 Imprimir acórdão
 Imprimir acórdão   
			
Processo n.º 874/07
 
 3ª Secção
 Relator: Conselheiro Vítor Gomes
 
 
 Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional
 
 
 
  
 O relator proferiu a seguinte decisão, nos termos do n.º 1 do artigo 78.º-A da 
 LTC:
 
  
 
  
 
 “1. A., melhor identificado nos autos, instaurou, em 22 de Abril de 2005, acção 
 declarativa de condenação, emergente de acidente de viação, contra B. – 
 Companhia de Seguros, SA., pedindo que esta fosse condenada a pagar-lhe a 
 quantia de € 26.500,00, acrescida de juros de mora, por danos patrimoniais e não 
 patrimoniais sofridos em consequência de um acidente de viação ocorrido em 27 de 
 Fevereiro de 1980, com culpa do condutor de um veículo segurado na ré. Para 
 tanto, invoca ter sofrido ferimentos que determinaram o seu internamento 
 hospitalar e a necessidade de ser submetido a intervenção cirúrgica, o que lhe 
 provocou dores ao longo dos anos e alteração da sua saúde, particularmente desde 
 
 1999, e motivou que tivesse que ser internado e submetido a nova intervenção 
 cirúrgica em 2002, que, todavia, não redundou em cura total.
 Na contestação, a ré invocou, além do mais, a prescrição e os limites, ao tempo, 
 do capital seguro, o que motivou o pedido do autor de intervenção principal do 
 condutor do veículo segurado pela ré. Admitida a intervenção foi citado o 
 chamado que também invocou a prescrição.
 No despacho saneador foi julgada procedente a excepção peremptória da prescrição 
 e, em consequência, absolveu-se a ré e o chamado do pedido.
 
 2. Inconformado apelou o autor, vindo o Tribunal da Relação de Coimbra, por 
 acórdão de 14 de Novembro de 2006, a confirmar a decisão recorrida, com os 
 seguintes fundamentos [segue transcrição parcial desta decisão]:
 
  
 
 «[…]A questão suscitada através do presente recurso tem a ver com o início e 
 decurso do prazo de prescrição aplicável à pretensão deduzida pelo A./apelante 
 através da acção intentada contra a R. “B.” e posteriormente contra o 
 interveniente. 
 Emergindo a responsabilidade do interveniente e da R. seguradora de um acidente 
 de viação, situamo-nos no âmbito da responsabilidade civil delitual ou aquilina, 
 por resultar de um facto ilícito prejudicial a alguém, independentemente de 
 qualquer obrigação preexistente entre lesante e lesado, sendo a prescrição o 
 instituto por via do qual os direitos subjectivos extinguem-se quando não 
 exercidos durante certo tempo, por força de um interesse social de certeza dos 
 direitos e na estabilidade patrimonial do devedor. 
 Com efeito, a prescrição tem por fundamento específico a recusa de protecção a 
 um comportamento contrário ao direito, a negligência do titular, e ainda a 
 necessidade de obviar, em face do decurso do tempo, à dificuldade de prova por 
 parte do sujeito passivo da relação jurídica. 
 Dispõe o artº 498º, nº 1, do Código Civil, diploma de que serão os demais 
 preceitos mencionados sem indicação de origem, que; 
 
 “O direito de indemnização prescreve no prazo de três anos, a contar da data em 
 que o lesado teve conhecimento do direito que lhe compete, embora com 
 desconhecimento da pessoa do responsável e da extensão integral dos danos, sem 
 prejuízo da prescrição ordinária se tiver decorrido o respectivo prazo a contar 
 do facto danoso.” 
 Decorre do preceito trás indicado, que são dois os prazos de prescrição ali 
 estabelecidos, um deles, de três anos, que inicia logo que o lesado tenha 
 conhecimento do seu direito à indemnização, e um outro de 20 anos, o prazo 
 ordinário estabelecido pelo artº 309º, que tem o seu início com o facto danoso, 
 ou seja, o acidente. 
 No que aquele diz respeito basta que o lesado tenha conhecimento do direito, não 
 da extensão integral do dano, e, chegados aqui, vejamos os factos alegados pelo 
 próprio A. no seu articulado inicial, e que foram quase todos considerados no 
 saneador-sentença:
 
  No dia 27/02/1980 cerca das 07h40 no local de Mata do Maxial-Penacova ocorreu 
 um acidente de viação em que foram intervenientes o veículo matrícula …-..-.., 
 conduzido pelo interveniente C., segurando, então, pela Companhia de Seguros D., 
 a qual passou a fazer parte integrante da Companhia de Seguros E. e mais tarde 
 passou a designar-se E1. e, mais recentemente B., Companhia de Seguros, S.A., a 
 aqui ré. 
 E o ciclomotor Casal  .-…-..-.., conduzido pelo autor. 
 Em consequência de tal embate, o autor foi sujeito, no próprio dia do acidente, 
 a tratamentos pelos serviços clínicos da seguradora. 
 O A. recebeu a título de indemnização da D., a então seguradora do ligeiro, a 
 quantia de Esc. 18.112$50. 
 O autor mais tarde em Outubro de 1996, ao ser observado apresentou um 
 agravamento de lesões anteriores (relatório de fls 22). 
 Desde 1999 a situação clínica do autor tem se vindo a agravar. 
 Em 22/04/2002 foi internado no sector de ortopedia. 
 Em 29/04/2002 foi dada alta ao autor. Em 02/05/2002 foi reinternado. 
 Em 08/05/2002 foi submetido a intervenção cirúrgica. 
 Em 17/05/2002 o autor veio a ter alta. 
 A presente acção deu entrada em juízo no dia 22 de Abril de 2005. 
 A ré seguradora foi citada em 28 de Abril de 2005. 
 A intervenção processual de C. foi requerida pelo autor em 24 de Junho de 2005. 
 O interveniente C. foi citado em 17 de Outubro de 2005.
 
