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Processo nº 144/07
 Plenário                                
 Relator: Conselheiro Rui Moura Ramos
 
  
 
   
 Acordam em Plenário no Tribunal Constitucional
 
  
 
  
 
                                                                                  
 
                   I
 
  
 
                                                                                  
 
         Relatório
 
  
 
  
 
  
 
 1. Por deliberação tomada na reunião plenária de 18 de Janeiro de 2007, a 
 Comissão Nacional de Eleições (de ora em diante CNE) decidiu não aceitar a 
 inscrição do Grupo de Cidadãos designado “Diz que Não”, para os efeitos 
 previstos no artigo 41º, nº 1, da Lei nº 15-A/98, de 3 de Abril (Lei Orgânica do 
 Regime do Referendo, de ora em diante LORR).
 
  
 Tal deliberação fundamentou-se na circunstância de o resultado da extrapolação 
 da amostra para o universo das subscrições entregues ser inferior ao número 
 mínimo exigido por lei (5.000), verificando-se ainda ser o limite máximo do 
 intervalo de confiança igualmente inferior àquele número mínimo. Situando-se 
 todos os valores abaixo dos 5.000, incluindo a própria margem de erro 
 admissível, e na falta de tempo para proceder a uma validação com recurso a uma 
 amostra mais alargada e com menor margem de erro, a CNE deliberou não aceitar a 
 inscrição do grupo de cidadãos “Diz que Não”.
 
  
 Considerando um universo de 6.590 subscrições apresentadas pelo grupo de 
 cidadãos “Diz que Não”, a CNE refere que o resultado da verificação 
 administrativa da amostra mínima (100 subscrições) permitiu detectar a 
 ocorrência de 37 irregularidades (5 na análise preliminar da própria CNE, 
 traduzidas uma na falta de indicação de um número de bilhete de identidade, duas 
 na falta do nome completo e duas na falta de assinatura, 3 no controlo levado a 
 efeito pelo STAPE, e que decorriam da não localização dos nomes dos subscritores 
 na BDRE, e 29 na apreciação levada a cabo pela DSIC). O resultado da 
 extrapolação conduziria assim a um número de 4.152 subscrições, cujo intervalo 
 de confiança se situaria entre um limite inferior de 3.530 e um limite superior 
 de 4774, o que levou a CNE a concluir pela inexistência do número de 5.000 
 cidadãos eleitores requerido pelo artigo 41º, nº 1 da LORR.
 
  
 
 2. A deliberação da CNE precedentemente referida foi notificada por telecópia  
 ao grupo de eleitores “Diz que Não” em 19 de Janeiro de 2007. Em 22 de Janeiro 
 seguinte, este grupo, atendendo a que pensava ser demasiado elevado o número de 
 assinaturas recusadas pela DSIC, solicitou à CNE um conjunto de dados (critério 
 utilizado na averiguação da autenticidade das assinaturas dos cidadãos 
 signatários, cópias legíveis dos verbetes utilizados pelo Serviço de 
 Identificação Civil relativas às 29 ocorrências registadas pelo DSIC, e 
 indicação das 100 assinaturas que foram utilizadas na amostra), com o objectivo 
 de avaliar a possibilidade de recorrer da decisão da CNE.
 
  
 No mesmo dia, a CNE respondeu ao grupo de cidadãos em causa, referindo não ter 
 conhecimento do critério utilizado pela DSIC para averiguação da autenticidade 
 das assinaturas nem possuir cópia dos verbetes utilizados por aquele organismo, 
 pelo que não poderia satisfazer o pedido nessa parte; e indicou as 100 
 assinaturas que integravam a amostra, discriminando aquelas em relação às quais 
 se tinham detectado irregularidades no exame levado a cabo  quer pela própria 
 CNE, quer pelo STAPE, quer pela DSIC.
 
