 Imprimir acórdão
 Imprimir acórdão   
			
Processo nº 1011/07
 
 1ª Secção
 Relatora: Conselheira Maria João Antunes
 
  
 Acordam na 1ª secção do Tribunal Constitucional
 
 
 
  
 I. Relatório
 
 1. Nos presentes autos, vindos do Supremo Tribunal de Justiça, em que são 
 recorrentes o Ministério Público e A. e é recorrido IEP – Instituto de Estradas 
 de Portugal, foi interposto recurso para o Tribunal Constitucional, ao abrigo da 
 alínea a) do nº 1 do artigo 70º da Lei da Organização, Funcionamento e Processo 
 do Tribunal Constitucional (LTC), do acórdão daquele Tribunal de 3 de Outubro de 
 
 2007.
 
  
 
 2. A. demandou o Instituto de Estradas de Portugal, em acção proposta no 
 Tribunal do Trabalho de Coimbra em Maio de 2004, pedindo, entre o mais, que os 
 contratos designados por tarefas, contrato de trabalho a termo e contrato de 
 trabalho temporário, sucessivamente celebrados entre as partes desde 1 de Abril 
 de 2001, fossem declarados um contrato de trabalho subordinado; e que a Autora 
 fosse declarada trabalhadora do Réu, ao abrigo de contrato sem termo, desde esta 
 data.
 Foi então proferida sentença que, para o que agora releva, declara que entre a 
 Autora e o Réu “vigora um contrato de trabalho sem termo, com efeitos reportados 
 a 1 de Abril de 2001, para o exercício pela mesma de funções de administrativa, 
 nas instalações sitas em Coimbra”, condenando o Réu a “reconhecer a existência 
 de um contrato de trabalho sem termo, entre as partes”.
 
  
 
 3. Interposto recurso para o Tribunal da Relação de Coimbra, a sentença da 
 primeira instância foi integralmente confirmada. O Instituto de Estradas de 
 Portugal recorreu desta decisão para o Supremo Tribunal de Justiça que, pelo 
 acórdão recorrido, decidiu conceder parcialmente a revista e, “declarando nulo o 
 contrato de trabalho que vinculou as partes até 14 de Abril de 2004, absolver o 
 Réu do pedido de reintegração e do pagamento das importâncias reclamadas com 
 fundamento em despedimento ilícito”; e “manter a condenação do Réu no pagamento 
 
 à Autora da importância fixada nas instâncias, a título de compensação por não 
 gozo de férias e respectivo subsídio”.
 Para o que agora cumpre apreciar e decidir, importa transcrever deste acórdão o 
 seguinte:
 
  
 
 «2. As questões que vêm suscitadas nas conclusões da revista são as seguintes:
 
 (…)
 
 5. A inconstitucionalidade material, por violação do artigo 47.º, n.º 2, da CRP, 
 do artigo 44.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 427/89, de 7 de Setembro, interpretado 
 no sentido de, consentindo a aplicação dos Estatutos do Réu, permitir, por via 
 da conversão de contratos a termo em contratos sem termo, a admissão de 
 trabalhadores sem um procedimento prévio de recrutamento e selecção que garanta 
 o acesso em condições de liberdade e igualdade.
 A questão foi examinada no supra mencionado Acórdão de 26 de Setembro de 2007, 
 numa perspectiva diferente daquela com que vinha sendo enfrentada por este 
 Supremo Tribunal, que, até então, se orientava no sentido de não se verificar a 
 inconstitucionalidade (…).
 A nova perspectiva foi apresentada do seguinte modo:
 
 [...] 
 Sobre a questão em apreço e abordando hipótese paralela à dos autos, 
 pronunciou-se o recente acórdão do Tribunal Constitucional n.º 409/2007, de 
 
 11.07.2007, proferido no Processo n.º 306/07 (em recurso do acórdão deste STJ, 
 de 7 de Fevereiro de 2007, na Revista n.º 2451/06, desta 4.ª Secção).
 Aquele aresto, já publicado na Internet, no sítio www.tribunalconstitucional.pt 
 
 (…), de que se junta cópia, e cujo teor damos aqui por reproduzido, julgou 
 
 “inconstitucional, por violação do artigo 47.º, n.º 2, da Constituição da 
 República Portuguesa, a norma extraída da conjugação dos artigos 41.º, n.º 4, do 
 Decreto-Lei n.º 184/89, de 2 de Junho, 44.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 427/89, 
 de 7 de Dezembro, e 13.º dos Estatutos do Instituto para a Conservação e 
 Exploração da Rede Rodoviária (…), aprovados pelo Decreto-Lei n.º 237/99, de 25 
 de Junho, interpretados no sentido de permitirem a contratação de pessoal 
 sujeito ao regime jurídico do contrato individual de trabalho, designadamente na 
 parte em que permite a conversão de contratos de trabalho a termo em contratos 
 de trabalho sem termo, sem imposição de procedimento de recrutamento e selecção 
 dos candidatos à contratação que garanta o acesso em condições de liberdade e 
 igualdade”.
 E nesse acórdão, que aderiu às considerações que, para hipóteses semelhantes, 
 tinham já sido seguidas por anteriores arestos do TC, a propósito de outros 
 institutos públicos (…), escreveu-se o seguinte, no que respeita à projecção do 
 aludido juízo de inconstitucionalidade na apreciação do caso concreto em apreço:
 
