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Processo n.º 710/06
 
 2.ª Secção
 Relator: Conselheiro Mário Torres
 
 
 
  
 
          Acordam na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional,
 
  
 
  
 
                                     1. Relatório
 
                                     1.1. A. e B. interpuseram recurso para o 
 Tribunal Constitucional, ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei 
 de Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional, 
 aprovada pela Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, e alterada, por último, pela 
 Lei n.º 13‑A/98, de 26 de Fevereiro (LTC), contra o acórdão do Supremo 
 Tribunal de Justiça, de 20 de Abril de 2006 – que, concedendo provimento a 
 recurso de revista interposto por Rede Ferroviária Nacional – REFER, EP, revogou 
 o acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, de 16 de Novembro de 2005 (que 
 concedera parcial provimento à apelação deduzida pelos ora recorrentes), 
 ficando a subsistir o decidido na sentença do Tribunal Judicial da Comarca de 
 Braga, de 6 de Abril de 2005 –, pretendendo ver apreciada a 
 inconstitucionalidade, por violação dos princípios constitucionais da igualdade, 
 da justa indemnização e do direito à propriedade privada, consagrados nos 
 artigos 13.º e 62.º da Constituição da República Portuguesa (CRP), das normas 
 constantes dos artigos 23.º, n.º 1, 25.º, n.ºs 2 e 3, 26.º, n.º 12, e 27.º do 
 Código das Expropriações, aprovado pela Lei n.º 168/99, de 18 de Setembro, 
 
 “quando interpretadas no sentido que lhes é atribuído no impugnado acórdão, isto 
 
 é, no sentido de excluírem da classificação de solo apto para construção ou 
 sequer de mera equiparação directa ou analógica a uma tal classificação – e de 
 remeterem para a classe residual de solo para outros fins – os solos integrados 
 em Reserva Agrícola Nacional, quando expropriados para a construção de um 
 terminal ferroviário para apoio a parque industrial, mesmo que a parcela 
 expropriada apresente elementos objectivos indicadores de potencialidade de 
 urbanização/construção – designadamente, (i) ser marginada por arruamento com 
 baía de estacionamento e por caminho público pavimentado, (ii) estar inserida 
 numa zona em que a construção existente é predominantemente de rés‑do‑chão e 
 andar e que beneficia de escolas, parques e outros equipamentos desportivos, 
 fazendo parte de aglomerado urbano e encontrando‑se nas imediações de 
 aglomerado industrial, (iii) dispor de serviço das redes de energia eléctrica, 
 telefónica, saneamento com ligação a estação depuradora, abastecimento de água, 
 etc., e (iv) ser destacada de imóvel que se encontra parte em espaço 
 urbanizável e parte na dita reserva e que confronta com terrenos destinados a 
 fins urbanísticos”.
 
  
 
                                     1.2. A sentença do Tribunal Judicial da 
 Comarca de Braga, de 6 de Abril de 2005 – considerando resultar dos factos 
 provados que a parcela em questão se enquadra perfeitamente na alínea a) do n.º 
 
 2 do artigo 25.º do Código das Expropriações (por confrontar com caminho 
 pavimentado, na extensão de 122 metros, dispondo de rede de distribuição de 
 energia eléctrica, rede telefónica, rede de saneamento e rede de abastecimento 
 de água, estando inserida em aglomerado urbano), embora se encontrasse, à data 
 da declaração de utilidade pública, integrada, pelo Plano Director Municipal 
 
 (PDM) em vigor, em espaço agrícola integrado em Reserva Agrícola Nacional (RAN), 
 mas sendo certo que a expropriação se destinava à realização das obras da 
 empreitada de remodelação do troço Nine‑Braga, do itinerário ferroviário 
 Porto‑Braga, com vista à duplicação e electrificação da via e remodelação das 
 estações e apeadeiros, e que a parcela em concreto se destinava à instalação do 
 terminal de Braga, em Aveleda, para apoio ao Parque Industrial de Celeirós –, 
 deu conta de que esse Tribunal tinha vindo a decidir classificar este tipo de 
 parcelas como “solo apto para construção”. Nesse sentido apontariam a eliminação 
 do artigo 25.º do Código das Expropriações de 1999 (correspondente ao artigo 
 
 24.º do Código de 1991) de disposição equivalente ao n.º 5 do artigo 24.º do 
 Código de 1991 (“Para efeitos de aplicação do presente Código é equiparado a 
 solo para outros fins o solo que, por lei ou regulamento, não possa ser 
 utilizado na construção”), de que resultaria que, dada essa eliminação, o solo 
 que reúna as características de alguma das alíneas do artigo 25.º, ainda que por 
 lei ou regulamento não seja edificável, deverá ser considerado como “solo apto 
 para construção” (neste sentido: Perestrelo de Oliveira, Código das 
 Expropriações, 2.ª edição, 2000, p. 97), devendo então utilizar‑se o critério do 
 artigo 26.º, n.º 12 (neste sentido: Alípio Guedes, Valorização de Bens 
 Expropriados, 2.ª edição, 2001, pp. 82 e 92), normativo este que 
 significativamente passou a incluir, além dos solos classificados por plano de 
 ordenamento do território como zona verde ou de lazer, também os solos 
 destinados a equipamentos públicos. No entanto, o Tribunal de Braga, no 
 presente caso, decidiu abandonar o referido critério, que vinha adoptando, por 
 entretanto ter sido publicado o Acórdão n.º 275/2004 do Tribunal Constitucional, 
 que, sem votos de vencido, julgou inconstitucionais, por violação do princípio 
 da igualdade, consagrado no artigo 13.º da CRP, as normas contidas nos artigos 
 
