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Processo nº 986/06
 
 1ª Secção
 Relatora: Conselheira  Maria João Antunes
 
  
 
  
 Acordam na 1ª Secção do Tribunal Constitucional
 
   
 
  
 I. Relatório
 
 1. Nos presentes autos, vindos do Tribunal da Relação de Coimbra, em que é 
 recorrente o Ministério Público e recorrido A., foi interposto recurso para o 
 Tribunal Constitucional, ao abrigo da alínea a) do nº 1 do artigo 70º da Lei da 
 Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional (LTC), do 
 acórdão daquele Tribunal de 10 de Outubro de 2006.
 
  
 
 2. O ora recorrido formulou, junto dos serviços de Segurança Social, pedido de 
 concessão de protecção jurídica, na modalidade de apoio judiciário, pretendendo 
 a dispensa de pagamento de taxa de justiça e demais encargos com o processo, 
 para contestar acção com o valor de 1.201.000 €.
 O requerente foi notificado de que, face aos documentos apresentados, não lhe 
 poderia ser concedida “a dispensa total dos encargos judiciais”, “mas apenas o 
 pagamento faseado dessa despesa”, sendo-lhe concedido o prazo de dez dias para 
 se pronunciar e, nomeadamente, para clarificar se pretendia ou não a concessão 
 do apoio judiciário nessa modalidade. O requerente respondeu reiterando o pedido 
 anteriormente formulado.
 Por decisão de 19 de Novembro de 2004, o pedido de dispensa do pagamento de taxa 
 de justiça e demais encargos com o processo foi indeferido.
 
  
 
 3. Esta decisão da Segurança Social foi impugnada judicialmente, vindo o 
 Tribunal Judicial da Figueira da Foz a julgar improcedente o recurso, por 
 decisão de 21 de Janeiro de 2005, que transitou em julgado. Foi elaborada conta 
 de custas, apurando-se como valor a pagar pelo ora recorrido a quantia de 
 
 11.894,85 €.
 Notificado para pagamento das custas, o recorrido apresentou reclamação, 
 indeferida por despacho de 11 de Outubro de 2005. Foi então interposto recurso 
 para o Tribunal da Relação de Coimbra, decidido pelo acórdão agora recorrido.
 Esta decisão apresenta a seguinte fundamentação:
 
  
 
 «7.1. O objecto do recurso é o de saber se as custas são contadas a partir do 
 valor da acção para a qual é pedido o apoio judiciário, como ocorreu, ou a 
 partir do valor que o juiz fixar «tendo em atenção a repercussão económica da 
 acção para o responsável pelas custas ou, subsidiariamente, a situação económica 
 deste», como defende o recorrente.
 O artigo 6° do Código das Custas Judiciais (CCJ) prevê, para efeitos de custas, 
 um critério especial para fixar o valor da causa: «nos casos a seguir enunciados 
 considera-se como valor, para efeito de custas: ...». Um desses casos, é o da 
 impugnação judicial de decisão sobre a concessão de apoio judiciário: «na 
 impugnação judicial de decisão sobre a concessão de apoio judiciário, o da 
 respectiva acção ou, subsidiariamente, o resultante da alínea a)» (…); a alínea 
 a) do mesmo artigo, refere-se ao valor das acções «sobre o estado das pessoas e 
 nos processos sobre interesses imateriais» para os quais estabelece o valor 
 
 «fixado pelo juiz, tendo em atenção a repercussão económica da acção para o 
 responsável pelas custas ou, subsidiariamente, a situação económica deste», ou 
 seja, o critério defendido pelo recorrente.
 