  Desse circunstancialismo enunciado decorre portanto que o A. teve imediatamente 
 conhecimento do seu direito, e dos danos sofridos, sendo ressarcido e dado 
 quitação, pelo que quanto a tais prejuízos está devidamente ressarcido, 
 situando-se o desacordo daquele quanto aos danos que redundaram na intervenção 
 cirúrgica levada a cabo em 08.05.02, que tem início um novo prazo prescricional 
 de 3 anos. 
 Em nosso entender, porém, sem razão. 
 Resulta da alegação do próprio A., e dos elementos trazidos aos autos, que desde 
 Outubro de 1996 tem ele inteiro conhecimento do dano sofrido, pois que naquele 
 mencionando relatório de fls. 22 expressa queixas e relaciona-as com o acidente 
 de que foi vítima em 1980 e a intervenção cirúrgica a que foi então submetido, 
 sendo referido aí que “apresenta assim grave situação patológica sendo 
 importante envio a ortopedista para tratamento cirúrgico”, para além de referir 
 um agravamento do seu estado de saúde ao longo dos anos (art° 11º) 
 Assim, ainda que sendo de admitir a superveniência totalmente imprevisível das 
 lesões que obrigaram o A. a submeter-se a intervenção cirúrgica, prescreveu o 
 direito de reclamar uma indemnização quanto a elas, quer por ter decorrido o 
 prazo de 3 anos a que alude o artº 498º, nº 1, a contar de 1996, quer o prazo de 
 prescrição a que alude o artº 309º, que teve início com a ocorrência do 
 acidente, em 27.02.80. 
 Seria de aplicar naquela primeira situação acima indicada, não podendo ser 
 concretizáveis os danos sofridos, o disposto no artº 564º, nº 2, preceito 
 relativo à fixação da obrigação de indemnizar, que impende sobre o autor do acto 
 lesivo no domínio da responsabilidade civil por actos ilícitos a que alude o 
 artº 483º e sgs, relativo estes preceitos à existência ou não dessa mesma 
 obrigação de indemnizar, ou seja, ficaria fixada a obrigação de indemnizar os 
 danos cuja determinação teria lugar posteriormente. 
 O mencionado artº 564º, nº 2, surge exactamente da exigência feita ao lesado de 
 exigir o ressarcimento, ainda que não conhecendo a concreta extensão do dano, 
 como forma de afastar a prescrição desse direito, e não se trata, como refere o 
 apelante, de um meio dado ao lesado de não observar os prazos de prescrição 
 acima aludidos, interpretação que não tem suporte no nº 1 do artº 9º. 
 Posto que a prescrição não opera de pleno direito, ao contrário da caducidade, 
 daí que tenha de ser arguida pelo prescribente por via de excepção, não se 
 vislumbra como tal exercício por parte da R. seguradora e do interveniente possa 
 configurar um abuso de direito como pretende o A., a que alude o artº 334º que 
 refere; 
 
 “É ilegítimo o exercício de um direito, quando o titular exceda manifestamente 
 os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes ou pelo fim social e 
 económico desse direito”. 
 O abuso de direito, radica no princípio da boa fé e tutela da confiança e 
 exprime de algum modo reprovação social e moral e teria de concretizar-se numa 
 conduta do seu titular que, objectivamente interpretada à face da lei e dos bons 
 costumes e do princípio da boa fé, seja susceptível de gerar na outra parte a 
 convicção de que esse direito não seria exercido. 
 Não seria nunca o caso vertente, bem pelo contrário, em que as dificuldades da 
 R. seguradora decorrem da inexistência dos próprios documentos relativos ao 
 sinistro face ao lapso de tempo, sendo de censurar a própria conduta do A., que 
 remetendo-se a uma atitude de silêncio e inactividade pretende afastar assim as 
 consequências com que a lei fere o seu próprio comportamento, sendo de atentar a 
 tal propósito nos fundamentos do instituto de prescrição já apontados acima. 
 Os artºs lº e 20º da Constituição tratam da dignidade da pessoa humana, nas suas 
 vertentes quanto aos direitos pessoais à saúde e integridade física, o primeiro 
 e do acesso ao direito e aos tribunais, preceitos que em um e outro caso não 
 foram postos em causa com a decisão anterior nem com a presente, posto que 
 tratamos apenas e tão só da repercussão do decurso de tempo na possibilidade do 
 direito do A./apelante em exigir o ressarcimento devido, sem por em causa a 
 existência direito, que não se extingue ao contrário do que acontece com a 
 caducidade, e da possibilidade de acesso no segundo caso. 
 O prejuízo que decorre para o A. com a sua inércia ao longo dos anos, conforme 
 dissemos já acima, é-lhe totalmente imputável, e não pode agora buscar uma 
 interpretação legislativa, que não tendo cabimento no artº 9º, visa pura 
 simplesmente afastar as regras que levam à paralização de um direito não 
 exercido atempadamente, conseguindo por esta via o que lhe foi igualmente vedado 
 a propósito do abuso de direito. 
 A interpretação feita pelo A. é ela sim inconstitucional, por violar uma regra 
 que o Tribunal Constitucional tem vindo a sufragar de modo incessante, o da 
 confiança, firmado no artigo 2º da Constituição, que garante um mínimo de 
 certeza e segurança das pessoas quanto a direitos e expectativas legitimamente 
 criadas no desenvolvimento das relações jurídico-privadas, e que seria atingido 
 com a possibilidade de exercer um direito para além do período que é concedido 
 por lei, alterando as consequências jurídicas que com ela visa assegurar depois 
 de atingida uma determinada situação.» 
 
