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Processo n.º 838/08
 
 1ª Secção
 Relator: Carlos Pamplona de Oliveira
 
 
 EM CONFERÊNCIA DA 1ª SECÇÃO ACORDAM NO TRIBUNAL CONSTITUCIONAL
 
 
 
             1. A., SA pretendeu interpor recurso para o Supremo Tribunal de 
 Justiça do acórdão da Relação do Porto que confirmou a decisão do Tribunal do 
 Trabalho da Maia que decretara a suspensão do despedimento de B.. Porém, o Juiz 
 desembargador relator não admitiu tal recurso, considerando que “nos termos do 
 artigo 40.º do C. P. Trabalho é inadmissível recurso para o S.T.J. do acórdão 
 proferido pela Relação em processo cautelar de suspensão de despedimento”.
 
  
 Desse despacho reclamou A., SA para o Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, 
 nos seguintes termos:
 
  
 
      São duas as questões sob apreciação na presente reclamação: a questão de 
 direito material e a questão de direito processual. 
 Comecemos pela primeira, por ser essa a questão de fundo, que tem 
 necessariamente de dominar a questão adjectiva ou de direito processual. 
 O acórdão proferido pela Relação do Porto, em síntese, contém e fixa a seguinte 
 doutrina: 
 
 «Ora, e atento o teor da nota de culpa atrás transcrita, não temos dúvidas em 
 afirmar que a mesma contém apenas afirmações imputações genéricas sem 
 concretizar minimamente no tempo e no espaço as circunstâncias que rodearam a 
 prática dos factos. (...) 
 Em resumo: a nota de culpa e a decisão final (esta remeteu quanto aos factos 
 para a nota de culpa) contém apenas imputações genéricas e juízos de valor, a 
 determinar, assim, a nulidade do processo disciplinar. 
 E nem se diga, como defende a recorrente, que no caso concreto o trabalhador 
 entendeu e compreendeu a acusação e dela se defendeu.» (sic.) 
 Ou seja: 
 a) a nota de culpa tem obrigatoriamente de conter uma descrição minuciosa dos 
 factos, nas circunstâncias de tempo e lugar;
 b) é irrelevante o arguido/trabalhador ter apresentado defesa, da qual demonstre 
 ter percebido claramente o teor e alcance da acusação. 
 Este acórdão contende directamente com: 
 
 1. o princípio jurídico consagrado no art. 236º, nº 1, do Código Civil;
 
 2. o princípio jurídico consagrado no art. 1930, nº 3, do Código Processo Civi1; 
 
 
 
 3. o princípio jurídico consagrado no art. 283º, nº 3, alínea b), do Código 
 Processo Penal. 
 Este último é especialmente relevante, porque em processo penal, expoente máximo 
 da acusação, a lei permite que o libelo acusatório não contenha as 
 circunstâncias de lugar, tempo e motivação da prática dos factos. 
 Sem prejuízo do exposto, o acórdão recorrido contende ainda com a jurisprudência 
 unanimemente firmada pelos Tribunais Superiores. 
 Assim:
 
 1. acórdão do STJ, de 27-02-2002, tirado no processo 497/01, publicado in 
 
 www.dgsi.pt, de que se junta cópia, o qual referencia jurisprudência em igual 
 sentido;
 
 2. acórdão do STJ, de 14-01-1986, publicado in www.dgsi.pt, e in Acórdãos 
 Doutrinais. n.º 303, p. 444: 
 
 3. acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 06-05-98, tirado no processo 
 
 9810731, publicado in www.dgsi.pt, de que se junta cópia, o qual referencia 
 jurisprudência em igual sentido; 
 
 4. acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 08-05-95, tirado no processo 
 
 9440963, in www.dgsi.pt, de que se junta cópia. 
 Ou seja, o acórdão recorrido contradiz a jurisprudência firmada nos Tribunais 
 Superiores. 
 Dessa contradição nasce a questão processual ou adjectiva: do acórdão proferido 
 pelo Tribunal da Relação cabe recurso, para o Supremo Tribunal de Justiça, nos 
 termos do nº 2, do art. 754º, do CPC. 
 Não caberia recurso, se o agravo fosse ordinário, ou seja, se a sua motivação 
 não se inserisse na norma excepcional do nº 2, do art. 754º do CPC, se não 
 contradissesse expressamente a jurisprudência, seja do STJ, seja da Relação do 
 Porto. 
 A não se entender deste modo, fere-se directamente, com esta interpretação 
 restritiva do art. 754.º, nº 2, do CPC os princípios constitucionais de 
 segurança jurídica e estabilidade das decisões judiciais.
 