 7.2. Face a esta redacção, pensamos que a questão não oferece dúvidas: é 
 correcta a posição do despacho recorrido, ou seja, o valor a tomar em conta é o 
 da respectiva acção.
 Para que o valor tributário da acção fosse o fixado na alínea a) do artigo 6° do 
 CCJ seria necessário que não pudesse ser o do critério principal, já que este é 
 subsidiário, ou seja, só se aplica quando não for possível o primeiro. É isso 
 que significa o vocábulo subsidiário.
 E quando se aplica o subsidiário? Quando não existir uma acção que permita 
 determinar o valor segundo o critério principal. O que acontece quando ainda não 
 há nenhuma acção instaurada: um cidadão dirige-se ao Instituto de Segurança 
 Social para pedir apoio judiciário para uma acção que vai ser intentada; o 
 benefício é-lhe negado e ele impugna judicialmente a decisão administrativa; 
 proferida a decisão judicial, qual o valor a ter em conta para elaborar a 
 respectiva conta? O da acção não pode ser, porque ainda não existe e nem sequer 
 se sabe por qual acção vai optar o advogado que, inclusivamente, pode ser a 
 nomear. Então, entra em acção o critério subsidiário.
 E tanto é assim que o CCJ anterior, quando o apoio judiciário ainda era 
 processado judicialmente, a alínea o), do artigo 6°, estabelecia somente um 
 
 único critério: «no apoio judiciário, o da respectiva acção». Não precisava de 
 um critério subsidiário porque o pedido de apoio judiciário – pedido judicial e 
 não administrativo – era sempre formulado numa acção, ou que se instaurava, 
 sendo necessário dar-lhe um valor (…), ou que já corria. Antes de formular o 
 pedido, a parte poderia ter necessidade da nomeação de patrono, incidente esse 
 que estava isento de custas (…).
 
 7.3.1. O facto «do procedimento de protecção judiciária na modalidade de apoio 
 judiciário» ser «autónomo em relação à causa que respeita, não tendo qualquer 
 repercussão no andamento desta» (…) resulta do disposto no artigo 24° da Lei n° 
 
 34/2004, de 29 de Julho, e em nada altera o que foi decidido. Aliás, é por essa 
 razão que as custas foram contadas considerando tratar-se de uma acção, 
 precisamente, autónoma; autonomia, em termos de processamento, inclusivamente 
 porque o órgão do Estado competente para a decisão é um órgão da Administração 
 Pública em vez de um judicial. Mas, já a impugnação da decisão administrativa se 
 processa no tribunal e o Código respectivo manda tomar em conta o valor da acção 
 para a qual se pretende o apoio judiciário. E o recorrente foi condenado em 
 custas pela forma como são condenadas todas as partes: «custas do recurso pelo 
 recorrente» (…); nada a seu favor pode o recorrente tirar daqui.
 
 7.3.2. Por outro lado, também não tem que ser chamado à colação a norma do 
 artigo 84° do CCJ (…), uma vez que diz respeito às custas criminais.
 
 7.4. Não obstante a correcção formal do processado, o resultado a que se chega 
 fere de uma forma intolerável o sentido de justiça e de proporcionalidade. É 
 chocante, podendo mesmo dizer-se que levaria a um resultado cínico e caricato 
 que nenhuma pessoa de bem compreenderia, por muitos argumentos jurídicos que 
 houvesse ou que haja.
 
 7.4.1. Para a análise do que se passou em concreto neste processo, é necessário 
 ter presentes três circunstâncias, muito embora, pela sua natureza, não as 
 comentemos:
 a) a transferência para a administração de um incidente que, nos tribunais, 
 nunca provocou problemas nem dificuldades nem delongas;
 b) a ideia geralmente difundida de que a nova disciplina do apoio judiciário em 
 nada contribui para um acesso saudável dos cidadãos à justiça, pelos seus 
 critérios. Do ponto de vista objectivo, podemos dizer que este caso – e todos os 
 casos semelhantes – dificultam mesmo tal acesso.
 c) de uma forma geral, os cidadãos não podem dirigir-se só por si à 
 administração da justiça, necessitam de o fazer através de um advogado, que gere 
 a posição processual de alguém que é leigo na matéria.
 Então, com estas coordenadas, olhemos ao que se passou neste processo: 
 
 (…).
 
 7.5. Ora, o que há-de pensar o cidadão leigo em direito «que tem condições 
 objectivas para suportar os custos da consulta jurídica, mas não tem condições 
 objectivas para suportar os custos de um processo, e por isso deve beneficiar do 
 apoio judiciário na modalidade de pagamento faseado, ...» disto tudo? De ter 
 direito a pagar faseadamente, mas tal não lhe ter atribuído? De, ao fim de tudo 
 isto, ter de pagar 2.384:703$00 por ter pedido dispensa total, mas só ter 
 direito a pagamento faseado (que, entretanto, não lhe foi atribuído)?
 Há-de pensar mal. E, salvo melhor opinião, também nós pensamos que não é 
 direito.
 