 3. Deste aresto interpôs, então, o autor recurso para o Supremo Tribunal de 
 Justiça, que, oportunamente, motivou e conclui nos seguintes termos:
 
 1.ª - Os danos que o ora recorrente sofreu em Maio de 2002 estão numa relação de 
 dependência com o acidente de viação ocorrido em 27/2/1980. 
 
 2.ª - Os danos sofridos pelo autor desde Maio de 2002 até ao momento por não 
 serem previsíveis e determináveis à data do acidente são novos danos 
 indemnizáveis nos termos gerais. 
 
 3.ª -  O decurso do tempo que medeia entre o acidente ocorrido em 27/02/1980 que 
 vitimou o recorrente e as lesões verificadas em 2002 e que obrigaram a 
 intervenção cirúrgica ao autor na ortopedia dos H.U.C., não pode (não deve) ser 
 atendido para efeitos de contagem do prazo prescricional geral do art. 309.º ou 
 do prazo trienal do n.º 1 do art. 498.º ambos do Cód. Civil. 
 
 4.ª - O nº 2 do art. 564.º do código civil configura uma válvula de escape do 
 sistema jurídico para que os danos futuros possam ser ressarcidos. 
 
 5.ª - Os danos futuros como danos que são devem ser indemnizáveis. 
 
 6.ª - Só podem ser peticionadas indemnizações por danos sofridos, quando 
 temporalmente os danos se verificam. 
 
 7.ª - Os danos que o autor relata neste processo ocorreram no seu corpo em 2002, 
 podendo ser peticionados no prazo de três anos a partir do seu conhecimento. 
 
 8.ª - A acção intentada pelo autor para pagamento da indemnização a que tem 
 direito em consequência dos danos sofridos desde Maio de 2002, foi intentada 
 tempestivamente. 
 
 9.ª - O direito do autor reclamar judicialmente contra o lesado a indemnização 
 pelos danos que hoje sofreu, nasceu com o conhecimento dos danos. 
 
 10.ª ‑ Antes da intervenção cirúrgica que fez em Maio de 2002 não existia 
 direito a indemnização por estes danos. 
 
 11.ª - O prazo médio de vida de um ser humano vai até aos 80 anos. 
 
 12.ª - O futuro, e os danos futuros podem ocorrer ao longo de pelo menos 80 
 anos. 
 
 13.ª - Para tornear a “eventual prescrição dos danos futuros” seria necessário 
 intentar acções judiciais de 20 em 20 anos para interromper a prescrição. 
 
 14.ª - A vontade do legislador não pode ser entendida como querendo iniciativas 
 processuais para interromper prescrições só para não deixar cair o futuro. 
 
 15.ª - O legislador permitiu a petição de indemnização futura quando os danos 
 não poderem ser determináveis à data de uma qualquer decisão sobre os danos 
 dados como provados. 
 
 16.ª - O artigo 809.º do Código Civil dispõe ser nula qualquer norma legal que 
 permite proclamar a presunção, ou mesmo a renúncia antecipada do credor ao 
 exercício de um qualquer direito. 
 
 17.ª - A decisão recorrida ao decidir que o autor, deixando passar 20 anos sem 
 reclamar qualquer indemnização por danos, renunciou ao direito de ser 
 indemnizado, violou o disposto no artigo 809.º do código civil. 
 
 18.ª - Uma interpretação extensiva (correctiva?) Do n.º 2 do art. 564.º do Cód. 
 Civil permite que o caso sub judicie se perspective como uma situação de 
 obrigação de indemnização dos danos que o lesado sofreu, interpretação essa 
 imposta pelo art. 9.º do Cód Civil. 
 
 19.ª - A obrigação de indemnizar prevista nos termos do art. 483.º do Cód. Civil 
 
 é um corolário do princípio fundamental da dignidade da pessoa humana e, em 
 consequência, do direito a integridade física que a ordem jurídica reconhece a 
 cada sujeito. 
 
 20.ª - A invocação pelos recorridos da excepção da prescrição configura-se como 
 um inequívoco abuso de direito nos termos do art. 334.º do Cód. Civil. 
 
 21.ª - Com o douto acórdão recorrido o Tribunal da Relação de Coimbra violou os 
 arts. 483.º, art. 562.º, n.º 2 do art. 564.º, art. 809.º; art. 334.º e art.º 9.º 
 todos do Cód. Civil e o art. 1º, 20.º, 24.º, 25.º, e 64.º da Constituição da 
 República Portuguesa. 
 
