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Processo n.º 362/09
 
 2.ª Secção
 Relator: Conselheiro João Cura Mariano
 
  
 
  
 
         Acordam na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional
 
  
 Relatório
 No âmbito da acção administrativa especial proposta por A. contra o Ministério 
 da Defesa Nacional, que correu os seus termos no Tribunal Administrativo e 
 Fiscal de Lisboa, sob o n.º 323/05.2 BELSB, foi proferido acórdão, datado de 9 
 de Julho de 2007, que julgou improcedentes os pedidos de declaração de nulidade 
 de um despacho do Ministro de Estado, da Defesa Nacional e dos Assuntos do Mar, 
 e de condenação do demandado na reconstituição da carreira militar do 
 demandante.
 Na sequência de recurso interposto pelo Autor, tal decisão viria a ser 
 integralmente confirmada por acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, 
 proferido em 30 de Outubro de 2008.
 Após ter interposto recurso de revista desta decisão para o Supremo Tribunal 
 Administrativo - que não chegou a ser admitido –, o recorrente acabou por 
 interpor recurso daquela mesma decisão para o Tribunal Constitucional, ao abrigo 
 do disposto na alínea b), do n.º 1, do artigo 70.º, da Lei do Tribunal 
 Constitucional (LTC), onde, mediante requerimento oportunamente aperfeiçoado, 
 suscitou a inconstitucionalidade da norma constante do artigo 4.º, n.º 2, do 
 Decreto-Lei n.º 330/84, de 15 de Outubro, na interpretação dada pelo tribunal 
 recorrido, segundo a qual a reconstituição da carreira nunca poderá ultrapassar 
 o posto de coronel, pelo que quem já é titular deste posto, como o Recorrente, 
 não tem direito a essa reconstituição.
 Notificado para efeito de apresentação de alegações de recurso, o recorrente 
 apresentou as respectivas alegações e concluiu do seguinte modo:
 
 «[...]
 
 1ª- À data em que foi vitima de “saneamento administrativo e discricionário, 6 
 de Agosto de 1974, nos termos e por aplicação do disposto na alínea b) do artº 
 
 1º do Decreto-Lei nº 309/74 de 8 de Julho, o recorrente era coronel tirocinado, 
 por estar habilitado com o curso de Altos Comandos, habilitação que constituía 
 condição de promoção a brigadeiro (1º nível da categoria ou classe de oficiais 
 generais, hoje Major-general) – Cf supra, factos provados – Parte II. 
 
 2ª – À mesma data o recorrente reunia já todas as condições pessoais (incluindo 
 com condecorações e louvores), todas as condições gerais e todas as condições 
 especiais para ser promovido a brigadeiro, pois 
 a) era o Coronel mais antigo do serviço e desempenhava o cargo de Brigadeiro, 
 b) Estava entre os quatro oficiais mais condecorados e louvados, tendo sido o 
 primeiro a quem foram concedidas tais condecorações, 
 c) era o único dos coronéis que tinha licenciatura dada pela frequência de 
 escolas próprias para a função 
 d (factos assentes – cf supra Parte I e Parte II, de alíneas A) a M). 
 
 3ª- Por isso, à mesma data indicada na conclusão 1ª, o recorrente tinha a 
 expectativa jurídica legítima e fundada de que seria promovido, pelo menos a 
 brigadeiro, logo no ano de 1974, ou, pelo menos, a breve prazo, pois fora 
 nomeado pelo Conselho Superior da Aeronáutica para a realização do curso de 
 Altos Comandos, precisamente na previsão da iminente ocorrência de vaga para 
 esse posto (cf. supra factos assentes Parte II- Alínea E) 
 
 4ª- Na douta decisão recorrida confirmou-se a decisão anterior – proferida em 1ª 
 instância - que negara a reconstituição da carreira militar do recorrente, com 
 fundamento em que o nº 2 do artº 4 do D.L. nº 330/84 de 15 de Outubro é 
 aplicável ao recorrente, e impede a reconstituição da sua carreira militar além 
 do posto de coronel por já ser coronel à data do saneamento. 
 
 5ª- No entanto tal norma legal, é materialmente inconstitucional por violação do 
 princípio da igualdade constante no artº 13º, nº 1 da CRP, na vertente de 
 proibição do arbítrio, se interpretada como abrangendo a situação do recorrente 
 e impedindo a reconstituição da sua carreira militar além de coronel, visto que 
 
 à data em que foi vitima de saneamento administrativo e discricionário, era 
 coronel tirocinado (habilitado com o curso de Altos Comandos), diferente de 
 simples coronel, e, ao contrário da generalidade dos restantes coronéis, gozava 
 da expectativa jurídica, legítima e fundada, de ser promovido nesse ano de 1974, 
 ou em breve prazo, pelo menos a brigadeiro; 
 
 6ª – Com efeito, a descrita situação do recorrente, à data em que foi vitima de 
 saneamento, era essencialmente diferente dos coronéis não tirocinados, que 
 constituía a maioria dos restantes coronéis, e por isso, sendo substancialmente 
 diferentes essas duas situações devem elas ter tratamento diferente sob pena de 
 violação do principio da igualdade, na indicada vertente da proibição do 
 arbítrio – o que aconteceria caso se entendesse e interpretasse o indicado 
 preceito como aplicável indistintamente aos coronéis tirocinados ou não 
 tirocinados. 
 
 7ª- Aliás, nem no indicado preceito artº 4º nº 2, nem em qualquer outro do 
 citado diploma legal, consta, nem se vislumbra, qualquer razão, motivo ou 
 fundamento material quer para a limitação da reconstituição da carreira dos 
 militares aí referidos - visto ser infundada a justificação da necessidade de 
 escolha e de vaga - quer para o âmbito da sua aplicação (supostamente 
 abrangendo todos os coronéis, independentemente de serem ou não tirocinados) – 
 falta absoluta de “ratio”, ou fundamento razoável para um tal tratamento igual 
 perante duas situações essencialmente diferentes, em violação do invocado 
 principio constitucional da igualdade.
 SEM conceder, e subsidiariamente, 
 Ainda que assim se não entenda, 
 Sempre se dirá que, 
 
 8ª – A decisão recorrida aplicou que a norma constante do artº 4º nº 2º do 
 citado D.L. nº 330/84 de 15 de Outubro, considerando que a mesma se aplica ao 
 caso do recorrente e impede a reconstituição da sua carreira militar com 
 fundamento em que à data em que foi saneado o recorrente já era coronel, e esse 
 preceito impõe que a reconstituição da carreira militar não pode ultrapassar o 
 posto de coronel 
 
 9ª – Porém, a citada norma legal constante do artº 4º nº 2 do DL nº 330/84 de 15 
 de Outubro, sofre do vício de inconstitucionalidade material, quando 
 interpretada no sentido de que impede a reconstituição da carreira militar dos 
 militares que, como o recorrente, eram já coronéis à data em que foram saneados, 
 ao contrário do que noutros preceitos do mesmo diploma (artº 2º e 4º) se 
 reconhece a outros militares em condições de igualdade de saneamento, a quem é 
 reconhecida a reconstituição da carreira militar até ao posto de coronel e 
 capitão de mar e guerra, sem que exista ou se vislumbre qualquer fundamento 
 material ou outro para essa diferenciação de tratamento 
 
 10ª - A absoluta falta de fundamento material – pelo qual se torne 
 compreensível, por razoável, tão diferente tratamento para situações 
 essencialmente iguais, isto é, - por um lado os militares saneados a quem se 
 reconhece o direito a reconstituição da carreira militar (até coronel e capitão 
 de mar e guerra - artº 4º nº 2 do citado diploma) - e por outro lado, os 
 militares saneados a quem se recusa qualquer reconstituição da sua carreira 
 militar (os que tenham sido saneados nesses postos) e embora seja exactamente 
 igual a situação de todos esses militares (destinatários desse diploma) por 
 terem sido todos igualmente alvo do “saneamento administrativo e discricionário” 
 a que se faz referência expressa no preâmbulo do mesmo diploma) torna 
 incompreensível e arbitrária, e por isso inconstitucional, essa norma segundo 
 tal interpretação, por violação do principio da igualdade, na vertente da 
 proibição do arbítrio. 
 