 7.6.1. Mas, para além deste episódio ocorrido neste processo - de que o 
 interessado poderia ter recorrido e que poderá ser rectificado no futuro -, o 
 mais importante é que a norma constante do artigo 6°, alínea o), conjugada com a 
 do artigo 14°, ambas do CCJ, é inconstitucional na parte em que tributa a 
 impugnação judicial de negação de apoio judiciário como uma acção, embora com 
 redução a metade (…).
 
 7.6.1.1. Por violação do princípio da igualdade consagrado no artigo 13° da 
 Constituição da República.
 Nenhuma justificação haveria para que duas pessoas em situações económicas 
 semelhantes – por exemplo, no limiar da insuficiência económica aceite pela lei 
 de apoio judiciário –, pagassem custas marcadamente diferentes, por uma delas 
 querer intentar ou defender-se de uma acção de baixo valor e a outra o fizesse 
 numa acção de valor muito elevado, sendo certo que, indeferida a pretensão de 
 apoio, qualquer deles, em sucumbência dessa outra acção para que pedira o apoio 
 judiciário, teria ainda de pagar as custas e, então aí sim, mais ou menos 
 consoante o valor dessa acção; mas o processamento da concessão ou da denegação 
 de apoio judiciário não justifica diferenças muito grandes entre os diversos 
 requerentes.
 Assim, estaria em causa o princípio consagrado no artigo 13° da Constituição da 
 República se tal situação fosse taxada nos termos dos artigos 6°, alínea o), e 
 
 14° do CCJ.
 
 7.6.1.2. Por violação do princípio do acesso à justiça, consagrado no artigo 20° 
 da Constituição da República.
 Se um cidadão, por fracassar na sua reacção ao indeferimento de apoio 
 judiciário, por essa razão, fosse obrigado a pagar 2.384.703$00 (!) - para além 
 do que poderia ter de pagar com a acção respectiva -, criar-se-ia, 
 verdadeiramente, medo em recorrer à administração da justiça e tal consequência 
 significaria um perigo real para os cidadãos e, seguramente, um sério factor de 
 inibição de acesso ao direito, incluindo o direito de discutir com a 
 Administração a sua situação de carência económica.
 
 7.6.1.3. Por violação dos princípios da justiça e da proporcionalidade, ambos 
 decorrentes da ideia de Estado de direito democrático (…).
 
 É demais ter de pagar 2.384.703$00 (!) por decair na pretensão de apoio 
 judiciário, independentemente de se ter uma situação económica que permitia o 
 direito a pagamento faseado, circunstância que só realça a injustiça. Seria um 
 exagero, que ninguém compreenderia. Seria preciso ser-se extraordinariamente 
 rico.
 
 7.6.2. Dentro desta linha, já foi julgado inconstitucional a norma constante do 
 artigo 3º do Decreto-Lei n° 199/90, de 19 de Junho, conforme decidiu o Acórdão 
 do Tribunal Constitucional, de 22 de Março de 2006: «julgar inconstitucional – 
 por violação dos princípios do acesso ao direito e da proporcionalidade – a 
 norma constante do artigo 3° do Decreto-Lei n.° 199/90, de 19 de Junho, na parte 
 em que, conjugada com as respectivas tabelas anexas, estabelece a taxa de 
 justiça devida num processo de impugnação judicial de liquidação de imposto no 
 valor de 14.943.938$00, fixando-a em 1.150.076$00 (…)». Decisão esta que 
 corresponde a corrente jurisprudencial reiterada e uniforme do referido 
 Tribunal, conforme resulta dos Acórdão n.° 1182/96, 70/98, 107/98, 136/98, 
 
 143/98, 146/98, 166/98, 172/98, 196/98, 280/98 e 283/98.
 