  
 
             O Vice-presidente do Supremo Tribunal de Justiça indeferiu a 
 reclamação por despacho proferido em 23 de Outubro de 2008 com os seguintes 
 termos:
 
  
 Nos termos do art. 387.º-A do CPC, “das decisões proferidas nos procedimentos 
 cautelares não cabe recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, sem prejuízo dos 
 casos em que o recurso é sempre admissível”. 
 E para os procedimentos cautelares de suspensão de despedimento dispõe o art. 
 
 40.º do CPT que “da decisão final cabe sempre agravo para a Relação”. 
 Assim sendo, só cabe recurso para este Supremo Tribunal quando se verifiquem os 
 casos em que o recurso é sempre admissível, (v.g, no caso concreto, os n.ºs 2, 
 
 4, e 6 do art. 678.º do CPC). 
 Logo, em primeiro lugar, a ser admissível recurso, com base em oposição de 
 acórdãos, seria ao abrigo do art. 678.º, n.º 4, e não do art. 754.º, n.º 2, do 
 CPC, porquanto, com a introdução do art. 387.º-A pelo Decreto-Lei n.º 375-A/99 
 de 20 de Setembro, pretendeu-se restringir os recursos para este Supremo 
 Tribunal, bastando que fique assegurado o segundo grau de jurisdição. 
 Ora, a admitir-se recurso para o S.T.J., com base no referido artigo, 
 estar-se-ia a possibilitar uma situação que o referido Decreto-Lei veio impedir 
 e a desrespeitar o art. 754.º, n.º 1, do CPC onde, além do mais, se excluem do 
 
 âmbito do recurso de agravo os casos que, por força de disposição expressa da 
 lei, não admitem recurso para o S.T.J.
 E, nos termos do art. 678.º, n.º 4, do CPC, também o recurso não é admissível, 
 tendo em conta o valor do procedimento cautelar € 3740,99 (conforme se encontra 
 narrativamente certificado a fls. 37), inferior ao da alçada da Relação, e ainda 
 por não ter sido feita referência como é exigido pelo art. 687.º, n.º 1, do CPC, 
 no requerimento de interposição de recurso, ao acórdão ou acórdãos que se 
 encontram em contradição com o acórdão de que se pretende recorrer. 
 
  
 
             2. É dessa decisão que, inconformado, a reclamante pretende recorrer 
 para o Tribunal Constitucional, com fundamento no artigo 70.º, nº 1, alínea b) 
 da Lei n.º 28/82 de 15 de Novembro, para efeito de ver apreciada «a 
 interpretação restritiva dos arts. 678º, nº 4, 754.º, n.º 2, 387º-A do CPC e 
 
 40º, nº 1, do CPT, os princípios constitucionais de segurança jurídica e 
 estabilidade das decisões judiciais, ínsitos ao princípio do Estado de Direito 
 do art. 2º e art. 205º, nº 1, da Constituição da República Portuguesa, bem como 
 o princípio de acesso ao direito e aos tribunais constante do art. 20.º». 
 Acrescentou a ora recorrente que a questão da constitucionalidade levantada se 
 refere às normas processuais supra citadas, na interpretação que foi feita pelas 
 instâncias, e que vai no sentido de não permitir o recurso nas causas em que 
 esteja em discussão uma decisão judicial de um tribunal superior que contraria a 
 jurisprudência firmada pelos Tribunais de Relação e Supremo Tribunal de Justiça, 
 sobre a mesma questão de direito e sob a mesma legislação. 
 Por despacho proferido em 23 de Outubro de 2008 no Supremo Tribunal de Justiça, 
 o recurso de inconstitucionalidade foi admitido nos seguintes termos para o 
 Tribunal Constitucional: 
 
  
 A requerida A., S.A., veio interpor recurso para o Tribunal Constitucional, nos 
 termos do art. 70.º, n.º 1, alínea b), da LTC, para ver apreciada a 
 inconstitucionalidade dos arts. 678.º, n.º 4, 754.º, n.º 2, e 387.º- A do CPC e 
 também do art. 40.º, n.º 1, do CPT, por violação dos arts. 2.º, 205.º, n.º 1 e 
 