 11ª - Fundamentos por que, e segundo o douto suprimento deste Venerando 
 Tribunal, Requer seja dado provimento ao presente Recurso e em consequência ser 
 declarada a inconstitucionalidade material 
 a) da norma constante do nº 2 do artº 4º do D.L. nº 330/84 de 15 de Outubro, – 
 por violação do principio da igualdade na vertente de proibição do arbítrio, se 
 interpretada como abrangendo a situação do recorrente, mas impedindo a 
 reconstituição da sua carreira militar além de Coronel, apesar de à data em que 
 foi vitima de saneamento administrativo e discricionário, ser coronel 
 tirocinado (habilitado com o curso de Altos Comandos) e reunir todas as 
 condições pessoais, gerais e especiais para a promoção a brigadeiro, ao 
 contrário dos restantes coronéis não tirocinados, sem que exista qualquer 
 fundamento material para esse tal tratamento igual para situações essencialmente 
 tão diferenciadas: 
 b) da mesma norma legal, constante do nº 2 do artº 4º do D.L. nº 330/84 de 15 de 
 Outubro - por violação do principio da igualdade, na vertente de proibição do 
 arbítrio, quando interpretada no sentido de que impede a reconstituição da 
 carreira militar dos militares que, como o recorrente, eram já coronéis à data 
 em que foram vitimas de saneamento administrativo e discricionário, ao contrário 
 do que noutros preceitos do mesmo diploma (artº 2º e 4º) se reconhece a outros 
 militares, em igualdade de condições de saneamento, a quem é reconhecida a 
 reconstituição da carreira militar até ao posto de coronel ou capitão de mar e 
 guerra (reconstituição que consistirá na reconstituição integral em relação a 
 todos os que á data do saneamento não estivessem habilitados com o curso de 
 Altos Comandos) sem que exista ou se vislumbre qualquer fundamento material para 
 essa diferenciação de tratamento para situações essencialmente iguais.
 
 [...]».
 
  
 Por seu turno, o Recorrido Ministério da Defesa Nacional contra-alegou e 
 concluiu nos seguintes termos: 
 
 «[...]
 
 1. Veio o Recorrente, atento o historial jurisprudencial sobre o assunto em 
 apreço, que lhe foi desfavorável, recorrer para o Tribunal Constitucional 
 pedindo a declaração de inconstitucionalidade da norma constante do art 4.º, n.º 
 
 2 do DL 330/84, com fundamento na sua inconstitucionalidade material, por 
 violação do princípio da igualdade na vertente de proibição do arbítrio (...)”, 
 bem como no facto da interpretação que é feita desse normativo impedir a “(...) 
 reconstituição da carreira militar dos militares que, como o recorrente, era já 
 coronel à data em que foi vítima de saneamento administrativo e discricionário, 
 ao contrário do que noutros preceitos do mesmo diploma (art. º 2º nº 4) se 
 reconhece a outros militares, em igualdade de condições de saneamento, a quem é 
 reconhecida a reconstituição da carreira militar até ao posto de coronel ou 
 capitão de mar e guerra (reconstituição que consistirá na reconstituição 
 integral em relação a todos os que à data do saneamento não estivessem 
 habilitados com o curso de Altos Comandos) sem que exista ou se vislumbre 
 qualquer fundamento material para essa diferenciação de tratamento:” 
 
 2. O n.º 2 do artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 330/84, de 15 de Outubro, prevê que 
 a reconstituição da carreira não pode, em circunstância alguma, ultrapassar o 
 posto de Coronel. 
 
 3. O ora Recorrente, apesar de possuir o curso de tirocinado, detém o posto de 
 Coronel. 
 
 4. Resulta claro da letra da lei que o legislador quis abarcar única e 
 exclusivamente todos os postos até coronel ou capitão-de-mar-e-guerra, excluído 
 da sua aplicação os postos superiores como Major-general e Tenente-general e de 
 General. 
 
 5. E não tomou tal opção legislativa de forma inadvertida, pois conforme se 
 extrai do preâmbulo do Decreto-Lei n.º 330/84, de 15 de Outubro, a “(...) 
 revisão da situação do militar, com eventual alteração da mesma, à luz da 
 reconstituição possível da sua evolução presumível, dentro de certos juízos, 
 condicionalismos e limites realistas (...).“ 
 
 6. Ao conceder o pretendido pelo Recorrente, estar-se-ia a violar o princípio da 
 igualdade, previsto no artigo 13.º da Constituição da República Portuguesa 
 
 (CRP), em relação a outros militares nas mesmas condições e detentores do posto 
 de Coronel, tal como o Recorrente. 
 
 7. A promoção para o actual posto de Major-general não era, nem é hoje em dia, 
 automática, pois, para além de ser necessário o curso de tirocínio (Curso de 
 Altos Comandos da Força Aérea) que o ora Recorrente possui, dependia da 
 existência de vaga e era feita por escolha, de acordo com o Estatuto do Oficial 
 da Força Aérea vigente até 1990, aprovado pelo Decreto n.º 377/71, de 10 de 
 Setembro, mormente os artigos 128.º e 129.º. 
 
 8. Só podendo ser promovidos à categoria de Oficiais generais, os militares que 
 reúnam as condições gerais e especiais de promoção, em cúmulo com outras 
 exigências, nomeadamente, a existência de vagas e o posicionamento dos militares 
 face aos demais candidatos existentes, de acordo com os respectivos estatutos e 
 regulamentos militares. 
 
 9. E só reunidas todas as condições, a situação do militar será conduzida ao 
 Conselho Superior da Defesa Nacional, para aferir da sua possibilidade de 
 promoção, segundo critérios previamente definidos. 
 
 10. Só sendo promovidos os militares “(...) considerados mais competentes e que 
 ofereçam maior garantia de melhor servir a Força Aérea”, de acordo com o 
 estatuído na alínea c) do artigo 118.º do citado Decreto-Lei n.º 377/71. 
 
 11. O direito à promoção não é absoluto, antes resultando da globalidade do 
 anterior Estatuto do Oficial da Força Aérea e dos posteriores Estatutos dos 
 Militares das Forças Armadas, como um direito dependente das necessidades 
 estruturais das Forças Armadas e da consequente existência de vagas. 
 
 12. Carece, assim, em absoluto, de fundamento o defendido pelo Recorrente quanto 
 ao posto a que alega ter direito, uma vez que o mesmo não prova, nem o 
 conseguirá fazer, que teria sido escolhido de entre os coronéis tirocinados 
 para a promoção a Major-general nem que existisse vaga que permitisse a referida 
 promoção (isto no período que medeia entre 6 de Agosto de 1974 e 9 de Junho de 
 
 1977 já que nesta data o mesmo sempre teria que ter passado à reserva, por 
 limite de idade). 
 
 13. Aquando do seu pedido formulado em 1986, a Força Aérea reconstituiu a 
 carreira do Recorrente, aplicando o normativo constante no artigo 4º do Decreto 
 Lei n.º 330/84, de 15 de Outubro, tendo sido alterada a sua passagem à situação 
 de reserva de 6 de Agosto de 1974 para 9 de Junho de 1977. 
 
 14. Vem ainda o Recorrente que por ser Coronel tirocinado e por não se incluir 
 na previsão do referido preceito legal, defender que lhe deveria ter sido 
 aplicado a regra geral do Decreto-Lei n.º 330/84 ou ser excepcionado da 
 aplicação do n.º 2 do artigo 4.º do desse diploma, que manda reconstituir 
 integralmente a carreira dos militares saneados, sem qualquer restrição. 
 
 15. Tal solução violaria de forma gritante o princípio da igualdade, ao conceder 
 ao Recorrente um tratamento diferenciado sem que exista qualquer substrato legal 
 para o mesmo, consubstanciando um arbítrio. 
 