 7.7. Então, a solução é considerar a impugnação judicial como um incidente, para 
 efeitos de tributação (…).
 E os incidentes são tributados de acordo com o artigo 16° do CCJ, em que a taxa 
 de justiça tem uma redução «em função da sua complexidade, do valor da causa, do 
 processado a que deu causa ou da sua natureza manifestamente dilatória», sendo 
 fixada entre 1 UC e 20 UC.
 
 7.7.1. A transferência da questão apoio judiciário para outro órgão do Estado 
 teria sempre que ter como consequência a criação de um processo autónomo e 
 independente, com objecto próprio (…). Mas, isto do ponto de vista formal, 
 porque, do material, não deixa de ter natureza instrumental; viverá sempre na 
 
 órbita de um outro procedimento, que é o principal, tanto que o legislador até 
 lhe determinava o valor pelo da respectiva acção. Mas, não é a transferência da 
 competência para tais decisões que lhe altera a natureza. E o facto de ter um 
 processamento autónomo só reforça essa classificação, pois isso é próprio das 
 questões incidentais; tal como a característica de ter como objecto uma questão 
 fora do encadeado daquelas que são logicamente necessárias para a resolução da 
 acção a que diz respeito (…).
 Natureza instrumental que corresponde ao tratamento que sempre teve (…).
 O que está em causa é a natureza da questão e não a sua forma. E o legislador, a 
 par das acções, conhece os incidentes com a estrutura de acções para base do 
 cálculo da taxa de justiça (…).
 
 7.7.2. Portanto, o que há-de ser critério desta questão é natureza do processo 
 que decide o apoio judiciário; e este, quer na fase administrativa, quer na 
 judicial, tem sempre natureza incidental.
 
 7.7.3. E esta solução é consentânea com a relativa a muitos outros incidentes, 
 com muito maior complexidade do que este.
 Não faria sentido nenhum que um recorrente, numa impugnação judicial de negação 
 de apoio judiciário, suportasse custas de acordo com o valor da acção, com uma 
 redução da taxa de justiça a metade e partes habilitadas num processo que também 
 fosse muito complexo e com valor elevado merecessem a atenção do artigo 16° do 
 CCJ, sendo que a habilitação (…) pode aparecer como (ter a forma de):
 a)         uma acção (habilitação-acção ou habilitação principal);
 b)        incorporada na petição ou requerimento iniciais 
 
 (habilitação-legitimidade);
 c)         incidente no decurso de uma acção (habilitação-incidente).
 E chamámos o exemplo da habilitação porque, historicamente, o incidente de apoio 
 judiciário teve sempre um tratamento semelhante ao da habilitação.
 III – Decisão.
 Nestes termos, por inconstitucionalidade material da norma constante do artigo 
 
 6°, alínea o), do Código das Custas Judiciais, na parte em que tributa a 
 impugnação judicial de decisão sobre a concessão de apoio judiciário, prevista 
 nos artigos 27° e 28° da Lei n° 34/04, de 29/7, como uma acção, reduzindo a 
 respectiva taxa de justiça a metade, e recorrendo à norma constante do artigo 
 
 16° do mesmo Código, fixam a taxa de justiça em cinco unidades de conta».
 
  
 
 4. O Ministério Público interpôs, então, o presente recurso, requerendo a 
 apreciação da norma constante da alínea o) do artigo 6º do Código das Custas 
 Judiciais, na parte em que tributa a impugnação judicial de decisão sobre a 
 concessão de apoio judiciário, prevista nos artigos 27º e 28º da Lei nº 34/04, 
 de 29/7, como uma acção, reduzindo a respectiva taxa de justiça a metade. 
 Notificado para alegar, concluiu que:
 
  
 
 «1 – É inconstitucional a norma constante do artigo 6°, n° 1, alínea o), do 
 Código das Custas Judiciais em vigor, na parte em que tributa a impugnação 
 judicial da decisão administrativa sobre a concessão do apoio judiciário, 
 prevista nos artigos 27° e 28° da Lei n° 34/04, de 29 de Julho, como uma acção, 
 tributando tal recurso em função do valor da causa principal.
 
