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Processo n.º 443/09
 
 1ª Secção
 Relator: Conselheiro Gil Galvão
 
  
 Acordam, em conferência, na 1ª Secção do Tribunal Constitucional:
 
  
 I – Relatório
 
  
 
 1. Nos presentes autos, vindos do Supremo Tribunal de Justiça, em que figuram 
 como recorrentes A. e B. e como recorridos C. e Mulher, foi proferido acórdão 
 indeferindo a reclamação interposta contra o despacho do relator de não admissão 
 do recurso de uniformização de jurisprudência que os ora recorrentes pretendiam, 
 ao abrigo do disposto no artigo 763º do Código de Processo Civil, interpor. 
 Desse acórdão foi interposto recurso de constitucionalidade, através do seguinte 
 requerimento:
 
 “[...], Recorrentes nos autos à margem identificados, devidamente notificados da 
 douta decisão que em conferência, para a qual oportunamente reclamaram do douto 
 despacho que lhes indeferiu (por simples despacho do Exmo. Senhor Conselheiro 
 Relator) o recurso para uniformização de jurisprudência interposto do douto 
 Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, vem, com benefício de apoio judiciário 
 na modalidade de dispensa total de custas e demais encargos do processo, 
 interpor recurso deste referido Acórdão para o venerando Tribunal 
 Constitucional. 
 Assim, nos termos do disposto no art. 70º, n°1, al. b) da Lei do Tribunal 
 Constitucional, por violação da disciplina legal do art. 11°, n.°s 1 e 2 do 
 Decreto-Lei n° 303/2007 de 24 de Agosto e, consequentemente, também o disposto 
 nos art.°s 763° a 770º do Código de Processo Civil com as alterações 
 introduzidas pelo mesmo citado Dec.-Lei, e ainda — por ilegalidade e 
 inconstitucionalidade —- a disciplina estabelecida nos art.°s 732-A, n°1, 2 e 3 
 do mesmo Código na versão anterior (ainda aplicável), porquanto, a interpretação 
 que foi dada e perfilhada no Acórdão em recurso, foi no sentido normativo de que 
 não é admissível aquele recurso extraordinário para uniformização de 
 jurisprudência porque se trata de processo pendente à data de 1 de Janeiro de 
 
 2008, quando, como sustentam os Recorrentes, o entendimento mais acertado é, 
 salvo o devido respeito, o de que é admissível aquele recurso. Assim, foram 
 também violados os princípios constitucionais dos art.°s 2°, 13°, n°1 e 2, 18°, 
 
 20°, n°1 e 5 da Lei Fundamental, de acordo com o anteriormente suscitado nas 
 alegações de recurso apresentadas junto do Supremo Tribunal de Justiça, no 
 recurso extraordinário para uniformização de jurisprudência, tempestivamente 
 interposto, a fls. dos autos”. 
 
  
 
 2. Neste Tribunal foram os recorrentes convidados, nos termos do nº 6 do artigo 
 
 75º-A da Lei do Tribunal Constitucional – LTC, a dar integral cumprimento ao 
 disposto nos nºs 1 e 2 do artigo 75º-A da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro, bem 
 como a esclarecer, “em termos concisos, claros e perceptíveis, qual a norma e a 
 interpretação normativa, cuja constitucionalidade pretendem ver apreciada, de 
 tal modo que, se este Tribunal a vier a julgar desconforme com a Constituição, a 
 possa enunciar claramente na decisão que proferir”. Como então se acrescentou, 
 
 “incumbindo aos recorrentes a definição do objecto do recurso, devem os mesmos, 
 quando pretendam questionar determinada interpretação normativa de um certo 
 preceito, explicitar com concisão, precisão e clareza essa dimensão normativa, 
 sob pena de, não o fazendo, transferirem para o Tribunal Constitucional, de 
 forma inaceitável, o ónus que sobre eles impende”.
 