 16. O processo de solução problema criado pelo saneamento administrativo e 
 discricionário dos militares não cria mecanismos e procedimentos de excepção, 
 seguindo trâmites idênticos aos estabelecidos nos estatutos e regulamentos 
 militares, razão pela qual se estabelece como limite máximo de promoção o posto 
 de Coronel. 
 
 17. Na verdade, sendo a ascensão a posto superior feita por escolha, não é 
 possível ao legislador, por um lado, determinar quais os militares que teriam 
 sido escolhidos nem, por outro, regular no sentido de todos serem promovidos. 
 
 18. Podemos, pois, concluir que o legislador quis reconstituir a carreira 
 militar dos envolvidos até ao posto de Coronel, não tendo excepcionado, nem o 
 podendo fazer, como pretende o Recorrente, a sua situação, por ser possuidor do 
 tirocínio. 
 
 19. O n.º 2 do artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 330/84, de 15 de Outubro, não está 
 ferido de inconstitucionalidade material por violação do artigo 13.º da 
 Constituição da República Portuguesa. 
 
 20. Não existe fundamento legal para interpretar o n.º 2 do artigo 4.º do 
 Decreto-Lei n.º 330/84, de 15 de Outubro, no sentido de permitir um tratamento 
 diferenciado da situação do Recorrente, e considerar tal seria manifestamente 
 atentatório dos princípios da igualdade e da justiça. 
 
 21. De igual forma, a norma do n.º 2 do artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 330/84, de 
 
 15 de Outubro, não é inconstitucional por violação do princípio da igualdade na 
 vertente de proibição de arbítrio. 
 
 22. Pelo exposto, poderá concluir-se que não assiste razão ao ora Recorrente, 
 pelo que não tem acolhimento o pedido formulado de declaração de 
 inconstitucionalidade.
 
      
 
                                                     *                      
 Fundamentação
 
 1. Delimitação do objecto do recurso de constitucionalidade
 Resulta do requerimento de interposição de recurso para o Tribunal 
 Constitucional, após aperfeiçoamento, que o Recorrente pretende submeter à 
 respectiva apreciação a inconstitucionalidade da norma constante do artigo 4.º, 
 n.º 2, do Decreto-Lei n.º 330/84, de 15 de Outubro, na interpretação dada pelo 
 tribunal recorrido segundo a qual a reconstituição da carreira nunca poderá 
 ultrapassar o posto de coronel, pelo que quem já é titular deste posto, como o 
 Recorrente, não tem direito a essa reconstituição.
 Posteriormente, em sede de alegações, o Recorrente concluiu pedindo a 
 
 “declaração de inconstitucionalidade material:
 a) da norma constante do nº 2 do artº 4º do D.L. nº 330/84 de 15 de Outubro, – 
 por violação do principio da igualdade na vertente de proibição do arbítrio, se 
 interpretada como abrangendo a situação do recorrente, mas impedindo a 
 reconstituição da sua carreira militar além de Coronel, apesar de à data em que 
 foi vitima de saneamento administrativo e discricionário, ser coronel tirocinado 
 
 (habilitado com o curso de Altos Comandos) e reunir todas as condições pessoais, 
 gerais e especiais para a promoção a brigadeiro, ao contrário dos restantes 
 coronéis não tirocinados, sem que exista qualquer fundamento material para esse 
 tal tratamento igual para situações essencialmente tão diferenciadas: 
 b) da mesma norma legal, constante do nº 2 do artº 4º do D.L. nº 330/84 de 15 de 
 Outubro - por violação do principio da igualdade, na vertente de proibição do 
 arbítrio, quando interpretada no sentido de que impede a reconstituição da 
 carreira militar dos militares que, como o recorrente, eram já coronéis à data 
 em que foram vitimas de saneamento administrativo e discricionário, ao 
 contrário do que noutros preceitos do mesmo diploma (artº 2º e 4º) se reconhece 
 a outros militares, em igualdade de condições de saneamento, a quem é 
 reconhecida a reconstituição da carreira militar até ao posto de coronel ou 
 capitão de mar e guerra (reconstituição que consistirá na reconstituição 
 integral em relação a todos os que  data do saneamento não estivessem 
 habilitados com o curso de Altos Comandos) sem que exista ou se vislumbre 
 qualquer fundamento material para essa diferenciação de tratamento para 
 situações essencialmente iguais”.
 Ora, atenta a natureza instrumental da fiscalização concreta da 
 constitucionalidade das normas, impõe-se fazer uma prévia delimitação do 
 objecto do presente recurso de constitucionalidade, de acordo com o real 
 conteúdo da fundamentação da decisão recorrida, onde se pode ler o seguinte:
 
 «[...] Resulta do preâmbulo do D.L. n.º 330/84, de 15/10, que este diploma 
 visava reparar a violação do direito de defesa na prática dos actos de 
 saneamento administrativo e discricionário de militares, devendo essa reparação 
 consistir “na outorga da faculdade de revisão da situação militar, com eventual 
 alteração da mesma, à luz da reconstituição possível da sua evolução presumível, 
 dentro de certos juízos, condicionalismos e limites realistas (mormente o facto 
 inapagável de uma década de ausência da vida militar activa), no pressuposto da 
 sua não interrupção provável, se não fora o acto de saneamento em causa”.
 Nos termos do n.º 1 do art. 1.º, este D.L. n.º 330/84 era aplicável “aos 
 militares dos quadros permanentes dos 3 Ramos das Forças Armadas afastados da 
 situação de activo ao abrigo das disposições dos DLs. n.os 178/84, de 30/4, 
 
 309/74, de 8/7, 648/74, de 2/12, 147-C/75, de 21-3 e 383/75, de 22/6”.
 Um dos efeitos da revisão da situação militar, quando deferida, consistia na 
 
 “reconstituição da carreira militar do requerente, tendo em atenção o disposto 
 nos arts. 3º e 4º - cfr. art. 2.º, al. b).
 Porém, essa reconstituição da carreira não podia, em circunstância alguma, 
 ultrapassar o posto de capitão-de-mar-e-guerra ou de coronel (cfr. n.º 2 do art. 
 
 4º.).
 Quanto aos oficiais generais, na revisão da sua situação militar não poderia, em 
 caso algum ser considerada a possibilidade de promoção ou de regresso à situação 
 de activo – cfr. n.º 1 do art. 5º.
 Em face do exposto, logo se conclui que não se verifica a alegada violação do 
 preâmbulo do D.L. n.º 330/74 nem dos seus arts. 2º, al. b) e 4º, nº 1, al. a).
 Efectivamente, não ocorre violação do preâmbulo porque este – além de ser 
 interpretado em conjunto com o articulado do diploma – não impõe que a carreira 
 militar tenha sempre de ser reconstruída, admitindo que o seja “dentro de certos 
 juízos, condicionalismos e limites realistas”. E embora o D.L. n.º 330/84 seja 
 aplicável ao recorrente, por ter sido afastado do activo ao abrigo do D.L. n.º 
 
 309/74 (cfr. transcrito n.º 1 do art. 1º), resulta claramente da conjugação do 
 art. 2º, al. b), com o art. 4º, n.º 2, que a reconstituição da carreira nunca 
 poderá ultrapassar o posto de coronel, pelo que sendo já aquele titular deste 
 posto não haverá lugar a tal reconstituição.
 Também não assiste razão ao recorrente quando invoca a violação do referido art. 
 
