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Processo n.º 693/08
 
 2.ª Secção
 Relator: Conselheiro Benjamim Rodrigues
 
 
 
             Acordam, em conferência, na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional:
 
  
 A – Relatório
 
  
 
             1 – A. reclama para a conferência, ao abrigo do disposto no n.º 3 do 
 artigo 78.º-A da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, na sua actual versão (LTC), 
 da decisão sumária proferida pelo relator, no Tribunal Constitucional, que 
 decidiu não conhecer do recurso de constitucionalidade interposto do acórdão do 
 Tribunal da Relação de Évora.
 
  
 
             2 – Fundamentando a reclamação, esgrime o reclamante do seguinte 
 modo:
 
  
 
 «DO ERRO DA DECISÃO SUMÁRIA ORA RECLAMADA 
 POR NÃO TER TOMADO CONHECIMENTO DO RECURSO 
 
  
 
 1- O Ex.mo Senhor Juiz Conselheiro Relator desse Tribunal não conheceu o objecto 
 do recurso, visto que considerou que as decisões recorridas não se enquadram nas 
 hipóteses normativas previstas nas alíneas h) e i) do art. 70º da LTC. 
 
  
 
 2- Porém, in casu é bem patente que os Exmos. Senhores Juízes Desembargadores do 
 Tribunal da Relação de Évora subscritores do Acórdão de 1.4.2008 – Rec. N° 
 
 2602/07-1 aplicaram a norma do art. 412°/4 do CPP, já julgada inconstitucional – 
 nos termos do Acórdão nº 320/2002, de 9/7 desse Tribunal Constitucional, [parece 
 ser o caso previsto na dita alínea h)], Acresce que; 
 
  
 
 3- In casu é igualmente bem patente que os Exmos. Senhores Juízes 
 Desembargadores do Tribunal da Relação de Évora subscritores do Acórdão de 
 
 1.4.2008 – Rec. N° 2602/07-1 aplicaram a norma do art. 412°/4 do CPP, em 
 desconformidade com o já decidido sobre a questão – Pelo Acórdão nº 320/2002, de 
 
 9/7 desse Tribunal Constitucional, [parece ser o caso previsto na dita alínea 
 i)], Por outro lado; 
 
  
 
 4- O Ex.mo Senhor Juiz Conselheiro Relator desse Tribunal também não conheceu o 
 objecto do recurso, visto que considerou que o ora reclamante “imputa 
 directamente à decisão – e não ao seu fundamento normativo – a violação dos 
 parâmetros jusfundamentais”, no que diz respeito à decisão do Exmo. Senhor Juiz 
 Desembargador Relator do Tribunal da Relação de Évora subscritor do Despacho de 
 
 17.6.2008, que não admitiu, mas era admissível, o recurso que havia sido 
 interposto para o Supremo Tribunal de Justiça; 
 
  
 
 5- Porém, in casu é bem patente que a defesa atacou directamente o fundamento do 
 dito despacho e não o Despacho em si. Acresce ainda que; 
 
  
 
 6- Os Exmos. Senhores Juízes Desembargadores do Tribunal da Relação de Évora 
 subscritores do Acórdão de 1.4.2008 – Rec. N° 2602/07-1 além de não terem 
 conhecido a matéria de facto, violando o dito preceito do art. 412°/4 do CPP; 
 Negaram ainda: 
 
  
 
 7- O direito constitucionalmente protegido deste arguido poder usufruir de 
 
 “todas as garantias de defesa” – previsto no artigo 32° da Constituição da 
 República Portuguesa; 
 Com efeito, in casu, também 
 
  
 
 8- Foi igualmente violado o preceito do artigo 32°/9 da Constituição da 
 República Portuguesa: 
 
    O arguido em 2001, altura em que ocorreu o acidente que deu origem a este 
 processo, era Juiz de Direito, motivo pelo qual foi-lhe fixado como competente 
 para a causa o Tribunal da Relação de Évora. 
 
  
 Só que o Tribunal que o julgou foi o Tribunal Judicial da Comarca de Vila Real 
 de Santo António, com a fundamentação de que o arguido já não era Juiz de 
 Direito. 
 
  
 Ao arrepio do citado nº 9 existiu uma subtracção nítida da causa ao Tribunal da 
 Relação de Évora; 
 
  
 Motivos pelos quais: 
 
  
 
 9- O Douto Despacho de 17.6.2008 do Exmo. Senhor Juiz Desembargador Relator do 
 Tribunal da Relação de Évora, sancionou uma decisão ilegal porque claramente 
 violadora da Constituição, como atrás foi referido; 
 
  
 
  
 CONCLUSÃO
 
  
 Perante o exposto, resulta óbvio que devem V. Exªs decidir que deve conhecer-se 
 do objecto do Recurso». 
 
  
 
             
 
             3 – O Procurador-Geral Adjunto, no Tribunal Constitucional, 
 respondeu no sentido de a reclamação ser manifestamente improcedente, por “a 
 argumentação do reclamante em nada abala[r] os fundamentos da decisão reclamada, 
 no que toca à evidente inverificação dos pressupostos do recurso interposto”.
 
