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Processo n.º 559/09
 
 1ª Secção
 Relator: Conselheiro Carlos Pamplona de Oliveira
 
  
 ACORDAM NO TRIBUNAL CONSTITUCIONAL EM CONFERÊNCIA DA 1ª SECÇÃO 
 
                                                                                                               
 
 1. Dizendo-se inconformado com o acórdão de 19 de Março de 2009 que, no Supremo 
 Tribunal de Justiça, indeferiu a reclamação por si apresentada contra o acórdão 
 de 18 de Dezembro de 2008, o reclamante A. pretendeu recorrer para o Tribunal 
 Constitucional ao abrigo da alínea c) do n.º 1 do artigo 70º da Lei n.º 28/82 de 
 
 15 de Novembro (LTC), nos seguintes termos:
 
  
 O presente recurso vai interposto ao abrigo do disposto no art. 6.º e na al. c) 
 do art. 70.º da Lei 28/1982 de 15 de Novembro; art. 20.º, 204.º, 223.º e 280.º 
 n.º 2 al. a) da CRP, porque o Tribunal “a quo” ao interpretar de modo restritivo 
 e erróneo o disposto no art. 728.º do Código de Processo Civil e ao valorizar, 
 como lei de valor reforçado, o que vem preceituado no n.º 1 do art. 87.º do 
 Código de Processo de Trabalho, sem atentar no n.º 2 da mesma disposição, violou 
 aquela norma legal (artº 728.º do CPC) e atentou contra princípios fundamentais 
 de direito, tais como os princípios da legalidade, da proporcionalidade e da 
 igualdade de tratamento. 
 Com efeito, a interpretação jurídico legal que afasta a aplicação da norma do 
 art. 728.º do CPC quando, em processo laboral, o Tribunal “a quo” funcione como 
 tribunal de revista, consubstancia uma ilegalidade traduzível numa 
 inconstitucionalidade interpretativa da referida norma, porquanto reduz os 
 direitos dos litigantes, em processo laboral, face aos litigantes de processo 
 civil, penal, etc... Na verdade, esta interpretação traduz um tratamento 
 discriminatório em matéria em que a Constituição impõe tratamento igual (por ser 
 aplicável o mesmo diploma legal – CPC – ainda que subsidiariamente). 
 Tal situação, porque emana de uma decisão surpresa e mesmo impensável e 
 insólita, que contraria jurisprudência continuada do STJ, ao longo de muitos 
 anos, na vigência da mesma legislação, não permitiu ao ora Recorrente antecipar 
 sequer a probabilidade de vir a ser confrontado com decisão que, por mera 
 interpretação errónea, afastasse a aplicação do art. 728.º do CPC e arguir, em 
 fase processual anterior, a ilegalidade/ inconstitucionalidade de tal 
 interpretação jurídico legal. 
 Termos em que, sempre com o mui douto suprimento de V. Ex.as deve o presente 
 recurso para o Tribunal Constitucional ser admitido, porque é tempestivo, 
 legitimo e devidamente fundamentado.
 
  
 No entanto, o recurso não foi admitido, no Supremo Tribunal de Justiça, por 
 despacho do seguinte teor:
 
  
 Notificado do acórdão lavrado nestes autos em 19 de Março de 2009 (fls. 859 a 
 
 860), veio o autor, Lic. A., juntar aos autos requerimento, ora junto a fls. 
 
 873, por intermédio do qual manifestou a sua vontade de, daquele aresto, 
 interpor recurso para o Tribunal Constitucional ao abrigo da alínea c) do nº 1 
 do art. 70º da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro, dizendo que “o Tribunal ‘a quo’ 
 ao interpretar de modo restritivo e erróneo o disposto no art. 728.º do Código 
 de Processo Civil e ao valorizar, como lei de valor reforçado, o que vem 
 preceituado no n.º 1 do art.º 87.º do Código de Processo de Trabalho, sem 
 atentar no nº 2 da mesma disposição, violou aquela norma legal (art. 728.º do 
 CPC) e atentou contra princípios fundamentais de direito, tais como os 
 princípios da legalidade, da proporcionalidade e da igualdade de tratamento.” E 
 prosseguiu, dizendo: 
 
 [...]
 