 4.º, n.º 2, pois nunca existiu, nem existe, qualquer posto denominado de Coronel 
 Tirocinado (cfr. Estatuto do Oficial da Força Aérea aprovado pelo Dec. n.º 
 
 377/71, de 10/9 e art. 129º do EMFAR aprovado pelo D.L. n.º 236/99, de 25-6), 
 pelo que quando a lei se refere a “Coronel” não pode deixar de abranger todos os 
 que detém este posto, como sucede com o recorrente.
 Quanto à violação do art. 6.º, não se vê, em face da alegação do recorrente, 
 como ela se poderá verificar, sendo certo que esse preceito não é aplicável à 
 sua situação (que não regressou “à efectividade de serviço na situação de 
 activo”) nem dele resulta a existência de vagas para oficiais licenciados.
 No que concerne à violação dos aludidos arts. 101º, nº 1, 129º, nº 4  e 246º, 
 entendemos que também não se verifica, pois a circunstância de o recorrente 
 estar habilitado com curso que constituía condição para o exercício das funções 
 inerentes à categoria de oficial general ou de dever ser designado por coronel 
 tirocinado é completamente irrelevante para a decisão, dado que o posto que 
 detinha era o coronel, estando, por isso, abrangido pela limitação estabelecida 
 pelo citado art. 4º, nº 2.
 Finalmente, quanto à violação do art. 13.º da CRP, invocada com o fundamento que 
 ficou referido, afigura-se-nos que também não ocorre, visto não estar 
 demonstrado que o recorrente tenha sido o “único discriminado”, sendo certo que, 
 em face do que dispõem os arts. 4º, n.º 2, e 5º, do D.L. n.º 330/84, a 
 reconstituição de carreira militar não abrange os oficiais generais nem todos 
 aqueles que detinham os postos de coronel e capitão-de-mar-e-guerra.
 Assim sendo, improcedem todas as conclusões da alegação do recorrente, o que 
 implica que se negue provimento ao presente recurso jurisdicional, com a 
 consequente confirmação da sentença recorrida [...]»
 O aludido n.º 2, do artigo 4.º, do Decreto-Lei n.º 330/84, de 15 de Outubro, 
 dispõe que a reconstituição da carreira – nomeadamente dos militares 
 discricionariamente afastados da situação de activo ao abrigo do Decreto-Lei 
 n.º 309/74, de 8 de Julho – não pode, em circunstância alguma, ultrapassar o 
 posto de capitão-de-mar-e-guerra ou de coronel. 
 Esta foi precisamente a disposição legal que fundamentou a improcedência do 
 pedido de condenação da entidade recorrida na reconstituição da carreira militar 
 do demandante.                                                                   
 
                  
 Para esse efeito, o tribunal recorrido entendeu, à luz da referida disposição 
 legal, que o recorrente não tinha direito à reconstituição da sua carreira uma 
 vez que não podendo esta ultrapassar o posto de coronel ele já era titular desse 
 posto na hierarquia militar da Força Aérea, sendo irrelevante o facto de estar 
 habilitado com curso que constituía condição para o exercício das funções 
 inerentes à categoria de oficial general (designadamente o curso de altos 
 comandos da Força Aérea previsto no artigo 101.º, n.º 1, do Estatuto do Oficial 
 da Força Aérea, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 377/71, de 10 de Setembro).        
 
               
 
  O objecto do presente recurso de constitucionalidade não se pode estender a 
 outras realidades normativas que não foram apreciadas pelo tribunal recorrido, 
 nomeadamente o alegado preenchimento pelo recorrente de todas as condições 
 legalmente exigidas para a promoção a brigadeiro, devendo cingir-se à sua ratio 
 decidendi. 
 Por isso, o objecto do presente recurso de constitucionalidade restringir-se-á à 
 fiscalização da constitucionalidade da norma constante do artigo 4.º, n.º 2, do 
 Decreto-Lei n.º 330/84, de 15 de Outubro, na interpretação segundo a qual não há 
 lugar à reconstituição da carreira militar, nos termos deste diploma, quando o 
 interessado é já coronel habilitado com o curso de altos comandos da Força 
 Aérea.
 
  
 
 2. Do mérito do recurso
 
 2.1. Enquadramento da questão
 O presente recurso versa a constitucionalidade do regime jurídico aprovado pelo 
 Decreto-Lei n.º 330/84, de 15 de Outubro, na parte respeitante à reconstituição 
 de carreira de alguns militares que foram compulsivamente afastados da situação 
 de activo após a Revolução de 25 de Abril de 1974.
 Na sequência desta Revolução, o Programa do Movimento das Forças Armadas 
 Portuguesas, constante da Lei n.º 3/74, de 14 de Maio, aprovada pela Junta de 
 Salvação Nacional, pugnava pela adopção imediata de medidas para a 
 
 “reorganização e saneamento das formas armadas e militarizadas”.
 Em conformidade com o referido instrumento pré-constitucional, a Junta de 
 Salvação Nacional decretou a possibilidade dela própria determinar a passagem à 
 reserva dos militares que não oferecessem garantia de isenção política e 
 competência profissional por simples despacho (artigo 1.º, do Decreto-Lei n.º 
 
 178/74, de 30 de Abril).
 Posteriormente, o Conselho dos Chefes de Estado-Maior das Forças Armadas, “tendo 
 em vista assegurar, imediatamente, uma reestruturação da cadeia de comando por 
 forma a que ela seja eficiente, dinâmica e correspondente aos legítimos anseios 
 da dignificação da função militar”, determinou, entre outras medidas, a 
 
 “elaboração, para cada posto, de listas ordenadas, com base numa votação 
 secreta, de oficiais que devem passar à situação de reserva”, a sancionar pelos 
 respectivos Chefes de Estado-Maior (artigo 1.º, n.º 1, alínea b), e n.º 2, do 
 Decreto-Lei n.º 309/74, de 8 de Julho).
 Mais tarde, o Conselho da Revolução previu a possibilidade dele próprio ordenar 
 a passagem à reserva dos militares que não dessem garantia de fidelidade aos 
 princípios definidos no Programa do Movimento das Forças Armadas (artigo 1.º, do 
 Decreto-Lei n.º 147-C/75, de 21 de Março).
 O Recorrente passou compulsivamente à reserva, durante o ano de 1974, no posto 
 de coronel da Força Aérea, após ter sido incluído numa das listas elaboradas ao 
 abrigo do disposto no acima referido Decreto-Lei n.º 309/74, de 8 de Julho.
 O Decreto-Lei n.º 383/75, de 22 de Julho, veio a conceder o direito à pensão e 
 a passagem ao quadro de complemento, com direito a indemnização a todos os 
 militares que haviam passado à reserva compulsivamente nos termos dos diplomas 
 acima referidos.
 E, passada quase uma década, o legislador ordinário entendeu que “dez anos 
 volvidos sobre o período imediatamente posterior a 25 de Abril de 1974, é 
 possível um juízo distanciado e sereno sobre actos que, justificados pelos seus 
 autores numa perspectiva revolucionária, carecem de justificação à luz dos 
 direitos fundamentais que precisamente a revolução consagrou e hoje constituem 
 património inalienável dos Portugueses. 
 Estão nesse caso os actos de saneamento administrativo e discricionário de 
 militares a quem não foi reconhecido o direito de defesa ou sequer de prévia 
 audição. 
 Há que, embora tardiamente, reparar essa violação de um direito fundamental tão 
 caro à civilização de que Portugal se orgulha, tanto mais que, noutros domínios, 
 idênticas reparações foram sendo efectivadas. 
 A reparação consiste, em sucinto resumo, na outorga da faculdade de revisão da 
 situação militar, com eventual alteração da mesma, à luz da reconstituição 
 possível da sua evolução presumível, dentro de certos juízos, condicionalismos e 
 limites realistas (mormente o facto inapagável de uma década de ausência da vida 
 militar activa), no pressuposto da sua não interrupção provável, se não fora o 
 acto de saneamento em causa. 
 O processo de solução do problema não cria mecanismos e procedimentos de 
 excepção, seguindo ao contrário trâmites idênticos aos estabelecidos nos 
 estatutos e regulamentos militares.”(preâmbulo do Decreto-Lei n.º 330/84, de 15 
 de Outubro).
 Neste espírito de reparação da danos injustamente causados, o Decreto-Lei n.º 
 
 330/84, de 15 de Outubro, veio reconhecer aos militares dos quadros permanentes 
 dos três ramos das Forças Armadas afastados da situação do activo ao abrigo dos 
 diplomas acima referidos, incluindo o Decreto-Lei n.º 309/74, de 8 de Julho, a 
 faculdade de requererem a revisão da sua situação militar, com vista à sua 
 eventual alteração com reconstituição da respectiva carreira (artigo 1.º, n.º 
 