 22.ª - Os artigos 309.º e 498.º, n.º 1 do C.C. - se entendidos no sentido do 
 acórdão recorrido sofrem de inconstitucionalidade em relação aos danos que 
 surjam depois de decorridos 20 anos sobre o acidente que vitime o lesado, contra 
 quem é invocada a prescrição violando os artigos lº, 20.º e 64.º da Constituição 
 da República Portuguesa.» 
 O Supremo Tribunal de Justiça, por acórdão de 14 de Junho de 2007, negou 
 provimento à revista, remetendo, ao abrigo do disposto no artigo 713º n.º5, 
 aplicável ex vi do artigo 724º, n.º1, ambos do Código de Processo Civil, para os 
 fundamentos do acórdão da Relação.
 
  
 
 4. Ainda inconformado, veio A. interpor recurso para o Tribunal Constitucional, 
 nos seguintes termos [segue transcrição do requerimento de interposição de 
 recurso]:
 
 1.º
 De acordo com o disposto nos n.ºs 1 e 2 do artigo 75.º- A da Lei do Tribunal 
 Constitucional, desde já o recorrente esclarece que com o presente recurso, 
 pretende que o Tribunal Constitucional aprecie a inconstitucionalidade e 
 desconformidade com a Lei Fundamental do artigo 498º do Código Civil, atento o 
 disposto nos artigos 70.º n.º1 alíneas b) da Lei do Tribunal Constitucional e 
 artigo 280.º, n.º 1 alínea b) da Constituição da República Portuguesa ao abrigo 
 das quais o presente recurso é interposto. 
 
 2.º
 De facto, o recorrente invocou em diversas peças processuais, em especial nas 
 alegações perante a Relação de Coimbra e o STJ a inconstitucionalidade das 
 normas constantes do artigo 498.º do Código Civil, em especial no seu n.º 1 e 
 também das restantes normas que, do todo coerente deste diploma legal lhes sejam 
 directa ou indirectamente consequentes ou delas decorram, 
 
 3.º
 tudo por manifesta violação dos artigos 1.º, 20.º, 24.º, 25.º, e 64.º da 
 Constituição da República Portuguesa. Isto porque, 
 
 4.º
 o recorrente intentou acção de indemnização por responsabilidade civil contra a 
 recorrida Companhia de Seguros B., por via de um acidente de viação de que foi 
 vitima em 27/02/1980, para ressarcimento dos danos que tal acidente lhe 
 provocou, cuja culpa na produção dos mesmos coube ao condutor do veículo seguro 
 na recorrida e que é o aqui recorrido C.. Ora, 
 
 5.º
 a seguradora invocou, além do mais a prescrição, e os limites do capital seguro 
 na época do acidente. 
 
 6.º
 Por tal motivo foi chamado à intervenção principal o condutor do veículo 
 causador do acidente, o C.. 
 
 7.º
 Admitida a intervenção, foi este citado e também invocou a prescrição. 
 
 8.º
 No despacho saneador o juiz a quo julgou procedente a referida excepção de 
 prescrição e absolveu a recorrida e o interveniente do pedido. 
 
 9.º
 O recorrente apelou para o Tribunal da Relação de Coimbra, o qual negou 
 provimento ao recurso interposto, e confirmou a decisão recorrida. 
 
 10.º
 Do acórdão proferido na segunda instância foi interposto recurso de revista para 
 o Supremo Tribunal de Justiça, que confirmou o acórdão proferido pelo Tribunal 
 da Relação de Coimbra, e concomitantemente da primeira instância, negando a 
 revista requerida. 
 
 11.º
 Nas alegações de recurso o recorrente levantou por várias vezes a questão da 
 inconstitucionalidade do artigo 498.º n.º 1 do Código Civil, por violação ao 
 artigo 1.º, e 20 n.º 4 e 5 da C.R.P., (Cfr. Alegações perante o Tribunal de 
 Relação de Coimbra e perante o STJ). 
 Na verdade, 
 
 12.º
 a interpretação efectuada a tal artigo pelas instâncias julgadoras, ofende 
 claramente a dignidade da pessoa humana, e o direito do ser humano a obter uma 
 tutela jurisdicional efectiva com decisões equitativas. 
 
 13.º
 Ofensa esta que, o aqui recorrente quer ver analisada em termos de fiscalização 
 de constitucionalidade pelo Tribunal Constitucional para onde ora se recorre. 
 Pois, 
 
 14.º
 se a Constituição da República Portuguesa visa a protecção desses direitos 
 particulares, o que não merece ou permite qualquer dúvida ou hesitação, então o 
 atentado ao princípio da dignidade humana que representa a não tutela do Direito 
 a uma indemnização justa por novas lesões (lesões supervenientes, imprevisíveis, 
 não adivinháveis por um homem normal, colocado na posição de um bonus pater 
 familiae) e que está presente no douto acórdão proferido pelo Tribunal da 
 Relação de Coimbra, e confirmado pelo Supremo Tribunal de Justiça, no douto 
 acórdão de que ora se recorre, constitui uma subversão dos princípios 
 constitucionais e gerais do Direito. Senão vejamos, 
 
 15.º
 a nossa Constituição da República Portuguesa, estabelece desde logo como 
 corolário dos direitos, liberdades e garantias, o direito à vida (cf. Artigo 
 
 24.º C.R.P.), dizendo no seu n.º 1, “A vida humana é inviolável.” e no n.º 2,. 
 