  
 
 3. Em resposta, os recorrentes vieram, para o que ora importa, dizer que:
 
 “O enunciado nuclear da questão jurídico-constitucional que se pretende colocar 
 
 à consideração deste Venerando Tribunal Constitucional é o seguinte:
 Da interpretação literal extensiva aos “recursos extraordinários” previstos no 
 art. 763° do CPC, das normas dos art. 11 nº 1 e 12 nº 1 do Dec-Lei nº 303/07 de 
 
 24 de-08, que apenas numa sua interpretação restritiva estabelece a 
 inaplicabilidade do novo regime aos «...processos pendentes à data da sua 
 entrada em vigor»”.
 
  
 
 4. Na sequência, foi proferida pelo relator neste Tribunal, ao abrigo do 
 disposto no n.º 1 do artigo 78º-A da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, na 
 redacção que lhe foi dada pela Lei n.º 13-A/98, de 26 de Fevereiro, decisão 
 sumária de não conhecimento do objecto dos recursos. É o seguinte, na parte 
 agora relevante, o seu teor:
 
 “6. Nos termos do artigo 75º-A, nº 1 da LTC, o recorrente deve, logo no 
 requerimento de interposição do recurso, indicar “a norma cuja 
 inconstitucionalidade ou ilegalidade se pretende que o Tribunal aprecie”. Não o 
 tendo feito, deve o juiz (no tribunal recorrido) ou o relator do processo no 
 Tribunal Constitucional (nºs 5 e 6 do artigo 75º-A já referido), convidar o 
 requerente a prestar a indicação em falta – o que, no caso dos autos, foi feito 
 já neste Tribunal.
 Verifica-se, porém, que nem no requerimento de interposição do recurso nem na 
 resposta ao convite acima referido, os recorrentes identificam, da forma clara e 
 perceptível que vem sendo exigida por este Tribunal, a exacta dimensão normativa 
 dos preceitos do Código de Processo Civil ou do Decreto-Lei nº 303/2007, de 24 
 de Agosto, que pretendem ver apreciada. No requerimento de interposição do 
 recurso podia, a este propósito, ler-se:
 
 «Assim, nos termos do disposto no art. 70º, n°1, al. b) da Lei do Tribunal 
 Constitucional, por violação da disciplina legal do art. 11°, n.°s 1 e 2 do 
 Decreto-Lei n° 303/2007 de 24 de Agosto e, consequentemente, também o disposto 
 nos art.°s 763° a 770º do Código de Processo Civil com as alterações 
 introduzidas pelo mesmo citado Dec.-Lei, e ainda — por ilegalidade e 
 inconstitucionalidade —- a disciplina estabelecida nos art.°s 732-A, n°1, 2 e 3 
 do mesmo Código na versão anterior (ainda aplicável), porquanto, a interpretação 
 que foi dada e perfilhada no Acórdão em recurso, foi no sentido normativo de que 
 não é admissível aquele recurso extraordinário para uniformização de 
 jurisprudência porque se trata de processo pendente à data de 1 de Janeiro de 
 
 2008, quando, como sustentam os Recorrentes, o entendimento mais acertado é, 
 salvo o devido respeito, o de que é admissível aquele recurso».
 Na resposta ao convite de fls. 101 pode, por sua vez, ler-se:
 
 «O enunciado nuclear da questão jurídico-constitucional que se pretende colocar 
 
 à consideração deste Venerando Tribunal Constitucional é o seguinte: Da 
 interpretação literal extensiva aos “recursos extraordinários” previstos no art. 
 
 763° do CPC, das normas dos art. 11 n°1 e 12 n°1 do Dec.-Lei nº 303/07de 24 
 de-08, que apenas numa sua interpretação restritiva estabelece a 
 inaplicabilidade do novo regime aos “...processos pendentes à data da sua 
 entrada em vigor».
 Trata-se, em qualquer dos casos, manifestamente, de fórmulas absolutamente 
 inadequadas de colocar uma questão de constitucionalidade normativa em termos de 
 permitir o seu conhecimento pelo Tribunal Constitucional. Na verdade, como este 
 Tribunal tem afirmado repetidamente, nada obsta a que seja questionada apenas 
 uma certa interpretação ou dimensão normativa de um determinado preceito. Porém, 
 nesses casos, tem o recorrente o ónus de enunciar, de forma clara e perceptível, 
 o exacto sentido normativo do preceito que considera inconstitucional. Como se 
 disse, por exemplo, no Acórdão nº 178/95 (Acórdãos do Tribunal Constitucional, 
 