 «Estas considerações são inteiramente transponíveis para o caso do presente 
 recurso, sendo inquestionável que o instituto em causa (…) está investido de 
 poderes de autoridade (cf., designadamente, o n.º 3 do artigo 5.º do Decreto-Lei 
 n.º 237/99), e não se vislumbra nenhuma razão válida, nomeadamente face à 
 especificidade das funções desempenhadas, para subtrair todo o seu pessoal, e 
 especificamente a categoria profissional da ora recorrida, à regra do concurso.
 Não se ignora que, entre a matéria de facto provada, consta que “a autora foi 
 contratada na sequência de um processo de avaliação de currículo dos candidatos, 
 com entrevista de selecção” (...). No entanto, para além de o critério normativo 
 seguido no acórdão recorrido (e é sobre esse que há-de incidir o juízo de 
 inconstitucionalidade deste Tribunal) ter considerado de todo irrelevante a 
 existência, ou não, de procedimentos objectivos de selecção do pessoal a 
 contratar, o certo é que aquele facto provado é insuficiente (por nada revelar, 
 por exemplo, sobre a prévia publicitação da existência da vaga) para dar por 
 adquirido que o procedimento em concreto seguido tenha efectivamente garantido a 
 todos os potenciais candidatos o acesso ao cargo “em condições de liberdade e 
 igualdade”. Competirá, naturalmente, ao tribunal recorrido, ao proceder à 
 reformulação da sua decisão, e se tal lhe for processualmente permitido, apurar 
 se, em concreto, estas condições terão sido respeitadas, hipótese em que, 
 adoptando então – como lhe é lícito – critério normativo distinto do ora julgado 
 inconstitucional, não está à partida excluída a possibilidade de vir a julgar 
 não inconstitucional esse novo critério» (Fim de transcrição).
 Do que se deixou dito resulta que o Tribunal Constitucional não julgou 
 inconstitucionais, em si mesmas, as normas dos art.os 41.º, n.º 4 do DL n.º 
 
 184/89 e 44.º, n.º 1 do DL n.º 427/89, na parte em que salvaguardam a existência 
 de regimes especiais – diversos do regime geral de emprego público –, 
 determinando a aplicação das respectivas disposições estatutárias ao pessoal dos 
 institutos públicos que revistam a natureza de serviço personalizado e se rejam 
 pelo regime do contrato individual de trabalho.
 Nem julgou inconstitucional, em si mesma, a norma do art.º 13.º, n.º 1 dos 
 Estatutos do ICERR, aprovados pelo DL n.º 237/99, de 25.06, que dispôs que o 
 pessoal do ICERR está sujeito ao regime jurídico do contrato individual de 
 trabalho, com as especificidades previstas nesses estatutos e no diploma que os 
 aprovou.
 Julgou sim e tão só inconstitucional a norma extraída da conjugação desses 
 preceitos, na interpretação segundo a qual seria permitida a contratação de 
 pessoal desse Instituto sujeito ao regime jurídico do contrato individual de 
 trabalho, designadamente na parte em que permite a conversão dos contratos de 
 trabalho a termo em contratos sem termo, sem imposição de recrutamento e 
 selecção dos candidatos à contratação que garanta o acesso em condições de 
 liberdade e igualdade.
 E, como vimos, aceitou que os tribunais, ao emitirem o juízo de conversão de 
 tais contratos, abordem a questão da suficiência ou não, em concreto, dos 
 procedimentos objectivos de selecção do pessoal a contratar que, porventura, 
 tenham sido implementados na contratação levada a efeito e da consequente 
 constitucionalidade ou não do critério normativo adoptado, na interpretação 
 feita das normas sub judice.
 
 [...] 
 Subscrevendo o juízo de inconstitucionalidade proferido no mencionado acórdão do 
 Tribunal Constitucional, haverá que reconhecer-se que ele tem projecção no caso 
 que nos ocupa, apesar de se registarem algumas diferenças entre as situações de 
 facto e as pretensões com base nelas formuladas, submetidas a juízo.
 Na verdade, o que aqui se nos depara não é, em rigor, apenas, a conversão de um 
 contrato a termo em contrato por tempo indeterminado, por força da aplicação, na 
 sua plenitude, quer dizer sem restrições, do Regime Jurídico da Cessação do 
 Contrato Individual de Trabalho e da Celebração e Caducidade do Contrato de 
 Trabalho a Termo (LCCT), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 64-A/89, de 27 de 
 Fevereiro.
 O quadro que se nos apresenta envolve, de harmonia com os factos declarados 
 provados, a prestação de actividade remunerada, sem qualquer hiato, durante 3 
 anos e 14 dias, ao abrigo, sucessivamente, por ordem cronológica, de dois 
 contratos denominados de “tarefa”, um intitulado contrato de trabalho a termo, 
 dois contratos denominados de “tarefa”, um contrato de trabalho temporário, e, 
 finalmente, sem qualquer contrato de trabalho, o que, na óptica da Autora, 
 sufragada pelas instâncias, consubstancia – face aos termos de subordinação em 
 que, sempre, se desenvolveu a execução do convencionado pelas partes – a 
 existência de uma relação laboral perene, com início reportado ao momento da 
 celebração do primeiro contrato.
 Retira-se da exposição dos fundamentos do referido acórdão do Tribunal 
 Constitucional a conclusão de que o n.º 2 do artigo 47.º da CRP não permite que 
 uma lei ordinária consinta a contratação por institutos públicos, investidos de 
 poderes de autoridade – por isso que equiparáveis ao Estado –, de pessoal 
 sujeito ao regime jurídico do contrato individual de trabalho, sem precedência 
 de recrutamento e selecção dos candidatos à contratação que garanta o acesso em 
 condições de liberdade e igualdade.
 Daí o juízo de inconstitucionalidade da interpretação do bloco constituído pelas 
 normas em causa – os artigos 41.º, n.º 4, do Decreto-Lei n.º 184/89, 44.º, n.º 
 