 20.º da CRP. 
 Face ao disposto no n.º 2 do art. 72.º da LTC, o recurso previsto na alínea b) 
 do n.º 1 do art. 70.º da LTC só pode ser interposto pela parte que haja 
 suscitado a questão da inconstitucionalidade “de modo processualmente adequado 
 perante o tribunal que proferiu a decisão recorrida, em termos de este estar 
 obrigado a dela conhecer”. 
 Verifica-se da reclamação apresentada que não foi suscitada a 
 inconstitucionalidade das normas constantes dos arts. 678.º, n.º 4 e 387.º- A 
 ambos do CPC e do art. 40.º, n.º 1, do CPT, por violação dos arts. 2.º, 205.º, 
 n.º 1 e 20.º da CRP e que a interpretação normativa de que foram objecto no 
 despacho que indeferiu a reclamação não apresenta qualquer surpresa, dada a 
 previsibilidade da sua aplicação ao caso. 
 E, como a jurisprudência constitucional tem acentuado, é momento inidóneo para 
 suscitar a questão da inconstitucionalidade o requerimento de interposição de 
 recurso para o Tribunal Constitucional, por, após a sua apresentação, o tribunal 
 a quo já não poder emitir juízos de inconstitucionalidade.
 Não se admite assim nesta parte o recurso interposto. 
 No que concerne ao art. 754.º, n.º 2, do CPC, cuja inconstitucionalidade também 
 se pretende ver apreciada, admite-se o recurso interposto por esta questão ter 
 sido suscitada na reclamação. 
 Com efeito, nela se disse que “a não se entender deste modo, fere-se 
 directamente, com esta interpretação restritiva do art. 754.º, n.º 2, do CPC os 
 princípios constitucionais da segurança jurídica e estabilidade das decisões 
 judiciais”. 
 Assim sendo, admite-se o recurso ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do art. 70.º, 
 da LTC, apenas para apreciação da inconstitucionalidade da referida norma, na 
 interpretação normativa que lhe foi dada na decisão que indeferiu a reclamação. 
 
  
 
  
 
 3.  Remetido o processo ao Tribunal Constitucional, foi proferida decisão 
 sumária de não conhecimento do objecto do recurso. Em suma, a decisão assentou 
 nos seguintes fundamentos: 
 
  
 
 «[...] O objecto do presente recurso cinge-se, por isso, unicamente à questão da 
 inconstitucionalidade suscitada relativamente ao disposto no artigo 754.º, n.º 2 
 do Código de Processo Civil no sentido de do acórdão proferido pelo Tribunal da 
 Relação caber recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, por o acórdão de que 
 se pretende recorrer contrariar jurisprudência firmada nos tribunais superiores 
 
 (…).
 
 É, todavia, bem certo que a decisão que indeferiu a reclamação onde é suscitada 
 a questão de constitucionalidade supra identificada – a decisão aqui recorrida – 
 não aplicou a norma contida no artigo 754.º n.º 2 do Código de Processo Civil, 
 pois ancorou a sua fundamentação no artigo 678.º do mesmo Código, nomeadamente 
 os seus n.ºs 2, 4 e 6.
 Ora, nos recursos interpostos ao abrigo do disposto na alínea b) do n.º 1 do 
 artigo 70.º da LTC, a norma cuja conformidade constitucional se visa apreciar 
 deve ter sido aplicada na decisão recorrida enquanto seu fundamento decisório, 
 pois só assim a eventual procedência do recurso teria utilidade, determinando a 
 pretendida alteração daquela decisão.
 Verificando-se, neste caso, que a norma objecto do recurso não foi aplicada na 
 decisão sob recurso, impõe-se concluir pelo seu não conhecimento. 
 
 (...) Nestes termos, e ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 78.º-A da LTC, 
 decide-se não conhecer do objecto do recurso interposto [...].»
 
  
 Sempre inconformada, a recorrente reclama para a conferência contra tal decisão 
 sumária, dizendo:
 
  
 
 [...] São fundamentos: 
 Não se discutem bagatelas no presente recurso. Discute-se uma questão estrutural 
 do Estado de Direito. O resultado dessa discussão pode dignificar o Estado 
 português ou pode demonstrar uma aparência de Estado de Direito, cujos 
 resultados terão que ser apreciados pelo Tribunal Europeu dos Direitos do Homem. 
 