 30º vol., p.1118.) “tendo a questão de constitucionalidade que ser suscitada de 
 forma clara e perceptível (cfr., entre outros, o Acórdão nº 269/94, Diário da 
 República, II Série, de 18 de Junho de 1994), impõe-se que, quando se questiona 
 apenas uma certa interpretação de determinada norma legal, se indique esse 
 sentido (essa interpretação) em termos que, se este Tribunal o vier a julgar 
 desconforme com a Constituição, o possa enunciar na decisão que proferir, por 
 forma a que o tribunal recorrido que houver de reformar a sua decisão, os outros 
 destinatários daquela e os operadores jurídicos em geral, saibam qual o sentido 
 da norma em causa que não pode ser adoptado, por ser incompatível com a Lei 
 Fundamental”. Ora, é patente que, um juízo que considerasse inconstitucional a 
 
 “interpretação literal extensiva aos «recursos extraordinários» previstos no 
 art. 763° do CPC, das normas dos art. 11 n°1 e 12 n°1 do Dec.-Lei nº 303/07de 24 
 de-08, que apenas numa sua interpretação restritiva estabelece a 
 inaplicabilidade do novo regime aos «...processos pendentes à data da sua 
 entrada em vigor»”, não satisfaria, em caso algum, estas exigências de clareza e 
 perceptibilidade.
 
 7. Acresce, ainda, que a não indicação da clara e perceptível dimensão normativa 
 cuja inconstitucionalidade os recorrentes pretendem ver apreciada coloca o 
 Tribunal numa situação de verdadeira impossibilidade de verificar se se 
 encontram preenchidos os demais pressupostos de admissibilidade do recurso 
 interposto (o previsto na alínea b) do nº 1 do art. 70º da LTC), ou seja: (i) 
 saber se os recorrentes suscitaram, durante o processo, a inconstitucionalidade 
 dessa precisa dimensão normativa; (ii) saber se a decisão recorrida utilizou, 
 como ratio decidendi, a exacta dimensão normativa cuja inconstitucionalidade foi 
 suscitada.
 
 8. Por todas estas razões, há que concluir pela impossibilidade de conhecimento 
 do objecto do recurso.”
 
  
 
 5. Inconformados, os recorrentes reclamam para a Conferência, dizendo, em 
 síntese:
 
 “[…] demonstraram os recorrentes, concisa, clara e perceptivelmente, em jeitos 
 de concretização das normas constitucionais indicadas no requerimento de 
 interposição de recurso (art. °s 2°, 13° n.° 1 e 2, 18° n.° 1 e 5 da CRP) que 
 consideram violadas pela interpretação normativa do art. 110 n.° 1 e 2 do 
 Dec.-Lei n. ° 303/2007 de 24 de Agosto e, consequentemente, do disposto nos 
 art.°s 763° a 770° do CPC, figurada pelo Supremo Tribunal de Justiça. 
 
 12. E, nem se diga, que os ora reclamantes não definiram o objecto de recurso ou 
 as normas “cuja inconstitucionalidade ou ilegalidade se pretende que o Tribunal 
 aprecie”, tanto mais que delimitaram e individualizaram tal objecto, e por mais 
 de uma vez, desconhecendo-se que mais poderiam os reclamantes acrescentar ou 
 esclarecer para efeitos de determinação e consequente admissibilidade do recurso 
 para este Venerando Tribunal pois que, 
 
 13. A exacta dimensão normativa do identificado preceito do Dec.-Lei n.° 
 
 303/2007 de 24 de Agosto que pretendem ver apreciada é, tão só, a da 
 inadmissível interpretação extensiva do referido art. 11º ao recurso 
 extraordinário para uniformização de jurisprudência, na medida em que tal revela 
 uma inconstitucionalidade material das enunciadas normas da Lei Fundamental, 
 designadamente, por violação dos princípios da igualdade, da tutela 
 jurisdicional efectiva, da proporcionalidade e segurança jurídica. Ademais, 
 
 14. Os ora Reclamantes têm conhecimento de processo pendente neste Venerando 
 Tribunal com objecto similar sem que, quanto à sua admissibilidade, qualquer 
 questão tivesse sido levantada”.
 