 1).
 Na verdade, entre os diversos efeitos da revisão da situação militar dos 
 militares saneados, foi prevista a reconstituição da carreira militar (artigo 
 
 2.º, b)).
 Porém, nos termos do artigo 4.º, n.º 2, deste diploma, a reconstituição da 
 carreira não podia, em circunstância alguma, ultrapassar – no caso da Força 
 Aérea – o posto de coronel.
 No caso concreto, esta norma foi interpretada pelo tribunal a quo no sentido de 
 que não podendo nunca a reconstituição de carreira ultrapassar o posto de 
 coronel, não há lugar a tal reconstituição na circunstância de o interessado ser 
 já coronel da Força Aérea habilitado com o curso de altos comandos da Força 
 Aérea.
 Não cabe na economia do recurso de constitucionalidade aferir da bondade da 
 referida interpretação normativa no plano meramente infra-constitucional.
 A intervenção do Tribunal Constitucional justifica-se porque o Recorrente 
 sustenta que esta interpretação normativa viola o princípio constitucional 
 estruturante da igualdade, consagrado no artigo 13.º, n.º 1, da Constituição. 
 No essencial, o Recorrente entende que a interpretação normativa sob análise, na 
 medida em que impede a reconstituição de carreira a todos os coronéis saneados, 
 sem qualquer excepção, “viola o princípio da igualdade, na vertente de proibição 
 do arbítrio” por duas razões: 
 
 1.ª) por um lado, a mesma interpretação normativa conduz a que apenas uma parte 
 dos militares da Força Aérea saneados – a saber, os militares de posto inferior 
 a coronel –  tem direito à reconstituição da respectiva carreira (tratamento 
 diferente de situações iguais);
 
 2.ª) por outro lado, essa interpretação normativa permite que um coronel da 
 Força Aérea que se encontra habilitado com o curso de promoção a oficial 
 general, seja tratado da mesma forma que os coronéis que ainda não têm esse 
 curso (tratamento igual de situações diferentes).
 
  
 
 2.2. A reconstituição da carreira
 No essencial, através da aprovação do Decreto-Lei n.º 330/84, de 15 de Outubro, 
 o legislador ordinário pretendeu reparar os militares que haviam sido objecto de 
 actos de afastamento compulsivo da situação de activo, mediante a revisão da sua 
 situação militar, com eventual reconhecimento do direito à reconstituição da sua 
 carreira, de modo a colocá-los na posição em que se encontrariam se não 
 tivessem sido passados compulsivamente à reserva.
 Esta solução de reconstituição de carreira, como forma de reparação, não 
 constitui nenhuma originalidade no seio do ordenamento jurídico português.
 A reconstituição da carreira constitui um efeito jurídico transversal às 
 relações de emprego público e privado, que se revela maxime quando a carreira de 
 um funcionário ou de um trabalhador é interrompida nas situações de invalidade 
 das penas de demissão ou de ilicitude de despedimentos. 
 Há muito que é reconhecido aos funcionários públicos, em caso de declaração 
 judicial da invalidade da pena disciplinar de demissão ou de revisão procedente 
 do processo disciplinar, o direito à reconstituição da carreira ou da situação 
 jurídico-funcional actual hipotética, com consideração das expectativas 
 legítimas de promoção que não se efectivaram por efeito da punição (Vide o 
 artigo 85.º, n.º 6, do Estatuto Disciplinar dos Funcionários e Agentes da 
 Administração Central, Regional e Local, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 191-D/79, 
 de 25 de Junho; o artigo 83.º, n.º 6, do Estatuto Disciplinar dos Funcionários e 
 Agentes da Administração Central, Regional e Local, aprovado pelo Decreto-Lei 
 n.º 24/84, de 16 de Janeiro; o artigo 173.º, n.os 1 e 4 do CPTA, aprovado pela 
 Lei n.º 15/2002, de 22 de Fevereiro; os artigos 64.º, n.º 1, al. c), e 77.º, 
 n.º 4, al. a), do Estatuto Disciplinar dos Trabalhadores da Função Pública, 
 aprovado pela Lei n.º 58/2008, de 9 de Setembro).
 O mesmo efeito jurídico é reconhecido no âmbito das relações jurídico-laborais 
 de direito privado quando à declaração judicial da invalidade do despedimento é 
 associado o direito do trabalhador à reintegração na empresa no respectivo cargo 
 ou posto trabalho e com a antiguidade que lhe pertencia (Vide o artigo 12.º, n.º 
 
 2, do Decreto-Lei n.º 372-A/75, de 16 de Julho; o artigo 13.º, n.º 1, al. b), do 
 Decreto-Lei n.º 64-A/89, de 27 de Fevereiro; o artigo 436.º, n.º 1, al. b), do 
 Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 99/2003, de 27 de Agosto; o artigo 
 
 389.º, n.º 1, al. b), do Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 
 de Fevereiro).
 A reconstituição de carreiras passa, necessariamente, como ensina A,, pela 
 operação intelectual que consiste na “tentativa de apurar de que maneira teria a 
 carreira do funcionário público evoluído sem o acto anulado, para o que deve 
 atender às circunstâncias que existiam e às normas que se encontravam em vigor 
 em cada momento a que teria correspondido cada passo dessa evolução” (in 
 
 “Anulação de actos administrativos e relações jurídicas emergentes”, pág. 523, 
 da ed. de 2002, da Almedina).
 Nas palavras do próprio legislador do Decreto-Lei n.º 330/84, de 15 de Outubro, 
 o processo de reconstituição de carreira dos militares abrangidos por este 
 diploma “não cria mecanismos e procedimentos de excepção, seguindo ao contrário 
 trâmites idênticos aos estabelecidos nos estatutos e regulamentos militares” 
 
 (Preâmbulo e artigo 3.º, n.º 1, alínea a)), sendo as promoções e mudanças de 
 situação decididas pelo Chefe do Estado-Maior de cada ramo das Forças Armadas 
 
 (artigo 3.º, n.º 2).
 Em geral, a revisão da situação militar, quando deferida, implica a 
 reconstituição da carreira militar do requerente, a qual, tendo sempre em 
 consideração a respectiva idade, faz-se por referência à carreira dos militares 
 
 à sua esquerda à data em que mudou de situação e que foram normalmente 
 promovidos aos postos imediatos (artigo 4.º, n.º 1, proémio).
 Para esse efeito, o legislador teve de regular expressamente, pelo menos, duas 
 situações particulares respeitantes aos militares colocados compulsivamente na 
 situação de reserva:
 
 - O militar que regressar à situação do activo reocupará o seu lugar na escala 
 do respectivo quadro, depois de ter realizado com aproveitamento os cursos, 
 concursos, estágios ou tirocínios que constituam condição de promoção aos postos 
 por que transita ou a que ascende (artigo 4.º, n.º 1, al. a);
 
 - O militar que permanecer na situação de reserva fora da efectividade de 
 serviço, a seu pedido ou por ter atingido o limite de idade estabelecido para o 
 seu posto e quadro, é considerado como satisfazendo todas as condições especiais 
 de promoção, com excepção dos cursos que constituam condição de acesso a oficial 
 
 (artigo 4.º, n.º 1, al. b).
 Relativamente aos referidos militares que regressem à efectividade de serviço 
 na situação de activo, os mesmos são considerados na situação de 
 supranumerários permanentes até que por razões de idade, transitem para as 
 situações de adido ao quadro ou de reserva, ou solicitem a passagem a esta 
 
 última situação (artigo 6.º).
 