 “Em caso algum haverá pena de morte”. Mais, 
 
 16.º
 o artigo 25.º da Lei Fundamental tendo como título (direito à integridade 
 pessoal) refere: “1-A integridade Moral e física das pessoas é inviolável. 2- 
 Ninguém pode ser submetido a tortura, nem a tratos ou penas cruéis, degradantes 
 ou desumanos.”: E, 
 
 17.º
 de entre os vários direitos fundamentais com assento na C.R.P. temos o “direito 
 
 à saúde” plasmado no artigo 64.º da nossa Lei Fundamental, onde se lê: “1- Todos 
 tem direito à protecção da saúde e o de ver de a defender e promover. (...)” 
 Ora, 
 
 18.º
 estes direitos, nos termos da nossa Constituição da República só podem ser 
 restringidos por Lei, devendo as restrições limitar-se ao necessário, para 
 salvaguardar outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos, 
 conforme está bem definido no artigo 18.º da C.R.P. que estipula a força 
 jurídica dos preceitos constitucionais respeitantes aos direitos, liberdades e 
 garantias, os quais são directamente aplicáveis e vinculam as entidades públicas 
 e privadas. 
 
 19.º
 Em função de tais preceitos constitucionais, no caso específico do recorrente, o 
 conhecimento de imediato da invocada excepção de prescrição pelo tribunal a quo, 
 e confirmado pelo tribunal recorrido, e agora pelo Supremo Tribunal de Justiça, 
 sem permitir que este fizesse prova de que, por força de circunstâncias maiores 
 
 (inexistência de dano visível no período dos 20 anos posteriores à ocorrência do 
 acidente de que foi vítima) violou os artigos 1.º e 2.º da C.R.P. Mais, 
 
 20.º
 denegou ao recorrente o direito de acesso à justiça e tribunais para obter a 
 reparação dos danos que sofreu no seu corpo e saúde, e fê-lo em violação do 
 próprio direito à segurança, pois só, após análise do caso in concreto, poderia 
 ser aferida a superveniência extra prescrição ordinária, dos danos cuja 
 reparação reclama no processo em causa. 
 
 21.º
 Pois, nada o legitimava a recorrer ao tribunal e exercer o seu direito de acção 
 pelo simples prazer - dever de o fazer para acautelar lesões, sofrimentos e 
 danos que poderiam nunca vir a ter repercussões no corpo ou saúde do recorrente, 
 dito de outro modo, que poderiam nunca vir a existir. Assim, 
 
 22.º
 repita-se, invocar e conhecer de preceito uma excepção de prescrição sem admitir 
 a contra prova da sua inexistência, é um acto judicial que coarcta o direito do 
 lesado, a demonstrar que o seu direito nasceu depois dos 20 anos que o instituto 
 da prescrição estabelece como limite máximo para o exercício de direitos. E, 
 como tal, 
 
 23º
 Tem de ser objecto de conhecimento, mesmo que se qualifique como excepcional, 
 porquanto provêm de circunstancialismos externos à vontade do lesado, que não 
 pode escolher o período conveniente para as lesões se manifestarem no seu corpo. 
 Deste modo, 
 
 24.º
 no entender do recorrente, a prescrição só pode ocorrer sobre direitos que são 
 conhecidos, e existentes desde a prática do facto danoso na esfera jurídica do 
 lesado, porquanto, só pode prescrever algo que existe, e não as expectativas de 
 vir a existir ou as probabilidades de ocorrer, já que o nosso sistema jurídico 
 processual assenta na análise dos factos, e exige a prova da veracidade dos 
 mesmos. 
 
 25.º
 Pelo que, o artigo 498.º n.º 1 quando fixa: “O direito de indemnização prescreve 
 no prazo de três anos a contar da data em que o lesado teve conhecimento do 
 direito que lhe compete, embora com desconhecimento da pessoa do responsável, e 
 da extensão integral dos danos, sem prejuízo da prescrição ordinária se tiver 
 decorrido o respectivo prazo a contar do facto danoso.”: terá que ser 
 considerado inconstitucional por violação do disposto no artigo 20° da Lei 
 Fundamental, na medida, em que tal norma impõe que seja assegurado o acesso ao 
 direito e aos tribunais de forma a obter a tutela efectiva (sublinhado do 
 recorrente) (Cfr. Artigo 20 nº 1 e 5 da CRP). 
 
 26.º
 Ora, o artigo 498º na medida em que impõe o prazo de prescrição afronta 
 claramente a norma supra citada, sendo que, os princípios da certeza e de 
 segurança não podem sobrepor-se igualmente ao direito à dignidade humana, 
 integridade física e saúde, que configuram direitos fundamentais. Assim, 
 
 27.º
 tal norma viola o artigo 25º nº 1 , 64º e, o artigo 1º na parte referente à 
 dignidade humana todos da Lei Fundamental.»
 
