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Processo n.º 999/09 
 
 
 
 2.ª Secção 
 
 
 Relator: Conselheiro Benjamim Rodrigues 
 
 
 Acordam, em conferência, na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional: 
 
 
 A ? Relatório 
 
 
 
 1 ? A., melhor identificada nos autos, reclama para o Tribunal Constitucional, 
 
 ?(...) ao abrigo do disposto no n.º 3 do artigo 78.°-A da Lei n.º 28/82 (Lei 
 Tribunal Constitucional), da Decisão Sumária, que decidiu não admitir o recurso 
 de constitucionalidade por ela interposto?, reportando-se à decisão do Supremo 
 Tribunal de Justiça que não lhe admitira o recurso de constitucionalidade que aí 
 interpôs nos termos do disposto no artigo 70.º, n.º 1, alínea b), da Lei n.º 28/82, 
 de 15 de Novembro, na sua actual redacção (LTC). 
 
 
 
 2 ? A decisão reclamada tem o seguinte teor: 
 
 
 
 ?(...) 
 
 
 A arguida A. notificada do despacho que lhe indeferiu a reclamação veio em 
 requerimento dirigido aos Ex.mos Conselheiros interpor recurso para o Tribunal 
 Constitucional, ao abrigo do art. 70.°, n.º 1, alínea b), da LTC. 
 
 
 No respeitante à parte do requerimento de interposição de recurso para o TC em 
 que se invoca, pelos motivos nele expostos, que a decisão da reclamação ao não 
 admitir o recurso para o Supremo Tribunal de Justiça violou os arts. 29.° e 32.° 
 da CRP, refere-se que, face ao disposto no n.º 2 do art. 72.° da LTC, o recurso 
 previsto na alínea b) do n.º 1 do art. 70º da LTC só pode ser interposto pela 
 parte que haja suscitado a questão da inconstitucionalidade ?de modo 
 processualmente adequado perante o tribunal que proferiu a decisão recorrida, em 
 termos de este estar obrigado a dela conhecer?. 
 
 
 E na reclamação não foi suscitada qualquer questão de inconstitucionalidade. 
 
 
 Refira-se ainda que o recurso de inconstitucionalidade no nosso sistema jurídico 
 só pode incidir sobre normas e não sobre decisões judiciais, como resulta do n.º 
 
 1 do art. 280.° da CRP. 
 
 
 Não se admite pois o recurso para o Tribunal Constitucional, que se reporta à 
 decisão que indeferiu a reclamação e não a qualquer norma em que a mesma decisão 
 se tenha baseado. 
 
 
 
 * 
 
 
 No que concerne ao segmento do requerimento de interposição do recurso onde se 
 pretende que sejam apreciadas as normas dos arts. 70.° e 71.°, ambos do CP, na 
 interpretação que lhes foi dada pelo Tribunal da Relação do Porto, refere-se que 
 não compete ao Presidente do Supremo Tribunal de Justiça pronunciar-se sobre a 
 admissibilidade do recurso ora interposto para o Tribunal Constitucional, atento 
 o disposto no art. 76.°, n.º 1, da LTC, uma vez que nessa parte a decisão não 
 foi proferida nos termos do art. 405.° do CPP. 
 
 
 Pelo exposto, não se toma conhecimento desta parte do requerimento de fls. 158 e 
 segs. 
 
 
 
 (...)?. 
 
 
 
 3 ? Por seu turno, a reclamação assenta nos seguintes argumentos: 
 
 
 
 ?(...) 
 
 
 O Tribunal a quo entende que ?O Recurso para o Tribunal Constitucional não é 
 admissível pois se reporta à decisão que indeferiu a reclamação e não a qualquer 
 norma em que a mesma decisão se tenha baseado. 
 
 
 Todavia, nesta parte, a arguida alude aos art.s 29° e 32° da CRP, por entender 
 que a não admissão do recurso em causa configura uma violação de tais artigos. 
 
 
 Por outro lado, é claro que a arguida/recorrente não poderia arguir em momento 
 anterior tal inconstitucionalidade ? pela simples razão de não poder prever que 
 a mesma se registaria em fase de Recurso! 
 