  
 
 2.3. A limitação à reconstituição da carreira militar
 O direito de reconstituição da carreira regulado no Decreto-Lei n.º 330/84, de 
 
 15 de Outubro, contém uma limitação, nada despicienda, que originou precisamente 
 o presente recurso: a reconstituição de carreira não pode, em circunstância 
 alguma ultrapassar o posto de capitão-de-mar-e-guerra ou de coronel (artigo 
 
 4.º, n.º 2).
 A referida limitação é ainda complementada pela impossibilidade de promoção ou 
 de regresso à situação de activo dos oficiais generais (artigo 5.º, n.º 2, 2.ª 
 parte). 
 O legislador ordinário, nomeadamente no preâmbulo do diploma não justificou 
 especificamente a limitação introduzida na reconstituição de carreira dos 
 oficiais saneados no artigo 4.º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 330/84, de 15 de 
 Outubro, tendo apenas dito, duma forma genérica, que a possibilidade dessa 
 reconstituição era consagrada dentro de certos juízos, condicionalismos e 
 limites realistas (mormente o facto inapagável de uma década de ausência da vida 
 militar activa).
 
  Por seu turno, a entidade administrativa recorrida identifica uma razão 
 fundamental, assente em dois pressupostos cumulativos, para a existência da 
 referida limitação em matéria de reconstituição de carreira: a promoção ao 
 posto de brigadeiro não era automática, na medida em que, para além do 
 preenchimento das condições gerais e especiais de promoção, dependia da 
 existência de vaga no posto de brigadeiro e era efectuada por escolha.
 Para se compreender melhor o alcance destas razões, importa descrever, de forma 
 sintética, como estava organizado hierarquicamente o ramo da Força Aérea nas 
 categorias de oficiais e, sobretudo, como se processava a promoção dos coronéis 
 desse ramo militar no período compreendido entre a passagem do recorrente à 
 situação de reserva e a entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 330/84, de 15 de 
 Outubro.
 Nos termos do artigo 6.º, n.º 1, do Estatuto do Oficial da Força Aérea (EOFA), 
 aprovado pelo Decreto-Lei n.º 377/71, de 10 de Setembro, que reproduz, no 
 essencial, o artigo 22.º do Estatuto dos Oficiais das Forças Armadas (EOFAR), 
 aprovado pelo Decreto-Lei n.º 46 672, de 29 de Novembro de 1965, a pretensão de 
 promoção do Recorrente ocorre por referência a um quadro hierárquico em que os 
 oficiais da Força Aérea se encontram agrupados nas seguintes categorias e postos 
 por ordem crescente: 
 a) Subalternos: Alferes, Tenente; 
 b) Capitães: Capitão; 
 c) Oficiais superiores: Major, Tenente-coronel, Coronel; 
 d) Oficiais generais: Brigadeiro, General (de três estrelas), General de quatro 
 estrelas, e Marechal da Força Aérea.
 A promoção dos coronéis ao posto mais baixo da categoria dos oficiais generais 
 
 (brigadeiro) processava-se então por escolha, feita, em relação a cada 
 vacatura, entre todos os coronéis que, na data em que ocorresse a vacatura 
 respeitante ao seu quadro, perfizessem as necessárias condições de promoção 
 
 (artigos 128.º, n.º 1, al. b), e 129.º, al. b), do EOFA). 
 A promoção por escolha, que consistia no acesso a posto superior, 
 independentemente da posição na escala de antiguidade, tinha em vista a 
 vantagem de acelerar a promoção dos oficiais considerados mais competentes e que 
 oferecessem maior garantia de melhor servir a Força Aérea (artigo 118.º, n.º 1, 
 al. c)). 
 A referida promoção apenas se efectuava para preenchimento de vacatura nos 
 quadros (artigo 118.º, n.º 3).
 As condições gerais de promoção a brigadeiro eram – nos termos do artigo 135.º 
 do EOFA – as seguintes:
 
 - Bom comportamento militar e civil e perfeito espírito militar;
 
 - Boas qualidades morais;
 
 - Qualidades pessoais, intelectuais e profissionais necessárias para o 
 desempenho das funções do posto imediato;
 
 - Aptidão física adequada.
 As condições especiais de promoção a brigadeiro no quadro de intendência e 
 contabilidade (quadro a que pertencia o Recorrente) eram – nos termos do artigo 
 
 157.º, al. f), do EOFA – as seguintes:
 
 - Quinze anos de tempo mínimo de serviço contados a partir da promoção a 
 tenente;
 
 - Dois anos de tempo de permanência no posto de coronel,
 
 - Ter exercido, no posto de coronel ou no de tenente-coronel, com reconhecida 
 competência, pelo prazo mínimo de um ano, funções de direcção em órgãos 
 privativos de serviços;
 
 - Ter frequentado com aproveitamento o curso de altos comandos da Força Aérea.
 Interessa precisar o alcance da frequência com aproveitamento do curso de altos 
 comandos da Força Aérea – desde logo porque o mesmo assume uma relevância 
 fundamental na argumentação aduzida pelo Recorrente.
 Nos termos do n.º 1, do artigo 101.º, n.º 1, do EOFA, a habilitação com o curso 
 de altos comandos da Força Aérea constituía, como regra, condição para o 
 exercício das funções inerentes à categoria de oficial general dos respectivos 
 quadros.
 A nomeação para a frequência do referido curso de promoção era feita anualmente, 
 por escolha, em separado para cada quadro, entre todos os coronéis (artigo 
 
 101.º, n.º 2).
 Tendo em atenção as vagas de oficial general que se previssem vir a ocorrer e a 
 conveniência do serviço, o Conselho Superior da Aeronáutica propunha o número de 
 oficiais de cada quadro que deviam ser nomeados para a frequência do referido 
 curso de promoção e elaborava a lista dos elegíveis, pela ordem votada, e dos 
 que não deviam ser designados, as quais eram submetidas à apreciação do 
 Secretário de Estado da Aeronáutica para efeito de homologação (artigo 101.º, 
 n.º 3).
 A promoção ao posto de brigadeiro começou por ser da competência do Conselho 
 Superior da Defesa Nacional, após audição do Conselho Superior da Aeronáutica 
 
 (artigo 128.º, n.º 2).
 A seguir à Revolução de 25 de Abril, essa promoção passou a ser feita, pelos 
 Chefes dos Estados-Maiores das Forças Armadas (artigo 3.º, do citado Decreto-Lei 
 n.º 309/75, e artigo 9.º, al. j), do Decreto-Lei n.º 400/74, de 29 de Agosto).
 Posteriormente, a referida promoção continuou a ser efectuada por deliberação 
 do Conselho dos Chefes de Estado-Maior, com necessidade de confirmação do 
 Conselho Superior de Defesa Nacional (artigo 28.º, n.º 2, da Lei de Defesa 
 Nacional e das Forças Armadas, aprovada pela Lei n.º 29/82, de 11 de Dezembro). 
 Não se atenderá aqui, desde logo, porque não são aplicáveis ao período sob 
 análise, aos ulteriores regimes de promoção constantes dos Estatutos dos 
 Militares das Forças Armadas aprovados pelo Decreto-Lei n.º 34-A/90, de 24 de 
 Janeiro, e pelo Decreto-Lei n.º 236/99, de 25 de Junho. 
 Todavia, como se referiu atrás, para efeito de aplicação do Decreto-Lei n.º 
 
 330/84, de 15 de Outubro, as promoções e mudanças de situação são decididas 
 exclusivamente pelo Chefe do Estado-Maior de cada ramo das Forças Armadas 
 