  
 
  
 
 5. O recurso de constitucionalidade interposto ao abrigo da alínea b) do n.º 1 
 do artigo 70.º da LTC – como ocorre no presente caso –, depende da verificação 
 cumulativa dos requisitos de a questão de inconstitucionalidade haver sido 
 suscitada «durante o processo», «de modo processualmente adequado perante o 
 tribunal que proferiu a decisão recorrida, em termos de este estar obrigado a 
 dela conhecer» (n.º 2 do artigo 72.º da LTC), e de a decisão recorrida ter feito 
 aplicação, como sua ratio decidendi, das dimensões normativas arguidas de 
 inconstitucionais pelo recorrente.
 No requerimento de interposição de recurso o recorrente, embora mencione 
 inicialmente que invocou em diversas peças processuais, em especial nas 
 alegações perante a Relação de Coimbra e o STJ a inconstitucionalidade das 
 normas constantes do artigo 498.º do Código Civil, em especial no seu n.º 1 e 
 também das restantes normas que, do todo coerente deste diploma legal lhes sejam 
 directa ou indirectamente consequentes ou delas decorram (cf. ponto 2º), 
 delimita o objecto do recurso à norma do artigo 498.º, n.º 1 do Código Civil, 
 quando fixa que: “O direito de indemnização prescreve no prazo de três anos a 
 contar da data em que o lesado teve conhecimento do direito que lhe compete, 
 embora com desconhecimento da pessoa do responsável, e da extensão integral dos 
 danos, sem prejuízo da prescrição ordinária se tiver decorrido o respectivo 
 prazo a contar do facto danoso.”
 Porém, da análise do requerimento, verifica-se que, não obstante o recorrente se 
 referir ao preceito do artigo 498.º, n.º 1, do Código Civil, na sua 
 integralidade – comportando as duas situações de prescrição nele previstas, ou 
 seja, a do decurso do prazo de três anos contados do conhecimento do direito que 
 se pretende accionar e a do prazo ordinário de vinte anos, estabelecido no 
 artigo 309º do mesmo Código, que teve o seu início com o facto danoso, no caso o 
 acidente (como se consignou no acórdão recorrido) –, o único prazo cuja 
 constitucionalidade, verdadeiramente, questiona e [relativamente ao qual] 
 suscitou a questão de constitucionalidade durante o processo é este último.
 Na verdade, disse o recorrente na conclusão 22ª que os artigos 309.º e 498.º, 
 n.º 1 do Código Civil, se entendidos no sentido do acórdão recorrido sofrem de 
 inconstitucionalidade em relação aos danos que surjam depois de decorridos 20 
 anos sobre o acidente que vitime o lesado, contra quem é invocada a prescrição, 
 violam os artigos lº, 20.º e 64.º da Constituição da República Portuguesa, mas 
 não questionou a validade constitucional da consagração daquele outro prazo 
 prescricional de 3 anos.
 Em relação ao prazo dos 3 anos, o que o recorrente invocou durante o processo 
 para afastar este prazo de prescrição, foi que o mesmo não se iniciou na data 
 considerada pelo acórdão da Relação, ou seja, em Outubro de 1996, mas sim em 
 Maio de 2002, data em que foi operado.
 Ora, o Supremo Tribunal de Justiça na decisão recorrida, sufragando o 
 entendimento consignado pela Relação, julgou verificada a prescrição porque 
 considerou que ainda que sendo de admitir a superveniência totalmente 
 imprevisível das lesões que obrigaram o A. a submeter-se a intervenção 
 cirúrgica, prescreveu o direito de reclamar uma indemnização quanto a elas, quer 
 por ter decorrido o prazo de 3 anos a que alude o artigo 498º, nº 1, a contar de 
 
 1996, quer o prazo de prescrição a que alude o artigo 309º, que teve início com 
 a ocorrência do acidente, em 27 de Fevereiro de 1980.
 Estamos, assim, em presença de pluralidade de fundamentos, um dos quais estranho 
 ao objecto do recurso, e que por si só é suficiente para assegurar o sentido da 
 decisão recorrida, ainda que esta viesse a ser revogada na parte respeitante à 
 questão da inconstitucionalidade, o que coloca o problema de saber se o Tribunal 
 deve conhecer do objecto do recurso. 
 Nesta matéria, é dominante na jurisprudência do Tribunal o entendimento de que, 
 face à função instrumental do recurso de fiscalização concreta de 
 constitucionalidade, comportando a decisão recorrida pluralidade de fundamentos 
 decisórios, não há que conhecer dos recursos de constitucionalidade em que 
 apenas se questione um desses fundamentos. 
 A esta luz, o presente recurso não tem utilidade, uma vez que, ainda que viesse 
 a ser julgada procedente a questão de constitucionalidade referente à 
 consagração do prazo prescricional de 20 anos, e nessa parte se determinasse a 
 alteração da decisão recorrida, esta sempre manteria o seu sentido decisório com 
 o fundamento de que ocorreu o prazo de prescrição de três anos.
 Deste modo, não pode tomar-se conhecimento do objecto do recurso.
 
 7. Nestes termos, ao abrigo do n.º 1 do artigo 78.º-A da Lei nº 28/82, de 15 de 
 Novembro, decide-se não tomar conhecimento do objecto do recurso.
 Custas a cargo do recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 7 unidades de 
 conta, sem prejuízo do apoio judiciário.”
 
  
 
  
 
  
 
 2. O recorrente reclamou para a conferência, ao abrigo do n.º 3 do citado artigo 
 
 78.º-A da LTC. Além de considerações sem relação directa com a questão da 
 admissibilidade do recurso, alega o seguinte:
 
  
 
 “23.º
 A admissibilidade desta espécie de fiscalização concreta de constitucionalidade 
 depende, além de outros, da verificação cumulativa de dois requisitos 
 essenciais, por um lado exige-se que a inconstitucionalidade da norma tenha sido 
 previamente suscitada durante o processo e de forma processualmente adequada, e 
 por outro lado que tal norma, não obstante a arguição da sua 
 inconstitucionalidade tenha sido utilizada na decisão do recurso, como 
 fundamento normativo do próprio julgamento da causa. 
 