 1, do Decreto-Lei n.º 427/89, e 13.º, n.º 1, dos Estatutos do ICERR – no sentido 
 de ser autorizada a contratação sem aquela garantia, em regra, tornada efectiva 
 por via de concurso ou procedimento equiparável.
 Assim, tendo em atenção o disposto nos artigos 280.º, n.º 1 e 294.º do Código 
 Civil (…), nenhuma relação jurídica com a natureza de contrato de trabalho – 
 seja qual for a denominação que lhe tenha sido atribuída –, em que o Instituto 
 de Estradas de Portugal figure como empregador, será válida, se tiver sido 
 preterida, sem motivo excepcionalmente atendível, a prévia realização do 
 adequado procedimento.
 No caso vertente, sabe-se que a Autora, tendo tido conhecimento de que o Réu 
 estava a admitir trabalhadores, havendo uma vaga para o sector das licenças, 
 apresentou o seu currículo, foi seleccionada para apresentar uma proposta para a 
 execução de determinados trabalhos, na sequência do que foi admitida, em 1 de 
 Abril de 2001, ao serviço do Réu (factos 1., 2. e 3.).
 Estes factos não são suficientes para se considerar que houve um procedimento de 
 recrutamento e selecção de candidatos equiparável ao concurso, que pressupõe a 
 publicitação da existência da(s) vaga(a)s, de modo a permitir a candidatura de 
 todos os eventuais interessados, facto que não está demonstrado, nem foi alegado 
 
 – como não foi demonstrado, nem alegado o contrário.
 Como se observou no supra referido Acórdão de 26 de Setembro de 2007, “estamos 
 perante aspecto de facto que, na presente acção, reveste natureza constitutiva e 
 cujo ónus da prova cabe, por isso, ao A., nos termos do art.º 342.º, n.º 1, do 
 Cód. Civil (diga-se que parece ter sido também o entendimento subjacente à 
 posição do Acórdão do TC que vem sendo abordado, como se deduz da passagem acima 
 transcrita sobre a projecção do juízo de inconstitucionalidade nele formulado ao 
 caso concreto aí abordado)”.
 Não se sabendo se houve ou não o adequado procedimento, porque à Autora competia 
 alegar e provar o facto, a dúvida resolve-se contra ela, nos termos das 
 disposições combinadas dos artigos 342.º, n.º 1, do Código Civil e 516.º do CPC.
 De tudo o exposto resulta que a relação estabelecida entre as partes, que se 
 iniciou em 1 de Abril de 2001, quando encarada como relação de trabalho 
 subordinado, tem de ser, considerada nula e como tal, em vista do disposto no 
 artigo 286.º do Código Civil, declarada, o mesmo sucedendo relativamente aos 
 dois posteriores “contratos de tarefa”.
 Quanto aos contratos denominados de trabalho a termo e de trabalho temporário, 
 nunca poderiam ser convertidos em relação laboral duradoura, face ao assumido 
 juízo de inconstitucionalidade, no que toca à sua conversão.
 Soçobra, por conseguinte, a pretensão da Autora de ver reconhecido um vínculo 
 laboral permanente e o Réu condenado, por despedimento ilícito, a reintegrá-la e 
 a pagar-lhe retribuições vencidas e vincendas até à data do trânsito em julgado 
 da sentença.
 
 (…)
 Já se viu que o vínculo que permaneceu entre 1 de Abril de 2001 e 14 de Abril de 
 
 2004 consubstancia um contrato de trabalho.
 Esse contrato deve ser declarado nulo, por força do disposto nos artigos 280.º, 
 n.º 1, 286.º e 294.º do Código Civil».
 
  
 
 4. O Ministério Público recorreu deste acórdão para o Tribunal Constitucional 
 requerendo a apreciação:
 
  
 
 «das normas conjugadas dos artigos 41º, n° 4, do Decreto-Lei n° 184/89, de 2 de 
 Junho, 44°, n° 1, do Decreto-Lei n° 407/89, de 7 de Setembro e 13°, n° 1, dos 
 Estatutos do Instituto para a Conservação e Exploração da Rede Rodoviária 
 
 (ICERR), aprovado pelo Decreto-Lei n° 237/99, de 25 de Junho, “na interpretação 
 segundo a qual seria permitida a contratação de pessoal desse Instituto sujeito 
 ao regime jurídico do contrato individual de trabalho, designadamente na parte 
 em que permitem a conversão dos contratos de trabalho a termo em contratos sem 
 termo, sem imposição de recrutamento e selecção dos candidatos à contratação que 
 garanta o acesso em condições de liberdade e igualdade”, por violação do artigo 
 
 47°, n° 2, da Constituição».
 
  
 A. também interpôs recurso desta decisão para o Tribunal Constitucional para 
 apreciação: 
 
  
 
 «das normas conjugadas dos artigos 44°, n.° 1 do Decreto – Lei n.° 407/89, de 7 
 de Setembro, 41.º, n.° 4 do Decreto – Lei n.° 184/89, de 2 de Junho e artigo 
 
 13°, n.° 1 dos Estatutos do ICERR, aprovados pelo Decreto – Lei n.° 237/99, de 
 
 25 de Junho, “na interpretação segundo a qual seria permitida a contratação de 
 pessoal desse Instituto sujeito ao regime jurídico do contrato individual de 
 trabalho, designadamente na parte em que permitem a conversão dos contratos de 
 trabalho a termo em contratos sem termo, sem imposição de recrutamento e 
 selecção dos candidatos à contratação que garanta o acesso em condições de 
 liberdade e igualdade”, por violação do artigo 47°, n.° 2 da Constituição, mas 
 também do artigo 13.° e artigo 53.° do mesmo diploma Constitucional».
 
