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Processo n.º 106/2010
 
 3ª Secção
 Relator: Conselheiro Vítor Gomes
 
  
 
  
 
             Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional
 
  
 
             1. A. reclama para a conferência, ao abrigo do n.º 3 do artigo 
 
 78.º-A da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro (LTC) da seguinte decisão do relator:
 
 “1. A. [corrige-se o lapso: na decisão sumária escreveu-se “A1”] interpôs 
 recurso do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 8 de Setembro de 2009, ao 
 abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro 
 
 (LTC), mediante requerimento do seguinte teor:
 
 “2. Pretende o Recorrente ver apreciada a questão da inconstitucionalidade do 
 Artigo 486º- nº1 do C.P.Civil, que o douto Despacho de 09.06.2003, proferido a 
 Fls...58 e 59 dos autos não apreciou –, a saber a de que o Art.486º-nº1 do 
 C.P.Civil na interpretação de que para apresentação da Contestação o Réu não 
 beneficia do prazo de dilação designadamente a prevista no Art. 252-A-n°1, 
 alíneas a) e b) C.P.C., a que normalmente teria direito, no caso de ter havido 
 nomeação de Patrono aos RR. no âmbito do Apoio Judiciário, é inconstitucional, 
 por violação das normas contidas nos Arts. 13º e 20º da Constituição. 
 
 3. Pretende ainda o Recorrente ver apreciada a questão da inconstitucionalidade 
 da norma, conjugadamente, contida nos Arts 229º-A e 260º-A CPC na interpretação 
 de que sobre o Patrono nomeado, designadamente no âmbito da Lei do Apoio 
 Judiciário (Lei Nº 30-E/2000, de 20.12.) - que não foi constituído mandatário 
 pela parte que patrocina - recai a obrigação de dar cumprimento ao disposto nos 
 Arts. 229º-A e 260º-A do C.P.Civil (notificação à contraparte das peças 
 processuais posteriores à contestação) é inconstitucional por violação entre 
 outros dos princípios da igualdade e da proporcionalidade consignados nos Arts. 
 
 13º e 18º da Constituição. 
 
 4. Pretende ainda o Recorrente ver apreciada a questão da inconstitucionalidade 
 da norma contida no Art. 512º-A do C.P.Civil conjugada com o disposto no 
 Art.623º-nº1 do C.P.Civil interpretada no sentido de que as testemunhas aditadas 
 ao rol, quando residentes fora do circulo judicial do Tribunal onde corre a 
 causa, são a apresentar neste Tribunal e não no tribunal da comarca da 
 residência das Testemunhas para aí serem ouvidas por 
 teleconferência/videoconferência é inconstitucional, por violação do princípio 
 da igualdade, da proporcionalidade e do acesso ao direito e tutela jurisdicional 
 efectiva consagrados, respectivamente, nos Art. 13º, 18º e 20º da Constituição. 
 
 5. Pretende ainda o Recorrente ver apreciada a questão da inconstitucionalidade 
 que o douto Acórdão STJ de 08.09.2009, proferido a Fls... dos autos não apreciou 
 
 –, a saber a de que: A norma contida no Artigo 289º-nºs 1 e 3 do Código Civil, 
 de que se fez aplicação no douto Acórdão em apreço, na interpretação aí acolhida 
 de que o Mutuário deve restituir ao Mutuante a quantia mutuada, acrescida de 
 juros legais vencidos desde a citação, quando é certo e (está dado como provado) 
 que aquela quantia mutuada não foi entregue ao Mutuário mas sim directamente 
 entregue ao fornecedor/Vendedor é inconstitucional, por violação do direito à 
 protecção dos interesses económicos do consumidor (Recorrente), e dos princípios 
 da certeza do direito, da confiança jurídica, da igualdade e da 
 proporcionalidade previstos nos Arts. 60º, 2º, 13º, 16º e 18° da Constituição. 
 
 6. Normas e Princípios constitucionais violados: normas contidas nos Arts. 13º, 
 
 16º, 18º e 20º da Constituição e do direito à protecção dos interesses 
 económicos do consumidor (Recorrente), e dos princípios da certeza do direito, 
 da confiança jurídica, da igualdade e da proporcionalidade previstos nos Arts. 
 
 60º, 2º, 13º, 16º e 18º da Constituição. 
 
 7. As questões de inconstitucionalidade foram suscitadas: 
 
 -Nas Alegações de Recurso do douto Despacho de 09.06.2003, proferido a Fls...58 
 e 59 dos autos; 
 
 -No Requerimento de Arguição de nulidade do douto Despacho de 02.11.2005 
 proferido a Fls.268/269 dos autos; nas Alegações/Conclusões (em l5.03.2007) do 
 Recurso do douto Despacho de 02.11.2005 proferido a Fls.268/269 dos autos e das 
 Alegações/Conclusões do recurso de Revista/Agravo do douto Acórdão de 25.10.2007 
 proferido a Fls... dos autos; e 
 
 -No Requerimento de Arguição de Nulidade e Aclaração/reforma do douto Acórdão do 
 STJ de 08.09.2009 proferido a Fls... dos autos.” 
 
