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Processo n.º 514/04
 
 2ª Secção
 Relator: Conselheiro Paulo Mota Pinto
 
  
 Acordam na 2.ª secção do tribunal constitucional:
 I. Relatório
 
 1.Em 7 de Maio de 2003, A., juíza em regime de nomeação temporária, foi 
 notificada da deliberação proferida pelo Plenário do Conselho Superior da 
 Magistratura, datada de 8 de Abril de 2003, que indeferiu a reclamação por si 
 apresentada do despacho do Juiz Conselheiro Vice-Presidente, de 18 de Fevereiro 
 de 2003, que indeferira o seu pedido de admissão ao Curso Especial do Centro de 
 Estudos Judiciários, previsto para Maio de 2003, “dado a magistrada acima 
 identificada não possuir, de acordo com o Estatuto dos Magistrados Judiciais, o 
 tempo de serviço efectivo considerado suficiente para uma avaliação rigorosa e 
 objectiva da sua prestação funcional, sendo essa avaliação um dos requisitos 
 essenciais de admissão ao mencionado Curso Especial”.
 Inconformada, a recorrente interpôs recurso contencioso da referida deliberação, 
 em 6 de Junho de 2003, para o Supremo Tribunal de Justiça, que, por acórdão de 9 
 de Março de 2004, decidiu negar provimento ao recurso, com os seguintes 
 fundamentos:
 
 «A recorrente imputa à deliberação do Plenário de 8-4-03 (aqui recorrida) os 
 seguintes vícios:
 
 - falta de fundamentação, por omissão de pronúncia, relativamente aos 
 fundamentos invocados na reclamação do despacho de 17-2-03, do Ex.m.º 
 Vice-Presidente do C.S.M., e ainda por falta de indicação das motivações de 
 direito;
 
 - violação da lei.
 Mas sem razão.
 A Lei n.º 7-A/2003, de 9 de Maio, veio criar novos instrumentos de gestão, 
 conferindo aos Conselhos Superiores e ao Ministro da Justiça competências 
 excepcionais, destinadas a suprir situações de carência de quadros de 
 magistrados, conforme se refere no seu art.º 1.º.
 O art.º 2.º, da mesma Lei, prescreve o seguinte :
 
 “1 – Tendo em conta excepcionais razões de carência de quadros, o Ministro da 
 Justiça, sob proposta do Conselho Superior da Magistratura ou do Conselho 
 Superior da Ministério Público, pode determinar que o Centro de Estudos 
 Judiciários organize cursos especiais de formação específica para recrutamento 
 de Magistrados Judiciais ou do Ministério Público, com dispensa de testes de 
 aptidão.
 
 2 – Os cursos previstos no número anterior são dirigidos a candidatos que 
 ofereçam garantias de aptidão bastante, a recrutar, consoante a magistratura a 
 que, especificamente, respeitem:
 a) De entre juízes de nomeação temporária em exercício efectivo de funções, ao 
 abrigo do disposto na Lei n.º 3/2000, de 20 de Março, e no Dec.-Lei n.º 
 
 179/2000, de 9 de Agosto, independentemente do ano da sua licenciatura.
 b) (...)
 c) (...)
 
 3 – A admissão dos juízes de nomeação temporária (...) aos cursos especiais 
 dirigidos a magistrados judiciais é precedida de informação positiva do Conselho 
 Superior da Magistratura sobre o seu desempenho profissional no exercício das 
 respectivas funções, obtida por avaliação efectuada através do seu serviço de 
 inspecções, nos termos do respectivo estatuto e regulamento de inspecções”.
 Pois bem.
 
 1. Quanto à aduzida falta de fundamentação da deliberação recorrida, na dupla 
 dimensão de omissão de pronúncia e de falta de indicação das motivações de 
 direito (conjugada com o teor do despacho reclamado do Ex.mo Vice-Presidente do 
 C.S.M. a que se reporta), constata-se que ela esclarece, concretamente e com 
 suficiente clareza, a motivação do acto.
 Com efeito, aponta como causa de indeferimento do pedido de candidatura ao 
 referido Curso Especial o facto de a recorrente “não possuir o tempo de serviço 
 efectivo considerado suficiente para uma avaliação rigorosa e objectiva da sua 
 prestação funcional, sendo essa avaliação um dos requisitos essenciais [de 
 admissão] ao mencionado Curso Especial”.
 E explica que, computando-se em pouco mais de três meses o serviço efectivo 
 prestado até à data em que foi ordenada a inspecção aos Juízes temporários, a 
 recorrente não podia ser inspeccionada, nem podia presumir-se qualquer 
 classificação, pois há que analisar e valorar o trabalho do Juiz temporário, se 
 tiver quantidade de serviço que o justifique.
 Em termos de fundamentação de direito, invoca-se, por um lado, o projecto do 
 diploma que permitirá aos Juízes temporários frequentar o curso especial ai 
 previsto (Lei n.º 7-A/2003, de 9 de Maio, posteriormente aprovada) e, por outro, 
 o Estatuto dos Magistrados Judiciais, embora sem especificação de qualquer 
 artigo.
 Tal fundamentação, quer na vertente da alegada omissão de pronúncia, quer na 
 dimensão da motivação de direito, foi aprofundada e completada na posterior 
 deliberação do Plenário de 7-10-03, que julgou a reclamação apresentada contra a 
 deliberação de 8-4-03, ficando, assim, suprida qualquer insuficiência com a 
 desenvolvida apreciação que, então, foi feita de todos os fundamentos e com a 
 expressa indicação dos preceitos legais em que se suporta para decidir como 
 decidiu.
 Daí que a deliberação esteja concreta e suficientemente fundamentada, nos termos 
 do art.º 125.º do C.P.A..
 