  
 Em 22 de Janeiro de 2007, o grupo de cidadãos eleitores “Plataforma Diz Que 
 Não”, representado por Ana Maria Líbano Monteiro, interpôs, nos termos do artigo 
 
 11º e dos números 1 e 2 do artigo 102º-B da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro (Lei 
 de Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional, de ora em 
 diante LTC),  recurso para o Tribunal Constitucional daquela decisão, invocando 
 que ela incorre num lapso matemático que, por si só, implica a exclusão 
 injustificada deste grupo cívico e que acolhe, na interpretação dos resultados 
 da verificação administrativa de natureza estatística efectuada ao universo das 
 subscrições e correspondentes assinaturas apostas quanto ao grupo em causa, um 
 não justificado formalismo oposto e prevalecente ao princípio democrático e ao 
 direito de participação na vida pública, consagrados nos artigos 2º e 48º da 
 Constituição.
 
  
 O recorrente começa por referir que a CNE utilizou um universo de assinaturas de 
 dimensão inferior à real, introduzindo na sua análise um erro matemático de base 
 adequado a comprometer de imediato, como comprometeu, a sua aceitação como grupo 
 cívico. Indica, a este propósito, que a CNE assumiu que as subscrições por si 
 apresentadas foram no número de 6590, conforme constava de um mapa-resumo em 
 folha de cálculo anexa ao conjunto de folhas de assinaturas entregues, apesar de 
 o número efectivo de assinaturas apresentadas ter sido bastante superior (7108), 
 tendo o recorrente excluído da contagem 518 assinaturas que, no seu 
 entendimento, não seriam de validar. No seu entender, a fazer incidir a 
 verificação administrativa à amostra mínima de 100 assinaturas de que resultou o 
 registo de 37 ocorrências, sobre o universo de subscrições agora reclamado, o 
 resultado da extrapolação seria de 4478 assinaturas e o limite superior do 
 intervalo de confiança largamente superior a 5000 assinaturas, o que 
 determinaria a inscrição do grupo ora recorrente, circunstância que revelaria a 
 utilidade do conhecimento do presente recurso.
 
  
 Contesta, por outro lado, a metodologia utilizada na verificação levada a cabo 
 pela CNE, quer por se desconhecer o critério de selecção da amostra elegida, 
 quer por a validação estatística a que se procedeu ter por base uma variável 
 subjectiva (a verificação da autenticidade das assinaturas) e não objectiva, o 
 que determinaria a possibilidade da ocorrência de falsos negativos. Problema que 
 apenas poderia ser evitado, no seu entender, através de verificações sujeitas a 
 contraditório, desde logo quanto às subscrições em crise e invalidadas 
 constantes da amostra recolhida e verificada. Em acréscimo, argumenta que a 
 utilização exclusiva de métodos indirectos (como a amostragem) para a 
 confirmação da veracidade da afirmação dos grupos deveria ser excluída, quer 
 pela margem de erro que lhes está associada, que poderia levar à privação do 
 exercício de direitos por erros inerentes à metodologia, quer por as conclusões 
 baseadas sobre métodos indirectos jamais poderem prevalecer sobre as conclusões 
 directas, devendo apenas ser utilizadas na ausência de métodos directos ou 
 quando comprovem as conclusões por estes obtidas. Entendimento este que, no seu 
 entender, não seria estranho a posições anteriormente assumidas pela própria 
 CNE.
 
  
 Finalmente, sustenta poderem ter sido incorrectamente relevadas nas 
 irregularidades detectadas as situações de dúvida por semelhança ou  
 dissemelhança, ou poderem ter sido indevidamente considerados ou identificados 
 os requisitos essenciais a observar em matéria de regularidade da constituição e 
 inscrição de grupos, como teria já sido reconhecido pela jurisprudência deste 
 Tribunal. A este propósito, contesta a invalidação de subscrições, pela CNE, por 
 falta de nome completo, em termos que no seu entender contrariariam a posição 
 assumida pelo Tribunal no seu acórdão nº 608/98, de 21 de Outubro. E, 
 sublinhando o seu desconhecimento dos critérios utilizados pela CNE e pela DSIC, 
 sustenta que, bastando menos três ocorrências para que resultassem válidas e 
 regulares, por efeito do processo de extrapolação, mais de 5000 assinaturas, com 
 a consequente aceitação da inscrição da recorrente, seria inequívoca, também por 
 este motivo, a utilidade do conhecimento do presente recurso, devendo ser 
 escrutinadas as dúvidas da CNE quanto aos elementos essenciais e da DSIC quanto 
 
 à regularidade das assinaturas, havendo todas as irregularidades verificadas de 
 ser detectáveis pelo homem médio à luz de todos os dados do processo, sob pena 
 de prevalência do formalismo sobre a vontade de todos os que, em nome do 
 princípio democrático, pretendem participar num processo político da maior 
 importância.
 