 23.º, n.º 1, e 26.º, n.º 1, do Código das Expropriações de 1999, quando 
 interpretadas no sentido de incluir na classificação de “solo apto para 
 construção” e, consequentemente, de como tal indemnizar, o solo, integrado na 
 RAN, expropriado para implantação de vias de comunicação. Foi por se subordinar 
 a este juízo de inconstitucionalidade que a referida sentença acabou por 
 classificar a parcela expropriada como solo “para outros fins”, sendo o valor da 
 indemnização fixado, nos termos do n.º 3 do artigo 27.º do referido Código, em 
 
 € 374 999,50 (valor actualizável de acordo com o índice de preços no 
 consumidor, com exclusão da habitação).
 
  
 
                                     1.3. Desta sentença apelaram os expropriados 
 para o Tribunal da Relação de Guimarães, que, por acórdão de 16 de Novembro de 
 
 2005, concedeu parcial provimento ao recurso. Começou esse acórdão por salientar 
 ter a decisão arbitral, por unanimidade, dividido a parcela expropriada em duas 
 faixas distintas – uma com a área de 4530 m2, que classificou como solo apto 
 para construção, e uma outra, com a área de 16 316 m2, que classificou como solo 
 apto para outros fins, fixando a indemnização global devida pela expropriação 
 
 (valor da parcela, benfeitorias e desvalorização das partes sobrantes) em € 480 
 
 386,00. Como os recursos interpostos do acórdão arbitral visavam: o da 
 expropriante, o valor da indemnização fixada, mas concordando com a 
 classificação feita quanto às duas faixas de terreno em que dividiu a parcela; e 
 o dos expropriados, o da classificação de uma das faixas como solo apto para 
 outros fins – entendeu a Relação ter‑se constituído caso julgado do acórdão 
 arbitral quanto à classificação como solo apto para construção da faixa com a 
 
 área de 4530 m2, pelo que não podia o juiz a quo tê‑la reclassificado como solo 
 apto para outros fins, sendo de atribuir a essa faixa, de acordo com o laudo 
 unânime dos peritos, o valor de € 120 045,00. Passando à questão da 
 classificação da faixa de terreno com a área de 16 316 m2, o Tribunal da 
 Relação, reiterando o argumento já aludido de que da não reprodução, no Código 
 de 1999, da norma do n.º 5 do artigo 24.º do Código de 1991, se pode retirar não 
 existir obstáculo no Código vigente a que um terreno classificado como área RAN 
 ou REN possa vir a ser classificado como solo apto para construção ou 
 equiparado, e citando a doutrina do Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 
 
 114/2005, a que adere, concluiu:
 
  
 
                   “Tratando‑se no caso de expropriação de parcela de terreno, 
 com vista à instalação de infra‑estrutura e equipamento público, que preenche os 
 requisitos da alínea a) do n.º 2 do artigo 25.º do Código das Expropriações, 
 somos levados a classificá‑la como solo equiparado a solo apto para construção, 
 para efeitos do disposto no n.º 12 do artigo 26.º do Código das Expropriações e 
 consequentemente a determinar que a indemnização devida aos expropriados, no 
 que respeita à faixa de 16 316 m2, seja calculada em função do valor médio das 
 construções existentes ou que seja possível edificar nas parcelas situadas numa 
 
 área envolvente cujo perímetro exterior se situe a 300 m do limite da parcela 
 expropriada.
 
                   Posto isto, resta dizer que, em face de os Srs. Peritos não se 
 terem pronunciado sobre a avaliação da parcela expropriada, a perspectiva da 
 sua avaliação como solo equiparado a solo apto para construção, tendo em conta o 
 disposto no n.º 12 do artigo 26.º do Código das Expropriações, tem este 
 Tribunal que anular parcialmente o julgamento para que se proceda à dita 
 avaliação, o que se decide ao abrigo do disposto no n.º 4 do artigo 712.º do 
 Código de Processo Civil, devendo o Tribunal de 1.ª Instância, em face dessa 
 avaliação, fixar a justa indemnização a atribuir aos expropriados pela faixa de 
 
 16 316 m2 e pelas partes sobrantes.”
 