  
 
 5. Notificado para o efeito, o Ministério Público alegou, para o que agora 
 releva, o seguinte:
 
  
 
 «(…) Note-se que o douto acórdão recorrido (p. 339) “subscreve” o juízo de 
 inconstitucionalidade formulado pelo Tribunal Constitucional no acórdão n° 
 
 409/07, considerando ter o mesmo inteira “projecção” no caso ora em apreciação.
 Por sua vez, tal aresto aderiu à corrente jurisprudencial, já formada no 
 Tribunal Constitucional sobre a questão substancial em controvérsia (acórdãos 
 nos 61/04, 140/02 e 406/03).
 De salientar que a única especificidade do caso dos autos se traduz em tal 
 orientação jurisprudencial ser estendida também aos contratos denominados de 
 
 “tarefa”, celebrados, a nível precário, com a entidade pública, investida em 
 poderes de autoridade, que surge como ré na presente acção.
 Como ali se conclui, tal especificidade não impede que se adira à corrente 
 jurisprudencial, atrás citada, a qual deverá aplicar-se ao caso dos autos, 
 confirmando-se o juízo de inconstitucionalidade formulado no douto acórdão 
 recorrido.
 
 2. Conclusão
 Nestes termos e pelo exposto, conclui-se: 
 
 1º
 Pelas razões constantes do acórdão n° 409/07, a cuja fundamentação inteiramente 
 se adere, é inconstitucional, por violação do disposto no artigo 47°, n° 2, da 
 Constituição da República Portuguesa, a interpretação normativa, extraída dos 
 artigos 41°, n° 4, do Decreto-Lei n°184/89, de 2 de Junho, 44°, n° 1 do 
 Decreto-Lei n° 427/89, de 7 de Dezembro e 13° dos Estatutos do ICERR, aprovados 
 pelo Decreto-Lei n° 237/99, de 25 de Junho, segundo a qual seria permitida a 
 contratação de pessoal sujeito ao regime jurídico do contrato individual de 
 trabalho, designadamente na parte em que se permite a conversão de contratos de 
 trabalho a termo, de contratos de trabalho temporário, ou de relações assentes 
 em contratos de tarefa em contratos de trabalho sem termo, sem que se demonstre 
 o cumprimento adequado de um procedimento de recrutamento e selecção dos 
 candidatos à contratação que garanta o acesso, em condições de liberdade e 
 igualdade, ao exercício de funções públicas em entidade investida em poderes de 
 autoridade. 
 
 2º
 Termos em que deverá confirmar-se o juízo de inconstitucionalidade formulado 
 pela decisão recorrida».
 
  
 
 6. Notificada para o efeito, a recorrente alegou no sentido de ser concedido 
 provimento ao recurso. 
 
  
 
 7. Notificado para contra-alegar, o recorrido sustentou, entre o mais, o 
 seguinte:
 
  
 
 «I- 
 A Recorrente veio a interpor recurso para o Tribunal Constitucional, ao abrigo 
 da alínea a) do nº. 1 do artigo 70º da Lei nº. 28/82, de 15/11. 
 No seu requerimento de interposição de recurso, ao abrigo da alínea a) do nº. 1 
 do artº. 70º., a recorrente explicitou esse recurso nos seguintes termos: 
 
 “O douto acórdão recorrido conclui que o contrato de trabalho que vinculou as 
 partes até 14 de Abril de 2004 é nulo, absolvendo o Réu do pedido de 
 reintegração e do pagamento das importâncias reclamadas com fundamento em 
 despedimento ilícito. 
 Com o entendimento de que a contratação da A. pelo R., estava sujeita, conforme 
 decidido pelo acórdão do Tribunal Constitucional citado (acórdão nº. 409/07, de 
 
 11 de Julho de 2007 – Processo nº. 306/07) a procedimento administrativo de 
 recrutamento e selecção que assegurasse a liberdade e igualdade de acesso. 
 E acrescenta que, sem tal procedimento a norma extraída da conjugação dos 
 artigos 41º, nº. 4 do Decreto-Lei nº. 184/89, 44º. nº. 1 do Decreto-Lei nº. 
 
 427/89, e 13º dos Estatutos do ICERR, torna-se inconstitucional o que dita que 
 indemonstrada a sua existência, seja inválida a conversão do contrato a termo 
 celebrado em contrato sem termo por falta de suporte normativo para tal 
 conversão. 
 
 (...) 
 Ora o tribunal recorrido recusou a aplicação das normas citadas, com fundamento 
 em inconstitucionalidade, posição com a qual a A. não concorda”. 
 E, mais à frente, no mesmo requerimento, diz a recorrente que: 
 
 “Por fim, a não aplicação do regime do contrato individual de trabalho ao caso 
 dos autos e das normas desaplicadas, com os fundamentos constantes do douto 
 acórdão recorrido viola, desde logo, o princípio da igualdade e previsto no 
 artigo 13º da Constituição da República Portuguesa, mas também o princípio da 
 garantia da segurança no emprego postulada no artigo 53º do mesmo diploma 
 constitucional. 
 O Tribunal efectuou uma errada interpretação da norma constitucional 
 entendendo-se que a interpretação da norma no sentido da sua 
 inconstitucionalidade ocasiona uma violação dos princípios da igualdade e da 
 garantia e segurança no emprego, sendo certo que, em caso de colisão de 
 princípio constitucionais igualmente consagrados na CRP, deve proceder-se a uma 
 harmonização/concordância prática por forma a assegurar a conteúdo útil de cada 
 um deles, atribuindo-se-lhe a máxima efectividade possível, sob pena de se 
 esvaziar um princípio constitucional em favor de outro”. 
 Posteriormente, a recorrente, em resposta a despacho para o efeito, veio dizer 
 que: 
 
 “1) Alínea a) do nº. 1 do artigo 70º da LCT: 
 A ora recorrente vem interpor recurso para o Tribunal Constitucional do douto 
 acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, em que foi recusada, com fundamento em 
 inconstitucionalidade, a aplicação das normas conjugadas dos artigos 41º, nº. 4 
 do Decreto-Lei nº. 407/89, de 7 de Setembro, 44º. nº. 1 do Decreto-Lei nº. 
 