 
 O cidadão que recorre aos tribunais tem o direito de exigir que o Estado lhe 
 garanta certeza na aplicação do Direito e segurança nas decisões proferidas. 
 Se não fosse assim, não se justificaria o recurso para fixação de 
 jurisprudência, como forma de dirimir decisões contraditórias dos tribunais 
 superiores. 
 Como se disse, pensa-se, com clareza, no requerimento de interposição de recurso 
 e na reclamação perante o Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, não está em 
 causa a decisão concreta, mas a questão de direito a ela subjacente. 
 Viola os Princípios da Confiança, da Segurança Jurídica e da Estabilidade das 
 Decisões Judiciais a decisão que contraria jurisprudência firmada pelo mesmo 
 tribunal superior ou da mesma categoria. 
 Na interpretação de uma mesma norma jurídica, não pode a Relação do Porto 
 decidir que é quadrado e, depois, decidir que é redondo; não pode o Supremo 
 Tribunal de Justiça decidir que é branco, para, depois, a Relação de Lisboa 
 decidir que é preto! 
 Em situações deste teor, o conflito normativo deve ser decidido de uma forma 
 uniforme. Não podem existir decisões contraditórias. 
 Esta é a questão fundamental do recurso interposto. 
 No entanto, o recurso não foi admitido por questões formais. 
 São elas duas: 
 
 1ª O recurso foi admitido no Supremo Tribunal de Justiça apenas quanto ao artigo 
 
 754°, n°2, do Código de Processo Civil; 
 
 2ª O indeferimento da reclamação não suscitou qualquer questão de 
 constitucionalidade, verificando-se, neste caso, que a norma objecto do recurso 
 não foi aplicada na decisão sob recurso. 
 Fica mal o Estado de Direito, quando o Tribunal Constitucional se estriba em 
 questões formais para impedir a discussão de uma questão fundamental de direito 
 material. 
 São essas, no entanto, as questões que devem agora ser apreciadas. 
 Quanto à primeira questão, ela está expressamente prevista e, portanto, 
 resolvida pelo nº 3, do art. 76º, da Lei do Tribunal Constitucional: «A decisão 
 que admita o recurso ou lhe determine o efeito não vincula o Tribunal 
 Constitucional e as partes só podem impugná-la nas suas alegações». 
 O objecto do recurso foi restringido no Supremo Tribunal de Justiça. 
 Foi mal restringido.
 Caberia ao Tribunal Constitucional apreciar essa questão. 
 O recorrente só poderia impugnar essa decisão em alegações. 
 Logo, o recorrente não pôde impugnar a decisão do Supremo Tribunal de Justiça, 
 mas impugná-la-ia em alegações. 
 Conclusão: o Tribunal Constitucional não tinha de aceitar como definitiva e 
 válida, tout court, a decisão do STJ, cabendo-lhe apreciar se o recurso foi bem 
 ou mal admitido, bem ou mal restringido. 
 Essa decisão do STJ tem de ser objecto de apreciação na presente reclamação, 
 devendo tê-lo sido no despacho reclamado. 
 Quanto à segunda questão, a decisão proferida (a) inverte o sentido cronológico 
 das coisas e (b) não apreciou o teor, quer do requerimento de interposição de 
 recurso, apresentado na Relação do Porto, quer da reclamação apresentada para o 
 presidente do STJ.
 Foi proferido o acórdão da Relação do Porto.
 Esse acórdão fere jurisprudência dos tribunais superiores, devidamente 
 identificada no requerimento de interposição do recurso para o STJ.
 Ora a recorrente só podia suscitar a questão da inconstitucionalidade, depois do 
 acórdão proferido.
 A recorrente não podia antecipar o teor da decisão, logo, que o acórdão da 
 Relação iria jurisprudência firmada. 
 Sendo jurisprudência firmada, era expectável precisamente o oposto, ou seja, que 
 o acórdão iria sustentar essa jurisprudência e que o recurso teria provimento. 
 Perante esse acórdão, a recorrente imediatamente levantou a questão da 
 inconstitucionalidade da decisão, em dois momentos: 
 
