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Processo n.º 1107/07
 
 3ª Secção
 Relator: Conselheiro Carlos Fernandes Cadilha
 
 
 Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional
 
 
 
 1. Relatório
 
  
 Em acção declarativa emergente de contrato de trabalho que A. propôs contra o 
 Colégio B., S.A., a ré veio interpor recurso para o Tribunal da Relação de 
 Coimbra da decisão que, em primeira instância, julgou procedente a acção, 
 sustentando a inconstitucionalidade, por violação do disposto no artigo 112º, 
 n.º 6, da Constituição, da Portaria n.º 652/99, de 14 de Agosto, na medida em 
 que se entendeu, na decisão recorrida, que essa Portaria revogara o Decreto-Lei 
 n.º 553/80, de 21 de Novembro.
 
  
 O Tribunal da Relação de Coimbra, por acórdão de 21 de Junho de 2007, veio a 
 pronunciar-se sobre a questão de constitucionalidade assim suscitada no 
 seguintes termos:
 
  
 Analisando agora a questão (essencial) se dada a falta de autorização legal, o 
 contrato caducou em 31/8/02, diremos apenas que tal temática foi já tratada em 
 diversos acórdãos – citados aliás na sentença recorrida – e também nesta secção, 
 por exemplo no Recurso 2338/05 e no sentido de que a dita autorização não 
 necessita (desde que se mantenham os respectivos pressupostos, como é o caso) de 
 ser renovada anualmente.
 E assim sendo, cremos que é despiciendo acrescentar o que quer que seja ao que a 
 propósito foi escrito na decisão sob protesto, pelo que, para ela, neste ponto 
 remetemos usando da faculdade prevista no artigo 713º, n.º 5, do Código de 
 Processo Civil, apenas sendo de notar que a solução com o entendimento do que 
 dispõe a Portaria 652/99, de 14/8, não está ferida de qualquer 
 inconstitucionalidade, por a mesma não sofrer de tal vício, já que nem sequer é 
 de trazer à colação o DL nº 553/80, pois o mesmo (nesta parte – seus artigos 67º 
 e 68º - têm por implicitamente revogados pelo artigo 111º do Estatuto da 
 Carreira Docente – DL nº 139-A/90 de 28/4).
 
  
 Dessa decisão, interpôs o Colégio B., S.A. recurso para o Tribunal 
 Constitucional, ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal 
 Constitucional, alegando, para o que agora releva, o seguinte:
 
  
 a) Que não concordava com a interpretação segundo a qual o Decreto-Lei n.º 
 
 139-A/90, de 28 de Abril revogara tacitamente os artigos 67º a 69º do 
 Decreto-Lei n.º 553/80, de 21 de Novembro;
 b) Que na medida em que a Portaria n.º 652/99, de 14 de Agosto violava o artigo 
 
 68º do Decreto-Lei n.º 553/80, de 21 de Novembro, essa portaria e essas 
 disposições “são inválidas por inconstitucionais. Efectivamente, os artigos 2º a 
 
 7º da Portaria são inconstitucionais por violação do n.º 6 do artigo 112º da 
 Constituição.
 
  
 
             Por decisão sumária proferida ao abrigo do disposto no artigo 78º-A, 
 n.º 1, da Lei do Tribunal Constitucional, não se tomou conhecimento do objecto 
 do recurso, pelos seguintes fundamentos:
 