 184/89, de 2 de Junho, e artigo 13º dos Estatutos do ICERR, aprovados pelo 
 Decreto-Lei nº. 237/99, de 25 de Junho, “na interpretação segundo o qual seria 
 permitida a contratação de pessoal desse Instituto sujeito ao regime jurídico do 
 contrato individual de trabalho, designadamente na parte em que permite a 
 conversão de contratos de trabalho a termo em contratos sem termo, sem imposição 
 de procedimento de recrutamento e selecção dos candidatos à contratação que 
 garanta o acesso em condições de liberdade e igualdade”, por violação do artigo 
 
 47º, nº. 2 da Constituição, mas também do artigo 13º e artigo 53º do mesmo 
 diploma constitucional”. 
 Ora, diz-se no do douto acórdão recorrido: 
 
 “Do que se deixou dito resulta que o Tribunal Constitucional não julgou 
 inconstitucional, em si mesma, as normas dos artºs 41º, nº 4 do DL nº. 184/89 e 
 
 44º, n º. 1 do DL nº. 427/89, na parte em que salvaguardam a existência de 
 regimes especiais – diversos do regime geral de emprego público –, determinando 
 a aplicação das respectivas disposições estatutárias ao pessoal dos institutos 
 públicos que revistam a natureza de serviço personalizado e se rejam pelo regime 
 do contrato individual de trabalho. 
 Nem julgou inconstitucional, em si mesma, a norma do artº. 13º, nº. 1 dos 
 Estatutos do ICERR, aprovados pelo DL n º. 237/99, de 25.06, que dispôs que o 
 pessoal do ICERR está sujeito ao regime jurídico do contrato individual de 
 trabalho, com as especificidades previstas nesses estatutos e no diploma que os 
 aprovou. 
 Julgou sim e tão só inconstitucional a norma extraída da conjugação desses 
 preceitos, na interpretação segundo a qual seria permitida a contratação de 
 pessoal desse Instituto sujeito ao regime jurídico do contrato individual de 
 trabalho, designadamente na parte em que permite a conversão dos contratos de 
 trabalho a termo em contratos sem termo, sem imposição de recrutamento e 
 selecção dos candidatos à contratação que garanta o acesso em condições de 
 liberdade e igualdade. 
 E, como vimos, aceitou que os tribunais, ao emitirem o juízo de conversão de 
 tais contratos, abordem a questão da suficiência ou não, em concreto, dos 
 procedimentos objectivos de selecção do pessoal a contratar que, porventura, 
 tenham implementados na contratação levada a efeito e da consequente 
 constitucionalidade ou não do critério normativo adoptado, na interpretação 
 feita das normas sub judice”. 
 Aliás, este é exactamente o mesmo entendimento (do referido acórdão nº. 409/07) 
 perfilhado no Ac. STJ, de 3/10/07, revista 177/07. 
 Nos termos da alínea a) do nº. 1 do citado artº. 70º, cabe recurso para o 
 Tribunal Constitucional das decisões “Que recusem a aplicação de qualquer norma, 
 com fundamento em inconstitucionalidade”. 
 Segundo a jurisprudência – uniforme, tanto quanto sabemos – do Tribunal 
 Constitucional, “Só se abre a via de recurso para o Tribunal Constitucional, com 
 base na recusa de aplicação de uma norma jurídica, se o tribunal “a quo” tiver 
 rejeitado, com fundamento na sua inconstitucionalidade, a aplicação ao caso 
 concreto do conteúdo ou do regime jurídico constante de uma determinada norma 
 jurídica. 
 De acordo com este entendimento, não são recorríveis para o Tribunal 
 Constitucional as “falsas” recusas de aplicação de normas jurídicas, isto é 
 aquelas em que o tribunal “a quo” se limitou a formular um juízo de 
 inconstitucionalidade de uma norma jurídica, sem afastar a aplicação da norma 
 que ele reputou de inconstitucional. Em tais casos, terá de concluir-se que não 
 se está perante uma verdadeira desaplicação ou recusa de aplicação de uma norma, 
 mas apenas perante um simples “obiter dictum” ou em face de uma simples opinião 
 