 
 
 É a interpretação que o Digno Supremo Tribunal de Justiça fez dos preceitos 
 invocados (artigo art. 2°, nº 4 do Código Penal) que gera o vício da 
 inconstitucionalidade que se invocou. 
 
 
 Se o recorrente não pudesse invocar as inconstitucionalidades resultantes da 
 interpretação e aplicação das normas feitas pelos Tribunais Superiores (Relação 
 ou Supremo Tribunal de Justiça) ficaria fora da alçada do Tribunal 
 Constitucional uma grande parte da fiscalização concreta da constitucionalidade 
 que cabe a esse alto tribunal. 
 
 
 Como é óbvio, também nesta particular questão a arguida/recorrente não podia 
 pressupor, intuir, que o Digno Supremo Tribunal de Justiça, agiria como agiu, e 
 interpretaria as normas do Código Penal e da própria Constituição como 
 interpretou e aplicou. 
 
 
 
 É com a prolação da Decisão, e só nessa altura, que se tornam patentes os vícios 
 e manifesta a interpretação inconstitucional dada às normas, afrontando de 
 maneira gritante e inadmissível o Estado de Direito e processo Democrático, 
 pondo em causa princípios que deviam estar mais do que consolidados na ordem 
 jurídica portuguesa: 
 
 
 Assim sendo, o recorrente tem o Direito a ver apreciado o Recurso interposto 
 para o Tribunal Constitucional no sentido de controlar a constitucionalidade: 
 
 
 a) Ora, entendemos salvo melhor opinião que a interpretação e aplicação do 
 disposto no aludido art. 2°, pelo Insigne Supremo Tribunal de Justiça, ao não 
 admitir o recurso em causa constitui uma violação dos artigos 29° e 32° da 
 Constituição da República Portuguesa, inconstitucionalidades essas invocadas 
 previamente no seu recurso do Tribunal da Relação do Porto, para o Supremo 
 Tribunal de Justiça. 
 
 
 
 É, pois, um vício que se regista somente na Decisão, que se pretende seja 
 analisado à luz das normas da Constituição. 
 
 
 Desta forma, tem a recorrente o direito a ver apreciado o Recurso interposto 
 para o Tribunal Constitucional.? 
 
 
 
 4 ? Considerando os demais elementos constantes dos autos que antecederam a 
 prolação da decisão reclamada, resulta que a ora reclamante, inconformada com o 
 despacho que não lhe admitira o recurso interposto para o Supremo Tribunal de 
 Justiça, dele reclamou para o Presidente desse Tribunal, com base nos seguintes 
 fundamentos: 
 
 
 
 ?(...) 
 
 
 No caso em apreço estamos perante uma situação de uma confirmação pela Relação, 
 de uma Decisão da primeira instância, cuja pena aplicada é inferior a 8 anos. 
 
 
 De acordo com os supra indicados artigos não é permitido o Recurso para o 
 Supremo Tribunal de Justiça, nesta situação. 
 
 
 Tendo em conta que o processo em apreço diz respeito a factos praticados em 2006 
 e que o novo Código Processo Penal entrou em vigor em Setembro de 2007, estamos 
 na presença do problema da aplicação da Lei no Tempo. 
 
 
 
 ?«Num caso de sucessão de leis penais, havendo normas mais favoráveis num e 
 noutro dos regimes, há que comparar as consequências concretas que da aplicação 
 de uma e outra lei resultam e aplicar de maneira completa aquela cujos 
 resultados sejam menos gravosos para o arguido.» 
 
 
 Assim, analisando ambos os regimes penais, facilmente concluímos que o anterior 
 
 é mais favorável à arguida. 
 
 
 Como refere Germano Marques da Silva, in Direito Penal Português, I, 2001, p. 
 
 281, «para se determinar se uma Lei é mais favorável ao arguido do que outra, 
 avaliam-se as consequências no seu conjunto e no caso concreto» (ponderação 
 concreta). 
 
 
 Pertinentemente, Américo Taipa de Carvalho, in Sucessão de Leis Penais, 2ª ed, 
 Coimbra Editora, 1997, p. 191, salienta que não é necessário proceder a uma 
 avaliação concreta, quando é evidente, numa simples consideração abstracta, que 
 uma das Leis é claramente mais favorável que a outra. 
 
 
 O que se verificou no caso em apreço. 
 