  
 E conclui reafirmando o essencial da argumentação anteriormente expendida e 
 salientando que a não aceitação do grupo de cidadãos recorrente resulta de um 
 lapso matemático de base e do registo de ocorrências que aquele não pôde 
 analisar, factores independentes mas que, cada um de per si, permitiriam a sua 
 aceitação.
 
  
 
 3. Por o entender possível e necessário, o ora relator solicitou à CNE, nos 
 termos do artigo 102º-B, nº 4 da LTC que fossem enviados ao Tribunal os 
 originais das folhas de subscrição do Grupo de cidadãos eleitores designado “Diz 
 que Não” donde constassem as assinaturas correspondentes às 29 irregularidades 
 detectadas pela DSIC e às 5 irregularidades detectadas pela CNE; que se 
 diligenciasse no sentido quer de ser indicado ao Tribunal o critério utilizado 
 por aquele organismo para a avaliação da autenticidade das assinaturas, quer da 
 remessa das cópias dos verbetes utilizados pela DSIC para controlo da 
 autenticidade das assinaturas; e, posteriormente, que fosse remetida ao Tribunal 
 cópia do requerimento de inscrição e denominação do grupo de cidadãos “Diz que 
 Não”.
 
  
 A CNE transmitiu ao Tribunal Constitucional, nesse mesmo dia, a documentação 
 solicitada.
 
  
 Cumpre apreciar e decidir.
 
  
 
  
 II
 
  
 Fundamentação
 
  
 
  
 
  
 
  4. Como decorre do relatado, a deliberação da CNE foi comunicada à Comissão 
 Executiva do Grupo de Cidadãos “Diz que Não”, por telecópia em 19 de Janeiro de 
 
 2007. E o recurso interposto em nome do grupo de eleitores “Plataforma Diz Que 
 Não”, apresentado à CNE, foi interposto para o Tribunal Constitucional no dia 22 
 de Janeiro seguinte, o primeiro dia útil (os dias 20 e 21 foram, 
 respectivamente, um sábado e um domingo) posterior aquele, após o ora recorrente 
 ter entretanto (ainda a 19 de Janeiro) pretendido obter e parcialmente obtido (a 
 
 22 de Janeiro pouco depois das 11 horas) da CNE determinados elementos em ordem 
 
 à elaboração do recurso (fls 14 a 19).
 
  
 Deste modo, o presente recurso, interposto ao abrigo do disposto no artigo 
 
 102º-B, nº 1, da LTC, é tempestivo, tendo em conta o que estabelece o nº 2 do 
 mesmo artigo da mesma lei, que fixa para tal efeito o prazo de um dia.
 
  
 
  
 
 5. Também não ocorrem problemas de legitimidade que possam impedir o 
 conhecimento do recurso. Na verdade, e mau grado ser sistematicamente referido 
 na documentação da CNE sob a denominação de “Diz que Não” (ofício de remessa do 
 processo a este Tribunal e fls. 1, 2, 4, 6, 7, 15 e 16) e ter utilizado a mesma 
 designação no ofício em que solicitou esclarecimentos à CNE em 22 de Janeiro, o 
 grupo de cidadãos eleitores ora recorrente, “Plataforma Diz Que Não”, solicitou 
 a sua inscrição à CNE sob esta última designação para participação no 
 esclarecimento da questão submetida ao referendo nacional de 11 de Fevereiro. 
 Por outro lado, a signatária do recurso, Ana Maria Líbano Monteiro, surge 
 identificada nos elementos juntos ao processo pela CNE por iniciativa do ora 
 relator como mandatária nacional do referido grupo de cidadãos eleitores.
 