 “ad ostentationem” em matéria de inconstitucionalidade” (Ac. 350/92, BMJ, 421, 
 
 37). 
 Igualmente, tem entendido o Tribunal Constitucional que não existe recusa de 
 aplicação se o tribunal recorrido, de entre os sentidos possíveis de uma norma, 
 escolhe aquele que a não torne conflituosa com a Constituição, fazendo 
 interpretação da norma em conformidade com o Texto Fundamental. Só assim não 
 será se, porventura, a pretexto de interpretação conforme à Constituição, se 
 adoptar um sentido de todo em todo incomportável pela norma (vd. Ac. 425/89). 
 Ora, no caso do douto acórdão recorrido, e aderiu ao juízo de 
 inconstitucionalidade emitido pelo acórdão nº. 409/2007, da interpretação do 
 bloco constituídas pelas normas em causa, no sentido de ser autorizada a 
 contratação sem aquela garantia, em regra, tornada efectiva por via de concurso 
 ou procedimento equiparável. 
 Daí que o acórdão recorrido não recusou a aplicação daquelas normas, com 
 fundamento em inconstitucionalidade, não tendo recaído sobre qualquer uma das 
 normas em apreço qualquer juízo de inconstitucionalidade. 
 Mais ainda, o acórdão recorrido ao emitir o juízo de conversão do contrato, 
 abordou a questão da insuficiência, em concreto, dos procedimentos objectivos de 
 selecção do A. e da consequente inconstitucionalidade do critério normativo 
 adoptado. 
 Isto é, o acórdão recorrido formulou um juízo de inconstitucionalidade, baseada 
 numa certa interpretação, sem afastar a aplicação das normas (naquela mesma 
 interpretação) que reputou de inconstitucionais. 
 No caso concreto não foram aplicadas pela simples razão de que não se 
 verificaram os procedimentos de recrutamento e selecção dos candidatos à 
 contratação que garanta o acesso em condições de liberdade e igualdade. 
 E, o que aqui está em causa – bem demonstrado pela alegação do Recorrente sobre 
 o ónus de prova sobre a existência daqueles procedimentos – é uma questão de 
 direito ordinário: se foram ou não respeitados os procedimentos objectivos de 
 selecção do A. que tenham garantido aos potenciais candidatos o acesso ao cargo 
 em condições de igualdade e liberdade, e de quem era o ónus da prova sobre a 
 existência desses procedimentos. 
 Estas questões não cabem no âmbito do recurso de constitucionalidade. 
 Antes, tem de concluir-se que não se está perante uma “verdadeira desaplicação 
 ou recusa de aplicação de uma norma. 
 Isto é, o acórdão recorrido, de entre os sentidos possíveis de uma norma, 
 escolheu aquele que a não torne conflituosa com a Constituição, fazendo 
 interpretação da norma em conformidade com o Texto Fundamental. 
 Assim, e pelas razões expostas, a decisão do acórdão recorrido não configura uma 
 recusa de aplicação de uma(s) norma(s) jurídica(s) - com determinada 
 interpretação - com fundamento na sua inconstitucionalidade, pelo que tem de se 
 concluir pelo não conhecimento do recurso, interposto ao abrigo da alínea a) do 
 nº. 1 do artigo 70º da Lei 28/82.
 
 (…)
 Nestes termos e nos melhores de direito, deve: 
 
 - não se conhecer do objecto do recurso, porque a decisão do acórdão recorrido 
 não configura uma recusa de aplicação de uma norma jurídica com fundamento na 
 sua inconstitucionalidade;».
 
  
 
 8. Notificados da questão prévia levantada nas contra-alegações do recorrido, os 
 recorrentes concluíram pelo conhecimento do objecto do recurso.
 
  
 
 9. Por despacho da relatora, os recorrentes e o recorrido foram notificados, em 
 cumprimento do disposto no artigo 704º, nº 1, do Código de Processo Civil, 
 aplicável por força do artigo 69º da LTC, para, querendo, se pronunciarem sobre 
 a possibilidade de vir a ser proferida decisão de não conhecimento do objecto do 
 recurso:
 
  
 
 «É configurável que o Tribunal venha a entender que o acórdão recorrido não 
 recusou a aplicação da norma indicada pelos recorrentes nos requerimentos 
 respectivos, o que obsta a que se possa dar como verificado um dos requisitos do 
 recurso interposto ao abrigo da alínea a) do nº 1 do artigo 70º da Lei de 
 Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional (LTC).
 
  Do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça resulta que foi recusada a aplicação 
 dos artigos 41º, nº 4, do Decreto-Lei nº 184/89, de 2 de Junho, 44º, nº 1, do 
 Decreto-Lei nº 427/89, de 7 de Dezembro, e 13º, nº 1, dos Estatutos do Instituto 
 das Estradas de Portugal, quando interpretados no sentido de autorizarem o 
 estabelecimento de uma relação jurídica com a natureza de contrato de trabalho 
 sem um recrutamento e uma selecção dos candidatos à contratação que garanta o 
 acesso em condições de liberdade e igualdade, por violação do artigo 47º, nº 2, 
 da Constituição da República Portuguesa».
 
  
 
 10. Respondeu apenas a recorrente:
 
  
 
 «1. Conforme constado douto despacho proferido a fls., o Tribunal Constitucional 
 poderá entender que o acórdão recorrido não recusou a aplicação da norma 
 indicada pelos recorrentes, o que obsta a que se possa dar como verificado um 
 dos requisitos do recurso interposto ao abrigo da alínea a) do n.° 1 do artigo 
 
 70.° da Lei n.° 28/82. 
 
 2. O que se não aceita. 
 Com efeito, o douto acórdão recorrido recusou a aplicação dos artigos 41.°, n.° 
 
 4 do DL n.° 184/89, de 2 de Junho, 44.°, n.° 1 do DL n.° 427/89, de 7 de 
 Dezembro e artigo 13.°, n.° 1 dos Estatutos do IEP, quando interpretadas no 
 sentido de autorizarem o estabelecimento de uma relação jurídica com a natureza 
 de contrato de trabalho sem um recrutamento e uma selecção dos candidatos à 
 contratação que garanta o acesso em condições de liberdade e igualdade, por 
 violação do artigo 47.° n.° 2 da CRP. 
 Ou seja, o Tribunal recorrido não aplicou as normas em causa, com fundamento na 
 sua inconstitucionalidade (por violação do artigo 47°, n.° 2), uma vez que as 
 mesmas — caso fossem aplicadas — permitiriam a contratação da recorrente sem a 
 alegada precedência de recrutamento e selecção dos candidatos à contratação que 
 garantisse o acesso em condições de liberdade e igualdade.
 Ou seja, se fossem aplicadas as normas em causa nos presentes autos, a 
 recorrente seria admitida como trabalhadora do recorrido, quer mediante a 
 conversão do contrato de trabalho a termo em contrato de trabalho sem termo por 
 ausência de motivo justificativo, quer através da celebração sucessiva de 
 contratos (designados por contrato a termo, contratos de prestação de serviços 
 sucessivas e contrato trabalho temporário) para o exercício da mesma função, 
 conforme decidido pelo Tribunal do Trabalho de Coimbra, independentemente da 
 verificação do procedimento prévio de recrutamento. 
 Tudo por força da aplicação do regime do contrato individual de trabalho. 
 Regime laboral privado para o qual as normas citadas remetem.
 Assim, se as mesmas não fossem consideradas inconstitucionais e, 
 consequentemente, se fossem aplicadas ao caso sub judicie, a solução jurídica 
 seria, obviamente, outra. 
 Existe, efectivamente, uma recusa de aplicação das normas jurídicas indicadas 
 pela recorrente com fundamento na sua inconstitucionalidade. 
 O Tribunal Constitucional tem entendido que a recusa de aplicação de norma com 
 fundamento em inconstitucionalidade, para abrir via ao recurso previsto na 
 alínea a) do n.° 1 do artigo 70.° da LTC, tanto pode consistir numa recusa 
 explícita, como numa recusa implícita, e que são equiparáveis a recusas 
 determinadas decisões de aplicação da norma interpretada em conformidade com a 
 Constituição, “sempre que se esteja perante uma clara rejeição de certa 
 interpretação, mormente da interpretação literal ou «natural», com fundamento na 
 sua inconstitucionalidade” (José Manuel M. Cardoso da Costa, A Jurisdição 
 Constitucional em Portugal, 3.ª edição revista e actualizada, Coimbra, 2007, p. 
 