 2. Quanto ao apontado vício de violação da lei, o recurso não pode lograr melhor 
 sorte.
 Com efeito, o art.º 2.º, n.º 3, da Lei n.º 7-A/2003, é muito claro ao 
 estabelecer que a admissão dos juízes de nomeação temporária ao Curso Especial 
 de Formação fica condicionada àqueles cujo serviço, mediante inspecção, 
 realizada nos termos do E.M.J. e do Regulamento das Inspecções, tenha merecido 
 avaliação positiva por parte do Conselho Superior da Magistratura.
 Trata-se de um requisito necessário para acesso àquele Curso.
 Antes da publicação desta Lei, não existia qualquer diploma que previsse ou 
 autorizasse a recorrente a candidatar-se ao pretenso Curso Especial de formação 
 específica para recrutamento de Magistrados.
 O requerimento da recorrente só podia ser provisoriamente considerado à luz do 
 projecto do diploma, entretanto já elaborado, com conhecimento do Conselho, que 
 previa a criação de cursos dessa natureza e as respectivas condições de acesso.
 Em matéria de inspecções, rege o art.º 36.º do Estatuto dos Magistrados 
 Judiciais, que dispõe o seguinte, na parte que agora importa considerar:
 
 “1 – Os Juízes de Direito são classificados em inspecção ordinária, a primeira 
 vez decorrido um ano sobre a sua permanência em lugares de 1.º acesso e, 
 posteriormente, com uma periodicidade, em regra, de quatro anos.
 
 2 – (...)
 
 3 – Considera-se desactualizada a classificação atribuída há mais de quatro 
 anos, salvo se a desactualização não for imputável ao magistrado ou este estiver 
 abrangido pelo disposto no n.º 2 do artigo anterior.
 
 4 – No caso de falta de classificação não imputável ao magistrado, presume-se a 
 de Bom, excepto se o Magistrado requerer inspecção, caso em que será realizada 
 obrigatoriamente.
 
 5 – (...)”.
 Quando foi ordenada a inspecção ordinária aos Juízes de nomeação temporária, ao 
 abrigo do art.º 36.º do E.M.J., por deliberação do Plenário do C.S.M. de 1-10-02 
 
 (inspecção [que] se iniciou em 12-11-02), o serviço da recorrente não podia ser 
 objecto de inspecção, por esta só ter, então, pouco mais de três meses de 
 exercício efectivo de funções.
 
 É que, nos termos do art.º 7.º, n.º 1, al. a), do Regulamento das Inspecções 
 Judiciais, na redacção então vigente, a inspecção só podia ser realizada desde 
 que recaia sobre serviço prestado em período superior a um ano e os respectivos 
 volume e qualidade permitam uma segura avaliação.
 O actual Regulamento das Inspecções Judiciais, entretanto aprovado pela 
 deliberação n.° 55/2003, publicado no D.R. de 15-1-03, contém norma semelhante, 
 ao prescrever no seu art.º 5.º, n.º 3:
 
 “A primeira inspecção ao serviço e ao mérito de cada Juiz tem obrigatoriamente 
 lugar logo que decorrido um ano de exercício efectivo de funções”.
 Assim sendo, a recorrente não tinha o tempo mínimo necessário para poder ser 
 inspeccionada à data em que requereu a sua admissão ao Curso Especial (28-1-03), 
 nem à data em que foi proferido o despacho do Ex.mo Vice-Presidente do C.S.M., 
 ou a deliberação recorrida, nem à data em que entrou em vigor a Lei n.º 
 
 7-A/2003, nem tão-pouco à data em que teve início o dito Curso, ou seja, não 
 dispunha de tempo de serviço efectivo de um ano, considerado suficiente para uma 
 avaliação rigorosa e objectiva da sua prestação funcional.
 
 É que, segundo informação do C.S.M., durante o período de quase 20 meses em que 
 esteve ao serviço, desde que iniciou funções (26-9-01) até ao início do Curso 
 Especial (19-5-03), a recorrente esteve ausente do serviço durante mais de 10 
 meses, pelo que o período do exercício efectivo de funções era inferior a um ano 
 
 (fls. 59).
 Pretende a recorrente que, face ao disposto no art.º 36.º, n.º 4, do E.M.J., 
 deve presumir-se a classificação de Bom, por a falta de classificação não lhe 
 ser imputável, dado que as faltas ao serviço foram consequência da sua gravidez 
 e licença de maternidade.
 Não pode aceitar-se tal entendimento.
 O citado art.º 36.º, n.º 4, não é aplicável à situação da recorrente.
 