 É, no mínimo, imperceptível o requerimento que agora se aprecia. 
 Na verdade, esteado o recurso intentado interpor na alínea c) do nº 1 do art. 
 
 70.º da Lei nº 28/82, mister era que o acórdão que se pretende impugnar perante 
 o Tribunal Constitucional tivesse recusado a aplicação de qualquer normativo 
 constante de acto legislativo com fundamento na respectiva ilegalidade por 
 violação de lei com valor reforçado. 
 Ora, basta ler o aresto em causa para facilmente se verificar que a decisão nele 
 tomada se não ancorou na recusa de aplicação de qualquer norma inserta em acto 
 legislativo (e, na tese do ora requerente, esse normativo seria o que se 
 encontra precipitado no artº 728º do Código de Processo Civil) com base na 
 consideração de que o mesmo violava uma lei com valor reforçado. 
 Não poderá, assim, in casu, cobrar aplicação o que se encontra estabelecido na 
 alínea c) do nº 1 do art. 70º da referida Lei nº 28/82. 
 Por outro lado, a abertura de recurso de fiscalização concreta da (i)legalidade 
 prevista naquela alínea é independente dos pressupostos do recurso que defluem 
 da alínea f) do mesmo nº 1 – que se referem à aplicação de norma cuja 
 ilegalidade [por um dos fundamentos constantes das precedentes alíneas c), d) e 
 e)] fora, precedentemente ao proferimento da decisão, suscitada pela parte –, 
 pelo que, na situação, nem sequer haveria a necessidade de convocar a 
 impossibilidade da suscitação do vício de ilegalidade a que se reporta o 
 recorrente. 
 Mas, mesmo que porventura se entendesse que, afinal, aquilo que o ora impetrante 
 desejava, era lançar mão do recurso previsto na alínea f), por referência à 
 alínea c), ambas do no 1 do artº 70.º da Lei n.º 28/82, então é patente que essa 
 forma de impugnação se não tornava possível. 
 Efectivamente [e, não sendo aqui, de todo, cabidos os casos a que aludem as 
 alíneas d) e e) do mesmo número e artigo], seja o Código de Processo Civil, seja 
 o Código de Processo do Trabalho, não podem ser visualizados como leis de valor 
 reforçado, o que tanto basta (independentemente de uma mais circunstancial 
 análise sobre a verificação dos demais pressupostos do recurso) para que se 
 conclua que um recurso do jaez do desejado interpor não poderia ter âmbito de 
 aplicação na situação sub specie. 
 Termos em que não admito o recurso. 
 
  
 Inconformado, o interessado reclama para o Tribunal Constitucional argumentando 
 do seguinte modo:
 