  
 Resulta do disposto nas várias alíneas do n.º 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal 
 Constitucional que a competência deste Tribunal se cinge à apreciação da 
 inconstitucionalidade (e, em certos casos, da ilegalidade) de normas ou 
 interpretações normativas.
 Assim sendo, o Tribunal Constitucional não possui competência para proceder à 
 aplicação do direito ordinário ao caso concreto, designadamente determinando 
 qual o diploma legal vigente e aplicável à situação analisada pelo tribunal 
 recorrido.
 E, não possuindo o Tribunal Constitucional tal competência, é forçoso concluir 
 que não pode ser apreciado o primeiro pedido formulado pelo recorrente – 
 tendente a averiguar se o Decreto-Lei n.º 139-A/90, de 28 de Abril revogou ou 
 não tacitamente os artigos 67º a 69º do Decreto-Lei n.º 553/80, de 21 de 
 Novembro –, por falta de preenchimento de um dos pressupostos processuais do 
 presente recurso.
 No que diz respeito ao segundo pedido deduzido pelo recorrente – referente à 
 apreciação da conformidade constitucional da Portaria n.º 652/99, de 14 de 
 Agosto, na medida em que esta portaria alegadamente contrariaria o artigo 68º do 
 Decreto-Lei n.º 553/80, de 21 de Novembro –, outro motivo existe para o não 
 conhecimento do objecto do presente recurso de constitucionalidade.
 Nos termos da alínea b) do n.º 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal 
 Constitucional, constitui pressuposto processual do recurso de 
 constitucionalidade aqui previsto a aplicação, na decisão recorrida, da norma ou 
 interpretação normativa cuja conformidade constitucional se pretende que o 
 Tribunal Constitucional aprecie.
 Ora, o tribunal recorrido não aplicou a referida Portaria no sentido da 
 admissibilidade da sua prevalência em relação a um decreto-lei (o Decreto-Lei 
 n.º 553/80, de 21 de Novembro): e isto porque, como se lê no texto do acórdão 
 recorrido, “nem sequer é de trazer à colação o DL nº 553/80”, atendendo à sua 
 revogação por outro decreto-lei posterior.
 Não tendo o tribunal recorrido considerado aplicável, ao caso, o Decreto-Lei n.º 
 
 553/80, de 21 de Novembro, em virtude da sua revogação por um outro decreto-lei, 
 
 é imperioso concluir que o tribunal recorrido não adoptou a interpretação, 
 censurada pelo recorrente, segundo a qual uma portaria pode revogar um 
 decreto-lei.
 Não tendo o tribunal recorrido aplicado a interpretação que constitui o objecto 
 do presente recurso, não pode dele conhecer-se, por falta de preenchimento de um 
 dos seus pressupostos processuais.
 
  
 Desta decisão sumária reclama agora a recorrente para a conferência, ao abrigo 
 do disposto no artigo 78º-A, n.º 3, da Lei do Tribunal Constitucional, aduzindo 
 o seguinte:
 
  
 Conforme se extrai dos autos em epígrafe, cujo teor foi doutamente sumariado 
 pelo Exm.º Senhor Juiz Conselheiro-Relator, o cerne da questão jurídica 
 prende-se com o regime da acumulação de funções docentes em  estabelecimentos de 
 ensino públicos e particulares. 
 No fundo, em saber se o regime de acumulação anual — renovável — instituído pelo 
 Decreto-Lei n° 266/77, de 1.07, e mantido pelos Decretos-Lei n°s 553/80, de 
 
 31.11 e 300/81, de 5.11 — posteriormente desenvolvido pelo Despacho n° 92/ME/88 
 do Gabinete do Ministro da Educação, foi, de algum modo, beliscado pela 
 publicação do Decreto-Lei n° 139-A/90, de 28.04, ou pela publicação da Portaria 
 n° 652/99, de 14.08. 
 Como deixámos dito nas alegações, 
 Os diplomas que se reportam ao regime de acumulação foram expressamente 
 revogados no art° 6° do DL 139-A/90, de 28.4. a saber: o DL 266/77, de 1.7, e DL 
 
