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Processo nº 810/08
 
 1ª Secção
 Relatora: Conselheiro Maria João Antunes
 
 
 
             Acordam, em conferência, na 1ª secção do Tribunal Constitucional
 
 
 I. Relatório
 
  
 
 1. Nos presentes autos, vindos do Tribunal da Relação de Lisboa, em que é 
 recorrente A. e recorrido o Ministério Público, foi interposto o presente 
 recurso para o Tribunal Constitucional, ao abrigo da alínea f) do nº 1 do artigo 
 
 70º da Lei de Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional 
 
 (LTC), do acórdão daquele Tribunal de 9 de Setembro de 2008.
 
  
 
 2. Em 11 de Novembro de 2008 foi proferida decisão sumária ao abrigo do disposto 
 no nº 1 do artigo 78º-A da LTC, com a fundamentação que se segue:
 
  
 
 «Analisado o teor do requerimento de interposição de recurso para este Tribunal, 
 
 é manifesto que este não satisfaz os requisitos do artigo 75º-A da LTC. Não se 
 justifica, porém, convidar o recorrente, ao abrigo do nº 6 deste artigo, a 
 indicar os elementos em falta, uma vez que subsistiriam sempre razões para não 
 conhecer do objecto do recurso.
 Constituem requisitos do recurso interposto ao abrigo da alínea f) do nº 1 do 
 artigo 70º da LTC que a decisão recorrida aplique, como ratio decidendi, a norma 
 cuja ilegalidade se pretende apreciada e que a questão de ilegalidade haja sido 
 suscitada durante o processo com qualquer dos fundamentos referidos nas alíneas 
 c), d) e e) do nº 1 do mesmo artigo (artigos 70º, nº 1, alínea f), e 72º, nº 2, 
 da LTC). No caso em apreço, atento o teor da decisão recorrida e o da reclamação 
 da decisão sumária proferida (cf., respectivamente, fls. 58 e ss. e 49 e s.), é 
 manifesto que nunca se poderia dar como verificado qualquer um destes 
 requisitos».
 
  
 
 3. Desta decisão vem agora o recorrente reclamar para a conferência, nos termos 
 do nº 3 do artigo 78º-A da LTC, com os fundamentos seguintes:
 
  
 
 «1.- Na sua alegação para o Tribunal da Relação de Lisboa, o reclamante 
 escreveu:
 
 “... 17.- Ora, se os relatórios e pareceres são peças para que remete a decisão 
 de que se pretende recorrer e sua parte integrante, só com a sua notificação ao 
 recorrente, pode considerar-se cumprido o disposto no art.° 411, 1 . a) do 
 C.P.P. e só a partir daí é que pode começar a correr o prazo a que essa mesma 
 disposição alude.
 
 18.- Ora, logo que o recorrente recebeu tal informação (7.4.2008), começou o 
 signatário a trabalhar nas alegações de recurso que entraram em 23 desse mesmo 
 mês, quer dizer, ainda antes mesmo da notificação do douto despacho de que agora 
 se recorre. Não era humanamente possível fazer mais depressa. Mas,
 
 19.- No caso de se manter a douta decisão recorrida, estar-se-ia ainda a 
 desrespeitar o princípio constitucional consagrado no art.° 32.1 da CRP, visto 
 que, deste modo e na prática, não lhe estava a ser garantido o direito de 
 recurso ali elevado a dignidade constitucional.
 
 20.- Com efeito, como pode recorrer-se duma decisão cujo conteúdo integral se 
 não conhece?...”.
 
 2.- É certo que no seu requerimento de interposição de recurso, podia o 
 recorrente ter transcrito esta parte da peça processual em causa para sustentar 
 a sua motivação ao interpor o recurso mas tal obrigação, salvo o devido respeito 
 deve ser feita nas alegações.
 
 3.- Sabe-se que o Tribunal Constitucional não aprecia a saúde constitucional de 
 decisões judiciais e sim de normas mas também se sabe que certas interpretações 
 contidas em decisão “insólita, inesperada ou imprevisível da norma”… “Como este 
 tribunal tem afirmado repetidamente, nada obsta a que seja questionada apenas 
 uma certa interpretação ou dimensão normativa dum determinado preceito” (…) 
 
 4.- Ora, no seu incompleto requerimento de interposição de recurso para este 
 Venerando Tribunal, o reclamante esqueceu-se de indicar o princípio 
 constitucional que se considera violado.
 