 
 Discutida na Doutrina é a questão de saber se a ponderação deve ser unitária ou 
 diferenciada. 
 
 
 Ponderação unitária significa que é a Lei na sua totalidade, na globalidade das 
 suas disposições, que deve ser aplicada; a ponderação diferenciada, considerada 
 a complexidade de cada uma das Leis e a relativa autonomia de cada uma das 
 disposições, defende que deve proceder-se ao confronto de cada uma das 
 disposições de cada Lei, podendo, portanto, acabar por se aplicar ao caso sub 
 judice, disposições de ambas as Leis (vide Taipa de Carvalho, ob. cit., p. 192, 
 
 193). 
 
 
 A doutrina maioritária entende que se deverá optar pela ponderação unitária, 
 pois, caso contrário, o Julgador estaria a criar novos regimes, e não a aplicar 
 o mais favorável de entre os vigentes desde a prática do ilícito até à decisão, 
 violando, desse modo, o princípio da separação de poderes. 
 
 
 O STJ, por Ac. de 03/11/2005, publicado no DR Série I-A, de 19/12/2005 (Ac. nº 
 
 11/2005) decidiu que «sucedendo-se no tempo Leis sobre o prazo de prescrição do 
 procedimento contra-ordenacional, não poderão combinar-se, na escolha do regime 
 concretamente mais favorável, os dispositivos mais favoráveis de cada uma das 
 Leis concorrentes». 
 
 
 Aliás, tal Venerando Tribunal, na motivação do Assento publicado em 17/03/1989, 
 ao defender uma ponderação global e aplicação de uma das Leis em bloco, 
 considerou que «não é lícito construir regimes particulares pela conjugação de 
 elementos de uma e outra Lei, com prejuízo da quebra de coerência e a obtenção 
 de um resultado aberrante, ainda que concretamente vantajoso para o agente». 
 
 
 Assim, deve aplicar-se o CPP anterior ao caso em apreço, por ser mais favorável 
 para a arguida, em obediência ao disposto no art. 2°, nº 4 do CP.]? 
 
 
 Nestes termos deveria o Recurso em questão ser admitido?. 
 
 
 
 5 ? Perante o indeferimento dessa reclamação, a reclamante recorreu, então, para 
 este Tribunal, ao abrigo do disposto no artigo 70.º, n.º 1, alínea b), da LTC, 
 fazendo constar do respectivo requerimento as seguintes indicações: 
 
 
 
 ?(...) 
 
 
 A arguida foi condenada na 4ª Vara Criminal do Porto, a 4 anos e 4 meses de 
 prisão, como autora de um crime de Tráfico de Estupefacientes, do art. 21° n.º 1 
 do DL 15/93 de 22/01. 
 
 
 Inconformada interpôs recurso para o Digníssimo Tribunal da Relação do Porto, 
 por entender que a sua conduta preenche um crime de Tráfico de Menor Gravidade (art. 
 
 25° DL 15/93), pois estamos perante um caso de mera detenção, não se tendo 
 provado mais nada, nomeadamente o lucro. 
 
 
 Por outro lado, atentas as suas condições pessoais, o facto de ter 2 filhos 
 pequenos a seu cargo, que com a sua prisão, ficarão sem ter quem tome conta 
 deles, bem como o facto de permanecer em liberdade há cerca de dois anos sem que 
 se conheçam novos incidentes criminais e, pelo contrário estar a trabalhar para 
 a subsistência própria e da família, deveria ser-lhe aplicada uma pena mais leve, 
 atenuada, próxima do seu mínimo legal, o que satisfaria os fins de prevenção 
 geral e especial, devendo ser suspensa na sua execução, mostrando-se violados os 
 art.s 70° e 71° do CP; 25° da Lei 15/93 e 32° da CRP. 
 
 
 Assim não entendeu o Digno Tribunal da Relação do Porto, que negou provimento ao 
 recurso. 
 
 
 Dessa decisão, interpôs a arguida recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, 
 tendo o mesmo sido indeferido nos termos dos art.°s 400.º n.º 1 alín. f) do CPP 
 e art. 432° n.º 1 alín. b) e c) do mesmo diploma. 
 