  
 Tanto basta, sendo indisputável que a deliberação da CNE ora em apreço afecta 
 interesses legítimos do grupo de cidadãos eleitores recorrente, na medida em que 
 impede a sua participação no processo de esclarecimento conducente ao referendo 
 de 11 de Fevereiro próximo, para que seja reconhecida a sua legitimidade para a 
 interposição do presente recurso.
 
  
 
  
 
  6. Poderia ainda questionar-se se os termos em que o recorrente configura o 
 presente recurso respeitam o ónus de alegação dos vícios e ilegalidades que 
 afectam a decisão recorrida. Na verdade, é certo que o ora recorrente não 
 identifica quais as assinaturas (ou sequer o número destas) que em seu entender 
 
 (e contrariamente ao decidido pela CNE) hão-de ser tidas por válidas, 
 limitando-se a referir: que duas ocorrências de subscrições invalidadas por 
 falta de nome completo e duas invalidadas por falta de assinatura o não deveriam 
 ter sido, a ter sido seguida a orientação definida por este Tribunal no seu 
 acórdão nº 608/98, de 21 de Outubro; a recordar que bastariam menos três 
 ocorrências para que resultassem válidas e regulares, por efeito do processo de 
 extrapolação, mais de 5000 assinaturas, com o resultado de por esse facto dever 
 ser aceite a sua inscrição; e a suscitar, a partir do número elevado, e para si 
 inverosímil, de irregularidades detectadas, dúvidas quanto ao critério utilizado 
 pela DSIC na verificação administrativa.  De todo o modo, é certo igualmente que 
 a recorrente pretende que a idêntico resultado se deveria chegar, a revelar-se 
 procedente a sua argumentação, a propósito do lapso matemático de base que 
 imputa à CNE (e traduzido na desconsideração do que chama de universo real de 
 subscrições). 
 
  
 Nestes termos, conclui-se haver utilidade no conhecimento do recurso, na medida 
 em que o acolhimento das teses do recorrente poderá conduzir à procedência da 
 pretensão que faz valer perante este Tribunal. 
 
  
 
  
 
 7. Incumbe pois ao Tribunal Constitucional decidir se a deliberação impugnada se 
 baseia num erro matemático quanto à definição do universo real das subscrições, 
 se, como pretende o recorrente, não é admissível a exclusão de grupos de 
 cidadãos eleitores apenas pela simples utilização de métodos indirectos (como a 
 simples verificação administrativa com o recurso a uma amostragem) e se as 
 irregularidades apontadas na decisão da CNE impedem o preenchimento dos 
 requisitos legais de forma previstos, conjugadamente, nos artigos 41º, nº 3, e 
 
 17º, nºs 1 e 2, da LORR.
 
  
 
  
 
 8. Quanto à primeira daquelas questões, sustenta o recorrente que a CNE 
 considerou um universo real de 6590 subscrições, e não as 7108 inicialmente 
 apresentadas, tendo assim deixado totalmente de lado outras 518 assinaturas que 
 o próprio recorrente havia excluído da contagem. E sustenta ter assim a CNE 
 ocorrido num erro (um “erro matemático de base”), e um erro susceptível de 
 comprometer de imediato a aceitação do recorrente como grupo de cidadãos 
 eleitores. Para o efeito, alega que assumindo como correcto o resultado da 
 verificação administrativa à amostra mínima de 100 assinaturas considerada, e 
 aplicando os mesmos critérios de análise estatística ao número total de 
 assinaturas efectivamente entregue, obter-se-ia um resultado de extrapolação 
 diverso (4478 assinaturas e não 4152)  e um UIC (limite superior do intervalo de 
 segurança) seguramente superior a 5000 assinaturas, o que conduziria à plena 
 satisfação dos critérios necessários à inscrição da recorrente.
 