 300/81, de 5.11. 
 Sobre o DL 553/80, de 21.11, a norma revogatória do DL 139-A/90 nada dispõe. 
 O DL 553/80 rege o ensino particular e cooperativo ao invés do DL 139-A/90 que 
 rege a carreira dos professores do ensino púbico. 
 Assim, tratam-se de Decretos-Lei que regem áreas diferentes. 
 Acresce que o art° 111° do DL 139-A/90 que versa sobre as acumulações não 
 contraria em nada o que dispõem os art°s 67° e 68° do DL 553/80, de 21.11. 
 De tal modo assim foi que, mau grado ter entrado em vigor o DL 139-A/90 em 
 Fevereiro de 1990, o regime previsto no DL 553/80, de 21.11, art°s 67° e 68°, 
 manteve-se em vigor e em plena aplicação até Agosto de 1999. 
 O regime previsto no DL 553/80, de 21.11, foi aplicado até 1999, não tendo sido 
 considerado revogado pela entrada em vigor do diploma de 90. 
 A Portaria 652/99, de 14.08, veio estabelecer novas regras que contrariam o 
 disposto nos n°s 1, 2 e 3 do art° 68° do DL 553/80 em vigor à data da sua 
 publicação. 
 Isto é, 
 A Portaria veio revogar um Decreto-Lei. Isto é, o Governo, por Portaria e pelos 
 Ministros das Finanças e da Educação, escolheu o momento, ou seja, o dia 14.08, 
 para se arrogar no direito de revogar as disposições legais vigentes consignadas 
 no DL 553/80. 
 Assim, na medida em que a Portaria e as suas disposições violam o art° 68° do DL 
 
 553/80, são inválidas por inconstitucionais. 
 Efectivamente, os art°s 2° a 7° da Portaria são inconstitucionais por violação 
 do n° 6 do art° 112° da C.R.P. 
 Assim, são inconstitucionais as decisões que se alicerçam nas referidas 
 disposições da Portaria. 
 Foi nestes termos que a recorrente interpôs recurso do Acórdão do Tribunal da 
 Relação de Coimbra para o Tribunal Constitucional, atento o teor do artigo 75°-A 
 da Lei do Tribunal Constitucional. 
 Ora, refere o Exm. ° Senhor Juiz Conselheiro-Relator que o tribunal recorrido 
 não aplicou a referida Portaria no sentido da admissibilidade da sua prevalência 
 em relação a um decreto-lei (o Decreto-Lei n° 553/80, de 21 de Novembro)”. 
 Diz ainda o Exm. ° Senhor Juiz Conselheiro-Relator que “Não tendo o tribunal 
 recorrido considerado aplicável, ao caso, o Decreto-Lei n° 553/80, de 21 de 
 Novembro, em virtude da sua revogação por um outro decreto-lei, é imperioso 
 concluir que o tribunal recorrido não adoptou a interpretação censurada pelo 
 recorrente, segundo a qual uma portaria pode revogar um decreto-lei” 
 Nestes termos, conclui o Exm. ° Senhor Juiz Conselheiro-Relator que “não tendo o 
 tribunal recorrido aplicado a interpretação que constitui objecto do presente 
 recurso, não pode dele conhecer-se, por falta de preenchimento de um dos seus 
 pressupostos legais”. 
 Mas será que assim é de facto? 
 Será que se justifica o teor da decisão sumária de fls. … que obsta ao 
 conhecimento do mérito do recurso de constitucionalidade? 
 Parece-nos claramente que não! 
 Vejamos porquê! 
 O Douto Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, a fls., exara o seguinte no 
 que respeita à questão de direito: 
 
 “E assim sendo, cremos que é despiciendo acrescentar o que quer que seja ao que 
 a propósito foi escrito na decisão sob protesto, pelo que, para ela, neste ponto 
 remetemos usando da faculdade prevista no artigo 713°, n° 5, do CPC.(...) 
 Assim, o Tribunal da Relação de Coimbra, no que tange à questão em torno do 
 regime jurídico aplicável à autorização de acumulação de funções docentes opta 
 por remeter para o que foi consignado pela 1ª Instância na sentença de fls. 
 Assim, importa auscultar tal decisão. 
 Ora, refere o Tribunal de 1ª Instância, a fls. … que em 1980 é publicado o 
 Estatuto do Ensino Particular e Cooperativo — Decreto-Lei nº 553/80, de 31 de 
 Novembro, que vem de modo expresso autorizar a acumulação de funções de docentes 
 em escolas particulares, autorização que, de novo, continua sujeita a 
 autorização da Direcção-Geral de Pessoal e deve ser solicitada até 31 de Outubro 
 de cada ano (artigos 67° e 68°). 
 