 2 – Na verdade, tal critério de fixação do valor tributário do recurso – 
 coligando-o, não ao montante das custas em controvérsia, mas ao valor dos 
 interesses litigados na causa principal – é susceptível de constituir factor de 
 inibição no exercício do direito ao recurso por parte de quem se considera 
 economicamente carenciado, atento o desproporcionado valor que as custas do dito 
 recurso podem envolver, quando a causa principal seja de elevado valor.
 
 3 – Termos em que deverá confirmar-se o juízo de inconstitucionalidade formulado 
 pela decisão recorrida».
 
  
 
 5. Notificado, o recorrido não contra-alegou.
 
  
 Cumpre apreciar e decidir.
 
  
 II. Fundamentação
 
 1. A decisão recorrida recusou a aplicação da norma constante do artigo 6º, 
 alínea o), do Código das Custas Judiciais, na parte em que tributa a impugnação 
 judicial de decisão sobre a concessão de apoio judiciário, prevista nos artigos 
 
 27º e 28º da Lei nº 34/04, de 29 de Julho, como uma acção, reduzindo a 
 respectiva taxa de justiça a metade, por violação dos princípios consagrados nos 
 artigos 13º e 20º da Constituição da República Portuguesa e dos princípios da 
 justiça e da proporcionalidade decorrentes da ideia de Estado de direito 
 democrático.
 A norma do Código das Custas Judiciais, cuja aplicação foi recusada pelo 
 Tribunal da Relação de Coimbra, tem o seguinte teor:
 
  
 
 «Artigo 6.º
 Regras especiais
 
 1 – Nos casos a seguir enunciados considera-se como valor, para efeito de 
 custas:
 
 (…)
 o) Na impugnação judicial de decisão sobre a concessão de apoio judiciário, o da 
 respectiva acção ou, subsidiariamente, o resultante da alínea a);
 
 (…)».
 
  
 
 2. A norma que é objecto deste recurso – a contida na alínea o) do nº 1 do 
 artigo 6º do Código das Custas Judiciais, na parte em que tributa em função do 
 valor da causa principal a impugnação judicial de decisão administrativa sobre a 
 concessão de apoio judiciário – foi recentemente apreciada e decidida no Acórdão 
 do Tribunal Constitucional nº 255/2007 (disponível em 
 
 www.tribunalconstitucional.pt). 
 Esta decisão confirmou o juízo de inconstitucionalidade constante da decisão 
 recorrida, nos seguintes termos:
 
  
 
 «(…) De acordo com a transcrita disposição [alínea o) do nº 1 do artigo 6º do 
 Código das Custas Judiciais], se um pedido de concessão de apoio judiciário 
 visar obter os respectivos benefícios quanto à instauração de uma acção com 
 determinado valor (não se sendo esta referente a estado das pessoas ou a 
 interesses imateriais), caso esse pedido seja objecto de não deferimento 
 
 (qualitativa ou quantitativamente) por parte dos serviços da Segurança Social, à 
 respectiva impugnação, para efeitos de custas, é conferido o valor da acção 
 intentada interpor.
 Deste modo, numa situação de improvimento da impugnação da decisão de 
 indeferimento tomada pelos serviços da Segurança Social, o impugnante será 
 responsável pelo pagamento de uma taxa de justiça que terá por referência o 
 valor da instauranda acção.
 
 4. No domínio do Código das Custas Judiciais vigente anteriormente ao aprovado 
 pelo Decreto-Lei nº 224-A/96, de 26 de Novembro, as pretensões da então 
 denominada assistência judiciária eram deduzidas no tribunal da causa (a 
 instaurar ou já instaurada) e por este decididas, sendo o respectivo 
 processamento visualizado como um incidente processual (cfr. nº 1 do artº 43º 
 daquele Código).
 Dispunha-se, naquele domínio [cfr. alínea v) do nº 1 do artº 8º do Código então 
 em vigor] que o valor atendível para efeitos de custas era o que resultava das 
 leis de processo para o processado a contar e, tratando-se de processos de 
 assistência judiciária, o respectivo valor era o da acção a que respeitavam.
 E porque, como se disse acima, as pretensões de assistência judiciária se 
 processavam como um incidente processual, a taxa de justiça era igual a um 
 quarto da fixada na tabela anexa ao aludido Código (esta referente ao 
 processamento de uma acção com o valor da instaurada ou a instaurar) ou a um 
 oitavo, caso não fosse deduzida oposição ou esta não fosse admissível (dito nº 1 
 do artº 43º).
 A análise da compatibilidade constitucional da alínea v) do nº 1 do artº 8º do 
 Código das Custas Judiciais vigente antes do aprovado pelo Decreto-Lei nº 
 