  
 
                                     1.4. Deste acórdão (na parte em que decidiu 
 classificar a faixa de terreno de 16 316 m2 como solo equiparado a solo apto 
 para construção para efeito do disposto no n.º 12 do artigo 26.º do Código das 
 Expropriações e da que anulou a sentença com vista à avaliação pericial), 
 interpôs recurso de revista (com fundamento em oposição entre o acórdão 
 recorrido e o acórdão da mesma Relação, de 19 de Outubro de 2005, Proc. n.º 
 
 1410/05‑2, transitado em julgado) a expropriante Rede Ferroviária Nacional – 
 REFER, EP, aduzindo, em síntese, que: (i) o acórdão recorrido é contraditório 
 com outro do mesmo tribunal e assenta em pressupostos não verificados à data da 
 declaração da utilidade pública da expropriação; (ii) a parcela de terreno não 
 poderá ser classificada como solo acto para construção ao abrigo do disposto no 
 n.º 2 do artigo 25.º do Código das Expropriações; (iii) a desafectação de 
 terrenos integrados na reserva agrícola nacional para efeitos de expropriação 
 com vista ao melhoramento de uma via ferroviária não lhes traz maior 
 potencialidade edificativa; (iv) por se tratar de realidades distintas, não é 
 aplicável, extensiva ou analogicamente, aos terrenos integrados na Reserva 
 Agrícola Nacional, o n.º 12 do artigo 26.º do Código das Expropriações; (v) 
 valorizar essas diferentes realidades com base em critérios idênticos constitui 
 violação do princípio constitucional da igualdade.
 
                                     Os expropriados contra‑alegaram, 
 sustentando, em síntese: (i) a questão da indemnização em que a recorrente faz 
 assentar a sua discordância do acórdão recorrido não é susceptível de apreciação 
 no recurso de revista; (ii) o facto de a parcela expropriada visar a construção 
 de um terminal ferroviário é elemento decisivo de diferenciação entre os casos 
 versados no acórdão recorrido e no acórdão fundamento, inexistindo identidade ou 
 paralelismo entre os núcleos das situações de facto apreciadas em cada um 
 deles; (iii) dispõe de acessos pavimentados, serviço de redes de abastecimento 
 de água, de saneamento, de distribuição de energia eléctrica, estação 
 depuradora em ligação com rede de colectores de saneamento e rede telefónica e 
 está inserida num aglomerado urbano e nas imediações de um aglomerado 
 industrial; (iv) está inserida em contexto de verdadeiro espaço urbano – núcleo 
 urbano traduzido na existência na sua envolvente imediata de todo um conjunto de 
 moradias, edifícios urbanos e espaços urbanizáveis – bastante para ser 
 classificada de solo apto para a construção; (v) a concretização do objectivo 
 da expropriação, que é a construção do terminal ferroviário, implica que os 
 terrenos previstos para a sua implantação sejam desafectados da reserva agrícola 
 nacional, com a consequente extinção das respectivas restrições e 
 condicionalismos; (vi) a parcela expropriada tem características e beneficia de 
 infra‑estruturas que superam o exigido pelo n.º 2 do artigo 25.º do Código das 
 Expropriações, pelo que deve ser classificada como solo apto para a construção; 
 
 (vii) os princípios da igualdade e da justa indemnização implicam a atribuição 
 da classificação do solo apto para construção ao terreno integrado na reserva 
 agrícola nacional dela desafectado com vista ao aludido terminal ferroviário; 
 
 (viii) valorar somente como solo agrícola a parcela de terreno em causa era 
 infligir redobrada penalização aos recorridos que já se viram patrimonialmente 
 prejudicados com a integração desses terrenos na reserva agrícola nacional sem 
 qualquer compensação indemnizatória.
 
                                     Por acórdão de 20 de Abril de 2006, o 
 Supremo Tribunal de Justiça concedeu provimento ao recurso da expropriante, 
 desenvolvendo, para tanto, a seguinte fundamentação:
 
  
 
                   “1. Comecemos pela delimitação do objecto do recurso.
 
                   Salvo casos excepcionais legalmente previstos, o Supremo 
 Tribunal de Justiça apenas conhece de matéria de direito (artigo 26.º da Lei de 
 Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais, aprovada pela Lei n.º 3/99, 
 de 13 de Janeiro – LOFTJ).
 
                   Nessa conformidade, como tribunal de revista, a regra é a de 
 que o Supremo Tribunal de Justiça aplica definitivamente aos factos materiais 
 fixados pelo tribunal recorrido o regime jurídico que julgue adequado (artigo 
 
 729.º, n.º 1, do Código de Processo Civil).
 
                   Excepcionalmente, no recurso de revista, pode o Supremo 
 Tribunal de Justiça sindicar o erro na apreciação das provas e na fixação dos 
 factos materiais da causa cometido pela Relação se houver ofensa de disposição 
 expressa da lei que exija certa espécie de prova para a existência do facto ou 
 fixe a força probatória de determinado meio de prova (artigos 722.º, n.º 2, e 
 
 729.º, n.º 2, do Código de Processo Civil).
 
                   Assim, o Supremo Tribunal de Justiça só pode conhecer do juízo 
 de prova sobre a matéria de facto formado pela Relação quando esta deu como 
 provado um facto sem produção da prova por força da lei indispensável para 
 demonstrar a sua existência, ou quando ocorrer desrespeito das normas 
 reguladoras da força probatória dos meios de prova admitidos no nosso 
 ordenamento jurídico de origem interna ou externa.
 
                   Por isso, o erro na apreciação das provas e a consequente 
 fixação dos factos materiais da causa, isto é, a decisão da matéria de facto 
 baseada nos meios de prova livremente apreciáveis pelo julgador, excede o âmbito 
 do recurso de revista.
 