 24.º
 Ora, a verdade é que a questão da inconstitucionalidade do artigo 498.º n.º 1 do 
 C.C. foi suscitada sempre em momento em que o tribunal recorrido ainda poderia 
 conhecer da questão, ou seja desde a Relação até ao Supremo Tribunal e na 
 fundamentação do recurso interposto para o Tribunal Constitucional. 
 
 25.º
 Tal equivale a dizer, que a inconstitucionalidade da norma que se pretende ver 
 fiscalizada, seguiu o entendimento defendido pelo Tribunal Constitucional, pois 
 foi levantada antes de esgotado o poder jurisdicional do juiz sobre a matéria a 
 que aquela questão de inconstitucionalidade respeita. 
 
 26.º
 Diga-se contudo, que a questão sustentada no requerimento de interposição de 
 recurso para este tribunal, é uma questão de verdadeira inconstitucionalidade 
 normativa, na medida que o que o recorrente invoca e questiona por 
 desconformidade face à Constituição, é a interpretação manifestamente 
 inconstitucional extraída pelo Tribunal da Comarca de Penacova, Tribunal da 
 Relação de Coimbra, e Supremo Tribunal de Justiça, daquele preceito legal. Mais, 
 
 
 
 27.º
 
 É inquestionável conforme decorre do Requerimento de 29 de Junho de 2007 que o 
 Reclamante pretendeu a análise da questão da inconstitucionalidade do artigo 
 
 498º nº 1 no seu todo. Com efeito, 
 
 28.º
 basta atentar no ponto 25º de tal requerimento “ Pelo que, o artigo 498.º nº 1 
 quando fixa “ o direito de indemnização prescreve no prazo de três anos a contar 
 da data em que o lesado teve conhecimento do direito que lhe compete, embora com 
 desconhecimento da pessoa do responsável, e da extensão integral dos danos, sem 
 prejuízo da prescrição ordinária se tiver decorrido o respectivo prazo a contar 
 do facto danoso “, terá que ser considerado inconstitucional por violação do 
 disposto no artigo 20.º da Lei Fundamental, na medida, em que tal norma impõe 
 que seja assegurado o acesso ao direito e aos tribunais de forma a obter a 
 tutela efectiva ( sublinhado do recorrente ) (Cfr. artigo 20 nº 1 e 5 da C.R.P. 
 
 )“. 
 Mais, acrescenta o ora reclamante que “ ... o artigo 498 na medida em que impõe 
 o prazo da prescrição afronta claramente a norma supra citada, sendo que, os 
 princípios da certeza e de segurança não podem sobrepor-se igualmente ao direito 
 
 à dignidade humana, integridade física e saúde, que configuram direitos 
 fundamentais “. Assim, 
 
 29.º
 
 é manifesto que o que se pretende é a declaração de inconstitucionalidade do nº 
 
 1 do artigo 498º do Código Civil in totum, isto é, quer quanto à prescrição dos 
 
 3 anos quer dos 20 anos. E, 
 
 30.º
 Diga-se que, qualquer outra interpretação não faz sentido atentas as decisões de 
 que o, ora reclamante sucessivamente recorreu. 
 Termos em que, e nos melhores de direito deve a presente Reclamação para a 
 Conferência ser julgada procedente e consequentemente tomar o Tribunal 
 Constitucional conhecimento do recurso apresentado pelo recorrente na parte em 
 que pede a apreciação da constitucionalidade do artigo 498.º n.º1, no seu todo, 
 desde a fixação do prazo de prescrição de três anos, à fixação do prazo 
 prescricional dos 20 anos, na interpretação insólita e imprevisível que lhe foi 
 efectuada perante a sua invocação à situação jurídica que o recorrente levou a 
 tribunal para defesa dos seus direitos constitucionalmente consagrados, tudo com 
 as legais consequenciais.” 
 
  
 
  
 
  
 
 3. Entendeu-se no acórdão da Relação que o do Supremo Tribunal de Justiça 
 confirmou que:
 
 “Resulta da alegação do próprio A., e dos elementos trazidos aos autos, que 
 desde Outubro de 1996 tem ele inteiro conhecimento do dano sofrido, pois que 
 naquele mencionando relatório de fls. 22 expressa queixas e relaciona-as com o 
 acidente de que foi vítima em 1980 e a intervenção cirúrgica a que foi então 
 submetido, sendo referido aí que “apresenta assim grave situação patológica 
 sendo importante envio a ortopedista para tratamento cirúrgico”, para além de 
 referir um agravamento do seu estado de saúde ao longo dos anos (artº 11º). 
 Assim, ainda que sendo de admitir a superveniência totalmente imprevisível das 
 lesões que obrigaram o A. a submeter-se a intervenção cirúrgica, prescreveu o 
 direito de reclamar uma indemnização quanto a elas, quer por ter decorrido o 
 prazo de 3 anos a que alude o artº 498º, nº 1, a contar de 1996, quer o prazo de 
 prescrição a que alude o artº 309º, que teve início com a ocorrência do 
 acidente, em 27.02.80.”
 