 73, nota 93). 
 Necessário é que o juízo de inconstitucionalidade (ou de desconformidade 
 constitucional) constitua uma verdadeira ratio decidendi da decisão recorrida, 
 como é o caso.
 Pelo que, deverá ser conhecido o recurso interposto ao abrigo da alínea a) do 
 n.° 1 do artigo 70.° da Lei n.° 28/82».
 
  
 Cumpre apreciar e decidir.
 
  
 II. Fundamentação
 
 1. Nos presentes autos, os recorrentes requerem a apreciação das normas 
 conjugadas dos artigos 41º, nº 4, do Decreto-Lei nº 184/89, de 2 de Junho, 44º, 
 nº 1, do Decreto-Lei nº 407/89, de 7 de Dezembro, e 13º, nº 1, dos Estatutos do 
 Instituto para a Conservação e Exploração da Rede Rodoviária (ICERR), aprovado 
 pelo Decreto-Lei nº 237/99, de 25 de Junho, na interpretação segundo a qual 
 seria permitida a contratação de pessoal desse Instituto sujeito ao regime 
 jurídico do contrato individual de trabalho, designadamente na parte em que 
 permitem a conversão dos contratos de trabalho a termo em contratos sem termo, 
 sem imposição de recrutamento e selecção dos candidatos à contratação que 
 garanta o acesso em condições de liberdade e igualdade. 
 Os recorrentes requerem a apreciação desta norma ao abrigo da alínea a) do nº 1 
 do artigo 70º da LTC, segundo a qual cabe recurso para o Tribunal Constitucional 
 das decisões dos tribunais que recusem a aplicação de qualquer norma com 
 fundamento na sua inconstitucionalidade. 
 
  
 
 2. Face ao teor do acórdão recorrido, é de concluir, contudo, pelo não 
 conhecimento do objecto do recurso interposto. Embora por razões distintas das 
 invocadas pelo recorrido, uma vez que o Tribunal Constitucional tem vindo a 
 entender que há recusa (implícita) de aplicação de uma norma, admitindo-se o 
 correspondente recurso, nos casos de interpretação em conformidade com a 
 Constituição em que há afastamento de outra possibilidade interpretativa, 
 mormente da interpretação literal ou «natural», com fundamento na sua 
 inconstitucionalidade, desde que este afastamento constitua a ratio decidendi da 
 decisão recorrida e não um mero obiter dictum (cf. Cardoso da Costa, A 
 Jurisdição Constitucional em Portugal, Almedina, 2007, p. 73, nota 93).
 Com efeito, a norma indicada pelos recorrentes nos requerimentos respectivos não 
 coincide com a norma cuja aplicação foi recusada pela decisão recorrida.
 Embora caiba ao recorrente definir o objecto do recurso no requerimento de 
 interposição (artigos 75º-A, nº 1, 76º, nº 2, e 78º-A, nºs 1 e 2, da LTC), a 
 decisão de constitucionalidade, em sede de fiscalização concreta, tem uma 
 
 “função instrumental”, ou seja, a decisão da questão de constitucionalidade tem 
 de “influir utilmente na decisão da questão de fundo” (Acórdão do Tribunal 
 Constitucional nº 169/92, Diário da República, II Série, de 18 de Setembro de 
 
 1992). Daí que constitua requisito do recurso de constitucionalidade interposto 
 a recusa de aplicação pelo tribunal recorrido, como ratio decidendi, da norma 
 cuja inconstitucionalidade pretende que o Tribunal aprecie. 
 Nos presentes autos, a norma cuja aplicação foi recusada, com fundamento em 
 violação do artigo 47º, nº 2, da Constituição da República Portuguesa, é a que 
 se extrai dos artigos 41º, nº 4, do Decreto-Lei nº 184/89, de 2 de Junho, 44º, 
 nº 1, do Decreto-Lei nº 427/89, de 7 de Dezembro, e 13º, nº 1, dos Estatutos do 
 Instituto das Estradas de Portugal, quando interpretados no sentido de 
 autorizarem o estabelecimento de uma relação jurídica com a natureza de contrato 
 de trabalho sem um recrutamento e uma selecção dos candidatos à contratação que 
 garanta o acesso em condições de liberdade e igualdade.
 O Supremo Tribunal de Justiça não deixa de salientar que o juízo de 
 inconstitucionalidade constante do Acórdão do Tribunal Constitucional nº 
 