  
 A argumentação da recorrente deve ter-se por improcedente. Na verdade, se o 
 próprio grupo de eleitores em questão considerou determinadas assinaturas como 
 não válidas não se vê como censurar à CNE a circunstância de, completamente, as 
 haver desconsiderado no quadro do controlo que é chamada a levar a cabo. Por um 
 lado, porque há que não esquecer que o exercício de controlo a que a CNE procede 
 não constitui um fim em si, apresentando-se pelo contrário direccionado à 
 verificação do preenchimento, por parte das subscrições apresentadas, de 
 determinado conjunto de requisitos legais, tidos por indispensáveis à garantia 
 das necessárias lealdade e genuinidade da participação dos grupos de eleitores 
 no processo referendário. Nestes termos, não se concebe que sentido teria 
 considerar incluída no universo relevante uma parcela que de todo (no entender 
 do próprio recorrente) não preenchia aqueles requisitos. Afigura-se seguro que, 
 a ser assim, e a serem utilizados os métodos directos que a recorrente considera 
 essenciais num processo deste tipo, tais subscrições não poderiam deixar de se 
 revelar igualmente como irregulares. Por outro lado, a argumentação do 
 recorrente revela-se contraditória, uma vez que supõe que, a incluir-se no 
 universo um determinado número de subscrições inválidas, o número de ocorrências 
 detectado numa amostragem de 100 se manteria inalterado, o que se não pode 
 assumir como certo, sendo aliás dificilmente verosímil. Por último, a assumir-se 
 a lógica do recorrente, a inclusão destas 518 subscrições no universo a que se 
 refere a amostra não poderia ter outra consequência que a de perturbar a 
 avaliação que se pretende levar a cabo por este método indirecto. Com efeito, a 
 aleatoriedade que a sua aplicação não deixa de encerrar e lhe é inerente seria 
 susceptível de desfigurar os próprios resultados da amostragem, na exacta medida 
 em que levaria à aplicação do método numa perspectiva já consabidamente viciada, 
 comprometendo o objectivo desta metodologia que, embora num contexto de redução 
 da realidade, sempre visa a sua reprodução de forma fidedigna.
 
  
 Nestes termos, não se vislumbra nem fundamento nem sentido em censurar  à CNE a 
 opção que a este respeito ela acabou por perfilhar, desconsiderando elementos 
 que à partida eram tidos por inválidos e cuja possibilidade de interferência no 
 resultado de uma avaliação de tipo indirecto sempre se deveria ter por 
 ilegítima, em razão desde logo da sua referida viciação (ademais, como se disse, 
 
 à partida reconhecida pelo recorrente).
 
  
 
  
 
 9. Num segundo momento, considera a recorrente, para além de entender necessária 
 a indicação do critério de selecção da amostra elegida, que a metodologia 
 proposta (que utiliza uma amostragem) só poderia fazer sentido em presença de 
 variáveis de verificação objectiva, e não já, como no caso, de verificação 
 subjectiva. A desconsideração deste condicionalismo traduzir-se-ia, no seu 
 entender, por poder gerar o aparecimento de falsos negativos, possibilidade a 
 que seria indiferente a extensão da amostra, visto ela permanecer constante, 
 atenta a natureza subjectiva da verificação. Em particular, a recorrente 
 contesta a utilização, pela CNE, em alternativa à verificação directa e 
 exaustiva de todas as candidaturas, de técnicas de amostragem, quando ela for 
 utilizada para excluir um direito de participação. E refere que a própria CNE, 
 na sua prática anterior, tem continuado a utilizar os métodos de verificação 
 directa, sublinhando que as exigências postas a este propósito por aquele 
 organismo em matéria de constituição e inscrição de grupos apenas têm sido 
 objecto de confirmação jurisprudencial no que se não refere aos requisitos 
 essenciais desta.
 
  
 Importa salientar, a este propósito, que é a própria LORR que, no seu artigo 
 
 17º, nº 2 (aplicável em matéria de forma de constituição dos grupos de cidadãos 
 eleitores por força do artigo 41º, nº 3 do mesmo diploma) prevê a possibilidade 
 de  solicitar aos serviços competentes da Administração Pública a verificação 
 administrativa, por amostragem, da autenticidade das assinaturas e da 
 identificação dos subscritores (da iniciativa popular referendária como da 
 constituição dos grupos de cidadãos eleitores). Verificação cuja legalidade já 
 foi de resto reconhecida por este Tribunal, no seu citado acórdão nº 608/98, de 
 
 21 de Outubro.
 