                   Em consequência, limitar‑nos‑emos, no recurso, a considerar os 
 factos que foram tidos por assentes no acórdão recorrido, isto é, sem qualquer 
 alteração ou modificação, e sem interferir na decisão das instâncias no sentido 
 da existência de caso julgado quanto ao cálculo da indemnização concernente a um 
 dos segmentos da parcela expropriada em causa.
 
                   Assim, tendo em conta que este recurso só foi admitido por 
 virtude de contradição do acórdão recorrido com outro acórdão proferido pela 
 mesma Relação cerca de quinze dias antes sobre a mesma questão fundamental de 
 direito, ou seja, a de saber se o terreno integrado em zona de reserva agrícola 
 nacional que seja expropriado deve ou não ser avaliado como sendo apto para 
 construção, a tanto se cingirá o objecto da nossa análise.
 
  
 
                   2. Elaboremos agora a síntese do quadro de facto relevante 
 para a decisão do recurso em análise.
 
                   O objecto da declaração da utilidade pública da expropriação 
 foi uma parcela de terreno com a área de 20 848 metros quadrados, a destacar de 
 um prédio rústico sito na freguesia da Aveleda, Município de Braga.
 
                   Destina‑se à realização de obras de remodelação do troço do 
 itinerário ferroviário que vai de Nine para Braga com vista à duplicação da 
 via, sua electrificação e remodelação de estações e apeadeiros, designadamente 
 do terminal de Aveleda, para apoio do Parque Industrial.
 
                   O referido prédio, que consubstancia um extenso prado quase 
 plano resultante da junção de vários artigos, confronta a sul com prédio dos 
 expropriados, onde é marginado por um arruamento com baía de estacionamento, e 
 a nascente com um caminho público pavimentado.
 
                   A parcela de terreno expropriada está inserida numa vasta 
 propriedade agrícola, localizada à margem da via férrea, que com ela confronta a 
 norte/poente, numa zona que beneficia de escolas, parques e outros equipamentos 
 desportivos, em que a construção é predominantemente de rés‑do‑chão e 1.º andar.
 
                   Confronta a nascente com o referido caminho público com 
 calçada à fiada de 122 metros, electricidade e telefone, e a sul com terreno dos 
 expropriados que se destinam a fins urbanísticos, e a norte inflecte na 
 direcção da via férrea com a qual confronta na extensão de 125 metros, vedada 
 por muro de alvenaria de pedra com a altura de dois metros e meio.
 
                   Está inserida no aglomerado urbano denominado do Louredo e, 
 nas imediações, além daquelas construções, existe o aglomerado industrial do 
 Parque Industrial de Celeirós, e à data da declaração da utilidade pública da 
 expropriação existiam junto dela redes de distribuição de energia eléctrica, 
 telefone, saneamento e de abastecimento de água.
 
                   O Plano Director Municipal de Braga, em vigor à data da 
 declaração da utilidade pública da expropriação, insere a parcela expropriada em 
 espaço agrícola integrado na reserva agrícola nacional, e os terrenos com ela 
 confrontantes a poente como espaços integrados nessa reserva e urbanizáveis.
 
  
 
                   3. Atentemos, ora, brevemente no critério legal da 
 indemnização decorrente da expropriação.
 
                   Como corolário de que a todos é garantido o direito de 
 propriedade privada e à sua transmissão em vida ou por morte, nos termos da 
 Constituição, a expropriação por utilidade pública só pode ser efectuada com 
 base na lei mediante o pagamento de justa indemnização (artigo 62.º da 
 Constituição).
 
                   Mas o legislador constitucional, no que concerne à 
 determinação do conceito de justa indemnização, remeteu para a lei ordinária a 
 definição dos critérios atinentes à sua concretização.
 
                   O referido normativo é concretizado na lei ordinária por via 
 do artigo 23.º, n.º 1, do Código das Expropriações, segundo o qual a justa 
 indemnização não visa compensar o benefício alcançado pela entidade 
 expropriante, mas ressarcir o prejuízo que para o expropriado advém da 
 expropriação, correspondente ao valor real e corrente do bem de acordo com o 
 seu destino efectivo ou possível numa utilização económica normal, à data da 
 publicação da declaração da utilidade pública, tendo em consideração as 
 circunstâncias e condições de facto existentes naquela data.
 
                   A determinação da indemnização em termos de ressarcimento do 
 referido prejuízo não pode deixar de atender ao valor de mercado do terreno 
 objecto da expropriação na altura da declaração da utilidade pública da mesma, 
 no quadro da equivalência de valores, excluídos os especulativos que haja, ou 
 seja, em termos de valor da posição de proprietário, de usufrutuário ou de 
 titular de outro direito real, conforme os casos.
 
  
 
                   4. Vejamos agora o regime legal de classificação de solos para 
 efeito da sua avaliação no quadro da expropriação.
 
                   Fragmentada a parcela expropriada em duas partes, uma delas 
 com a área de 16 316 metros quadrados, para efeito de cálculo do valor da 
 indemnização devida aos recorridos pela recorrente, o tribunal da 1.ª instância 
 considerou o solo apto para fins diversos da construção e a Relação teve‑o por 
 apto para a construção.
 