 1 – pelo facto da decisão contrariar a jurisprudência dos tribunais superiores, 
 logo, os  princípios constitucionais supra referidos; 
 
 2 – pelo facto da eventual não admissão de recurso ferir identicamente esses 
 princípios. 
 O recurso não foi admitido. 
 Perante esse despacho, a recorrente reclama para o Presidente do STJ e, 
 novamente, invoca a inconstitucionalidade supra referida. 
 O Vice-Presidente do STJ indefere a reclamação e não admite o recurso. 
 Dessa decisão, é interposto o actual recurso para o Tribunal Constitucional. 
 A questão da constitucionalidade foi levantada no processo, logo e imediatamente 
 após ter sido proferido o acórdão da Relação do Porto. 
 Era o primeiro e único momento em que a questão se poderia levantar. 
 Todas, mas todas as decisões proferidas após esse momento – despacho de não 
 admissão do recurso para o STJ, reclamação para o STJ, despacho de admissão do 
 recurso para o Tribunal Constitucional - apreciaram, expressa ou tacitamente, a 
 questão da constitucionalidade. 
 Consequentemente, não se entende a argumentação do despacho sob reclamação. 
 O despacho sob reclamação faz uma interpretação restritiva da alínea b), do nº 
 
 1, do art. 70º. 
 O despacho que indeferiu a reclamação «ancorou a sua fundamentação no artigo 
 
 678º do CPC, nomeadamente os seus nºs 2, 4 e 6». 
 Certo. 
 Essa norma está intimamente ligada e articulada com a do artigo 754º, nº 2. 
 Esta é a concretização formal da primeira. 
 Foi a constitucionalidade das normas do artigo 678º do CPC, nomeadamente o seu 
 nº 4, e do art. 754º, nº 2, que foi objecto de apreciação nos recursos 
 interpostos, precisamente na interpretação que as instâncias efectuaram, de 
 considerarem que não há violação dos Princípios da Confiança, da Segurança 
 Jurídica e da Estabilidade das Decisões Judiciais, logo, do Estado de Direito 
 Democrático, quando é negado o recurso para fixação de jurisprudência de um 
 acórdão que fere a jurisprudência firmada pelos tribunais superiores sobre a 
 mesma questão de direito, fazendo prevalecer a norma do art. 40º do Código de 
 Processo de Trabalho e as normas respeitantes às alçadas. 
 Em conclusão: 
 
 1º O despacho de admissão do recurso proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça 
 não vincula o Tribunal Constitucional, nos termos do art. 76º da LTC; 
 
 2º O recurso foi mal restringido; 
 
 3º A norma do art. 754º do CPC, cuja constitucionalidade, na interpretação 
 restritiva efectuada pelas instâncias, se discute, foi objecto de apreciação 
 pelas instâncias; 
 
 4ª A apreciação da constitucionalidade foi levantada atempadamente no processo 
 logo após ter sido proferido o acórdão da Relação do Porto, tendo sido recusada 
 a sua apreciação por todas as instâncias de recurso. 
 Nestes termos, deve dar-se provimento à reclamação e revogar-se o despacho 
 reclamado, substituindo-o por outro que admita o recurso interposto. 
 
  
 
  
 
 4.   A recorrida não respondeu, importando agora decidir.
 Conforme, aliás, bem detectou a reclamante, a decisão sumária ora em reclamação 
 fundamentou-se, essencialmente, em duas circunstâncias cuja evidência não é 
 desmentida: o recurso interposto tem como objecto unicamente a norma que se 
 extrai do n.º 2 do artigo 754º n.º 2 do Código de Processo Civil; tal norma não 
 foi aplicada, como ratio decidendi na decisão recorrida.
 Todavia, sustenta, em primeiro lugar, a reclamante que o Tribunal Constitucional 
 deveria ter oficiosamente sindicado o despacho que, no Supremo Tribunal de 
 Justiça, admitiu o recurso, restringindo o seu objecto à norma do n.º 2 do 
 artigo 754º n.º 2 do Código de Processo Civil; diz, para este efeito: 'o 
 Tribunal Constitucional não tinha de aceitar como definitiva e válida, tout 
 court, a decisão do STJ, cabendo-lhe apreciar se o recurso foi bem ou mal 
 admitido, bem ou mal restringido. Essa decisão do STJ tem de ser objecto de 
 apreciação na presente reclamação, devendo tê-lo sido no despacho reclamado.'
 Mas não é assim. 
 Na verdade, o que o n.º 3 do artigo 76º da LTC dispõe é que não vincula o 
 Tribunal Constitucional a decisão que admite o recurso e lhe fixa o efeito;  
 todavia, o que o reclamante pretende extrair da norma é uma determinação 
 normativa contrária, que o preceito não contém, nos termos da qual o Tribunal 
 Constitucional deveria sindicar oficiosamente o despacho que não admite o 
 recurso. Ora, o mecanismo de impugnação da decisão que – no tribunal recorrido – 
 