 (artigo 3.º, n.º 2).
 Analisado o processamento da promoção dos coronéis da Força Aérea no período 
 compreendido entre a passagem do recorrente à situação de reserva e a entrada em 
 vigor do Decreto-Lei n.º 330/84, de 15 de Outubro, importa agora verificar as 
 razões aventadas pela entidade recorrida para a consagração da limitação contida 
 no n.º 2, do artigo 4.º, deste diploma. 
 Em primeiro lugar, a alegada exigência de abertura de vaga no posto de 
 brigadeiro não constitui justificação material bastante para a limitação da 
 promoção dos coronéis sob análise, na medida em que a reconstituição de carreira 
 dos militares saneados prevista no Decreto-Lei n.º 330/84, de 15 de Outubro, se 
 faz por referência à carreira dos militares à sua esquerda à data em que mudou 
 de situação e que foram normalmente promovidos aos postos imediatos, sendo que a 
 promoção por simples antiguidade também apenas tem lugar para preenchimento de 
 vacatura (artigos 4.º, n.º 1, proémio, e 6.º, do Decreto-Lei n.º 330/84, de 15 
 de Outubro, e artigo 118.º, n.º 3, do EOFA).
 Uma vez verificada a existência de vaga no posto pretendido de que o militar 
 saneado poderia ter beneficiado por referência à carreira dos militares à sua 
 esquerda, a mesma torna-se depois um aspecto secundário uma vez que todos os 
 militares que regressem à efectividade de serviço na situação de activo são 
 considerados na situação de supranumerário permanente até passarem novamente à 
 situação de reserva (artigo 6.º, do Decreto-Lei n.º 330/84, de 15 de Outubro).
 Assim, em princípio, se um militar posicionado imediatamente à esquerda de um 
 militar saneado tiver sido ulteriormente promovido ao posto imediato, haverá 
 também lugar à promoção do militar saneado a esse posto, não sendo, pois, a 
 necessidade de abertura de vaga que explica a consagração da limitação aqui em 
 causa.
 Importa passar agora à alegada exigência da escolha como pressuposto específico 
 do procedimento de promoção de coronel ao posto de brigadeiro.
 Conforme se avançou atrás, a promoção por escolha consiste no acesso a posto 
 superior, independentemente da posição na escala de antiguidade, tendo em vista 
 a vantagem de acelerar a promoção dos oficiais considerados mais competentes e 
 que ofereçam maior garantia de melhor servir a Força Aérea (artigo 118.º, n.º 1, 
 al. c), do EOFA).
 A promoção de um coronel ao posto de brigadeiro não se trata de uma promoção 
 automática, baseada na mera antiguidade, mas de uma promoção também assente no 
 mérito, que se evidencia, desde logo, pela exigência cumulativa do exercício 
 com reconhecida competência de funções de direcção no posto de coronel e da 
 frequência com aproveitamento de um curso de promoção destinado a exercer um 
 inequívoco papel selectivo nas promoções a oficial general.
 Nestas situações, em que a promoção ocorre por escolha, a possibilidade de 
 reconstituição da carreira suscita naturais duvidas, atenta a dificuldade de 
 formular um juízo de prognose póstuma no sentido da previsibilidade da efectiva 
 escolha de um determinado coronel para efeito de promoção ao posto de brigadeiro 
 
 (vide, sobre esta questão, com posições não coincidentes, FREITAS DO AMARAL, em 
 
 “A execução das sentenças dos tribunais administrativos”, pág. 93-95, ed. 1967, 
 das Edições Ática, e A., na ob. cit., pág. 528-529).
 Contudo, o critério da reconstituição consagrado no diploma em análise, evita 
 estas dificuldades, uma vez que prescinde de qualquer juízo de mérito relativo, 
 bastando que o oficial-referência, situado na escala à sua esquerda, à data do 
 saneamento, haja sido normalmente promovido, independentemente da modalidade de 
 promoção desse militar ou daquela que caberia ao interessado (neste sentido se 
 pronunciou o Supremo Tribunal Administrativo em vários acórdãos. Por todos vide 
 o acórdão de 10-8-1987, publicado nos Apêndice do D.R. de 20-4-1994).
 Não é, pois, esta modalidade de promoção que justifica a limitação estabelecida 
 no n.º 2, do artigo 4.º, do Decreto-Lei n.º 330/84, de 15 de Outubro, até porque 
 a mesma também vigorava na promoção a postos inferiores aos dos oficiais 
 generais, como sucedia com as promoções a major (artigo 128.º, n.º 1, alínea e) 
 do EOFA), o que não impediu o legislador de permitir a reconstituição da 
 carreira até este posto.
 A limitação consagrada no n.º 2, do artigo 4.º, do Decreto-Lei n.º 330/84, de 15 
 de Outubro, parece, pois, ter razões diferentes daquelas que foram apontadas 
 pela entidade recorrida.
 O legislador apenas admitiu a reconstituição possível das carreiras militares 
 interrompidas pelos actos de saneamento, num juízo de evolução previsível, 
 tendo, por isso, consagrado limites a essa reconstituição que apelidou de 
 realistas.
 Daí que as promoções ficcionadas até aos postos de capitão-de-mar-e- guerra e de 
 coronel se fizessem por referência à carreira dos militares à esquerda do 
 requerente à data do seu saneamento e que foram normalmente promovidos aos 
 postos imediatos.
 
 É apenas o percurso normal na carreira que se pode presumir que teria ocorrido, 
 caso esta não tivesse sido interrompida pelo acto de saneamento, que é possível 
 reconstituir.
 Ora, foi o facto de não integrar o percurso normal da carreira  militar  a 
 ascensão à categoria de oficiais generais, atenta a excepcionalidade do ingresso 
 nestes lugares de topo, que determinou o legislador a impor, por um lado, que a 
 reconstituição da carreira militar não pudesse, em circunstância alguma, 
 ultrapassar o posto de capitão-de-mar-e-guerra ou de coronel (artigo 4.º, n.º 2) 
 e por outro a proibir a possibilidade de promoção dentro da categoria dos 
 oficiais generais (artigo 5.º, n.º 1).
 Além disso, e duma forma decisiva, ter-se-á entendido que a relevância destes 
 postos na hierarquia militar exigia uma escolha pessoal, efectiva e feita no 
 momento, não podendo resultar de um juízo de prognose póstuma, apoiado num 
 critério de normalidade.
 Daí que noutras situações em que o legislador sentiu a necessidade de proceder à 
 reconstituição de carreiras militares, tenha consagrado igual limitação, como 
 sucedeu com a Lei n.º 43/99, de 11 de Junho, que determinou a revisão da 
 situação dos militares dos quadros permanentes dos três ramos das Forças Armadas 
 que participaram na transição para a democracia iniciada em 25 de Abril de 1974 
 e, em consequência do seu envolvimento directo no processo político desencadeado 
 pelo derrube da ditadura, foram afastados ou se afastaram ou cuja carreira foi 
 interrompida ou sofrido alteração anómala. Também aí se dispôs que “a 
 reconstituição da carreira não pode ultrapassar o posto de 
 capitão-de-mar-e-guerra ou de coronel” (artigo 6.º, n.º 2).
 
  
 
 2.4. O princípio da igualdade
 Como tem referido o Tribunal Constitucional «o princípio da igualdade abrange 
 fundamentalmente três dimensões ou vertentes: a proibição do arbítrio, a 
 proibição de discriminação e a obrigação de diferenciação, significando a 
 primeira a imposição da igualdade de tratamento para situações iguais e a 
 interdição de tratamento igual para situações manifestamente desiguais (...); a 
 segunda, a ilegitimidade de qualquer diferenciação de tratamento baseada em 
 critérios subjectivos (v.g., ascendência, raça, língua, território de origem, 
 religião, convicções políticas ou ideológicas, instrução, situação económica ou 
 condição social) e, a última surge como forma de compensar as desigualdades de 
 oportunidades.» (Acórdão nº 412/2002, acessível em 
 
 www.tribunalconstitucional.pt).
 No caso concreto, o Recorrente convoca a vertente da proibição do arbítrio.
 