  
 Como quer que seja, o certo é que a recorrente suscita também a questão da 
 incorrecta detecção de irregularidades (ou de indevida consideração ou detecção 
 de situações de falta dos requisitos essenciais da validade das subscrições) por 
 parte da CNE a partir do número alegadamente elevado de irregularidades 
 detectadas em situações de dúvida por semelhança ou dissemelhança (37 em 100). E 
 esta argumentação, bem vistas as coisas, não contende já com a possibilidade de 
 aplicação da metodologia da amostragem para identificação dos casos de recusa, 
 mas com os termos em que foi concretamente realizada a verificação 
 administrativa em causa.
 
  
 Nestes termos, a questão a decidir desde logo é a de saber se o procedimento 
 seguido pela CNE para concluir pela existência das 37 irregularidades está em 
 consonância com os requisitos legais, tal como têm sido entendidos pela 
 jurisprudência deste Tribunal.
 
  
 
  
 
  
 
 10. A este propósito, e quanto às ocorrências detectadas pela DSIC, o recorrente 
 
  reafirma a ignorância, em que se encontraria, do critério seguido pelas 
 entidades encarregues da verificação, e a circunstância de o facto de bastarem 
 menos 3 ocorrências para que resultassem válidas e regulares, por efeito do 
 processo de extrapolação, mais de 5000 assinaturas, com o resultado de a sua 
 inscrição ter de ser em tal caso aceite.
 
  
 Ora, a consulta dos elementos enviados pela CNE, e que serviram de suporte à 
 verificação administrativa por esta efectuada, permite concluir que, de entre as 
 
 29 subscrições recusadas pela DSIC seguramente que 11, pelo menos, contém a 
 assinatura do cidadão eleitor proponente tal qual consta do verbete de 
 requisição do bilhete de identidade respectivo no lugar dedicado à inscrição do 
 nome completo deste.
 
  
 Como se afirmou no referido acórdão nº 608/98, de 21 de Outubro, deste Tribunal, 
 se “a lei exige que constem do requerimento de constituição do grupo de cidadãos 
 eleitores as respectivas assinaturas, como requisitos legais destinados à 
 expressão da clara vontade de tais cidadãos de constituírem o grupo e da sua 
 efectiva identificação” o certo é que “não consta dos requisitos legais 
 destinados a assegurar a realização dos objectivos anteriormente referidos a 
 indicação do lugar da assinatura ou do nome completo, podendo, claramente, valer 
 como assinatura aquilo que for designado por nome completo (…) Decisivo é que a 
 subscrição integre a assinatura do cidadão proponente, de forma adequada à prova 
 da sua autenticidade e à identificação do subscritor pelos serviços competentes 
 da Administração Pública. Por conseguinte, a subscrição deve compreender, em 
 princípio, a assinatura constante do bilhete de identidade.”
 
  
 No caso em apreço, repete-se, em todos os casos referidos há efectivamente uma 
 assinatura semelhante (segundo o critério do observador médio não especialista, 
 que, de acordo com a CNE, é o utilizado por ela própria e pelo Serviço de 
 Identificação Civil) à assinatura constante do verbete de requisição do bilhete 
 de identidade. Ainda que tal assinatura esteja aposta no local previsto para a 
 utilização do nome completo, se se tivesse, segundo o critério do observador 
 médio não especialista em grafologia, efectuado o confronto com as palavras 
 indicadas no lugar previsto para o nome completo, ter-se-ia concluído pela 
 semelhança das assinaturas.
 