 É que a primeira classificação, em inspecção ordinária, decorrido um ano sobre a 
 permanência do Juiz em lugar de primeiro acesso, a que alude o art.º 36.º, n.º 
 l, do E.M.J. não pode deixar de ser interpretado como “decorrido um ano de 
 exercício efectivo de funções”, tal como se explicita no citado art.º 5.º, n.º 
 
 3, do actual R.I.J..
 Por outro lado, importa ainda atentar no estatuto legal da recorrente, enquanto 
 Juiz de nomeação temporária.
 O regime excepcional de nomeação para o exercício temporário de funções de Juiz 
 nos tribunais de 1ª instância consta da Lei n.º 3/2000, de 20 de Março, e do 
 Dec.-Lei n.º 179/2000, de 9 de Agosto.
 Aí se prevê a nomeação a termo certo, não superior a quatro anos – art.º 4.º, 
 n.º 3, da Lei n.º 3/2000 e art.º 1.º, n.º 3, do Dec-Lei n.º 179/2000.
 Tem carácter excepcional e transitório, podendo efectuar-se até 15 de Setembro 
 de 2003 – art.º 6.º da mesma Lei e art.º 2.° daquele Dec.-Lei.
 Mas o posterior acesso à carreira da Magistratura não constitui regalia, direito 
 ou sequer mera expectativa jurídica, contida no estatuto do Juiz de nomeação 
 temporária.
 Assim, o facto de a recorrente não ter sido admitida, por falta de requisitos 
 legais, a um curso que lhe daria acesso à carreira da Magistratura não pode 
 significar perda de qualquer direito ou regalia estatutária.
 Nem se diga que se mostra violado o princípio constitucional da igualdade e que 
 a recorrente está a ser discriminada em razão da sua gravidez e licença de 
 maternidade.
 A recorrente beneficiou de protecção na doença, por causa da gravidez, e de 
 especial protecção na maternidade, esta última nos termos do art.º 68.º, n.º 3, 
 da Constituição e da Lei n.º 4/84, de 5 de Abril, e Dec.-Lei n.º 194/96, de 16 
 de Outubro.
 Ao abrigo desses regimes legais, a recorrente viu justificadas as suas faltas ao 
 serviço.
 O que não pode é pretender que essas ausências sejam equiparadas ou 
 automaticamente convertidas em efectivo desempenho de funções, para efeito de 
 avaliação do seu mérito profissional, que depende da quantidade e da qualidade 
 do serviço efectivamente prestado.
 O princípio da igualdade (art.º 13.º, da C.R.P.), que manda tratar igualmente o 
 que for essencialmente igual e diferentemente o que for diferente, não proíbe 
 que a lei estabeleça distinções e tratamentos diferenciados.
 O que proíbe é o arbítrio, ou seja, a diferenciação de tratamento, sem qualquer 
 justificação razoável e carecida de fundamento material bastante. Quando 
 requereu, em 28-1-03, a sua admissão ao Curso Especial, a recorrente 
 encontrava-se na situação objectiva de prestação de serviço efectivo por período 
 inferior a um ano, sendo certo que a ausência do serviço não foi motivada apenas 
 pelo gozo de quatro meses de licença de maternidade.
 Tal situação impediu-a de ser oportunamente inspeccionada e concretamente 
 avaliada (por ocasião da inspecção ordenada por deliberação do C.S.M. de 
 
 1-10-02), por forma a colocar-se em posição de aceder ao Curso Especial de 
 Formação, que veio a iniciar-se em 19-5-03.
 Estando numa situação desigual, relativamente aos demais Juízes de nomeação 
 temporária (com mais de um ano de serviço efectivamente prestado, no momento em 
 que foram avaliados, na sequência da mencionada inspecção que se iniciou em 
 
 12-11-02), não podia ter o mesmo tratamento que estes tiveram.
 Foi essa desigualdade de situação que esteve na base do despacho do Ex.mo 
 Vice-Presidente do Conselho Superior da Magistratura de 17-2-03, mantido pelas 
 deliberações do Plenário de 8-4-03 e de 7-10-03.
 Anote-se que a recorrente, depois da publicação da Lei n.º 7-A/2003, de 9 de 
 Maio, também não cuidou de solicitar o acesso ao referido Curso Especial, em 
 conformidade com a previsão dessa Lei, para que o C.S.M. apreciasse, de novo, a 
 possibilidade de avaliação do seu serviço, face ao aumento do tempo de efectivo 
 desempenho de funções de que, entretanto e concretamente nessa data, já 
 beneficiava.
 Em face do exposto, só resta concluir pela legalidade da deliberação recorrida, 
 face à improcedência de todos os vícios que lhe são assacados.»
 
 2.Inconformada com este acórdão, a recorrente interpôs recurso para o Tribunal 
 Constitucional, pretendendo ver apreciada a “inconstitucionalidade da norma 
 contida no n.º 4 do art.º 36.º do Estatuto dos Magistrados Judicias (...) 
 interpretada no sentido de que tal norma não é aplicável à situação concreta da 
 recorrente [juíza de nomeação temporária]”, uma vez que entende que essa 
 interpretação “viola o disposto no n.º 3 do art.º 68º da C.R.P. e art.º 13º da 
 C.R.P.”.
 Notificada para produzir alegações, a recorrente concluiu assim:
 
 «1 – Pretende ver-se apreciada a questão da inconstitucionalidade da norma 
 contida no n.º 4 do art.º 36.° do Estatuto dos Magistrados Judiciais (aprovado 
 pela Lei n.º 21/85, de 30 de Julho, pelo Decreto-Lei n.º 342/88, de 28 de 
 Setembro, e pelas Leis n.º 2/90, de 20 de Janeiro, 10/94, de 5 de Maio, 44/96, 
 de 3 de Setembro, 81/98, de 3 de Dezembro, e 143/99, de 31 de Agosto) 
 interpretada no sentido de que tal norma não é aplicável à situação concreta da 
 recorrente, interpretação essa defendida pela deliberação recorrida bem como 
 pelo acórdão recorrido (proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça).
 