 409/2007 (disponível em www.tribunalconstitucional.pt), que incidiu sobre a 
 norma indicada pelos recorrentes, tem apenas projecção no caso em análise. Este 
 envolve também quer a prestação de actividade remunerada ao abrigo de contratos 
 de “tarefa” e de um contrato de trabalho temporário quer a prestação de 
 actividade remunerada sem qualquer contrato de trabalho. E daí a extensão dos 
 fundamentos daquele juízo de inconstitucionalidade à norma aplicável ao caso – 
 aos artigos 41º, nº 4, do Decreto-Lei nº 184/89, de 2 de Junho, 44º, nº 1, do 
 Decreto-Lei nº 427/89, de 7 de Dezembro, e 13º, nº 1, dos Estatutos do Instituto 
 das Estradas de Portugal, quando interpretados no sentido de autorizarem o 
 estabelecimento de uma relação jurídica com a natureza de contrato de trabalho 
 sem um recrutamento e uma selecção dos candidatos à contratação que garanta o 
 acesso em condições de liberdade e igualdade. E a consequência da nulidade do 
 contrato de trabalho que vinculou as partes entre 1 de Abril de 2001 e 14 de 
 Abril de 2004, por aplicação dos artigos 280º, nº 1, 286º e 294º do Código 
 Civil.
 De resto, o Ministério Público dá-nos conta da não coincidência entre a norma 
 cuja apreciação foi requerida e a norma cuja aplicação foi recusada, quando 
 conclui, em sede de alegações, que, “pelas razões constantes do acórdão nº 
 
 409/07, a cuja fundamentação inteiramente se adere, é inconstitucional, por 
 violação do disposto no artigo 47º, nº 2, da Constituição da República 
 Portuguesa, a interpretação normativa, extraída dos artigos 41º, nº 4, do 
 Decreto-Lei nº 184/89, de 2 de Junho, 44º, nº 1 do Decreto-Lei nº 427/89, de 7 
 de Dezembro e 13º dos Estatutos do ICERR, aprovados pelo Decreto-Lei nº 237/99, 
 de 25 de Junho, segundo a qual seria permitida a contratação de pessoal sujeito 
 ao regime jurídico do contrato individual de trabalho, designadamente na parte 
 em que se permite a conversão de contratos de trabalho a termo, de contratos de 
 trabalho temporário, ou de relações assentes em contratos de tarefa em contratos 
 de trabalho sem termo, sem que se demonstre o cumprimento adequado de um 
 procedimento de recrutamento e selecção dos candidatos à contratação que garanta 
 o acesso, em condições de liberdade e igualdade, ao exercício de funções 
 públicas em entidade investida em poderes de autoridade” (itálico aditado). A 
 própria recorrente acaba por afirmar que “o douto acórdão recorrido recusou a 
 aplicação dos artigos 41.°, n.° 4 do DL n.° 184/89, de 2 de Junho, 44.°, n.° 1 
 do DL n.° 427/89, de 7 de Dezembro e artigo 13.°, n.° 1 dos Estatutos do IEP, 
 quando interpretadas no sentido de autorizarem o estabelecimento de uma relação 
 jurídica com a natureza de contrato de trabalho sem um recrutamento e uma 
 selecção dos candidatos à contratação que garanta o acesso em condições de 
 liberdade e igualdade, por violação do artigo 47.° n.° 2 da CRP”.
 
  
 III. Decisão
 Em face do exposto, decide-se não tomar conhecimento do objecto dos recursos.
 Sem custas.
 
  
 Lisboa, 28 de Janeiro de 2009
 Maria João Antunes
 Carlos Pamplona de Oliveira
 José Borges Soeiro
 
                                                          Gil Galvão (voto a 
 decisão nos termos da declaração do Senhor Conselheiro Presidente)
 
                                      Rui Manuel Moura Ramos. Com declaração.
 
  
 
  
 
  
 DECLARAÇÃO DE VOTO
 
  
 
  
 Subscrevi a decisão de não conhecimento do recurso, ainda que por uma razão 
 distinta da que consta da fundamentação em que ela se pretende basear.  Na 
 verdade, no meu entendimento, a decisão recorrida (o acórdão do STJ de 3 de 
 Outubro de 2007) não contem qualquer recusa de aplicação de preceitos 
 normativos. Antes, reconhecendo a projecção no caso concreto de um anterior 
 juízo de inconstitucionalidade formulado pelo Tribunal Constitucional (no 
 acórdão nº 409/2007, de 11 de Fevereiro de 2007), considera nulas, nos termos 
 dos artigos 280º, nº 1 e 294º do Código Civil as relações jurídicas “com a 
 natureza de contrato de trabalho, (…), em que o Instituto de Estradas de 
 Portugal figure como empregador (…) [quando haja] sido preterida, sem motivo 
 excepcionalmente atendível, a prévia realização do adequado procedimento”.  O 
 acórdão entendeu ser esta a consequência que decorria da leitura adequada do 
 texto constitucional, pelo que procedeu à indagação da existência in casu  de um 
 procedimento de recrutamento e selecção de candidatos equiparável ao concurso.  
 E foi por entender, na esteira do acórdão do mesmo Supremo de 26 de Setembro de 
 
 2007, que estava em causa um facto constitutivo do direito da Autora que esta 
 não lograra alegar e provar, que o acórdão sob recurso, por aplicação do artigo 
 
 286º do Código Civil, declarou nula a relação de trabalho subordinado 
 estabelecida entre as partes.
 Assentando a ratio decidendi da decisão recorrida numa interpretação do direito 
 ordinário (ainda que assente numa leitura da Constituição), em concreto do 
 regime da nulidade do contrato, não se verifica qualquer recusa de aplicação com 
 fundamento em inconstitucionalidade, pelo que  não se encontra assim aberta a 
 via de recurso ao Tribunal Constitucional prevista na alínea a) do nº 1 do 
 artigo 70º da LTC.
 
  
 Com este fundamento, não tomaria conhecimento do recurso.
 
   Rui Manuel Moura Ramos