 224-A/96 foi levada a efeito por este Tribunal por intermédio do seu Acórdão nº 
 
 495/96, publicado na II Série do Diário da República de 17 de Julho de 1996, aí 
 se tendo concluído pela não insolvência de tal norma em face da Lei Fundamental.
 
 5. Ponderando que o normativo apreciado naquele citado aresto apresentava um 
 teor que, praticamente, era semelhante ao do da norma agora em apreciação, 
 poder-se-ia ser levado a entender que a fundamentação carreada ao dito acórdão 
 seria transponível para o caso a analisar nestes autos.
 Simplesmente, haverá que não olvidar que, aquando da prolação da decisão aqui 
 impugnada, o preceito cuja recusa de aplicação foi operada por tal decisão se 
 insere num Código das Custas Judiciais que apresenta assinaláveis diferenças 
 relativamente ao que vigorava antes do Código que foi aprovado pelo Decreto-Lei 
 nº 224-A/96 e que as pretensões para obtenção do benefício de apoio judiciário 
 se processam de modo acentuadamente divergente da anteriormente designada 
 
 «assistência judiciária».
 Neste último particular, cabe assinalar que as pretensões de desfrute de apoio 
 judiciário atinentes a acções como a intentada instaurar pela recorrida são, 
 hodiernamente, formuladas perante os serviços da Segurança Social e as 
 respectivas decisões (que não são reclamáveis nem recorríveis hierarquicamente) 
 são impugnáveis perante o tribunal de comarca em que estão sediados aqueles 
 serviços – cfr. artigos 20º, 26º e 28º da Lei nº 30/2004, de 29 de Julho).
 Essa impugnação pode, por isso, perspectivar-se como um recurso interposto para 
 um tribunal de uma decisão de carácter administrativo, assumindo, em 
 consequência, um cariz de «uma acção impugnatória deduzida perante um órgão de 
 administração de justiça».
 São, pelo que veio de se expor, assinaláveis as diferenças de regimes, não 
 passando em claro o que igualmente já se consignou acima no tocante à 
 circunstância de os pedidos de assistência judiciária anteriores serem 
 processados como «incidentes» das acções e de a taxa de justiça devida nos casos 
 de indeferimento sofrer as reduções do mencionado artº 43º.
 Abra-se aqui um parêntesis para assinalar que, mesmo no domínio do Código das 
 Custas Judiciais na versão aprovada pelo Decreto-Lei nº 224-A/96, nos incidentes 
 de apoio judiciário era a taxa de justiça reduzida a um quarto [cfr. alínea o) 
 do nº 1 do artº 15º].
 
 6. Na conta efectuada nos autos foi considerado que a taxa de justiça, tendo por 
 referente o valor da acção a instaurar, era equivalente a metade daquela a que 
 refere a Tabela constante do Anexo I ao Código das Custas Judiciais emergente da 
 redacção dada pelo Decreto-Lei nº 324/2003, de 27 de Dezembro (o que significa 
 que a situação de uma impugnação de deliberação relativamente a um pedido de 
 apoio judiciário pelos serviços de Segurança Social foi entendida como 
 subsumível ao nº 2 do artº 18º daquele corpo de leis.
 Mesmo aceitando um tal critério, o que se torna indiscutível é que no domínio do 
 actual Código e do actual processamento da impugnação das deliberações 
 proferidas pelos serviços de Segurança Social desfavoráveis aos peticionantes, a 
 taxa de justiça devida em caso de improvimento é, pelo menos duas vezes (e 
 diz-se no mínimo em face da desenhada aceitação do critério), superior ao máximo 
 