 2 – Efectivamente, a ausência da recorrente ao serviço (que a impediu de ter um 
 ano de serviço efectivo) ocorreu por motivos inteiramente alheios à sua vontade, 
 não lhes sendo, portanto, imputáveis.
 
 3 – Pelo que se acha a recorrente na situação prevista no n.º 4 do art.º 36.° do 
 E.M.J..
 
 4 – Tanto mais que tal ausência foi determinada por motivo de doença devidamente 
 justificado (e que se prendeu com uma situação de gravidez de risco) bem como 
 por licença por maternidade, não lhe sendo, portanto, imputável.
 
 5 – É certo que a recorrente beneficiou do regime jurídico de protecção na 
 doença e a maternidade, contudo quer a deliberação do C.S.M. quer o acórdão 
 recorrido não extraem todas as consequências jurídicas decorrentes da aplicação 
 do referido regime em conjugação com o estatuído no n.º 4 do art.º 36.° do 
 E.M.J..
 
 6 – E tendo em conta que o Curso Especial de Formação dos Juízes de nomeação 
 temporária tem como objectivo o início de funções e (ou) um eventual e posterior 
 acesso à Carreira da Magistratura, a norma contida no n.º 4 do art. 36.° [d]a 
 CRP, interpretada no sentido dado pela deliberação recorrida, mostra-se 
 manifestamente inconstitucional, por colidir com o disposto no art.º 68.°, n.º 
 
 3, e art.º 13.° da C.R.P..
 
 7 – E a interpretação perfilhada pelo acórdão recorrido, na esteira, aliás, da 
 deliberação do C.S.M., colide com o princípio da igualdade, na sua vertente da 
 chamada discriminação indirecta, como tem sido entendimento do Tribunal de 
 Justiça das Comunidades Europeias.
 
 8 – E face às razões atrás expostas, e da conjugação das normas previstas no 
 art.º 68.°, n.º 3, da CRP, e art.º 13.°, da CRP tem de entender-se que, no caso 
 concreto, a recorrente foi discriminada em razão da sua gravidez e da sua 
 licença de maternidade.
 
 9 – O que ocorreu é manifesta violação do disposto no art.º 68.°, da C.R.P., 
 art.º 23.°, n.º 1, da Lei n.º 4/84, de 5 de Abril, e art.º 25.°, n.º 1, do D.L. 
 n.º 194/96 de 16 de Outubro.
 
 10 – Pelo que a norma contida no n.º 4 do art.º 36.° da C.R.P., interpretada no 
 sentido dado pela deliberação recorrida, bem como pelo acórdão recorrido, 
 mostra-se manifestamente inconstitucional, por colidir com o disposto no art.º 
 
 68.°, n.º 3, da C.R.P. e art.º 13.° da C.R.P. e art.º 266.°, n° 2, da C.R.P..
 
 11 – Perante tal quadro, tem de entender-se que a subsistência daquela norma na 
 Ordem Jurídica se mostra inadmissível, pelo menos, com o sentido e alcance e 
 efeito que o acto impugnado lhe empresta, e confirmado pelo acórdão ora 
 recorrido.
 
 12 – Devendo consequentemente ser declarada como materialmente inconstitucional, 
 por violação do disposto nos art.ºs 13.°, 68.°, n.º 3, e 266.°, n.º 2, todos da 
 C.R.P., e ser revogado o acórdão recorrido, com todas as legais consequências.»
 O Conselho Superior da Magistratura, nas suas contra-alegações, disse, no que 
 ora importa:
 
 «(…)
 
 24. Tendo em conta que o ingresso num curso especial de formação de magistrados 
 judiciais habilitaria a recorrente a ingressar, após aprovação, na carreira da 
 magistratura judicial, a informação positiva pelo Conselho Superior da 
 Magistratura, como condição de admissão a tal curso, exigiria a avaliação das 
 capacidades reveladas pela recorrente no exercício efectivo das funções de juiz 
 temporária.
 
 25. Como tem sido insistentemente decidido pelo Tribunal Constitucional, o 
 princípio da igualdade de tratamento veda a discriminação infundada de situações 
 semelhantes, mas não impõe o tratamento igualitário de situações diferentes.
 
 26. Estando a recorrente, à data em que foi realizada a inspecção aos restantes 
 juízes de nomeação temporária ou mesmo à data em que foi indeferido o seu 
 requerimento de ingresso no curso, especial, numa situação diferente dos 
 restantes juízes de nomeação temporária, a recusa de admissão ao referido curso 
 não violou o princípio da igualdade.
 
 27. Por outro lado, tendo em conta o estatuto da recorrente e o especial 
 circunstancialismo que rodeou a previsão de um curso especial de formação, de 
 modo algum se pode considerar violado o disposto no art.º 68.°, n° 3, da C.R.P..
 
 28. Com efeito, o estatuto de juiz temporária que detinha conferia-lhe o direito 
 de exercer as funções durante o período de 4 anos, sendo, durante esse período, 
 garantidos os direitos, designadamente relacionados com a protecção na 
 maternidade e na doença.
 
 29. Mas não emergia do diploma regulador, como “regalia” ou sequer como 
 expectativa jurídica a eventual integração num curso especial de formação para 
 magistrados judiciais.
 
 30. Como os factos o demonstram, malgrado a situação de doença e os efeitos da 
 gravidez, à recorrente foi abonada a respectiva remuneração, tal como foram 
 consideradas justificadas as faltas cometidas.
 