  
 O recurso do reclamante para o Tribunal Constitucional (TC) visa a apreciação de 
 uma decisão surpresa, proferida pelo Supremo Tribunal de Justiça (STJ). 
 Com efeito, o acórdão do STJ, ao revogar o acórdão do Tribunal da Relação (TR), 
 sem ter sido tirado com três votos conformes, nos termos do art. 728.º do Código 
 de Processo Civil (CPC) é, para o reclamante, uma decisão surpresa, insólita e 
 absolutamente imprevisível, atento o passado jurisprudencial do STJ. 
 Na motivação do recurso o reclamante invocou, por lapso, uma norma legal 
 inadequada, mas explicitou claramente que considerava a interpretação do art. 87 
 do CPT, que afasta a aplicação da norma do art. 728.º do CPC quando, em processo 
 laboral, o STJ funcione como tribunal de revista, consubstanciadora duma 
 ilegalidade traduzível numa inconstitucionalidade interpretativa, porque reduz 
 os direitos dos litigantes, em processo laboral, face aos litigantes de processo 
 civil, penal, etc..., e disse, ainda, que esta interpretação traduz um 
 tratamento discriminatório em matéria em que a Constituição impõe tratamento 
 igual (por ser aplicável o mesmo diploma legal – CPC– ainda que 
 subsidiariamente), e, 
 Acrescentou ainda o reclamante que tal situação, porque emana de uma decisão 
 surpresa e mesmo impensável e insólita, que contraria jurisprudência continuada 
 do STJ, ao longo de muitos anos, na vigência da mesma legislação, não permitiu 
 ao recorrente, ora reclamante, antecipar sequer a probabilidade de vir a ser 
 confrontado com decisão que, por mera interpretação errónea, afastasse a 
 aplicação do art. 728.º do CPC e arguir, em fase processual anterior, a 
 ilegalidade/inconstitucionalidade de tal interpretação jurídica. 
 O despacho de indeferimento de admissão do recurso, salvo o devido respeito, 
 fundou-se em questões formais, como sejam a norma legal indicada como fundamento 
 de recurso [alínea c) da Lei 28/82], tergiversando ainda acerca da hipótese do 
 recorrente, ora reclamante, pretender suscitar a questão da fiscalização 
 concreta com outro fundamento, mas acerca da questão fulcral que é a da decisão 
 surpresa, fundamento do recurso, nada foi dito, pelo que a reclamação para o TC 
 se justifica. 
 O que está em causa, quando o STJ funcione como tribunal de revista, é saber se 
 o disposto no n.º 2 do art. 87.º do CPT, permite ou não a aplicação do art. 
 
 728.º do CPC não obstante o disposto n.º 1 do art. 87.º do CPT. 
 A Secção Social do STJ entende – entendimento recente – que o art. 728.º do CPC 
 não é aplicável aos processos julgados no STJ, quando este funcione como 
 tribunal de revista, em processo de trabalho, no âmbito da legislação anterior 
 ao Decreto-Lei nº 303/2007, de 24 de Agosto, aplicável atento o preceituado nos 
 seus arts. 11.º e 12.º e a data do pedido no Tribunal de Trabalho. 
 Para o reclamante tal interpretação contraria a prática reiterada do STJ – 
 Secção Social –, ao longo .de vários anos (a titulo de exemplo indicamos aqui 
 alguns dos acórdãos, da Secção Social, que por terem voto de vencido foram 
 sufragados por cinco Conselheiros, nos termos do art. 728.º do CPC, a saber, 
 Acórdãos: 01S3359 de 06.03.2002, 03S3775 de 30.09.2004; 04S3037 de 15-02-2005, 
 
 05S3277, de 08.03.2006, todos disponíveis em http://.www.dgsi.pt) e é, ao mesmo 
 tempo, salvo o devido respeito, uma violação flagrante dos princípios 
 constitucionais da legalidade e da igualdade de tratamento dos cidadãos 
 litigantes, em processo laboral, sujeitos ao veredicto do STJ quando este 
 funcione como tribunal de revista. 
 O principio da legalidade foi violado porque o n.º 2 do art. 87.º do CPT, ao 
 remeter para os poderes conferidos no CPC, estabelece condições de intervenção 
 do STJ quando funcione como tribunal de revista, em processo laboral, e que são 
 as que constam dos artigos 721.º a 732.º do CPC, pelo que para haver vencimento 
 o acórdão teria de ser sufragado pelo menos por três de cinco Conselheiros (art. 
 
