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Processo n.º 904/07
 
 1.ª Secção
 Relator: Conselheiro José Borges Soeiro
 
  
 
  
 Acordam, em conferência, na 1.ª Secção do Tribunal Constitucional:
 
 
 I – Relatório
 
 1. Ao abrigo do disposto no artigo 669.º, n.º1, alínea a), do Código de Processo 
 Civil, vem o Reclamante A. pedir a aclaração do Acórdão n.º 540/2007, de 31 de 
 Outubro de 2007, nos termos seguintes:
 
 “Em 5 de Novembro de 2007, foi o arguido notificado do Acórdão 540/2007 que 
 desatendeu a reclamação interposta do despacho que não admitiu o recurso 
 interposto para este Tribunal do acórdão de 18/04/2007 do Tribunal da Relação de 
 Lisboa. 
 
 2°.
 Esta reclamação foi indeferida, tendo consequentemente sido confirmada a decisão 
 reclamada no sentido de não tomar conhecimento do objecto do recurso, com o 
 fundamento de que não foi, durante o processo, suscitada qualquer questão de 
 constitucionalidade, por forma a que o tribunal recorrido sobre ela se tivesse 
 de pronunciar, não tendo havido também qualquer recusa de aplicação da norma com 
 fundamento na sua inconstitucionalidade, bem como, não identificou a decisão do 
 Tribunal Constitucional, que, com anterioridade, julgou inconstitucional ou 
 ilegal a norma aplicada pela decisão recorrida, sendo que considerou ainda não 
 se estar no caso em apreço perante uma decisão surpresa – o que permitiria que 
 não fosse suscitada atempadamente qualquer questão de constitucionalidade. 
 
 3°.
 Ora, tal não pode, salvo o devido respeito, assim ser entendido, uma vez que, 
 
 4°
 Quanto à questão de que o Reclamante não identificou a decisão do Tribunal 
 Constitucional, que, com anterioridade, julgou inconstitucional ou ilegal a 
 norma aplicada pela decisão recorrida, deveria – salvo o devido respeito – o 
 Exm°. Juiz ter convidado o Reclamante a prestar essa indicação no prazo de 5 
 dias, o que não o fez. 
 
 5°.
 Por outro lado, quanto ao facto de durante o processo, não ter sido suscitada 
 qualquer questão de constitucionalidade, por forma a que o tribunal recorrido 
 sobre ela se tivesse de pronunciar, a verdade é que o ora reclamante também não 
 o poderia ter feito anteriormente – visto que posteriormente à interposição do 
 recurso do despacho de fls. 78 dos autos de 18 de Abril de 2006 interposto em 16 
 de Maio de 2006 por o requerente ter sido detido foi requerida a passagem de 
 guias no valor de 480,00 € para pagar a multa a que o arg°. tinha sido 
 condenado, tendo o pai do arg°. pago a multa; posteriormente à interposição do 
 recurso e posterior pagamento do arg°. por despacho datado também de 16 de Maio 
 de 2006 face à interposição de recurso e mostrando – se efectuado o depósito de 
 
 480,00 € foi determinado a passagem de mandados de libertação imediata – pelo 
 que não foi possível ao recorrente arguir o vicio de inconstitucionalidade das 
 normas questionadas, no Tribunal a quo, durante o processo e mesmo no 
 requerimento de interposição de recurso. Assim só após o Acórdão do Tribunal da 
 Relação e consequente Acórdão ao pedido de Aclaração é que foi possível arguir 
 os vícios de inconstitucionalidade na própria interposição de recurso para o 
 Tribunal Constitucional. 
 
 6.º
 Porém, mesmo que não fosse entendido conforme o anteriormente descrito, a 
 verdade é que após a interposição do recurso e antes do Acórdão proferido pelo 
 Tribunal da Relação houve uma razão objectiva para manifesta situação 
 imprevisível, isto é, o arg°. interpôs recurso, foi detido e pagou a multa já 
 após a interposição do recurso e com estes 2 pressupostos (interposição de 
 recurso e pagamento da multa) foi libertado. 
 
 7°
 Assim, tendo o Reclamante efectuado pagamento da multa a que foi condenado, 
 salvo melhor opinião, não faz sentido a exequibilidade da sentença dos autos, 
 isto é, o cumprimento dos 4 meses de prisão efectiva, já que a pena a que foi 
 condenado se mostra cumprida com o pagamento, não fazendo sentido agora que: 
 além de ter pago a multa ter também de cumprir os 4 meses de prisão efectiva – 
 porquanto assim estaria a cumprir 2 penas na mesma sentença: o pagamento da 
 multa e a prisão. 
 