 31. Por outro lado, como se referiu no douto acórdão recorrido, a recusa de 
 admissão por falta de prestação de efectivo serviço por período de tempo 
 suficiente não foi motivada apenas pela duração da licença de maternidade, de 4 
 meses, sendo a ausência imputada ainda a outras razões.»
 Cumpre apreciar e decidir.
 II. Fundamentos
 
 3.É a seguinte a redacção da norma impugnada do Estatuto dos Magistrados 
 Judiciais (aprovado pela Lei n.º 21/85, de 30 de Julho):
 
 “Artigo 36º
 
 1 – Os Juízes de Direito são classificados em inspecção ordinária, a primeira 
 vez decorrido um ano sobre a sua permanência em lugares de 1º acesso e, 
 posteriormente, com uma periodicidade, em regra, de quatro anos.
 
 2 – (...)
 
 3 – Considera-se desactualizada a classificação atribuída há mais de quatro 
 anos, salvo se a desactualização não for imputável ao magistrado ou este estiver 
 abrangido pelo disposto no n.º 2 do artigo anterior.
 
 4 – No caso de falta de classificação não imputável ao magistrado, presume-se a 
 de Bom, excepto se o Magistrado requerer inspecção, caso em que será realizada 
 obrigatoriamente.
 
 5 – (...)”.
 Está em causa a interpretação do n.º 4 deste artigo 36.º no sentido de não ser 
 aplicável antes de decorrido um ano de exercício efectivo de funções, em caso de 
 nomeação excepcional para o exercício temporário de funções (juiz de nomeação 
 temporária), ao abrigo da Lei n.º 3/2000, de 20 de Março, e do Decreto-Lei n.º 
 
 179/2000, de 9 de Agosto. Foi, na verdade, esse o fundamento decisivo para o 
 referido preceito não ser aplicado à recorrente – sendo certo, aliás, que no 
 acórdão recorrido se concluiu que a ausência de serviço não fora motivada apenas 
 pelo gozo de quatro meses de licença de maternidade, em juízo que não é 
 sindicável pelo Tribunal Constitucional.
 Além de invocar desconformidade da interpretação desta norma com outras normas 
 legais (da Lei n.º 4/84, de 5 de Abril, e do Decreto-Lei n.º 194/96, de 16 de 
 Outubro), matéria que não cabe a este Tribunal apreciar (pois não estão em causa 
 normas paramétricas de valor reforçado e o recurso interposto foi apenas o de 
 constitucionalidade), invoca a recorrente “violação do disposto no art.º 13.º, 
 
 68.º, n.º 3, e 266.º, n.º 2, todos da C.R.P.”
 Começando por este último parâmetro, ele vincula os órgãos administrativos a, no 
 exercício das suas funções, respeitarem os “princípios da igualdade, da 
 proporcionalidade, da justiça, da imparcialidade e da boa fé”. Não resulta, 
 porém, claramente da alegação da recorrente qual é a actuação que se pretende 
 subsumir à norma: se se trata da não aplicação da classificação subsidiária, na 
 falta de inspecção, ou se se trata antes da consequência de não admissão ao 
 curso de formação sem a classificação (decorrente esta da inspecção ou da 
 aplicação subsidiária da norma impugnada). Em qualquer caso, ao invocar como 
 norma constitucional padrão a que rege directamente a actuação dos órgãos e 
 agentes administrativos, a recorrente desloca a questão de constitucionalidade, 
 do terreno da inconstitucionalidade de normas, ou de dimensões normativas 
 
 (normas entendidas num determinado sentido), para o da apreciação da actividade 
 desenvolvida por estes. Em causa deixa de estar a norma impugnada para passar a 
 estar o que a Administração faz com ela – a sua actuação, em si mesma.
 A questão de constitucionalidade reportada à norma do artigo 36.º, n.º 4, do 
 Estatuto dos Magistrados Judiciais suscita-se, na verdade, antes da da aferição 
 da conformidade constitucional da actividade administrativa desenvolvida em sua 
 aplicação: quer a norma seja bem, quer seja mal aplicada pelos órgãos 
 administrativos, tal não interfere com a sua intrínseca conformidade 
 constitucional. É verdade que a norma pode ser interpretada de modo 
 inconstitucional pela Administração – mas então essa desconformidade com a Lei 
 Fundamental há-de resultar de violação de princípios ou regras diversos dos que, 
 com a invocação do artigo 266.º, n.º 2, da Constituição, se pretende convocar. 
 Ou, ainda que os princípios sejam os mesmos – e em grande medida sê-lo-ão –, 
 há-de ser imputada a uma sede (normativa) diversa da que foi invocada.
 