  
 Está, portanto, fora de qualquer dúvida que o acórdão recorrido considerou o 
 direito peticionado extinto por prescrição, não só por ter decorrido o prazo 
 geral de vinte anos a partir do facto danoso (o acidente) mas também porque 
 decorrera o prazo especial de três anos a partir do conhecimento dos danos 
 sobrevindos.
 
  
 Na decisão sumária reclamada decidiu-se não dever tomar-se conhecimento do 
 recurso de constitucionalidade porque, só estando reunidas as condições para 
 conhecer da questão de constitucionalidade na parte que respeita ao segmento 
 relativo ao prazo geral de prescrição (vinte anos após o facto danoso), o 
 julgamento do Tribunal quanto à constitucionalidade dessa norma ou segmento 
 normativo, fosse qual fosse o seu sentido, sempre seria inútil. Com efeito, a 
 decisão a julgar extinto o direito à indemnização por prescrição sempre se 
 manteria, por ficar incólume a aplicação da norma da 1.ª parte do n.º 1 do 
 artigo 498.º do Código Civil ( prazo de 3 anos a contar da data em que o lesado 
 teve conhecimento do direito que lhe compete).
 
  
 Sustenta o recorrente não só que indicou como objecto do recurso a norma do n.º 
 
 1 do artigo 498.º do Código Civil em toda a sua extensão, mas também que 
 suscitou perante o Supremo Tribunal de Justiça a questão de constitucionalidade 
 em relação aos dois prazos de prescrição a que o preceito se refere, seja nas 
 alegações, seja no requerimento de interposição.
 
  
 Esta argumentação não procede.
 
  
 Quanto ao requerimento de interposição do recurso é óbvio que esse não é momento 
 processualmente adequado para que se considere suscitada uma questão de 
 constitucionalidade perante o tribunal que profere a decisão de que se está a 
 recorrer (cfr. n.º 2 do artigo 72.º da LTC). Nesse momento está já extinto o 
 poder jurisdicional quanto à matéria em que a questão de constitucionalidade se 
 enxerta (cfr. artigo 666.º do CPC). 
 Quanto ao mais, embora se aceite – tornando mais claro o que se disse na decisão 
 sumária – que o requerimento de interposição abrange o n.º 1 do artigo 498.º do 
 Código Civil em toda a sua extensão, mantém-se que o recorrente não suscitou a 
 questão de constitucionalidade da norma que estabelece o prazo de prescrição de 
 três anos. 
 
  
 Na verdade, além do que se transcreveu na decisão sumária, sobre a questão de 
 constitucionalidade, nas alegações do acórdão da Relação para o Supremo Tribunal 
 de Justiça o recorrente apenas disse mais o seguinte: “E, se a previsão de um 
 prazo de prescrição anda quase sempre ligada à ideia de segurança jurídica, para 
 que quem pode vir a ser ‘incomodado’ e onerado com o exercício de pretensões 
 alheias, não esteja definitivamente e sem definição temporal sujeito a que essa 
 possibilidade de exercício paire para todo o sempre, ad eternum sobre a sua 
 cabeça, certo é que algumas circunstâncias, especialmente em casos como este em 
 que o direito ao ressarcimento pode nascer com o facto danoso, mas os danos só 
 são visíveis e sentidos passados os vinte anos, sempre se deverá declarar a 
 inconstitucionalidade do artigo 498.º n.º 1 do C.C., e deixar prosseguir o 
 processo para julgamento a fim de com dignidade, seriedade e verdade se aferir 
 da veracidade da superveniência extra (vinte anos) dos danos a reclamar 
 indemnização”. Nesta passagem, o que se diz inconstitucional é a sujeição do 
 direito de indemnização ao prazo geral de prescrição de vinte anos quando os 
 danos só posteriormente se revelem. Quanto ao prazo especial de três anos, o 
 recorrente procurou convencer que esse prazo não tinha decorrido, argumentando 
 que o termo inicial se deveria reportar à data em que foi submetido à 
 intervenção cirúrgica. Pretensão que não foi acolhida, limitando-se o Supremo a 
 confirmar o acórdão da Relação e a considerar que o prazo se iniciou em 1996, 
 quando foi clinicamente possível relacionar as queixas que apresentava com o 
 acidente ocorrido em 1980.
 
  
 
 É, portanto, indubitável que o recorrente não suscitou, tendo disposto de 
 oportunidade processual para fazê-lo, a questão de constitucionalidade do 
 segmento normativo do n.º 1 do artigo 498.º do Código Civil que estabelece o 
 prazo especial de três anos de prescrição do direito de indemnização. Nessa 
 parte, que constitui norma (ou segmento normativo) e fundamento decisório 
 autónomo – podendo, aliás, colocar problemas de constitucionalidade distintos 
 daqueles que coloca a aplicação do prazo geral de prescrição – não pode 
 conhecer-se do objecto do recurso de constitucionalidade. Consequentemente, 
 atendendo à sua natureza instrumental, não deve conhecer-se do recurso porque a 
 decisão do Tribunal, fosse ela qual fosse quanto à norma relativamente à qual 
 estariam reunidos os respectivos pressupostos, não seria susceptível de ter 
 qualquer influência no sentido da decisão recorrida.
 
  
 
  
 Decisão
 
  
 Pelo exposto, decide-se indeferir a reclamação e condenar o recorrente nas 
 custas, fixando a taxa de justiça em 20 UC,s.
 Lisboa, 25 de Fevereiro de 2008
 Vítor Gomes
 Ana Maria Guerra Martins
 Gil Galvão