 8°.
 Pelo que a interpretação dada à norma na decisão recorrida foi de todo 
 imprevisível, não podendo razoavelmente o reclamante contar com a sua aplicação. 
 Na verdade, tendo a decisão interpretado de modo tão particular tal norma, não 
 era exigível ao reclamante prever que essa interpretação viria a ser possível e 
 viesse a ser adoptada na decisão. 
 
 9.º
 Deste modo, tal situação constitui uma verdadeira decisão surpresa, inesperada, 
 sem que o ora Reclamante pudesse, razoavelmente antecipar tal cenário. 
 
 10.º
 Não se entendendo assim, por não se conseguir determinar, então o que seja uma 
 
 “decisão surpresa”. 
 
 11.º
 Assim, não se compreende porque não foi o ora Reclamante, nos termos do art. 
 
 75°. A n°. 5 da L.T.C. – notificado para no prazo de 5 dias identificar a 
 decisão do Tribunal Constitucional, que, com anterioridade, julgou 
 inconstitucional ou ilegal a norma aplicada pela decisão recorrida. 
 
 12°.
 Bem como, da leitura do douto acórdão, e salvo melhor opinião, não se consegue 
 perceber qual o alcance da expressão ‘decisão surpresa’. 
 
 13°.
 Deste modo, torna-se necessária que seja doutamente efectuada a Aclaração por 
 forma a serem clarificados estes 2 pontos referidos nos artigos 11°. a 12°.” 
 
 2. O Exmo. Procurador-Geral Adjunto junto deste Tribunal pronunciou-se nos 
 seguintes termos:
 
 “1.º
 A pretensão deduzida carece manifestamente de fundamento.
 
 2º
 Na verdade, o reclamante não enuncia qualquer obscuridade ou ambiguidade de 
 acórdão reclamado que careça de ser aclarado, o que traduz utilização anómala do 
 incidente pós decisório deduzido.”
 Cumpre apreciar e decidir.
 II – Fundamentação
 
 3. A arguição apresentada pelo Reclamante é manifestamente improcedente.
 Nos termos do artigo 669.º, n.º 1, alínea a), do Código de Processo Civil, pode 
 qualquer das partes requerer ao tribunal que proferiu a decisão “o 
 esclarecimento de alguma obscuridade ou ambiguidade que ela contenha”.
 Decisão obscura é a que contém algum passo cujo sentido não é inteligível e 
 decisão ambígua é a que permite a atribuição de mais do que um sentido ao seu 
 texto.
 Ora, no caso dos autos, o Reclamante não aponta qualquer aspecto obscuro ou 
 ambíguo da decisão reclamada. Limita-se, com efeito, a discordar do teor da 
 mesma o que, obviamente, excede o âmbito de apreciação de um pedido de 
 aclaração. 
 O conceito de “decisão surpresa” que o Reclamante diz não entender foi 
 amplamente discutido no Acórdão, tendo sido expressa e cuidadamente indicados os 
 fundamentos pelos quais não se poderia, nos autos, considerar ter existido uma 
 verdadeira “decisão surpresa” para efeitos de se ter como dispensado o ónus de 
 suscitação atempada (i.e. durante o processo) de questão de constitucionalidade 
 normativa.
 
 4. Da mesma forma não existiam motivos para a formulação do convite referido no 
 artigo 75.º-A, n.º 5, da Lei do Tribunal Constitucional. Como se disse no 
 Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 479/2004, disponível em 
 
 www.tribunalconstitucional.pt :
 
 “Com efeito, este aplica-se a situações de incompletude do requerimento de 
 interposição do recurso, por referência aos requisitos constantes dos nºs 1 a 3 
 do artigo 75º-A, e não, como aqui sucede, na ausência dos pressupostos do 
 recurso (no sentido de que o convite se não justifica quando faltam os 
 pressupostos do recurso, cfr. o Acórdão nº 543/03, disponível em 
 
 www.tribunalconstitucional.pt).”
 III – Decisão
 Nestes termos, indefere-se o pedido de aclaração.
 Custas pelo Reclamante fixadas em 15 (quinze) UC s.
 Lisboa, 11 de Dezembro de 2007
 José Borges Soeiro
 Gil Galvão
 Rui Manuel Moura Ramos