 4.Também a invocação do princípio da igualdade (artigo 13.º da Lei Fundamental) 
 para apreciar a norma impugnada se não afigura produtiva, embora por diferentes 
 razões. Em primeiro lugar a própria norma contempla diferentes situações: a dos 
 magistrados não classificados por causa não imputável aos próprios e com notação 
 presumida (de Bom); a dos magistrados não classificados por causa que lhes não 
 seja imputável e sujeitos obrigatoriamente a inspecção.
 Tais casos são, porém, diversos dos dos magistrados avaliados e classificados e 
 dos daqueles que não tenham sido classificados por causa a eles imputável.
 Trata-se de situações todas elas desiguais: não está em condições de igualdade 
 quem foi e quem não foi sujeito a inspecção; quem não foi por causa a si mesmo 
 imputável e quem não foi por causa que não lhe é imputável; quem, não tendo sido 
 inspeccionado por razões a ele não imputáveis, tem uma classificação presumida e 
 quem a não tem (por requerer inspecção); e, seguramente, não está em condições 
 de igualdade quem tem uma notação de “Bom” em resultado de uma avaliação, e quem 
 a tem em resultado de uma presunção.
 Dentro deste universo de situações desiguais, não pode o princípio da igualdade 
 servir para obrigar a dissipar as diferenças de tratamento.
 O que está em causa nos presentes autos – por ser esse o sentido da norma 
 impugnada – é, antes de mais, decidir o que fazer quando não é inspeccionado um 
 magistrado em regime de nomeação temporária.
 Podia a legislação ser omissa quanto a tal circunstância, embora tal fosse 
 injusto quanto a alguns magistrados (os não inspeccionados se da inspecção e 
 classificação resultassem benefícios, os inspeccionados se delas resultassem 
 prejuízos). Podia a legislação admitir uma única forma de ultrapassar essa falta 
 de avaliação, prevendo, por exemplo, um mecanismo de realização de inspecção a 
 pedido, embora tal continuasse a ser injusto para alguns magistrados (na medida 
 em que a decisão de escolha de ser ou não inspeccionado seria facultada apenas a 
 alguns, não tendo os outros essa possibilidade de optar). Podia a legislação 
 prever uma classificação administrativa como única forma de suprimento da falta 
 de inspecção, embora também isso fosse relativamente injusto sobretudo para quem 
 fosse impedido de ter o seu mérito graduado acima da classificação 
 administrativa. E podia a legislação fazer o que faz: suprir a falta de 
 inspecção não imputável ao magistrado por uma classificação administrativa e 
 permitir que, mesmo essa, não seja atribuída, sendo, a pedido, desencadeado 
 obrigatoriamente um processo de classificação.
 Do ponto de vista do princípio da igualdade, porém, a norma sindicada do 
 Estatuto dos Magistrados Judiciais não é inconstitucional – designadamente, se 
 comparada que seja com as alternativas acima enumeradas e com as normas que, sem 
 incorrerem em juízos de inconstitucionalidade, regem a progressão em outras 
 carreiras. (Veja-se, por exemplo o recente Acórdão n.º 55/2005, disponível em 
 
 www. tribunalconstitucional.pt).
 
 5.Resta portanto a norma do artigo 68.º, n.º 3, da Constituição como parâmetro 
 de aferição da conformidade com a Lei Fundamental da solução contida no artigo 
 
 36.º, n.º 4, do Estatuto dos Magistrados Judiciais.
 Dizendo respeito à protecção da maternidade, tal norma constitucional tem 
 incidência na interpretação do que seja “falta de classificação não imputável ao 
 magistrado”, pugnando a recorrente pelo entendimento de que “foi discriminada em 
 razão da sua gravidez e da sua licença de maternidade”, por a falta de avaliação 
 não ter sido considerada “não imputável” para efeitos de aplicação da 
 classificação supletiva.
 Na medida em que a interpretação das normas infra-constitucionais não cabe a 
 este Tribunal, não pode ele pronunciar-se sobre se “é de considerar em termos 
 objectivos essa não imputabilidade e não apenas em termos de culpa”, como 
 defendeu o Conselho Superior da Magistratura.
 Por outro lado, também não cabe ao Tribunal Constitucional sindicar o juízo das 
 instâncias quanto aos factos a que cabe aplicar o direito, e a verdade é que no 
 acórdão recorrido se decidiu que “a ausência de serviço não foi  motivada apenas 
 pelo gozo de quatro meses de licença de maternidade.” Ora, este juízo leva 
 necessariamente à inutilidade da decisão de uma específica questão de 
 constitucionalidade reportada ao gozo da licença de maternidade (ou em geral à 
 ausência fundada na maternidade), porquanto a decisão que o Tribunal viesse a 
 proferir quanto à natureza da imputabilidade das faltas ao serviço a título de 
 licença de maternidade seria, só por si, insusceptível de obrigar à revisão da 
 decisão proferida. É que, mesmo admitindo que esses quatro meses de ausência ao 
 serviço deveriam ser contabilizados como serviço efectivo para efeitos de 
 preenchimento dos pressupostos de uma avaliação – que, por ser então devida, 
 deveria ser substituída por uma classificação administrativa –, ainda assim, 
 para o tribunal recorrido, se não preencheriam os requisitos temporais para tal 
 avaliação, e não seria aplicável a norma do artigo 36.º, n.º 4, ora em questão. 
 Não tem, pois, este Tribunal de tratar, no presente recurso, de qualquer questão 
 de constitucionalidade reportada especificamente à relevância, para a contagem 
 do tempo de exercício de funções, da ausência por licença de maternidade.
 Invocou a recorrente (fls. 33-34 dos autos) que o período remanescente da sua 
 ausência ao serviço se ficou a dever a doença e a assistência médica inadiável a 
 familiar. Justificadas que sejam tais faltas – e a recorrente admite que o foram 
 
 -, elas não relevam para efeitos da disposição constitucional invocada, não se 
 podendo  fazer derivar dos artigos 59.º (Direitos dos trabalhadores) ou 64.º 
 
 (Saúde) o mesmo tipo de exigências ao legislador que decorrem do artigo 68.º, 
 n.º 3, da Constituição.
 Como se escreveu no acórdão n.º 202/2002 (publicado em Acórdãos do Tribunal 
 Constitucional, 53.º vol., pp. 223-238), antes de “apurar se a norma em 
 apreciação sub specie constitutionis se pode considerar violadora do princípio 
 da igualdade”:
 
 “Sobre o sentido do controlo de constitucionalidade material de soluções 
 legislativas que lhe incumbe efectuar à luz do princípio da igualdade, já este 
 Tribunal tomou posição por diversas vezes. Pode, assim, recordar-se o que, 
 recentemente, se escreveu a propósito no ponto 26 do Acórdão n.º 187/01 (DR, II 
 série, de 26 de Junho de 2001):
 
 «(...)
 