  
 
             4 – A decisão reclamada tem o seguinte teor:
 
  
 
             «1 – A., melhor identificado nos autos, recorre para o Tribunal 
 Constitucional ao abrigo do disposto nas alíneas h) e i) do n.º 1 do artigo 70.º 
 da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, na sua actual versão (LTC), do Acórdão do 
 Tribunal da Relação de Évora, de 1 de Abril de 2008, e do despacho proferido 
 nesse Tribunal que não admitiu, por inadmissibilidade, o recurso que havia sido 
 interposto para o Supremo Tribunal de Justiça, resultando do requerimento de 
 interposição do recurso que, quanto à primeira decisão, pretende ver apreciada a 
 inconstitucionalidade da norma do artigo 412.º, n.º 2, do Código de Processo 
 Penal “(bem como a violação em concreto dos n.ºs 1 e 9 do artigo 32.º da 
 Constituição da República Portuguesa)”, e que, quanto ao referido despacho, 
 considera o recorrente que o mesmo “violou igualmente, tal como o Acórdão da 
 Relação de Évora também recorrido, o preceito constitucional previsto no artigo 
 
 32.º, números 1 e 9 da Constituição da República Portuguesa, bem como a norma 
 prevista no n.º 2 do art. 412.º do Código de Processo Penal, já declarada pelo 
 Tribunal Constitucional, através do Acórdão n.º 320/2002, de 9 de Julho, 
 inconstitucional, com força obrigatória geral”.
 
  
 
             2 – Apesar do recorrente ter fundado o recurso nas “alíneas h) e i) 
 do artigo 78.º da Lei n.º 28/82”, o mesmo foi admitido “conforme [os] artigos 
 
 70.º, h) e i), 72.º, n.º 1, b), 76.º e 78.º, n.º 4, da Lei n.º 28/82, de 15 de 
 Novembro, na sua actual redacção”, corrigindo-se assim a errada indicação, no 
 requerimento de interposição de recurso, do artigo 78.º da LTC, como norma ao 
 abrigo da qual aquele se fundou, tendo o recorrente sido notificado dos exactos 
 termos em que o recurso foi admitido.
 
  
 
             3 – Tendo em conta o disposto nos artigos 76.º, n.º 3, e 78.º-A, n.º 
 
 1, da LTC, passa a decidir-se nos seguintes termos.
 
  
 
             4 – Nos termos do disposto nas alíneas h) e i) do artigo 70.º, n.º 
 
 1, da LTC, cabe recurso para o Tribunal Constitucional das decisões dos 
 tribunais que: apliquem norma já anteriormente julgada inconstitucional pela 
 Comissão Constitucional, nos precisos termos em que seja requerida a sua 
 apreciação ao Tribunal Constitucional (alínea h)); e que recusem a aplicação de 
 norma constante de acto legislativo, com fundamento na sua contrariedade com uma 
 convenção internacional, ou a apliquem em desconformidade com o anteriormente 
 decidido sobre a questão pelo Tribunal Constitucional (alínea i)).
 
             In casu, é bem patente que as decisões recorridas não se enquadram 
 nas hipóteses normativas supra transcritas, o que só por si determina o não 
 conhecimento do objecto do recurso.
 
             Por outro lado, na parte em que o recorrente impugnou o despacho que 
 não admitiu o recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, tão pouco se está 
 perante um objecto idóneo do recurso de constitucionalidade, sendo claro que o 
 recorrente imputa directamente à decisão – e não ao seu fundamento normativo – a 
 violação dos parâmetros jusfundamentais.
 
  
 
             5 – Destarte, atento o exposto, o Tribunal Constitucional decide não 
 tomar conhecimento do recurso.
 
  
 
             Custas pelo recorrente com taxa de justiça que se fixa em 7 (sete) 
 UCs.».
 
  
 
  
 B – Fundamentação
 
  
 
             5 – Na sua argumentação, o reclamante considera que estão 
 preenchidos os requisitos determinantes da admissibilidade do recurso nos termos 
 previstos nas alíneas h) e i) do artigo 70.º da LTC.
 
             Como se disse na decisão ora em crise, as referidas alíneas apenas 
 admitem recurso para o Tribunal Constitucional das decisões dos tribunais que: 
 apliquem norma já anteriormente julgada inconstitucional pela Comissão 
 Constitucional, nos precisos termos em que seja requerida a sua apreciação ao 
 Tribunal Constitucional (alínea h)); e que recusem a aplicação de norma 
 constante de acto legislativo, com fundamento na sua contrariedade com uma 
 convenção internacional, ou a apliquem em desconformidade com o anteriormente 
 decidido sobre a questão pelo Tribunal Constitucional (alínea i)).
 
             Ora, como é manifesto, nenhuma dessas hipóteses tem verificação no 
 caso sub judicio.
 
             Por um lado, no que concerne à alínea h) do n.º 1 do artigo 70.º, 
 estamos perante recursos de decisões dos tribunais que apliquem norma julgada 
 inconstitucional pela Comissão Constitucional. 
 Como é consabido, esse órgão apenas se manteve em funções até à entrada em 
 funcionamento do Tribunal Constitucional, não tendo obviamente proferido 
 qualquer julgamento de inconstitucionalidade quanto à norma do artigo 412.º, n.º 
 
 4, do Código de Processo Penal.
 