                   Ora, para efeitos do cálculo da indemnização por expropriação, 
 o solo é legalmente classificado em apto para construção ou apto para outros 
 fins (artigo 25.º, n.º 1, do Código das Expropriações).
 
                   O solo legalmente considerado apto para construção é aquele 
 que dispõe de acesso rodoviário e de rede de abastecimento de água, de energia 
 eléctrica e de saneamento, com características adequadas para servir as 
 edificações nele existentes ou a construir, o que apenas dispõe de parte das 
 referidas infra‑estruturas mas se integra em núcleo urbano existente, o que está 
 destinado, de acordo com instrumento de gestão territorial, a adquirir as 
 características mencionadas em primeiro lugar, e o que, não estando abrangido 
 por aquelas características, tem, todavia, alvará de loteamento ou licença de 
 construção em vigor no momento da declaração de utilidade pública, desde que o 
 processo respectivo se tenha iniciado antes da data da notificação da resolução 
 de a requerer (artigo 25.º, n.º 2, do Código das Expropriações).
 
                   Por exclusão, a lei estabelece considerar‑se solo para outros 
 fins o que não se encontre em qualquer das situações acima referidas (artigo 
 
 25.º, n.º 3, do Código das Expropriações).
 
                   A regra é a de que o valor do solo apto para a construção é 
 calculado por referência à construção que nele seria possível efectuar se não 
 tivesse sido sujeito a expropriação, num aproveitamento económico normal, de 
 acordo com as leis e os regulamentos em vigor e o disposto nos números 
 seguintes, sem prejuízo do que prescreve o n.º 5 do artigo 23.º (artigo 26.º, 
 n.º 1, do Código das Expropriações).
 
                   Sendo necessário expropriar solos classificados como zona 
 verde, de lazer ou para instalação de infra‑estruturas e equipamentos públicos 
 por plano municipal ou de ordenamento do território plenamente eficaz, cuja 
 aquisição seja anterior à sua entrada em vigor, o valor de tais solos será 
 calculado em função do valor médio das construções existentes ou que seja 
 possível edificar nas parcelas situadas numa área envolvente cujo perímetro 
 exterior se situe a 300 metros do limite da parcela expropriada (artigo 26.º, 
 n.º 12, do Código das Expropriações).
 
                   Abrange, pois, este último normativo a expropriação de solos 
 classificados em plano municipal ou de ordenamento do território eficaz como 
 zona verde, de lazer ou para a instalação de infra‑estruturas ou equipamento 
 públicos.
 
                   Dada a sua letra e o respectivo escopo finalístico, a sua 
 previsão restringe‑se a expropriações de terrenos adquiridos pelos expropriados 
 antes da entrada em vigor dos referidos planos directores municipais ou de 
 ordenamento do território, que se situem em zonas urbanizadas ou urbanizáveis.
 
                   Visa salvaguardar as legítimas expectativas dos expropriados 
 adquirentes de prédios que na altura da respectiva aquisição podiam utilizá‑los 
 na construção de imóveis e em função disso porventura tenham por eles pago o 
 preço conforme com essas circunstâncias e que, por virtude dos referidos planos, 
 deixaram de lhes poder dar essa utilização.
 
                   Por isso, não interfere o mencionado normativo com a avaliação 
 dos terrenos em geral para efeito de expropriação, designadamente em razão de 
 restrições da sua utilização em termos de urbanização ou de construção.
 
  
 
                   5. Atentemos agora no regime legal dos espaços agrícolas 
 decorrente do Plano Director Municipal de Braga, que é o aplicável na espécie.
 
                   A nova versão do Plano Director Municipal de Braga, com a 
 natureza de regulamento administrativo, foi ratificado pela Resolução do 
 Conselho de Ministros n.º 9/2001, de 30 Janeiro.
 
                   No que concerne ao regime do solo classificado como espaço 
 agrícola, o regime legal que resulta do mencionado regulamento administrativo é 
 essencialmente o seguinte.
 
                   Em função do seu uso dominante, o solo é classificado, entre o 
 mais, como espaço urbanizável ou agrícola (artigo 34.º, alíneas a), b) e e)).
 
                   O primeiro consubstancia‑se em áreas estrategicamente 
 localizadas, com capacidade construtiva, capazes de assegurar a expansão urbana 
 a curto ou a médio prazos, geralmente correspondentes à evolução dos espaços 
 urbanos já consolidados (artigo 54.º).
 
                   O último, por seu turno, envolve os que têm características 
 agrícolas e, como tal, se destinam predominantemente a essa actividade, 
 englobando as áreas integradas na reserva agrícola nacional (artigo 87.º).
 
                   Neste se identificam as categorias de reserva agrícola 
 nacional, constituída por áreas de maior potencialidade para a actividade 
 agrícola, e espaço agrícola constituído por áreas que, apesar de não estarem 
 integradas naquela reserva, possuam utilização agrícola predominante (artigo 
 
 88.º).
 