 É sabido que o princípio da igualdade, tal como tem sido entendido na 
 jurisprudência deste Tribunal, não proíbe ao legislador que faça distinções – 
 proíbe apenas diferenciações de tratamento sem fundamento material bastante, sem 
 uma justificação razoável, segundo critérios objectivos e relevantes. É esta, 
 aliás, uma formulação repetida frequentemente por este Tribunal (cf., por 
 exemplo, os Acórdãos deste Tribunal n.ºs 39/88, 325/92, 210/93, 302/97, 12/99 e 
 
 683/99, publicados, nos ATC, respectivamente, vol. 11.º, pp. 233 e ss., vol. 
 
 23.º, pp. 369 e ss., vol. 24.º, pp. 549 e ss., vol. 36.º, pp. 793 e ss., e no 
 Diário da República, II Série, de 25 de Março de 1999, e de 3 de Fevereiro de 
 
 2000).
 Como princípio de proibição do arbítrio no estabelecimento da distinção, tolera, 
 pois, o princípio da igualdade a previsão de diferenciações no tratamento 
 jurídico de situações que se afigurem, sob um ou mais pontos de vista, 
 idênticas, desde que, por outro lado, apoiadas numa justificação ou fundamento 
 razoável, sob um ponto de vista que possa ser considerado relevante.
 Ao impor ao legislador que trate de forma igual o que é igual e desigualmente o 
 que é desigual, esse princípio supõe, assim, uma comparação de situações, a 
 realizar a partir de determinado ponto de vista. E, justamente, a perspectiva 
 pela qual se fundamenta essa desigualdade, e, consequentemente, a justificação 
 para o tratamento desigual, não podem ser arbitrárias. Antes tem de se poder 
 considerar tal justificação para a distinção como razoável, constitucionalmente 
 relevante.
 O princípio da igualdade apresenta-se, assim, como um limite à liberdade de 
 conformação do legislador. Como se salientou no Acórdão n.º 425/87 (ATC, vol. 
 
 10.º, pp. 451 e ss.), 
 
 “O âmbito de protecção do princípio da igualdade abrange diversas dimensões: 
 proibição do arbítrio, sendo inadmissíveis, quer a diferenciação de tratamento 
 sem qualquer justificação razoável, de acordo com critérios de valor objectivos 
 constitucionalmente relevantes, quer a identidade de tratamento para situações 
 manifestamente desiguais; proibição de discriminação, não sendo legítimas 
 quaisquer diferenciações de tratamento entre os cidadãos baseadas em categorias 
 meramente subjectivas ou em razão dessas categorias; obrigação de diferenciação, 
 como forma de compensar a desigualdade de oportunidades, o que pressupõe a 
 eliminação pelos poderes públicos de desigualdades fácticas de natureza social, 
 económica e cultural (cf. Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da 
 República Portuguesa Anotada, I vol., 2ª ed., Coimbra, 1984, pp. 149 e segs.).
 A proibição do arbítrio constitui um limite externo da liberdade de conformação 
 ou de decisão dos poderes públicos, servindo o princípio da igualdade como 
 princípio negativo do controlo.
 Todavia, a vinculação jurídico-material do legislador a este princípio não 
 elimina a liberdade de conformação legislativa, pois lhe pertence, dentro dos 
 limites constitucionais, definir ou qualificar as situações de facto ou as 
 relações da vida que hão-de funcionar como elementos de referência a tratar 
 igual ou desigualmente.
 Só existe violação do princípio da igualdade enquanto proibição de arbítrio 
 quando os limites externos da discricionariedade legislativa são afrontados por 
 carência de adequado suporte material para a medida legislativa adoptada.
 Por outro lado, as medidas de diferenciação devem ser materialmente fundadas sob 
 o ponto de vista da segurança jurídica, da praticabilidade, da justiça e da 
 solidariedade, não se baseando em qualquer razão constitucionalmente imprópria.”
 Mais recentemente, no Acórdão n.º 409/99 (DR, II série, de 10 de Março de 1999) 
 disse-se que:
 
 “O princípio da igualdade, consagrado no artigo 13.º da Constituição da 
 República Portuguesa, impõe que se dê tratamento igual ao que for essencialmente 
 igual e que se trate diferentemente o que for essencialmente diferente. Na 
 verdade, o princípio da igualdade, entendido como limite objectivo da 
 discricionariedade legislativa, não veda à lei a adopção de medidas que 
 estabeleçam distinções. Todavia, proíbe a criação de medidas que estabeleçam 
 distinções discriminatórias, isto é, desigualdades de tratamento materialmente 
 não fundadas ou sem qualquer fundamentação razoável, objectiva e racional. O 
 princípio da igualdade, enquanto princípio vinculativo da lei, traduz-se numa 
 ideia geral de proibição do arbítrio (cf., quanto ao princípio da igualdade, 
 entre outros, os Acórdãos n.ºs 186/90, 187/90, 188/90, 1186/96 e 353/98, 
 publicados in Diário da República, respectivamente, de 12 de Setembro de 1990, 
 