 (...) No ano de 1990, o Governo fez publicar o Estatuto da Carreira dos 
 Educadores de Infância e dos Professores do Ensino Básico e Secundário — 
 Decreto-Lei n° 139-A/90, de 28 de Abril — que na sua Secção VIII veio 
 disciplinar as condições de acumulação do exercício de funções docentes em 
 estabelecimentos de ensino público com actividades de carácter ocasional ou em 
 outros estabelecimentos de ensino (artigo 111°). Todavia, deixou para portaria 
 conjunta dos Ministros das Finanças e da Educação as “condições em que é 
 permitida a acumulação”. 
 
 (...) Cerca de nove anos depois foi publicada a Portaria n° 652/99, de 14.08, 
 que veio regular o regime de acumulação de funções entre actividades públicas e 
 privadas (...) dos professores dos ensinos básico e secundário. 
 
 (...) A alteração de regime provocada pela entrada em vigor desta Portaria 
 
 ‘implica que não se pode sustentar a tese de que até à sua publicação continuou 
 a vigorar o despacho n° 92/ME/88 (...) (negritos nossos) 
 Ora, 
 
 É ostensivo, do que acima vai dito que o Decreto-Lei n° 139-A/90 não revogou o 
 Decreto-Lei n° 553/80!
 Aliás, do rol de diplomas revogados por tal normativo não consta o Decreto-Lei 
 n° 553/80! 
 No entender do Tribunal da Relação de Coimbra, por remissão operada para a 
 sentença de 1ª Instância — nos termos do artigo 713°, n° 5, do CPC — tal 
 revogação (que, obviamente, e nos termos das alegações de fls., entendemos nunca 
 se ter operado, como, aliás, veio a ser demonstrado no Ac. de Uniformização de 
 Jurisprudência tirado pelo STJ no processo n° 1619/06, de 26.09.2007) teria sido 
 implementada pela Portaria n° 652/99 de 14.08. 
 Com efeito, é do teor dos artigos 2° a 7°, 11° e 14° da referida Portaria que as 
 instâncias extraem o “fim da regra da anualidade das autorizações de acumulação 
 de funções de docência (entre o ensino público e o ensino privado), instituída 
 desde 1977. 
 Assim, se o Decreto-Lei n° 139-A/90 não revogou regime de acumulações instituído 
 pelos Decretos-Lei n°s 266/77 e 553/80, a posição das instâncias — leia-se, para 
 os presentes efeitos, do Tribunal da Relação de Coimbra — parte muito 
 claramente, da Portaria n° 652/99! 
 Colocando-se a questão de saber — questão para a qual o Tribunal Constitucional 
 
 é naturalmente competente! — se tal revogação pode ser implementada através da 
 referida Portaria, publicada 9 anos depois do Decreto-Lei n° 139-A/90! 
 Quando este não revoga, tácita ou expressamente, a legislação de 1977 e 1980. 
 No fundo, qual é legitimidade normativa da Portada n° 652/99? 
 Nessa matéria, e como acima dito, o Ac. do STJ tirado no processo nº 1619/06, em 
 
 26.09.2007 constitui um precioso auxiliar para o Tribunal Constitucional. 
 Assim, salvo o devido respeito, cremos estarem verificados os pressupostos da 
 competência do Tribunal Constitucional. 
 Com efeito, e em termos que melhor explanaremos em sede de alegações — caso o 
 recurso seja admitido, como entendemos dever ser! — verifica-se que é a Portaria 
 n° 652/99 que “revoga” o Decreto-Lei n° 553/80, e não o Decreto-Lei n° 139-A/90, 
 que a esse respeito é totalmente omisso! 
 Deste modo, justifica-se a tese — e a preocupação da recorrente de que uma 
 Portaria pode ter revogado um Decreto-Lei! 
 Só o Tribuna’Constitucional poderá, no caso concreto, apreciar se assim foi! 
 O que não há dúvida é que a decisão da Relação de Coimbra, por remissão para a 
 decisão de 1ª Instância, tem por pressuposto o regime introduzido pela Portaria 
 n° 652/99, com isso desconsiderando o regime do Decreto-Lei n° 553/80. 
 E nem se diga que tal «revogação» remonta ao artigo 111º do Decreto-Lei n° 
 