             Por outro lado, quanto à alínea i) da citada norma, estão, aí, em 
 causa decisões dos tribunais, relativas aos casos de desaplicação da lei 
 interna, com fundamento na contrariedade com uma convenção internacional ou, 
 então, que a apliquem em desconformidade com decisão anterior do Tribunal quanto 
 a essa matéria específica, restringindo-se o recurso às questões de natureza 
 jurídico-constitucional e jurídico-internacional implicadas na decisão recorrida 
 
 (artigo 71.º, n.º 2, da LTC) – cf., sobre o alcance do recurso em causa, José 
 Manuel Cardoso da Costa, A jurisdição constitucional em Portugal, 3.ª ed., 
 Coimbra, 2007, p. 38, n.40.
 
             In casu, é manifesto que não houve desaplicação de acto legislativo 
 interno com fundamento na sua contrariedade com convenção internacional, nem 
 aplicação de norma em desconformidade com o anteriormente decidido sobre essa 
 questão pelo Tribunal Constitucional. 
 
             Em suma, não se verificam os pressupostos da admissibilidade do 
 recurso interposto ao abrigo das alíneas h) e i) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC. 
 
 
 
             Já no que diz respeito à inadmissibilidade do recurso na parte em 
 que o recorrente impugnou o despacho que não admitiu o recurso para o Supremo 
 Tribunal de Justiça, o reclamante sustenta que “atacou directamente o fundamento 
 do dito despacho e não o despacho em si”.
 
             Vejamos.
 
             Na parte circunstancialmente em causa, o reclamante deixou 
 consignado o seguinte no requerimento de interposição de recurso:
 
      
 
 “II – Do erro do douto despacho de 17.6.2008 do Exmo. Senhor Juiz Desembargador 
 Relator
 
 11.º
 
      O Ex.mo Senhor Juiz Desembargador Relator do Tribunal da Relação de Évora, 
 subscritor do Despacho de 17.6.2008, não admitiu o recurso ora recorrido, visto 
 que “face ao artigo 400.º, n.º 1, alíneas e) e f) do CPP não é admissível 
 recurso”.
 
 12.º
 
      Porém, em 24 de Junho de 2001, quando o facto gerador deste processo 
 ocorreu, o fundamento invocado para a não admissibilidade do recurso não era 
 requisito legal, uma vez que o art. 400.º/1 do CPP, na redacção de 2001 permitia 
 o recurso;
 
                  Ao que acresce ainda;
 
 13.º
 
      Mesmo que assim não fosse, tal Despacho, por si só, mais não foi do que uma 
 RATIFICAÇÃO da decisão que violou o preceito constitucional previsto no artigo 
 
 32.º, números 1 e 9 da Constituição da República Portuguesa, bem como a norma 
 prevista no n.º 2 do artigo 412.º do Código de Processo Penal, já declarada pelo 
 Tribunal Constitucional, através do Acórdão n.º 320/2002, de 9 de Julho, 
 inconstitucional, com força obrigatória geral;
 
      Ou seja,
 
 14.º
 
      O dito Douto Despacho SANCIONOU uma decisão ILEGAL porque claramente 
 VIOLADORA da Constituição, e portanto NULA, o que logicamente acarreta também a 
 própria nulidade do Despacho ora recorrido”.
 
  
 
             E, com base nesse discurso, concluiu que “o Douto Despacho de 
 
 17.6.2008 ora recorrido ao não admitir o recurso, violou igualmente, tal como o 
 Acórdão da Relação de Évora também recorrido, o preceito constitucional previsto 
 no artigo 32.º, números 1 e 9 da Constituição da República Portuguesa, bem como 
 a norma prevista no n.º 2 do art. 412.º do Código de Processo Penal, já 
 declarada pelo Tribunal Constitucional, através do Acórdão n.º 320/2002, de 9 de 
 Julho, inconstitucional, com força obrigatória geral”.
 
             Resulta do exposto, com meridiana clareza e ao contrário do que se 
 invoca na reclamação, que o reclamante não controverteu sub species 
 constitutionis o fundamento normativo que constituiu ratio decidendi do juízo 
 recorrido, mas apenas o concreto despacho que apodou de ilegal e 
 inconstitucional, razão pela qual se concluiu não haver lugar ao conhecimento do 
 recurso nessa matéria por inidoneidade do seu objecto já que, como é consabido, 
 ao Tribunal Constitucional apenas cabe conhecer da (in)constitucionalidade de 
 normas e não de decisões.
 
  
 
  
 C – Decisão
 
  
 
             6 – Destarte, atento o exposto, o Tribunal Constitucional decide 
 indeferir a presente reclamação.
 
  
 
             Custas pelo reclamante, com taxa de justiça que se fixa em 20 
 
 (vinte) UCs..
 Lisboa, 10.12.2008
 Benjamim Rodrigues
 Joaquim de Sousa Ribeiro
 Rui Manuel Moura Ramos