 
 Ora, no caso em apreço estamos perante uma situação de uma confirmação pela 
 Relação, de uma Decisão da primeira instância, cuja pena aplicada é inferior a 8 
 anos. 
 
 
 De acordo com os supra indicados artigos não é permitido o Recurso para o 
 Supremo Tribunal de Justiça, nesta situação. 
 
 
 Todavia, de acordo com o CPP anterior tal situação era possível. 
 
 
 Tendo em conta que o processo em apreço diz respeito a factos praticados em 2006 
 e que o novo Código Processo Penal entrou em vigor em Setembro de 2007, estamos 
 na presença do problema da aplicação da Lei no Tempo. 
 
 
 
 ?«Num caso de sucessão de leis penais, havendo normas mais favoráveis num e 
 noutro dos regimes, há que comparar as consequências concretas que da aplicação 
 de uma e outra lei resultam e aplicar de maneira completa aquela cujos 
 resultados sejam menos gravosos para o arguido.» 
 
 
 Assim, analisando ambos os regimes penais, facilmente concluímos que o anterior 
 
 é mais favorável à arguida. 
 
 
 Como refere Germano Marques da Silva, in Direito Penal Português, 1, 2001, p. 
 
 281, «para se determinar se uma Lei é mais favorável ao arguido do que outra, 
 avaliam-se as consequências no seu conjunto e no caso concreto» (ponderação 
 concreta). 
 
 
 Pertinentemente, Américo Taipa de Carvalho, in Sucessão de Leis Penais, 2ª ed, 
 Coimbra Editora, 1997, p. 191, salienta que não é necessário proceder a uma 
 avaliação concreta, quando é evidente, numa simples consideração abstracta, que 
 uma das Leis é claramente mais favorável que a outra. 
 
 
 O que se verificou no caso em apreço. 
 
 
 Discutida na Doutrina é a questão de saber se a ponderação deve ser unitária ou 
 diferenciada. 
 
 
 Ponderação unitária significa que é a Lei na sua totalidade, na globalidade das 
 suas disposições, que deve ser aplicada; a ponderação diferenciada, considerada 
 a complexidade de cada uma das Leis e a relativa autonomia de cada uma das 
 disposições, defende que deve proceder-se ao confronto de cada uma das 
 disposições de cada Lei, podendo, portanto, acabar por se aplicar ao caso sub 
 judice, disposições de ambas as Leis (vide Taipa de Carvalho, ob. cit., p. 192, 
 
 193). 
 
 
 A doutrina maioritária entende que se deverá optar pela ponderação unitária, 
 pois, caso contrário, o Julgador estaria a criar novos regimes, e não a aplicar 
 o mais favorável de entre os vigentes desde a prática do ilícito até à decisão, 
 violando, desse modo, o princípio da separação de poderes. 
 
 
 O STJ, por Ac. de 03/11/2005, publicado no DR Série 1-A, de 19/12/2005 (Ac. nº 
 
 11/2005) decidiu que «sucedendo-se no tempo Leis sobre o prazo de prescrição do 
 procedimento contra-ordenacional, não poderão combinar-se, na escolha do regime 
 concretamente mais favorável, os dispositivos mais favoráveis de cada uma das 
 Leis concorrentes». 
 
 
 Aliás, tal Venerando Tribunal, na motivação do Assento publicado em 17/03/1989, 
 ao defender uma ponderação global e aplicação de uma das Leis em bloco, 
 considerou que «não é lícito construir regimes particulares pela conjugação de 
 elementos de uma e outra Lei, com prejuízo da quebra de coerência e a obtenção 
 de um resultado aberrante, ainda que concretamente vantajoso para o agente». 
 
 
 Assim, deve aplicar-se o CPP anterior ao caso em apreço, por ser mais favorável 
 para a arguida, em obediência ao disposto no art. 2°, nº 4 do CP.]? 
 
 
 Por tal motivo ao não se admitir o recurso em causa, violou-se o art. 29° e 32° 
 da CRP. 
 