 5.- Pensou na sua singeleza e no seu vício de tudo sintetizar que a remissão 
 para a peça processual onde suscitara a questão fosse suficiente.
 
 6.- Só que, salvo o devido respeito não lhe foi dada a oportunidade prevista no 
 n.° 5 do art.° 75-A da LTC porque se tivesse sido, o reclamante teria 
 esclarecido que o princípio violado fora o contido no artigo 411.1.a) do C.P.P. 
 com a interpretação insólita, inesperada e imprevisível que lhe foi dada pela 
 douta decisão recorrida.
 
 7.- Mais, uma decisão judicial só está conforme com a Constituição se “for 
 fundamentada” (art.° 205 do C.R.P.) e também este princípio foi violado.
 
 8.- Tudo isto se colocaria nas alegações, mas a douta decisão não reclamada não 
 dá ao recorrente essa oportunidade.
 Termos em que, porque essa douta decisão não cumpriu o disposto no n.° 5 do 
 art.° 75º da LTC, se requer que esta reclamação seja julgada com fundamento e se 
 proceda em conformidade com o que ali se dispõe».
 
  
 
 4. Notificado, o Ministério Público respondeu o seguinte:
 
  
 
 «1°
 A presente reclamação carece manifestamente de fundamento. 
 
 2°
 Na verdade, a argumentação do reclamante em nada abala os fundamentos da decisão 
 reclamada, no que toca à evidente inverificação dos pressupostos do recurso».
 
  
 Cumpre apreciar e decidir.
 
  
 II. Fundamentação
 A decisão que é objecto da presente reclamação concluiu pela não verificação dos 
 requisitos do recurso interposto. Concretamente, a não aplicação pela decisão 
 recorrida, como ratio decidendi, de norma cuja ilegalidade tivesse sido 
 suscitada durante o processo com qualquer dos fundamentos referidos nas alíneas 
 c), d) e e) do nº 1 do artigo 70º da LTC e a não suscitação, durante o processo, 
 de qualquer questão de ilegalidade com qualquer dos fundamentos referidos 
 naquelas alíneas: violação de lei de valor reforçado, violação do estatuto de 
 região autónoma ou violação de lei geral da República.
 Sem questionar estas razões, o reclamante sustenta que a reclamação deve ser 
 deferida, uma vez que não foi cumprido o disposto no nº 5 do artigo 75º-A da 
 LTC.
 De facto, o relator no Tribunal Constitucional pode convidar o requerente a 
 prestar as indicações em falta no requerimento de interposição de recurso (nºs 5 
 e 6 do artigo 75º-A da LTC). “Tal convite, porém, só é possível se a omissão for 
 sanável, ou seja, se consistir numa falta do próprio requerimento, não tendo 
 cabimento para o suprimento de falta de pressupostos de admissibilidade do 
 recurso que seja insanável” (Acórdão do Tribunal Constitucional nº 99/2000, 
 disponível em www.tribunalconstitucional.pt).
 Nos presentes autos, como também faltavam os requisitos do recurso interposto, 
 não tinha cabimento tal convite. Ainda que o recorrente prestasse todas as 
 indicações em falta – a norma cuja ilegalidade pretendia apreciada, a norma ou 
 princípio legal que considerava violado e a peça processual em que tinha 
 suscitado a questão de ilegalidade –, a falta daqueles requisitos ditaria sempre 
 o não conhecimento do objecto do recurso. 
 Com efeito, face ao teor das peças processuais já mencionadas na decisão sumária 
 
 (o acórdão recorrido e a reclamação que deu origem a este acórdão) e ao conteúdo 
 da presente reclamação, onde se afirma, entre o mais, que o “princípio violado 
 fora o contido no artigo 411.1.a) do C.P.P.”, é manifesto que nunca se poderiam 
 dar como verificados os requisitos do recurso de ilegalidade previsto na alínea 
 f) do nº 1 do artigo 70º da LTC.   
 
  
 III. Decisão
 Pelo exposto, decide-se indeferir a reclamação, confirmando, consequentemente, a 
 decisão de não tomar conhecimento do objecto do recurso.
 
  
 Custas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20 (vinte) unidades de 
 conta, sem prejuízo do benefício do apoio judiciário.
 
  
 Lisboa, 9 de Dezembro de 2008
 Maria João Antunes
 Carlos Pamplona de Oliveira
 Gil Galvão