 (um quarto da taxa referente a uma acção com o valor da a instaurar) possível 
 nos casos de indeferimento dos pedidos anteriores da então designada assistência 
 judiciária (sendo ainda possível, como se viu acima, que a taxa destes pudesse 
 ser reduzida a um oitavo).
 Existe, pois, quanto às situações de improvimento judicial da impugnação das 
 deliberações dos serviços de Segurança Social tal como agora se encontram 
 reguladas, um acentuado agravamento do montante da taxa de justiça 
 comparativamente com os casos de indeferimento dos pedidos de assistência 
 judiciária, conquanto numas e noutros o referente da taxa fosse sempre o do 
 valor da acção instaurada ou a instaurar.
 
 7. A propósito do direito de acesso aos tribunais, na sua vertente de proibição 
 de denegação de justiça por insuficiência de meios económicos, tem este Tribunal 
 seguido uma impressiva jurisprudência de acordo com a qual, conquanto a 
 Constituição não imponha a gratuitidade daquele acesso, o que será vedado ao 
 legislador é o estabelecimento de regras de onde resulte que os encargos que 
 hão-de ser suportados por quem recorre aos órgãos jurisdicionais possam, na 
 prática, constituir um entrave inultrapassável ou um acentuadamente grave ou 
 incomportável sacrifício para desfrutarem de tal direito.
 E tem também essa jurisprudência perfilhado a perspectiva que, revestindo as 
 custas judiciais a característica de uma taxa – e não de um imposto – 
 inserir-se-á na liberdade conformativa do legislador a fixação dos respectivos 
 montantes. Mas, se isso é assim, resulta identicamente da assinalada 
 jurisprudência que a falada liberdade de conformação “não implica que as normas 
 definidoras dos critérios de cálculo sejam imunes a um controlo de 
 constitucionalidade, quer no que toca à sua aferição segundo as regras de 
 proporcionalidade, decorrentes do princípio do Estado de direito (artigo 2.º da 
 Constituição), quer no que respeita à sua apreciação à luz da tutela 
 constitucional do direito de acesso à justiça (artigo 20º da Constituição)” 
 
 (cfr. Acórdão nº 1182/96, in Acórdãos do Tribunal Constitucional, 35º volume, 
 
 447 e seguintes).
 Na postura que ressalta do entendimento do Tribunal, não sendo imposta 
 constitucionalmente a gratuitidade do acesso aos tribunais, do mesmo passo que é 
 imposta a não denegação da justiça por insuficiência de meios económicos, os 
 institutos denominados de assistência judiciária ou de apoio judiciário «não 
 podem ser perspectivados como instrumentos generalizados ou pressupostos 
 primários de acesso ao direito», como se disse no já citado Acórdão nº 495/96. 
 De harmonia com a doutrina desse aresto, que aqui se perfilha por inteiro, tais 
 institutos são, antes, “um remédio, uma solução a utilizar, de forma 
 excepcional, apenas pelos cidadãos economicamente carenciados ou desfavorecidos, 
 e não de forma indiscriminada pela globalidade dos cidadãos”, o que não deixa de 
 implicar “necessariamente, que também o sistema das custas judiciais tenha de 
 ser um sistema proporcional e justo que não torne insuportável ou inacessível 
 para a generalidade das pessoas o acesso aos tribunais”.
 Neste contexto, o que haverá, pois, que aquilatar é se, com a alteração 
 procedimental a partir da entrada em vigor da Lei nº 30-E/2000, de 20 de 
 Dezembro (estando em causa, numa situação como a dos presentes autos, tão só uma 
 
 «instauração processual» que visa impugnar a decisão administrativa dos serviços 
 de Segurança Social denegatória – em parte – da pretensão de concessão do 
 benefício de apoio judiciário com vista à vir a ser instaurada uma dada acção) a 
 norma em análise – que, como ficou acima dito, vai redundar num agravamento do 
 montante das custas em, pelo menos, o dobro do limite máximo que anteriormente 
 se consagrava – pode, por um lado, constituir um verdadeiro e inultrapassável 
 escolho quanto à falada «instauração» «impugnatória» e, por outro, passar o 
 