  não admite o recurso, subordina-se ao impulso da parte, conforme claramente 
 decorre do n.º 4 do artigo 76º e do artigo 77º da LTC. Isto é; a decisão do 
 tribunal recorrido desfavorável à pretensão do recorrente – quer quanto ao 
 indeferimento do recurso, quer quanto à sua retenção – pode ser sindicada 
 mediante reclamação do interessado, mas nunca por intervenção oficiosa do 
 Tribunal. Cabia, assim, à ora reclamante ter impugnado a decisão que não admitiu 
 o recurso quanto às normas contidas nos artigos 678º, nº 4, 387º-A do CPC e 40º, 
 nº 1, do CPT, o que não fez, deixando fixar-se na ordem jurídica tal 
 determinação.
 
             Em segundo lugar, a reclamante sustenta, em suma, que foi a 
 constitucionalidade das normas do artigo 678º do CPC, nomeadamente o seu nº 4, e 
 do art. 754º, nº 2, que foi objecto de apreciação nos recursos interpostos, 
 precisamente na interpretação que as instâncias efectuaram, de considerarem que 
 não há violação dos Princípios da Confiança, da Segurança Jurídica e da 
 Estabilidade das Decisões Judiciais, logo, do Estado de Direito Democrático, 
 quando é negado o recurso para fixação de jurisprudência de um acórdão que fere 
 a jurisprudência firmada pelos tribunais superiores sobre a mesma questão de 
 direito, fazendo prevalecer a norma do art. 40º do Código de Processo de 
 Trabalho e as normas respeitantes às alçadas.
 
             Parece estar, deste modo, a concluir que, efectivamente, a ratio 
 decidendi da decisão recorrida se objectiva em outros preceitos que não no n.º 2 
 do artigo 754º n.º 2 do Código de Processo Civil. E a verdade é que decisão 
 recorrida é bem expressa ao afirmar que 'a ser admissível recurso, com base em 
 oposição de acórdãos, seria ao abrigo do art. 678.º, n.º 4, e não do art. 754.º, 
 n.º 2, do CPC', concluindo que, para além disso, 'também o recurso não é 
 admissível, tendo em conta o valor do procedimento cautelar € 3740,99 (conforme 
 se encontra narrativamente certificado a fls. 37), inferior ao da alçada da 
 Relação, e ainda por não ter sido feita referência como é exigido pelo art. 
 
 687.º, n.º 1, do CPC, no requerimento de interposição de recurso, ao acórdão ou 
 acórdãos que se encontram em contradição com o acórdão de que se pretende 
 recorrer.' 
 Pode, por isso, concluir-se – e com toda a segurança – que a norma identificada 
 pela reclamante como objecto do recurso não constitui a ratio decidendi da 
 decisão recorrida; nenhum sentido faria um julgamento sobre a conformidade 
 constitucional da apontada norma do n.º 2 do artigo 754º n.º 2 do Código de 
 Processo Civil, se, mesmo que fosse concedido procedência ao recurso, outros 
 fundamentos da decisão recorrida permanecessem incólumes, impedindo o efeito 
 
 útil do recurso que é a sua directa repercussão na decisão recorrida. 
 Em suma, a reclamação é manifestamente improcedente.
 
  
 
 5.   Decide-se, em consequência, indeferir a reclamação, mantendo a decisão 
 sumária de não admissão conhecimento do objecto do recurso. Custas pela 
 reclamante, fixando a taxa de justiça em 20 UC.
 
  
 Lisboa, 20 de Janeiro de 2009
 Carlos Pamplona de Oliveira
 Maria João Antunes
 Gil Galvão