 
 Por outro lado, entendemos também, salvo melhor opinião, que a interpretação e 
 aplicação do disposto nos arts. 70°, 71° do CP, pelo Insigne Tribunal da Relação 
 do Porto, na interpretação de que «não registando a recorrente quaisquer 
 antecedentes criminais e de condição social modesta», não se verifica suficiente 
 para acautelar as necessidades de prevenção especial e geral da medida de pena 
 que possa ser suspensa na sua execução, por haver na suspensão um juízo de 
 prognose mais favorável a esta, todos por violação do art. 32° da Constituição 
 da República Portuguesa, inconstitucionalidades essas invocadas previamente no 
 seu recurso da 1ª vara do Tribunal Criminal do Porto, para o Tribunal da Relação 
 do Porto. 
 
 
 Com efeito, ao erguer a culpa ? como critério principal de determinação da pena 
 
 ? e a prevenção como critério secundário, o Tribunal «a quo» não avalizou 
 correctamente o art. 71° do CP, não cumprindo com o princípio constitucional da 
 adequação e proporcionalidade das penas, revelando-se justo aplicar apenas uma 
 pena concreta correspondente ao limite mínimo abstractamente aplicável para 
 aquele tipo de ilícito, especialmente atenuada. 
 
 
 Violou assim também o douto acórdão recorrido o principio da proporcionalidade. 
 
 
 Pretende assim a recorrente a apreciação da constitucionalidade das normas 
 jurídicas em causa, por ambiguidade e falta de clareza dessas mesmas normas 
 jurídicas, por colidirem em função dessas debilidades com uma norma 
 constitucional. 
 
 
 
 (...)?. 
 
 
 
 6 ? Já neste Tribunal, o representante do Ministério Público pugnou pelo 
 indeferimento da reclamação. 
 
 
 B ? Fundamentação 
 
 
 
 7 ? Importa, antes de mais, começar por precisar que a presente reclamação versa 
 sobre o despacho de inadmissibilidade do recurso proferido de acordo com a 
 disposição do artigo 76.º, n.º 1, da LTC. Por esse motivo, a respectiva 
 reclamação devia ter sido deduzida nos termos do n.º 4 desse artigo e não, como 
 a recorrente invoca, com base no artigo 78.º-A, n.º 3, da LTC, que apenas tem 
 aplicação perante as decisões sumárias proferidas neste Tribunal ao abrigo do n.º 
 
 1 desse preceito. 
 
 
 A errada indicação da norma que sustenta formalmente o pedido não tem, neste 
 caso, efeito impeditivo ao seu conhecimento pela relação de identidade entre o 
 meio processual despoletado e o previsto na lei (cf. artigo 199.º do Código de 
 Processo Civil, ex vi o artigo 69.º da LTC). 
 
 
 
 8 ? Conhecendo do pedido, afigura-se manifesta a sua improcedência. 
 
 
 De facto, o recurso de constitucionalidade foi interposto nos termos da alínea b) 
 do n.º 1 do artigo 70.º da LTC, que admite a fiscalização concreta da 
 constitucionalidade de normas que tenham sido aplicadas como ratio decidendi 
 pela decisão recorrida, exigindo-se, ademais, que a questão tenha sido 
 adequadamente suscitada durante o processo. 
 
 
 O sentido desta exigência tem sido esclarecido, por várias vezes, por este 
 Tribunal Constitucional. 
 
 
 Assim, por exemplo, no Acórdão n.º 352/94, publicado no Diário da República II 
 Série, de 6 de Setembro de 1994, disse-se que o requisito da suscitação da 
 questão de constitucionalidade deve ser entendido ?não num sentido meramente 
 formal (tal que a inconstitucionalidade pudesse ser suscitada até à extinção da 
 instância)?, mas ?num sentido funcional?, de tal modo que essa invocação haverá 
 de ter sido feita em momento em que o tribunal a quo ainda pudesse conhecer da 
 questão, ?antes de esgotado o poder jurisdicional do juiz sobre a matéria a que 
 
 (a mesma questão de constitucionalidade) respeita?. 
 
 
 Por seu lado, afirma-se, igualmente, no Acórdão n.º 560/94, publicado no Diário 
 da República II Série, de 10 de Janeiro de 1995, que «a exigência de um cabal 
 cumprimento do ónus de suscitação atempada - e processualmente adequada - da 
 questão de constitucionalidade não é [...] ?uma mera questão de forma secundária?. 
 