 «crivo» do princípio da proporcionalidade.
 Ora, quanto a este particular, entende-se que, na realidade, o normativo em 
 apreço é conflituante com o direito consagrado no nº 1 – e, mais propriamente, 
 com a sua parte final – do artigo 20º do Diploma Básico, além de se patentear 
 como manifestamente desproporcionado e excessivo tocantemente ao benefício 
 económico pretendido alcançar, justamente o da dispensa de pagamento da taxa de 
 justiça e demais encargos com o processo.
 Como assinala a entidade recorrente na sua alegação, “a atribuição de um valor 
 tributário desproporcionado ao recurso, através do qual se impugna o 
 indeferimento administrativo, total ou parcial, do pedido de apoio judiciário, 
 constituirá naturalmente num factor inibitório ao exercício do direito de 
 impugnação, decorrente da ponderação do valor das custas no caso de um possível 
 e eventual decaimento: e tais riscos de sucumbência são particularmente 
 evidentes em situações em que a eventual insuficiência económica do requerente 
 não é absoluta, radicando antes numa – sempre delicada – ponderação ou 
 comparação entre o valor excepcionalmente elevado do litígio subjacente à causa 
 principal e o montante dos rendimentos efectivamente auferidos pelo requerente; 
 na verdade, embora estes não o coloquem numa situação de insuficiência económica 
 total ou absoluta (que o impedisse, nomeadamente, de litigar em acções de 
 pequeno ou médio valor) poderão constituir fundado obstáculo ao pleno exercício 
 de uma actividade processual em acções de valor muito elevado, em que o 
 interessado se possa ver envolvido, estando desprovido, apesar dos rendimentos 
 que aufere, de meios pecuniários suficientes para fazer frente às acrescidas 
 despesas que as mesmas envolvem”, dizendo, mais adiante, que “a atribuição ao 
 recurso interposto da decisão desfavorável da Segurança Social de valor idêntico 
 ao dos interesses controvertidos na causa principal pode perfeitamente funcionar 
 como factor inibidor a que o requerente, insatisfeito com a decisão negativa da 
 Segurança Social, exerça o direito de a impugnar em juízo, provocando uma 
 decisão jurisdicional sobre a matéria da efectividade do acesso à justiça – 
 atento o desproporcionalmente elevado montante das custas devidas, se o 
 tribunal, porventura, julgar aquela impugnação, no todo ou em parte, 
 improcedente”.
 A isto ainda é de aditar que, no sistema anterior (ao de que veio a ficar 
 consagrado após a Lei nº 30-E/2000, já revogada pela Lei nº 34/2004, de 29 de 
 Julho, mas, no que ora interessa, manteve o sistema daquela primeira), não só o 
 montante da taxa era, pelo menos, duas vezes inferior, como, no caso de recurso 
 da decisão primitiva de não concessão da então denominada assistência judiciária 
 
 – decisão essa que cabia ao juiz – a taxa ainda era reduzida (cfr. artº 35º do 
 Código das Custas Judiciais anterior ao aprovado pelo Decreto-Lei nº 224-A/96), 
 sendo que se não vislumbram razões conexionadas com direitos ou interesses 
 constitucionalmente protegidos para o acréscimo hoje surpreendido».
 
                                                                                  
 
                                                                                  
 
                                        
 Reiterando este entendimento, há que negar, pois, provimento ao recurso.
 
  
 III. Decisão
 Em face do exposto, decide-se:
 a) Julgar inconstitucional a norma contida na alínea o) do nº 1 do artigo 6º do 
 Código das Custas Judiciais, na parte em que tributa em função do valor da causa 
 principal a impugnação judicial de decisão administrativa sobre a concessão de 
 apoio judiciário, por violação do nº 1 do artigo 20º, em conjugação com o artigo 
 
 18º, da Constituição da República Portuguesa; 
 b) Negar provimento ao recurso, confirmando a decisão recorrida no que diz 
 respeito ao juízo de inconstitucionalidade.
 Sem custas.
 Lisboa, 15 de Maio de 2007
 Maria João Antunes
 José Borges Soeiro
 Gil Galvão
 Carlos Pamplona de Oliveira
 Rui Manuel Moura Ramos