 728º do CPC). 
 E há violação do principio constitucional da igualdade de tratamento porque no 
 STJ, em sede de revista, ninguém tem dúvida que quando os processos sejam da 
 jurisdição civil ou penal e haja que revogar um acórdão do Tribunal da Relação, 
 este vai sufragado nos termos do art. 728.º do CPC; ou seja se houver uma 
 declaração de voto de vencido o acórdão vai aos dois Conselheiros imediatos para 
 que a maioria revogatória seja sempre de três ou superior. 
 A fiscalização concreta da inconstitucionalidade de uma norma legal ou da 
 interpretação de certa norma só pode ser requerida quando algum interessado se 
 aperceba da possibilidade de a arguir. 
 Ora, o reclamante jamais poderia prever que o Julgador do acórdão recorrido, 
 atento o passado jurisprudencial do STJ, incluindo a Secção Social, não 
 aplicasse ao caso, em presença de voto de vencido, a norma do art. 728.º do CPC. 
 
 
 Daí que a presente reclamação deva ser admitida e, em consequência, declarada a 
 inconstitucionalidade da interpretação jurídica que, no acórdão recorrido, 
 afasta a aplicação do normativo do art. 728.º do CPC. 
 A presente reclamação vai apresentada ao abrigo do disposto nos n.º 4 e 5 do 
 art. 145.º do CPC, aplicável ao tempo da entrada da P1, pelo que se requer a 
 emissão de guia de multa (primeiro dia). 
 Termos em que, sempre com o mui douto suprimento de V. Ex.a, que se requer, deve 
 a presente reclamação ser admitida e seguirem-se os termos ulteriores, com as 
 consequências legais.
 
  
 
 2. Face à tramitação imposta, para este tipo de pedidos, pelo artigo 77º da já 
 referida LTC, foi ouvido o representante do Ministério Público, importando agora 
 decidir.
 
  
 
 3. É inequívoco que o reclamante pretende recorrer para o Tribunal 
 Constitucional do acórdão, proferido em 19 de Março de 2009 no Supremo Tribunal 
 de Justiça, ao abrigo da alínea c) do n.º 1 do artigo 70º da LTC, mediante a 
 invocação de que fora afastada a aplicação do artigo 728º do Código de Processo 
 Civil. Mas nos termos daquela disposição, cabe recurso para o Tribunal 
 Constitucional das decisões dos tribunais que 'recusem a aplicação de norma 
 constante de acto legislativo, com fundamento na sua ilegalidade por violação de 
 lei com valor reforçado'. O recurso visa, portanto, apreciar a ilegalidade da 
 norma cuja aplicação foi recusada com esse fundamento, por se mostrar 
 desconforme com uma lei de valor reforçado. Exigir-se-ia, portanto, que, na 
 decisão recorrida, o tribunal a quo tivesse concluído que a norma do artigo 728º 
 do Código de Processo Civil, em princípio aplicável ao caso, não podia, no 
 entanto, ser mobilizada por enfermar de ilegalidade, por se mostrar desconforme 
 com uma lei de valor reforçado. 
 Todavia, é patente que a decisão recorrida não recusou a aplicação do artigo 
 
 728º do Código de Processo Civil com tal fundamento.
 Na verdade, e ainda que – por facilidade de análise – se considere como decisão 
 recorrida não só a que negou provimento à reclamação, mas também o acórdão 
 reclamado, o certo é que a não aplicação da norma invocada – o artigo 728º do 
 Código de Processo Civil – se deveu a uma clara opção de escolha do direito 
 aplicável, unicamente fundamentada no apuramento dos respectivos pressupostos de 
 aplicação, sem qualquer interferência da hipotética ilegalidade da norma. 
 Resta apenas acrescentar que é, agora, totalmente irrelevante a matéria 
 relacionada com o carácter inesperado ou surpreendente da decisão recorrida, uma 
 vez que já se concluiu que se não verifica o pressuposto essencial que 
 permitiria a interposição do recurso previsto na referida alínea c) do n.º 1 do 
 artigo 70º da LTC, que o reclamante pretendia ver interposto.
 
  
 Em face do exposto, decide-se indeferir a reclamação. Custas pelo reclamante, 
 fixando-se a taxa de justiça em 25 UC.
 
  
 Lisboa, 9 de Julho de 2009
 
  
 Carlos Pamplona de Oliveira
 Maria João Antunes
 Gil Galvão