                   Os espaços integrados na reserva agrícola nacional regem‑se 
 por legislação específica e a respectiva edificação só é permitida nas áreas 
 autorizadas para o efeito pela entidade gestora, nos casos previstos naquela 
 legislação, nomeadamente o Decreto‑Lei n.º 196/89, de 14 de Junho, mas desde 
 que não haja afectação das características ambientais e paisagísticas da 
 envolvente, em razão da sua implantação ou volumetria, e não contribua para a 
 dispersão dos aglomerados e existam ou se criem infra‑estruturas básicas (artigo 
 
 90.º).
 
                   Quanto aos restantes espaços agrícolas é privilegiado esse 
 uso, embora se admitam outros usos complementares daquele, desde que 
 justificados e se verifiquem as condições referidas no artigo 90.º (artigo 92.º, 
 n.º 1).
 
                   Poderá, excepcionalmente, admitir‑se a edificabilidade nesses 
 espaços desde que a mesma se destine à habitação ou construção de instalações de 
 apoio agrícola, ou a equipamentos de iniciativa pública ou privada, 
 designadamente a equipamentos turísticos e estabelecimentos de restauração e 
 bebidas, apoio a transformação, embalagem e comercialização dos produtos 
 agrícolas da respectiva exploração, a vias de comunicação, equipamentos e 
 infra‑estruturas de interesse público ou a empreendimentos de interesse 
 municipal (artigo 92.º, n.º 2).
 
                   
 
                   6. Vejamos agora mais especificamente o regime legal dos 
 terrenos integrados em zona da reserva agrícola nacional.
 
                   O direito de propriedade individual pode sofrer restrições em 
 função da realização do interesse público, designadamente no quadro da 
 necessidade de racionalização do uso do solo por virtude da sua natureza ou 
 localização (artigos 62.º da Constituição e 1305.º do Código Civil).
 
                   É o caso, por exemplo, dos terrenos integrados nas zonas 
 legalmente classificadas de reserva agrícola nacional.
 
                   A defesa e a protecção das áreas de maior aptidão agrícola e a 
 garantia da sua afectação à agricultura, de forma a contribuir para o seu pleno 
 desenvolvimento e para o correcto ordenamento do território, consta do 
 Decreto‑Lei n.º 196/99, alterado pelos Decretos‑Leis n.ºs 274/92, de 12 de 
 Dezembro, e 278/95, de 25 de Outubro (artigo 1.º).
 
                   Nesse quadro, a lei definiu a reserva agrícola nacional como o 
 conjunto das áreas que, em virtude das suas características morfológicas, 
 climatéricas e sociais, maiores potencialidades apresentem para a produção de 
 bens agrícolas (artigo 3.º, n.º 1).
 
                   A regra é no sentido de que os solos da reserva agrícola 
 nacional devem ser exclusivamente afectos à agricultura e de que são proibidas 
 todas as acções que diminuam ou destruam as suas potencialidades agrícolas, por 
 exemplo, obras hidráulicas, construção de edifícios, aterros e escavações 
 
 (artigo 8.º, n.º 1, alínea a)).
 
                   As licenças, concessões, aprovações e autorizações 
 administrativas relativas a utilizações não agrícolas dos terrenos integrados 
 na reserva agrícola nacional carecem de parecer favorável das comissões 
 regionais, sob pena de nulidade dos concernentes actos administrativos (artigos 
 
 9.º, n.º 1, e 34.º).
 
                   O referido parecer só pode, porém, ser concedido quando 
 estejam em causa:
 
                   – obras com finalidade exclusivamente agrícola, quando 
 integradas e utilizadas em explorações agrícolas viáveis, desde que não existam 
 alternativas de localização em solos não incluídos na reserva agrícola nacional 
 ou, quando os haja, a sua implantação nestes inviabilize técnica e 
 economicamente a construção;
 
                   – habitações para fixação em regime de residência habitual dos 
 agricultores em explorações agrícolas viáveis, desde que não existam 
 alternativas válidas de localização em solos não incluídos na reserva agrícola 
 nacional;
 
                   – habitações para utilização própria e exclusiva dos seus 
 proprietários e respectivos agregados familiares, quando se encontrem em 
 situação de extrema necessidade sem alternativa viável para a obtenção de 
 habitação condigna e daí não resultem inconvenientes para os interesses 
 tutelados pelo presente diploma;
 
                   – vias de comunicação, seus acessos e outros empreendimentos 
 ou construções de interesse público, desde que não haja alternativa técnica 
 economicamente aceitável para o seu traçado ou localização;
 
                   – exploração de minas, pedreiras, barreiras e saídas, ficando 
 os responsáveis obrigados a executar o plano de recuperação dos solos que seja 
 aprovado;
 
                   – obras indispensáveis de defesa do património cultural, 
 designadamente de natureza arqueológica;
 
                   – operações relativas à florestação e exploração florestal 
 quando decorrentes de projectos aprovados ou autorizados pela Direcção‑Geral 
 das Florestas;
 
                   – instalações para agro‑turismo e turismo rural, quando se 
 enquadrem e justifiquem como complemento de actividades exercidas numa 
 exploração agrícola;
 
                   – campos de golfe declarados de interesse para o turismo pela 
 Direcção‑Geral do Turismo, desde que não impliquem alterações irreversíveis da 
 topografia do solo e não se inviabilize a sua eventual reutilização agrícola 
 
 (artigo 9.º, n.º 2, alíneas a) a i)).
 
