos, 
 funcionários de categoria inferior antes da transição passaram ser posicionados 
 em categoria superior da mesma carreira relativamente a funcionários que 
 detinham categoria superior, não se vislumbra qualquer fundamento válido para 
 tal inversão. O que configura violação do princípio da não inversão das posições 
 relativas dos funcionários ou agentes, enquanto um dos corolários do Princípio 
 da Igualdade consagrado nos artigos 13.° e 59.°, n.° 1 alínea a) da Constituição 
 da República Portuguesa e nos conduz ao juízo de inconstitucionalidade material 
 das normas do artigo 8.° n.° 3 do Decreto Regulamentar n° 48/2002 em conjugação 
 com o artigo 10.º n.° 2 do mesmo diploma e do artigo 9.° n.° 3 do DL n° 112/2001. 
 
 
 Juízo de inconstitucionalidade também já feito em dois Acórdãos do Tribunal 
 Constitucional [Acórdãos n°s 642/2005 e 51/2006]. 
 
 
 
 (?) 
 
 
 Resultando inconstitucionais, nos termos supra expostos, as normas do artigo 8.° 
 n.° 3 do Decreto Regulamentar n° 48/2002 em conjugação com o artigo 10.° n.° 2 
 do mesmo diploma e com o artigo 9.° n.° 3 do DL n° 112/2001 por violação do 
 artigo 59.°, n.° 1, alínea a) da Constituição da República Portuguesa enquanto 
 corolário do Princípio da Igualdade consagrado no seu artigo 13°, e recusando-se 
 a sua aplicação (em conformidade com o disposto nos artigos 204°, 277° e 280° n° 
 
 1 da CRP), forçoso é julgar procedente o pedido de anulação do despacho que 
 homologou a Lista de Transição, por falta de base legal, muito embora sejam 
 improcedentes, pelas razões expostas, os demais vícios imputados àquele despacho 
 homologatório, bem como os consequentes pedidos condenatórios formulados. 
 
 
 Julgado procedente o pedido de anulação daquele despacho, com aqueles 
 fundamentos, tal implica, como já se disse, que a Lista de Transição deva ser 
 elaborada, e os funcionários reposicionados, em conformidade com o juízo de 
 inconstitucionalidade formado, o mesmo é dizer, desaplicando as identificadas 
 normas que injustificadamente produziram a inversão das posições relativas dos 
 funcionários em causa. 
 
 
 
 2. Desta decisão interpôs o Ministério Público recurso para o Tribunal 
 Constitucional, ao abrigo do disposto na alínea a) do nº 1 do artigo 70º da Lei 
 nº 28/82. Pedia-se, no respectivo requerimento de interposição, que o Tribunal 
 apreciasse a ?constitucionalidade material do art. 8º, nº 3, do Decreto 
 Regulamentar nº 48/2002, de 26/11, em conjugação com o art.10º, nº2, do mesmo 
 diploma, e art. 9º, nº3, do Decreto-Lei nº 112/2001, de 06/04 (?) por violação 
 do princípio da não inversão das posições relativas dos funcionários ou agentes, 
 enquanto corolário do princípio da igualdade, consagrado nos arts. 13º e 59º, nº 
 
 1, al. a) da Constituição da República Portuguesa?. 
 
 
 
 3. Recebido o recurso no Tribunal Constitucional, e ordenada a produção de 
 alegações, veio o representante do Ministério Público neste Tribunal sustentar a 
 tese da inconstitucionalidade com fundamento na jurisprudência já fixada nos 
 Acórdãos nºs 642/05 e 51/06. No mesmo sentido pugnou o recorrido nas suas contra-alegações. 
 
 
 
 4. Como se depreende do que acabou de dizer-se, não é nova a questão de 
 constitucionalidade que, por este meio, é colocada ao Tribunal. 
 
 
 Nos Acórdãos nºs 642/2005 e 51/2006, disponíveis em www.tribunalconstitucional.pt 
 
 ? e também na Decisão Sumária nº 411/06 ?, o Tribunal julgou inconstitucional, 
 por violação do artigo 59º, nº 1, alínea a) da Constituição, enquanto corolário 
 do princípio da igualdade consagrado no seu artigo 13º, a norma resultante da 
 conjugação das normas ínsitas no nº 3 do art. 8º e do nº 2 do artigo 10º, um e 
 outro do Decreto Regulamentar nº 48/2002, e da alínea b) do nº 3 do art. 9º do 
 Decreto-Lei nº 112/2001, na medida em que implica que, na transição para a 
 estrutura das carreiras de inspecção da Administração Pública, definida neste 
 
 último diploma, um inspector técnico 
 de 2ª classe da Inspecção-Geral das Actividades Económicas, que possua igual ou 
 superior antiguidade e não detenha inferiores requisitos habilitacionais, possa 
 ser posicionado em categoria inferior e com menor remuneração do que aquela em 
 que foi posicionado um sub-inspector da mesma Inspecção-Geral. 
 
 
 Sendo a doutrina destes acórdãos inteiramente aplicável à situação sob juízo, e 
 permanecendo válidos os seus fundamentos ? que radicam nos limites impostos ao 
 legislador ordinário pelo princípio de igualdade concretizado na alínea a) do nº 
 
 1 do artigo 59º da Constituição ?, reitera-se no presente caso o juízo de 
 inconstitucionalidade. 
 
 
 
 5. Nestes termos, decide-se negar provimento ao recurso, confirmando?se a 
 decisão recorrida quanto à questão de constitucionalidade. 
 
 
 Lisboa, 30 de Setembro de 2009 
 
 
 Maria Lúcia Amaral 
 
 
 Vítor Gomes 
 
 
 Carlos Fernandes Cadilha 
 
 
 Ana Maria Guerra Martins 
 
 
 Gil Galvão