 2. O recurso não pode prosseguir, o que imediatamente se decide nos termos do 
 disposto no n.º 3 do artigo 76.º e do n.º 1 do artigo 78.º-A da LTC.
 Com efeito, o recurso interposto ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º 
 da LTC depende, além do mais, dos seguintes pressupostos ou condições (alínea b) 
 do n.º 1 do artigo 70.º e n.º 2 do artigo 72.º da LTC):
 a) versar sobre norma que integre a ratio decidendi da decisão recorrida;
 b) ter sido suscitada a respectiva questão de constitucionalidade suscitada 
 perante o tribunal que proferiu a decisão recorrida, em termos de este estar 
 obrigado a dela conhecer.
 Ora, não tendo o Supremo Tribunal de Justiça conhecido do recurso de agravo, é 
 manifesto que não decidiu qualquer questão em que tenha feito aplicação das 
 normas referidas nos n.ºs 2, 3 e 4 do requerimento de interposição todas elas 
 respeitando a questões discutidas ou discutíveis nesse recurso. 
 Consequentemente, desde logo com este fundamento, não pode conhecer-se do 
 recurso de constitucionalidade nesta parte.
 E também não pode conhecer-se do recurso quanto à norma identificada no n.º 5 do 
 mesmo requerimento, uma vez que não foi suscitada quanto a ela, de modo 
 processualmente adequado, qualquer questão de constitucionalidade. 
 
 É certo que o recorrente arguiu essa inconstitucionalidade no pedido de 
 aclaração ou reforma do acórdão de 8 de Setembro de 2009. Mas esse pedido de 
 reforma foi indeferido pelo acórdão de 24 de Novembro de 2009, tendo o Supremo 
 Tribunal de Justiça consignado a propósito da questão de constitucionalidade:
 
 “(…)
 Finalmente dir-se-á que no recurso de revista não foi suscitada qualquer questão 
 de inconstitucionalidade, existindo efectivamente questões desse tipo nos 
 recursos de agravo.
 A inconstitucionalidade que o reclamante ora invoca é uma questão nova de que 
 este tribunal não pode conhecer.
 Como flui de todo o exposto, está-se perante mera discordância do requerente com 
 o que decidiu este Tribunal, discordância essa que não encontra, no entanto, no 
 nosso ordenamento jurídico, através da norma dos artigos 666.º, 667.º e 669.º do 
 Código de Processo Civil, de ou de qualquer outra, meio de reparação.
 Não se verificando os pressupostos de que depende a possibilidade de sanação da 
 arguida nulidade, de aclaração ou reforma do acórdão – que, de resto, se nos 
 apresenta como isento de reparos –, importa lembrar a regra fundamental do nº 1 
 do artigo 666.º do Código de Processo Civil: proferido o acórdão, ficou 
 imediatamente esgotado o poder jurisdicional do julgador.
 Termos em que se indefere o pedido.”
 Ora, como o Tribunal Constitucional, de modo reiterado e uniforme, tem decidido, 
 os incidentes post-decisórios não constituem, em princípio, meio idóneo para 
 suscitar a questão de constitucionalidade relativamente a normas aplicadas ou 
 que deveriam ter sido aplicadas na decisão relativamente à qual tais incidentes 
 se suscitam. 
 Como lembra Carlos Lopes de Rego (Os Recursos de Fiscalização Concreta na Lei e 
 na Jurisprudência do Tribunal Constitucional, Almedina, 2010, pág. 77):
 
 “Na verdade, sempre entendeu o Tribunal Constitucional, em jurisprudência 
 reiterada e uniforme, que deve interpretar-se esta exigência de suscitação da 
 inconstitucionalidade “durante o processo” não num sentido meramente “formal” 
 
 (de tal modo que a referida questão pudesse ser suscitada até à extinção da 
 instância), mas num sentido “funcional”, carecendo a invocação da 
 inconstitucionalidade e ter sido feita em momento processual em que ainda fosse 
 possível ao tribunal “a quo” conhecer de tal questão jurídico-constitucional, 
 tomando sobre ela posição, por não estar ainda esgotado o seu poder 
 jurisdicional sobre a matéria a que diz respeito a questão de 
 constitucionalidade a que o recurso se reporta. Será, pois, este o sentido a 
 atribuir a este pressuposto ou requisito dos recurso de constitucionalidade 
 previstos da alínea b), em consonância com a natureza da intervenção do Tribunal 
 Constitucional em sede de fiscalização concerta – visando reapreciar uma questão 
 que o tribunal “a quo” pudesse e devesse ter anteriormente apreciado e decidido, 
 e não dirimir “questões novas” perante si inovatoriamente colocadas pelas partes 
 