 12 de Fevereiro de 1997, e o último, ainda inédito).”
 E no Acórdão n.º 245/00 (DR, II série, de 3 de Novembro de 2000) salientou-se 
 que
 
 “(...) tem, de há muito, vindo a afirmar este Tribunal que é ‘sabido que o 
 princípio da igualdade, entendido como limite objectivo da discricionaridade 
 legislativa, não veda à lei a realização de distinções. Proíbe-lhe, antes, a 
 adopção de medidas que estabeleçam distinções discriminatórias – e assumem, 
 desde logo, este carácter as diferenciações de tratamentos fundadas em 
 categorias meramente subjectivas, como são as indicadas, exemplificativamente, 
 no n.º 2 do artigo 13.º da Lei Fundamental –, ou seja, desigualdades de 
 tratamento materialmente infundadas, sem qualquer fundamento razoável 
 
 (vernünftiger Grund) ou sem qualquer justificação objectiva e racional. Numa 
 expressão sintética, o princípio da igualdade, enquanto princípio vinculativo da 
 lei, traduz-se na ideia geral de proibição do arbítrio (Willkürverbot)’ (cfr., 
 por entre muitos outros, o Acórdão n.º 1186/96, publicado no Diário da 
 República, 2ª Série, de 12 de Fevereiro de 1997), ou, dito ainda de outra forma, 
 o ‘princípio da igualdade (...) impõe se dê tratamento igual ao que for 
 essencialmente igual e se trate diferentemente o que diferente for. Não proíbe 
 as distinções de tratamento, se materialmente fundadas; proíbe, isso sim, a 
 discriminação, as diferenciações arbitrárias ou irrazoáveis, carecidas de 
 fundamento racional’ (verbi gratia, Acórdão n.º 1188/96, ob. cit., 2.ª Série, de 
 
 13 de Fevereiro de 1997).”»”
 No presente caso, o que está em causa é a aplicabilidade, ou não, de um regime 
 supletivo para uma falta de classificação de serviço, regime esse pensado para 
 situações em que, estando preenchidos os requisitos para se proceder à inspecção 
 atributiva dessa classificação – designadamente, exigindo-se que tenha decorrido 
 já um ano de exercício efectivo de funções –, ainda assim esta não tem lugar.
 Ora, poderia admitir-se que esse regime também pudesse ser aplicado em situações 
 em que esses requisitos se não verificam (como pretende a recorrente). E se essa 
 tivesse sido a opção legislativa, seria de analisar a questão da justificação da 
 inerente diferenciação resultante, não só à luz da protecção da maternidade mas 
 também da assistência na doença. Na ausência de previsão legislativa, porém, não 
 se pode fazê-la derivar, como obrigatória, do texto constitucional, já que nem a 
 previsão de um regime supletivo para uma falta de avaliação efectiva era 
 constitucionalmente devida, nem os seus contornos escapam à liberdade de 
 conformação do legislador, muito menos estando este impedido de considerar 
 relevante, como circunstância que permite uma diferenciação, o facto de ter já 
 decorrido, ou não, mais de um ano de exercício efectivo de funções (nos termos 
 do n.º 1 do citado artigo 36.º).
 De resto, como se disse, a invocação do princípio da protecção da maternidade 
 não cobre em toda a sua extensão a situação dos autos e dos restantes parâmetros 
 invocados não é possível derivar um imperativo de tutela que supra a 
 insuficiência daquele.
 
 6.Conclui-se, assim, uma vez que a interpretação questionada da norma do artigo 
 
 36.º, n.º 3, do Estatuto dos Magistrados Judiciais não viola o princípio 
 constitucional da igualdade (artigo 13.º da Constituição), que a ele é alheio o 
 parâmetro do artigo 266.º, n.º 2, da Constituição, e, qualquer que fosse o juízo 
 a proferir sobre tal regime à luz do disposto no artigo 68.º, n.º 3, da 
 Constituição, o tribunal a quo poderia manter a sua decisão, que tem o presente 
 recurso de improceder.
 III. Decisão
 Pelos fundamentos expostos, o Tribunal Constitucional decide:
 a)                   Não julgar inconstitucional a norma do artigo 36.º, n.º 4, 
 do Estatuto dos Magistrados Judiciais, entendida no sentido de não ser aplicável 
 antes de decorrido um ano de exercício efectivo de funções, em caso de nomeação 
 excepcional para o exercício temporário de funções (juiz de nomeação 
 temporária), ao abrigo da Lei n.º 3/2000, de 20 de Março, e do Decreto-Lei n.º 
 
 179/2000, de 9 de Agosto.
 b)                   Por conseguinte, confirmar a decisão recorrida no que à 
 questão de constitucionalidade respeita, e condenar a recorrente em custas, 
 fixando a taxa de justiça em 20 (vinte) unidades de conta.
 
  
 Lisboa, 21 de Setembro de 2005
 
  
 Paulo Mota Pinto
 Maria Fernanda Palma
 Mário José de Araújo Torres
 Benjamim Rodrigues
 Rui Manuel Moura Ramos