  
 
 6. Notificados para responder, querendo, os reclamados nada disseram.
 
  
 II – Fundamentação
 
  
 
 7. Na decisão sumária reclamada concluiu o Tribunal que nem no requerimento de 
 interposição do recurso nem na resposta ao convite do Relator para que o 
 aperfeiçoasse, os recorrentes identificam, da forma clara e perceptível que vem 
 sendo exigida por este Tribunal, a exacta dimensão normativa dos preceitos do 
 Código de Processo Civil ou do Decreto-Lei nº 303/2007, de 24 de Agosto, que 
 pretendiam ver apreciada. Depois de transcrever as partes daquelas peças 
 processuais onde, alegadamente, a questão de constitucionalidade teria sido 
 suscitada, concluiu-se que se tratava, “em qualquer dos casos, manifestamente, 
 de fórmulas absolutamente inadequadas de colocar uma questão de 
 constitucionalidade normativa em termos de permitir o seu conhecimento pelo 
 Tribunal Constitucional”. Acrescentou-se, ainda, que a não indicação da clara e 
 perceptível dimensão normativa cuja inconstitucionalidade os recorrentes 
 pretendem ver apreciada colocava o Tribunal numa situação de verdadeira 
 impossibilidade de verificar se se encontravam preenchidos os demais 
 pressupostos de admissibilidade do recurso interposto (o previsto na alínea b) 
 do nº 1 do art. 70º da LTC), ou seja: (i) saber se os recorrentes suscitaram, 
 durante o processo, a inconstitucionalidade dessa precisa dimensão normativa; 
 
 (ii) saber se a decisão recorrida utilizou, como ratio decidendi, a exacta 
 dimensão normativa cuja inconstitucionalidade foi suscitada.
 
  
 Com a presente reclamação os reclamantes pretendem contestar que seja assim. 
 Fazem-no, porém, em termos que não só não abalam a fundamentação e as conclusões 
 a que ali se chegou mas também demonstram que o exacto sentido das exigências 
 relativas à admissibilidade do recurso interposto não terá sido apreendido. Só 
 assim se compreende, aliás, que agora refiram que a exacta dimensão normativa do 
 preceito que pretendiam ver apreciada “revela uma inconstitucionalidade material 
 das enunciadas normas da Lei Fundamental […]”. 
 
  
 Finalmente, apenas se acrescenta, porque os recorrentes colocam expressamente a 
 questão, que para os presentes autos em nada releva o alegado “conhecimento de 
 processo pendente neste Venerando Tribunal com objecto similar sem que, quanto à 
 sua admissibilidade, qualquer questão tivesse sido levantada”. Quer porque as 
 circunstâncias processuais que alegadamente conduziram à admissão do recurso 
 noutros autos a correr os seus termos neste Tribunal serão normalmente 
 diferentes das que aqui conduziram a solução diferente, quer porque, ainda que 
 assim não fosse, a decisão proferida, nesta matéria, num determinado processo, 
 evidentemente que não obrigaria à prolação de idêntica decisão em todos os 
 processos pendentes.
 
  
 
 8. Assim, pelas razões constantes da decisão reclamada, que mais uma vez agora 
 se reiteram, porquanto em nada são abaladas pela reclamação apresentada, há que 
 concluir que o recurso interposto pelos recorrentes não pode ser conhecido.
 
  
 
  
 III – Decisão
 
  
 Nestes termos, decide-se indeferir a presente reclamação e, em consequência, 
 confirmar a decisão reclamada no sentido do não conhecimento do objecto dos 
 recursos.
 Custas pelos reclamantes, fixando-se a taxa de justiça em 20 (vinte) unidades de 
 conta.
 
  
 Lisboa, 29 de Julho de 2009
 Gil Galvão
 José Borges Soeiro
 Rui Manuel Moura Ramos