                   Independentemente do processamento das contra‑ordenações e da 
 aplicação das coimas, as comissões regionais da reserva agrícola podem ordenar 
 a cessação imediata das acções desenvolvidas em violação do disposto no presente 
 diploma, implicando o incumprimento da ordem o cometimento de crime de 
 desobediência (artigo 39.º).
 
                   As referidas restrições inviabilizam a faculdade dos 
 proprietários dos terrenos incluídos nas áreas de reserva agrícola nacional de 
 os destinarem à construção de edifícios urbanos.
 
                   Trata‑se, pois, de restrições ao direito de propriedade 
 individual que visam propiciar o desenvolvimento da actividade agrícola, o 
 equilíbrio ecológico e outros interesses públicos, por via das quais, por força 
 da lei, se exclui a potencialidade edificativa, antes ou depois de alguma 
 expropriação que haja.
 
  
 
                   7. Atentemos agora se, para o efeito em causa, se deve ou não 
 considerar o referido segmento da parcela de terreno expropriado como solo apto 
 para a construção.
 
                   Conforme resulta dos factos assentes e do Plano Director 
 Municipal de Braga, cuja natureza é a de regulamento administrativo, a parcela 
 expropriada está incluída em zona classificada de reserva agrícola nacional.
 
                   Assim, a conclusão é necessariamente no sentido de que a 
 referida parcela não pode ser considerada inserida em zona urbana ou 
 susceptível de urbanização, pelo que, em termos práticos, estavam os recorridos 
 impossibilitados de a afectar à construção de edifícios urbanos.
 
                   A desafectação de terrenos incluídos na reserva agrícola 
 nacional para efeitos de expropriação, ainda que com vista ao melhoramento de 
 vias de comunicação, não lhes transmite potencialidade construtiva, porque a 
 mesma não tem a virtualidade de lhe alterar a natureza jurídica.
 
                   Assim, o facto de a expropriação em causa haver visado o 
 melhoramento de uma infra‑estrutura pública consubstanciada em via de 
 comunicação ferroviária não transmite ao respectivo objecto aptidão edificativa.
 
                   Em consequência, ao invés do que é entendido pelos recorridos 
 e foi considerado no acórdão da Relação, não obstante os elementos indiciadores 
 de potencialidade de urbanização que resultam dos factos provados, a parcela de 
 terreno em causa não se integra nos parâmetros do n.º 2 do artigo 25.º do Código 
 das Expropriações para efeito de ser qualificada de solo apto para a construção.
 
                   Verifiquemos agora se a referida parcela de terreno deve ou 
 não ser considerada, para o efeito, a solo equiparado a solo apto para 
 construção, à luz do disposto no n.º 12 do artigo 26.º do Código das 
 Expropriações.
 
                   Entre os terrenos que algum plano director municipal ou de 
 ordenamento do território qualifique de zona verde ou de lazer ou destine a 
 infra‑estruturas ou equipamentos públicos, a que se reporta o artigo 26.º, n.º 
 
 12, do Código das Expropriações, e os terrenos legalmente qualificados de 
 reserva agrícola nacional, ocorre significativa diferença.
 
                   Com efeito, no primeiro caso, não releva só por si ausência de 
 aptidão edificativa, que se verifica no segundo, porque naquele, um dos 
 concernentes pressupostos consiste em que o solo já haja sido classificado de 
 apto para construção e que essa natureza jurídica tenha sido excluída por força 
 do próprio Plano.
 
                   Trata‑se, pois, de solos que, não fosse a sua nova afectação 
 por algum dos referidos planos gerais, regionais ou municipais de ordenamento do 
 território, integrar‑se‑iam, dadas as suas componentes objectivas, na 
 classificação de solo apto para a construção.
 
                   Em consequência, por virtude da não verificação da necessária 
 similitude situacional, não pode aplicar‑se à avaliação da parcela de terreno 
 expropriada em causa, por analogia, o normativo do n.º 12 do artigo 26.º do 
 Código das Expropriações.
 
                   Não está, pois, a referida parcela de terreno abrangida pelo 
 disposto nos artigos 25.º, n.º 2, e 26.º, n.º 12, do Código das Expropriações.
 
                   Como na parcela expropriada se não pode implantar a construção 
 imobiliária, o seu valor de expropriação há‑de ser determinado em função da 
 classificação da mesma como solo apto para outros fins, nos termos dos artigos 
 
 25.º, n.ºs 1, alínea b), e 3, e 27.º do Código das Expropriações.
 
                   Por isso, inexiste fundamento legal para equacionar a 
 problemática da constitucionalidade ou não, por violação ou não do princípio da 
 igualdade previsto no artigo 13.º da Constituição, das normas dos artigos 23.º, 
 n.º 1, e 26.º, n.º 12, do Código das Expropriações quando interpretadas no 
 sentido de incluir na classificação de solo apto para construção e, 
 consequentemente, de como tal indemnizar o solo integrado na reserva agrícola 
 nacional expropriado para implantação de vias de comunicação, que o Tribunal 
 
 [Constitucional] decidiu em sentido contrário nos Acórdãos n.ºs 114/2005, de 1 
 de Março, e 145/2005, de 16 de Março.
 