 – cfr. v.g., Acórdãos n.ºs 349/86, 199/88, 228/89, 318/90, 41/92, 269/94, 
 
 310/94, 352/94, 560/94, 155/95, 178/95, 1144/96 e 618/98.
 Assim – porque o poder jurisdicional se esgota, em princípio, com a prolação da 
 sentença ou acórdão e a eventual aplicação de uma norma inconstitucional não 
 constitui erro material ou lapso notório, não é causa de nulidade da decisão e 
 não torna esta obscura ou ambígua – tem de entender-se que os incidentes 
 pós-decisórios (pedido de aclaração, de reforma ou de arguição de nulidade da 
 decisão), previstos na lei de processo, não são já, em princípio, meios idóneos 
 e atempados para suscitar, pela primeira vez, uma questão de constitucionalidade 
 de normas aplicadas pelo julgador na decisão do pleito ou causa principal: é 
 que, como é óbvio, se tais pretensões da parte forem indeferidas, por 
 inverificação dos pressupostos do “incidente” requerido, as únicas normas 
 aplicadas serão as normas processuais reguladoras da admissibilidade e âmbito 
 dos pedidos de reforma ou nulidade – cfr., v.g., Acórdãos n.ºs 450/87, 46/88, 
 
 479/89, 61/92, 164/92, 152/93, 169/93, 261/94, 164/95, 122/98, 418/98, 496/99, 
 
 674/99, 374/00, 155/00, 142/01, 213/01, 300/02, 381/02, 443/02, 394/05, 533/07 e 
 
 55/08.”
 
 3. Decisão
 Pelo exposto decide-se não conhecer do objecto do recurso e condenar o 
 recorrente nas custas, fixando a taxa de justiça em 7 (sete) UCs, sem prejuízo 
 do regime de apoio judiciário.”
 
  
 
             2. Alega, em síntese:
 
             – Quanto às normas referidas no n.ºs 2, 3 e 4 do requerimento de 
 interposição do recurso de constitucionalidade, a circunstância de o acórdão 
 recorrido não ter conhecido do mérito do recurso não era impeditivo de que 
 conhecesse das questões de constitucionalidade colocadas, pelo que deve ser 
 admitido recurso para o Tribunal Constitucional;
 
             – Quanto à norma referida no n.º 5 desse mesmo requerimento, não era 
 exigível que o recorrente tivesse suscitado previamente a questão de 
 constitucionalidade porque a aplicação da norma com o sentido que lhe foi dado 
 era de todo imprevisível.
 
  
 
             Não houve resposta por parte do recorrido “Banco B., SA”.
 
  
 
             3. A reclamação é manifestamente improcedente.
 
  
 
             O recurso de constitucionalidade é interposto ao abrigo da alínea b) 
 do n.º 1 do artigo 70.º da LTC, o que tem como pressuposto que as normas cuja 
 inconstitucionalidade se pretende ver reconhecida tenham sido aplicadas pela 
 decisão recorrida. Ora, tendo o Supremo Tribunal de Justiça considerado 
 inadmissíveis os agravos interpostos pelo recorrente do acórdão da Relação, não 
 poderia ter feito aplicação, como efectivamente não fez, de quaisquer normas 
 respeitantes às questões que nesses agravos se queriam ver apreciadas. Fez 
 somente aplicação das normas que estabelecem as hipóteses em que há recurso de 
 agravo de acórdãos das relações. As questões de constitucionalidade 
 identificadas nos n.ºs 2, 3 e 4 do requerimento de interposição não dizem 
 respeito a esse regime jurídico, pelo que improcede este fundamento da 
 reclamação.
 
  
 
             Resta a “norma” identificada no n.º 5 do requerimento de 
 interposição, esta respeitante a matéria de que o acórdão recorrido se ocupou. 
 Mas aqui a nenhum título pode pretender-se justificar a falta de suscitação da 
 questão de constitucionalidade com uma aplicação ou interpretação anómala ou 
 inesperada da norma ou normas em causa. Com efeito, uma questão que desde sempre 
 se discutira no processo era a de saber se sobre o mutuário que invoca a 
 nulidade do contrato de crédito ao consumo impende a obrigação de restituição da 
 quantia entregue pelo mutuante, ainda que tal entrega tenha sido feita 
 directamente ao terceiro vendedor em cumprimento da obrigação resultante do 
 contrato de compra e venda coligado com o de mútuo. E igualmente se discutiu se, 
 face à nulidade do contrato, essa restituição devia ser acompanhada de juros e 
 desde quando eram devidos. Foi sobre estas questões que versou o recurso de 
 revista que o recorrente interpôs – cfr., os n.ºs 10 a 14 do relatório do 
 acórdão recorrido – pelo que, se entendia serem inconstitucionais as normas que 
 conduzem a esse resultado, deveria ter suscitado logo aí a questão, em termos de 
 o Supremo Tribunal de Justiça ficar vinculado a dela conhecer.
 
  Aliás, o recorrente estava consciente da controvérsia jurisprudencial quanto 
 aos efeitos da declaração de nulidade em casos semelhantes, tanto que requereu, 
 embora sem êxito, o julgamento ampliado de revista (fls. 577 e segs.).
 
  
 
             4. Decisão
 
             Pelo exposto, decide-se indeferir a reclamação e condenar o 
 recorrente nas custas, com 20 (vinte) UCs de taxa de justiça.
 Lx., 28/04/2010
 Vítor Gomes
 Ana Maria Guerra Martins
 Gil Galvão