 139-A/90, pois que, como vimos, tal diploma não tem esse alcance. 
 Assim, deve conhecer-se do objecto do recurso, prosseguindo os autos os seus 
 ulteriores termos. 
 Termos em que deve conhecer-se do objecto do recurso de constitucionalidade, 
 prosseguindo os autos os seus ulteriores termos. 
 
  
 Na sua resposta, a autora, ora recorrida, propugnou pela manutenção do julgado, 
 considerando que o Tribunal recorrido não adoptou a interpretação censurada pelo 
 recorrente e, não dispondo o Tribunal Constitucional de competência para 
 proceder à aplicação de direito ordinário ao caso concreto, não poderia 
 conhecer-se do objecto do recurso.
 
  
 Cumpre apreciar e decidir.  
 
  
 
 2. Fundamentação
 
  
 Pela decisão reclamada entendeu-se que não era de conhecer do objecto do 
 recurso, relativamente a qualquer dos seus pedidos, com seguintes fundamentos: 
 na parte em que se suscitava a questão da validade da interpretação segundo a 
 qual o Decreto-Lei n.º 139-A/90, de 28 de Abril, revogara tacitamente os artigos 
 
 67º a 69º do Decreto-Lei n.º 553/80, de 21 de Novembro, o Tribunal 
 Constitucional não era competente para conhecer do recurso, visto que não lhe 
 cabia aferir da bondade das soluções jurídicas adoptadas pela decisão recorrida 
 em matéria de determinação do direito aplicável ao caso concreto; na parte em 
 que se invocava a inconstitucionalidade da Portaria n.º 652/99, de 14 de Agosto, 
 por violação do n.º 6 do artigo 112º da Constituição, no pressuposto de que essa 
 Portaria contrariava o disposto em norma contida em diploma legislativo (artigo 
 
 68º do Decreto-Lei n.º 553/80, de 21 de Novembro), porque não se verificava um 
 dos pressupostos do recurso de constitucionalidade – a aplicação, pela decisão 
 recorrida, da interpretação normativa que se entende ferida de 
 inconstitucionalidade.
 
  
 Aparentemente, a reclamante não põe em causa o primeiro dos fundamentos 
 invocados e contesta apenas que não tenha sido aplicada, pelo tribunal 
 recorrido, a interpretação que foi arguida de inconstitucionalidade. Alega, para 
 tanto, que o Tribunal da Relação, no que se refere à questão do regime jurídico 
 aplicável à autorização de acumulação de funções docentes, se limitou a remeter 
 para a decisão de 1ª instância, e esta formulou o entendimento de que o 
 Decreto-Lei nº 553/80 não foi objecto de revogação por parte do Decreto-Lei n.º 
 
 139-A/90; de onde é possível concluir que foi a Portaria n° 652/99, publicada em 
 execução daquele diploma, que veio  regular o regime de acumulação de funções 
 entre actividades públicas e privadas dos professores dos ensinos básico e 
 secundário, e, assim, a revogar o estabelecido naquele outro diploma legal.
 