 É uma exigência formal, sim, mas essencial para que o tribunal recorrido deva 
 pronunciar-se sobre a questão de constitucionalidade para o Tribunal 
 Constitucional, ao julgá-la em via de recurso, proceda ao reexame da questão (e 
 não a um primeiro julgamento de tal questão», devendo aqui acentuar-se que, nos 
 processos de fiscalização concreta, a intervenção do Tribunal Constitucional se 
 limita ao reexame ou reapreciação da questão de (in)constitucionalidade que o 
 tribunal a quo apreciou ou devesse ter apreciado. Ainda na mesma linha de 
 pensamento podem ver-se, entre outros, o Acórdão n.º 155/95, publicado no Diário 
 da República II Série, de 20 de Junho de 1995, e, aceitando os termos dos 
 arestos acabados de citar, o Acórdão n.º 192/2000, publicado no mesmo jornal 
 oficial, de 30 de Outubro de 2000 - sobre o sentido de um tal requisito, cf. 
 José Manuel Cardoso da Costa, A jurisdição constitucional em Portugal, 3ª edição 
 revista e actualizada, Coimbra, 2007, pp. 76 e ss.). 
 
 
 
 É certo que nada impede que, ao invés de se suscitar a inconstitucionalidade de 
 um preceito legal se questione apenas um seu segmento ou uma determinada 
 dimensão normativa, contudo, para que se possa dar como cumprido o ónus de 
 suscitação de um problema de constitucionalidade, será sempre necessário que o 
 recorrente impute o vício da inconstitucionalidade, de forma directa e imediata, 
 a uma norma mediante a explicitação da dimensão normativa que, no seu 
 entendimento, viola a lei fundamental, não bastando para que possa considerar-se 
 suscitada uma questão de constitucionalidade a afirmação de que é 
 inconstitucional, qua tale, o entendimento sustentado por uma parte ou agente 
 processual. 
 
 
 Para tais efeitos, importa, pois, colocar o tribunal recorrido perante o dever 
 de apreciação da constitucionalidade de uma norma legal individualizada, havendo 
 de concretizar-se o sentido desse preceito de modo a que, no caso de vir a ser 
 julgado inconstitucional, o Tribunal o possa apresentar na sua decisão em termos 
 de, tanto os destinatários desta, como, em geral, os operadores do direito 
 ficarem a saber, sem margem para dúvidas, qual é o preceito e com que sentido 
 ele não deve ser aplicado por, desse modo, violar a Constituição. 
 
 
 Nestes termos, exigir-se-á que, em sede de recurso, a questão de 
 constitucionalidade seja concretizada de modo claro, directo e objectivo (cf. 
 Acórdão n.º 1210/96, disponível em www.tribunalconstitucional.pt) nas conclusões 
 da motivação do recurso uma vez que são estas que delimitam o âmbito e o objecto 
 do recurso e, concretizando o sentido dessa exigência, tem este Tribunal 
 estabelecido que «?suscitar a inconstitucionalidade de uma norma jurídica é fazê-lo 
 de modo tal que o tribunal perante o qual a questão é colocada saiba que tem uma 
 questão de constitucionalidade determinada para decidir. Isto reclama, 
 obviamente, que (...) tal se faça de modo claro e perceptível, identificando a 
 norma (ou um segmento dela ou uma dada interpretação da mesma) que (no entender 
 de quem suscita essa questão) viola a Constituição; e reclama, bem assim, que se 
 aponte o porquê dessa incompatibilidade com a lei fundamental, indicando, ao 
 menos, a norma ou princípio constitucional infringido.? Impugnar a 
 constitucionalidade de uma norma implica, pois, imputar a desconformidade com a 
 Constituição não ao acto de aplicação do Direito ? concretizado num acto de 
 administração ou numa decisão dos tribunais ? mas à própria norma, ou, quando 
 muito, à norma numa determinada interpretação que enformou tal acto ou decisão (cf. 
 Acórdãos nºs 37/97, 680/96, 663/96 e 618/96, este publicado no Diário da 
 República, II Série, de 15-05-1996). [§] É certo que não existem fórmulas 
 sacramentais para formulação dos pedidos, nem sequer para suscitação da questão 
 de constitucionalidade. [§] Esta tem, porém, de ocorrer de forma que deixe claro 
 que se põe em causa a conformidade à Constituição de uma norma (...)? ? cf. o 
 referido Acórdão n.º 618/98 e os acórdãos para os quais remete. 
 