  
 
 É o que ocorre, no mínimo e seguramente, com as seguintes situações:
 
  
 Luís Filipe Coelho Torres, fls 49, linha 1.
 Zelinda Narciso Castanheira, fls 513, linha 3
 José António Paulos, fls 20, linha 3
 Maria Luísa Andrade Dias, fls 178, linha 13
 Ana da Silva Oliveira, fls 492, linha 10
 Maria da Conceição Pardal, fls 223, linha 16
 Carlos Manuel Palma, fls 122, linha 4
 Maria Leonor da Silva Marques, fls 47, linha 6
 Maria Antónia Vieira, fls 511, linha 12
 Diamantino dos Santos, fls 39, linha 3
 Eduardo Adelino Guarda, fls 100, linha 8.
 
  
 De modo semelhante ao que se verificou ocorrer  na situação analisada no 
 referido acórdão nº 608/98, de 21 de Outubro, deste Tribunal, é pois o próprio 
 critério utilizado na confirmação das assinaturas que fornece resultados 
 contraditórios aos da deliberação da CNE. Com efeito, e como também aí se 
 afirmou, o observador médio não recusaria, de acordo com os dados do processo, a 
 autenticidade das assinaturas de pelo menos 11 dos 29 signatários 
 precedentemente referidos se tomasse em consideração a indicação dos nomes. “E é 
 de recusar, nesta matéria, em nome do próprio princípio democrático (art. 2º da 
 Constituição) a prevalência absoluta do formalismo de um formulário não oficial 
 sobre uma vontade que não pode deixar de se tomar (…) como autêntica e 
 inequivocamente expressa”, ainda nas palavras do acórdão nº 608/98.
 
  
 Assim o Tribunal Constitucional há-de concluir pela invalidade da deliberação da 
 CNE de 18 de Janeiro de 2007, no que se refere pelo menos àquelas 11 das 29 
 assinaturas consideradas dissemelhantes das constantes nos verbetes de 
 requisição do bilhete de identidade. Projectando a validade desse número de 
 assinaturas na fórmula matemática utilizada para calcular a repercussão da 
 amostragem no universo total das assinaturas, conclui-se que se atinge o 
 resultado da extrapolação de 4877, sendo que o respectivo limite superior do 
 intervalo de confiança sempre ultrapassará claramente o número de 5000 
 subscrições válidas legalmente exigido.
 
  
 Torna-se assim dispensável apreciar a possibilidade de aplicação de métodos 
 indirectos à exclusão de grupos de cidadãos eleitores. E torna-se igualmente 
 dispensável considerar se outras subscrições, para além das indicadas, seriam 
 ainda susceptíveis de validação de acordo com o critério exposto (designadamente 
 aquelas em que o nome foi abreviado em algum dos seus componentes ou reduzido 
 por eliminação de parte dos seus elementos),  bem como se quanto aos outros 
 quatro casos de irregularidades detectadas directamente pela CNE, mas 
 contestadas pelo recorrente, se deve concluir de igual modo. Por si só, a 
 conclusão de que não são inválidas 11 das 37 subscrições anteriormente 
 mencionadas basta para satisfazer o requisito numérico previsto no artigo 41º, 
 nº 1, da LORR e determinar a procedência do recurso.
 
  
 
  
 
  
 
  
 
  
 
                                                                        III
 
  
 
                                                                   Decisão
 
  
 
  
 
 11. Pelo exposto, o Tribunal Constitucional decide conceder provimento ao 
 recurso interposto da deliberação da CNE de 18 de Janeiro de 2007, relativa à 
 não inscrição do Grupo de Cidadãos Plataforma “Diz que Não”, determinando, 
 consequentemente, que se proceda à inscrição daquele Grupo de Cidadãos 
 eleitores, em conformidade com o disposto no artigo 41º, nº 1 da Lei nº 15-A/98, 
 de 3 de Abril.
 Lisboa, 26 de Janeiro de 2007
 Rui Manuel Moura Ramos
 Benjamim Rodrigues
 Maria Fernanda Palma
 Gil Galvão
 Carlos Pamplona de Oliveira
 Maria João Antunes
 Paulo Mota Pinto
 Maria Helena Brito
 Mário José de Araújo Torres
 Maria dos Prazeres Pizarro Beleza
 Vítor Gomes
 Artur Maurício