 “A interdependência de planos que a estrutura do princípio da igualdade exige 
 implica…que o critério que serve de base ao juízo de qualificação da igualdade 
 encontre a sua justificação no fim a atingir com o tratamento jurídico. E para 
 que tal aconteça a conexão entre o critério e o fim tem de ser razoável e 
 suficiente. Isto quer dizer que o princípio da igualdade não orienta, em 
 concreto, a opção por um ou outro critério valorativo, mas exige que o critério 
 escolhido encontre uma justificação razoável e suficiente no fim ou na ratio do 
 tratamento jurídico” (MARIA GLÓRIA GARCIA em “Princípio da igualdade: fórmula 
 vazia ou fórmula “carregada” de sentido”, em “Estudos sobre o princípio da 
 igualdade”, pág. 56, da ed. de 2005, da Almedina):
 E nessa matéria , o Acórdão n.º 69/2008 (acessível em 
 
 www.tribunalconstitucional.pt)  acrescentou que:
 
 «… a propósito do princípio da proibição do arbítrio, decorrente do nº 1 do 
 artigo 13º da CRP, tem sempre sublinhado o Tribunal duas ideias essenciais que 
 importa agora recordar. Antes do mais, que não estão aqui em causa – que não 
 podem estar aqui em causa – ‘juízos’ sobre a bondade das soluções legislativas; 
 depois, que proibindo a Constituição neste domínio apenas «as diferenciações de 
 tratamento sem fundamento material bastante, que o mesmo é dizer sem qualquer 
 justificação razoável, segundo critérios de valor constitucionalmente 
 relevantes» (Acórdão nº 39/88, in AcTC, 11º vol., pp. 233 e ss.), deve 
 descobrir-se a ratio das disposições em causa, para, a partir dessa mesma ratio, 
 se poder avaliar se as mesmas possuem ou não uma «fundamentação razoável» 
 
 (Acórdão nº 232/2003 e doutrina aí citada: AcTC, 56º vol., p. 39).»
 Por outro lado, como ensinam J. J. GOMES CANOTILHO/VITAL MOREIRA (in 
 Constituição da República Portuguesa Anotada, vol. I, pág. 399, da 4.ª Edição 
 revista, da Coimbra Editora), importa ter presente que:
 
 «(...) a vinculação jurídico-material do legislador ao princípio da igualdade 
 não elimina a liberdade de conformação legislativa, pois a ele pertence, dentro 
 dos limites constitucionais, definir ou qualificar as situações de facto ou as 
 relações da vida que hão-de funcionar como elementos de referência a tratar 
 igual ou desigualmente. Só quando os limites externos da “discricionariedade 
 legislativa” são violados, isto é, quando, a medida legislativa não tem adequado 
 suporte material, é que existe uma “infracção” do princípio do arbítrio.»
 A interpretação normativa aqui sindicada afirma que não há lugar à 
 reconstituição da carreira militar, nos termos do Decreto-Lei n.º 330/84, de 15 
 de Outubro, quando o interessado é já coronel habilitado com o curso de altos 
 comandos da Força Aérea.
 O Recorrente alega que estamos perante um tratamento diferenciado de situações 
 iguais, porque assim, de entre todos os militares saneados na sequência da 
 revolução de 25 Abril de 1974, apenas os militares de posto inferior ao de 
 coronel (no que respeita à Força Aérea) têm direito à reconstituição da 
 respectiva carreira.
 Apesar da impossibilidade da reconstituição da carreira acima do posto de 
 coronel afectar todos os militares, independentemente do posto que tinham no 
 momento em que foram saneados, é verdade que o tratamento jurídico, na óptica da 
 decisão recorrida, escolhido pelo legislador para reparar a situação dos 
 militares saneados após a Revolução de 25 de Abril de 1974, constituído pela 
 reconstituição da sua carreira, apenas beneficia os militares com uma patente 
 inferior à de coronel. Enquanto estes dispõem de uma margem de progressão até 
 este posto, os que já eram coronéis ou oficiais generais quando foram saneados, 
 não usufruem desta medida reparadora.
 Contudo, não se pode qualificar esta distinção como arbitrária.
 Em primeiro lugar, a mesma é coerente, suficiente e razoável, relativamente às 
 razões que motivaram o legislador a impedir o acesso à categoria de oficial 
 general através da reconstituição da carreira militar, como forma de reparação 
 de acto de saneamento injusto.
 Na verdade, ela encontra uma justificação adequada, no facto da promoção de um 
 coronel da Força Aérea à categoria dos oficiais generais constituir um acesso 
 aos postos de topo da hierarquia militar, não podendo ser encarada como um passo 
 
 “normal” da carreira militar.
 
 É certo que o Recorrente realça que essa distinção deixa de ter sentido, 
 relativamente aos coronéis que já se encontram habilitados com o curso de altos 
 comandos da Força Aérea, uma vez que o procedimento de escolha para efeito de 
 promoção de um coronel à categoria de oficial general não começa na selecção dos 
 coronéis que já reúnam as necessárias condições de promoção, incluindo a 
 habilitação com o curso de promoção, mas sim na nomeação e ordenação prévias 
 dos coronéis que vão frequentar aquele curso, atendendo ao número previsível de 
 vagas que venham a ocorrer, bem como pelo afastamento antecipado dos coronéis 
 que não devem sequer ser designados para o mesmo efeito e daqueles que não 
 obtiveram aproveitamento no curso de promoção (artigos 101.º, n.os 2 e 3, e 105, 
 n.º 2, do EOFA).
 Mas, mesmo que se considerasse, o que não é certo, que, concluído esse curso, a 
 promoção a brigadeiro constitui um procedimento normal na carreira militar, 
 sempre aquela distinção encontraria justificação suficiente na ideia de que a 
 importância na hierarquia militar dos postos da categoria dos oficiais generais 
 não admite um acesso resultante de um mero juízo de prognose póstuma, apoiado 
 num critério de normalidade.
 O critério distintivo apontado tem, pois, um fundamento material bastante e o 
 mesmo não merece qualquer censura do ponto de vista constitucional.
 O Recorrente alegou ainda que estamos perante um tratamento igual de situações 
 diferentes, uma vez que a interpretação normativa aqui sob fiscalização permite 
 que um coronel da Força Aérea que já se encontra habilitado com curso de 
 promoção a oficial general, seja tratado da mesma forma que os coronéis que 
 ainda não se encontram habilitados com este curso. 
 Apesar da existência da diferença apontada entre as duas situações, a aplicação 
 do mesmo tratamento jurídico também não integra uma violação do princípio da 
 igualdade, porque essa diferença não releva, atendendo aos fins que constituem o 
 fundamento material da solução jurídica adoptada.
 Visando o legislador impedir o acesso aos postos de topo da hierarquia militar 
 através de um simples juízo de prognose póstuma com recurso a um critério de 
 normalidade, é indiferente que o interessado estivesse ou não habilitado com o 
 curso que constituía uma das várias condições de promoção.
 Se é verdade que a habilitação com esse curso colocava os interessados numa 
 posição mais próxima da promoção, esta continuava dependente da satisfação de 
 outras condições cuja verificação no entendimento do legislador não era possível 
 efectuar a posteriori num simples juízo de normalidade.
 Isto é, a razão que tinha conduzido o legislador a adoptar o limite à 
 reconstituição da carreira militar questionado, valia indistintamente para os 
 coronéis que estavam habilitados com o curso de altos comandos da Força Aérea e 
 para os que não estavam habilitados com este curso, pelo que a sua aplicação a 
 todos eles não constitui qualquer violação ao princípio da igualdade.            
 
         
 Não se verificando que a interpretação normativa aqui fiscalizada resulte numa 
 violação ao princípio da igualdade, consagrado no artigo 13.º, da C.R.P., deve o 
 recurso interposto ser julgado improcedente.
 
  
 
                                                     *
 Decisão   
 Pelo exposto, decide-se:
 a) Não julgar inconstitucional a interpretação do artigo 4.º, n.º 2, do 
 Decreto-Lei n.º 330/82, de 15 de Outubro, com o sentido de que não há lugar à 
 reconstituição da carreira militar, nos termos deste diploma, quando o 
 interessado é já coronel habilitado com o curso de altos comandos da Força 
 Aérea;
 b) e, consequentemente, negar provimento ao recurso interposto para o Tribunal 
 Constitucional por A., do acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, 
 proferido nestes autos em 30 de Outubro de 2008.
 
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 Custas pelo recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 25 unidades de conta, 
 ponderados os critérios referidos no artigo 9.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 
 
 303/98, de 7 de Outubro (artigo 6.º, n.º 1, do mesmo diploma).
 
 
 Lisboa, 4 de Fevereiro de 2010
 João Cura Mariano
 Joaquim de Sousa Ribeiro
 Benjamim Rodrigues
 Rui Manuel Moura Ramos
 
 
 
 
 
 
 
 [1] Foram rectificados vários lapsos de escrita  pelo Acórdão nº 74/2010