  
 Ora, sendo embora certo que o acórdão do Tribunal da Relação, recorrido, remete 
 parte da sua fundamentaçao para a decisão da 1ª instância, também é verdade que 
 o mesmo acórdão adopta (ou reafirma), no específico ponto que aqui está em 
 causa, um argumento autónomo, ao acrescentar o seguinte: 
 
  
 
 […]
 neste ponto remetemos usando da faculdade prevista no artigo 713º, n.º 5, do 
 Código de Processo Civil, apenas sendo de notar que a solução com o entendimento 
 do que dispõe a Portaria 652/99, de 14/8, não está ferida de qualquer 
 inconstitucionalidade, por a mesma não sofrer de tal vício, já que nem sequer é 
 de trazer à colação o DL nº 553/80, pois o mesmo (nesta parte – seus artigos 67º 
 e 68º - têm por implicitamente revogados pelo artigo 111º do Estatuto da 
 Carreira Docente – DL nº 139-A/90, de 28.04).
 
  
 Isto é, o acórdão recorrido afirma, claramente, que os artigos 67º e 68º do 
 Decreto-Lei nº 553/80 se devem ter como tacitamente revogados pelo artigo 111º 
 do novo Estatuto da Carreira Docente, aprovado pelo Decreto-Lei nº 139-A/90, de 
 
 28 de Abril. Daí extrai o referido acórdão a conclusão de que se não pode 
 assacar à Portaria n.º 652/99 a inconstitucionalidade [por violação do princípio 
 da hierarquia das fontes de direito], visto que, bem entendido, a revogação fora 
 operada pelo diploma legislativo, e não pelo regulamento de execução.
 
  
 Mas mesmo que assim não fosse, nunca poderia retirar-se da decisão de 1ª 
 instância, para que o acórdão da Relação remete, a ideia de que fora a Portaria 
 n.º 652/99, e não o Decreto-Lei n° 139-A/90, a operar a revogação do anterior 
 regime de acumulação de funções. 
 
  
 O que a decisão de 1ª instância declara é o seguinte:
 
   
 
 (...) No ano de 1990, o Governo fez publicar o Estatuto da Carreira dos 
 Educadores de Infância e dos Professores do Ensino Básico e Secundário — 
 Decreto-Lei n° 139-A/90,  de 28 de Abril — que na sua Secção VIII veio 
 disciplinar as condições de acumulação do exercício de funções docentes em 
 estabelecimentos de ensino público com actividades de carácter ocasional ou em 
 outros estabelecimentos de ensino (artigo 111°). Todavia, deixou para portaria 
 conjunta dos Ministros das Finanças e da Educação as “condições em que é 
 permitida a acumulação”. 
 
 (...) Cerca de nove anos depois foi publicada a Portaria n° 652/99, de 14.08, 
 que veio regular o regime de acumulação de funções entre actividades públicas e 
 privadas (...) dos professores dos ensinos básico e 
 secundário. 
 
  
 Do que aqui se retira é que o Decreto-Lei n° 139-A/90 vei disciplinar ex novo o 
 regime de acumulação de funções docentes e que esse novo foi posteriormente 
 regulamentado por Portaria. Neste contexto, a Portaria é necessariamente um 
 regulamento de execução, que veio desenvolver ou completar o novo regime legal, 
 e, sendo assim, na própria lógica da decisão recorrida, não pode atribuir-se à 
 Portaria o efeito revogatório do anterior regime, já que esta nada mais fez do 
 que regulamentar o novo sistema legal que já provinha do Decreto-Lei n° 
 
 139-A/90.
 
  
 
 É patente, por tudo o que vem de dizer-se, que o acórdão recorrido não adoptou 
 qualquer interpretação normativa que permitisse concluir que o regime legal 
 atinente à cumulação de funções docentes foi revogado por simples diploma 
 regulamentar; a recorrente é que formula uma tal interpretação, mas que não tem, 
 no texto da decisão recorrida, um mínimo de correspondência verbal.
 
  
 Não há, por conseguinte, qualquer motivo para alterar o julgado.
 
  
 
  
 
 3. Decisão
 
  
 Nestes termos, e pelos fundamentos expostos, indefere-se a reclamação.
 
  
 Custas pelo recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 20 UC.
 
  
 
  
 Lisboa, 27 de Fevereiro de 2008
 Carlos Fernandes Cadilha
 Maria Lúcia Amaral
 Gil Galvão