 
 Sendo o objecto do recurso de fiscalização concreta de constitucionalidade 
 constituído por normas jurídicas, não pode sindicar-se, no recurso de 
 constitucionalidade, a decisão judicial em si própria, mesmo quando esta faça 
 aplicação directa de preceitos ou princípios constitucionais, quer no que 
 importa à correcção, no plano do direito infraconstitucional, da interpretação 
 normativa a que a mesma chegou, quer no que tange à forma como o critério 
 normativo previamente determinado foi aplicado às circunstâncias específicas do 
 caso concreto (correcção do juízo subsuntivo), sendo por isso forçoso que, no 
 
 âmbito dos recursos interpostos para o Tribunal Constitucional, se questione a (in)constitucionalidade 
 de normas, não sendo admissíveis recursos que, ao jeito da Verfassungsbeschwerde 
 alemã ou do recurso de amparo espanhol, sindiquem, sub species constitutionis, a 
 concreta aplicação do direito efectuada pelos demais tribunais, em termos de se 
 assacar ao acto judicial de ?aplicação? a violação (directa) dos parâmetros 
 jurídico-constitucionais. 
 
 
 Ou seja, não cabe a este Tribunal apurar e sindicar a bondade e o mérito do 
 julgamento efectuado in concreto pelo tribunal a quo. A intervenção do Tribunal 
 Constitucional não incide sobre a correcção jurídica do concreto julgamento, mas 
 apenas sobre a conformidade constitucional das normas aplicadas pela decisão 
 recorrida, cabendo ao recorrente, como se disse, nos recursos interpostos ao 
 abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º, o ónus de suscitar o problema de 
 constitucionalidade normativa num momento anterior ao da interposição de recurso 
 para o Tribunal Constitucional [cf. Acórdão n.º 199/88, publicado no Diário da 
 República II Série, de 28 de Março de 1989; Acórdão n.º 618/98, disponível em 
 
 www.tribunalconstitucional.pt, remetendo para jurisprudência anterior (por 
 exemplo, os Acórdãos nºs 178/95 - publicado no Diário da República II Série, de 
 
 21 de Junho de 1995 -, 521/95 e 1026/9, inéditos, e o Acórdão n.º 269/94, 
 publicado no Diário da República II Série, de 18 de Junho de 1994)], razão pela 
 qual se prevê no artigo 72.º, n.º 2, da LTC, que tais recursos ?só podem ser 
 interpostos pela parte que haja suscitado a questão da inconstitucionalidade ou 
 da ilegalidade de modo processualmente adequado perante o tribunal que proferiu 
 a decisão recorrida, em termos deste estar obrigado a dela conhecer?. 
 
 
 
 9 ? Projectando estes criteria no presente caso, constata-se que a decisão 
 recorrida não fez aplicação das normas dos artigos 70.º e 71.º do Código Penal, 
 o que constitui motivo bastante para que o recurso não pudesse ser admitido 
 quanto a tal questão. 
 
 
 Quanto ao restante, resulta dos elementos constantes dos autos que a reclamante 
 não suscitou, com o alcance atrás explicitado, qualquer questão de 
 constitucionalidade normativa, sendo que, contrariamente ao que alega, teve 
 oportunidade para o fazer no momento em que reclamou do despacho que não lhe 
 admitira o recurso interposto para o Supremo Tribunal de Justiça. 
 
 
 Por outro lado, não pode olvidar-se que o próprio recurso de constitucionalidade 
 acaba por ter como objecto a decisão recorrida na parte em que se contesta a 
 concreta definição e aplicação do regime legal, matéria que escapa, como se 
 disse, à sindicância deste tribunal. 
 
 
 A decisão reclamada não merece, pois, qualquer censura. 
 
 
 C ? Decisão 
 
 
 
 10 ? Destarte, atento o exposto, o Tribunal Constitucional decide indeferir a 
 presente reclamação. 
 
 
 Custas pela reclamante, com taxa de justiça que se fixa em 20 UCs.. 
 
 
 Lisboa, 04/02/2010 
 
 
 Benjamim Rodrigues 
 
 
 Joaquim de Sousa Ribeiro 
 
 
 Rui Manuel Moura Ramos