                   
 
                   8. Vejamos agora se a solução mencionada sob 7. envolve a 
 violação do princípio da igualdade ou outro princípio constitucional.
 
                   Conforme acima se referiu, por um lado, a Constituição não 
 fixa qualquer critério para a determinação da justa indemnização decorrente da 
 expropriação, antes remetendo para a lei ordinária.
 
                   E, por outro, o direito de propriedade individual pode sofrer 
 restrições em função da realização do interesse público, designadamente no 
 quadro da necessidade de racionalização do uso do solo por virtude da sua 
 natureza ou localização (artigos 62.º da Constituição e 1305.º do Código Civil).
 
                   É o caso, por exemplo, conforme acima se expressou, dos 
 terrenos integrados nas zonas legalmente classificadas de reserva agrícola 
 nacional.
 
                   Com efeito, trata‑se de restrições necessárias e 
 funcionalmente adequadas para acautelar reserva de terrenos agrícolas que 
 propiciem o desenvolvimento da actividade agrícola, o equilíbrio ecológico e 
 outros interesses públicos, que a Constituição salvaguarda, além do mais, nos 
 artigos 66.º, n.º 2, alínea b), e 93.º, n.º 2.
 
                   Quanto ao princípio da igualdade que decorre do artigo 13.º da 
 Constituição, conforme tem sido reiteradamente considerado pelo Tribunal 
 Constitucional, ele implica o tratamento igual de situações objectivamente 
 iguais, e o tratamento adequadamente diverso de situações objectivamente 
 diferentes, o que se traduz em tratar por igual o que é essencialmente igual e 
 de modo diferente o que é essencialmente diferente.
 
                   Assim, o referido princípio constitucional não proíbe que a 
 lei ordinária estabeleça distinções, mas tão‑só as distinções arbitrárias, em 
 quadro de previsão e estatuição, isto é, as que não tenham fundamento material 
 bastante.
 
                   São essencialmente diferentes as situações de proprietários de 
 terrenos com aptidão para a construção urbana e de proprietários de terrenos 
 apenas com vocação agrícola, ainda que integrados em zonas de restrições de 
 interesse público como as que são classificadas de reserva agrícola nacional.
 
                   Acresce que os expropriados, antes da expropriação, não tinham 
 alguma expectativa razoável sobre a potencialidade edificativa da parcela de 
 terreno em causa, já que sabiam ou podiam saber que, segundo o Plano Director 
 Municipal de Braga então vigente, a não podiam afectar à edificação urbana.
 
                   Em consequência, a interpretação das normas dos artigos 23.º, 
 n.º 1, 25.º, n.ºs 2 e 3, e 26.º, n.º 12, do Código das Expropriações no referido 
 sentido não viola o referido princípio da igualdade nem o direito de 
 propriedade.
 
  
 
                   9. Sintetizemos finalmente a solução para o caso espécie 
 decorrente dos factos provados e da lei.
 
                   A decisão no recurso assenta exclusivamente nos factos 
 considerados provados no acórdão recorrido.
 
                   A parcela de terreno expropriada não pode ser qualificada como 
 terreno apto para a construção além do mais porque está integrada em zona de 
 reserva agrícola nacional, integração que inviabiliza, só por si, o cálculo da 
 indemnização à luz do n.º 12 do artigo 26.º do Código das Expropriações.
 
                   O direito à indemnização dos recorridos no confronto da 
 recorrente, no que concerne à área de 16 316 metros quadrados da referida 
 parcela de terreno, deve ser concretizado por via da sua qualificação de terreno 
 apto para outros fins.
 
                   A referida solução não envolve interpretação contrária aos 
 princípios constitucionais da igualdade ou da propriedade consagrados nos 
 artigos 13.º e 62.º, n.º 1, da Constituição.
 
                   Procede, por isso, o recurso, com a consequência da revogação 
 do acórdão recorrido e da subsistência da sentença proferida no tribunal da 1.ª 
 instância.”
 
  
 
                                     1.5. É contra este acórdão que, como 
 inicialmente se referiu, vem interposto o presente recurso pelos expropriados A. 
 e B., pretendendo ver apreciada a inconstitucionalidade, por violação dos 
 princípios constitucionais da igualdade, da justa indemnização e do direito à 
 propriedade privada, consagrados nos artigos 13.º e 62.º da CRP, das normas 
 constantes dos artigos 23.º, n.º 1, 25.º, n.ºs 2 e 3, 26.º, n.º 12, e 27.º do 
 Código das Expropriações, aprovado pela Lei n.º 168/99, de 18 de Setembro, 
 
 “quando interpretadas no sentido (…) de excluírem da classificação de solo apto 
 para construção ou sequer de mera equiparação directa ou analógica a uma tal 
 classificação – e de remeterem para a classe residual de solo para outros fins 
 
 – os solos integrados em Reserva Agrícola Nacional, quando expropriados para a 
 construção de um terminal ferroviário para apoio a parque industrial, mesmo que 
 a parcela expropriada apresente elementos objectivos indicadores de 
 potencialidade de urbanização/construção”
 
                                     Neste Tribunal Constitucional, os 
 recorrentes apresentaram alegações (acompanhada de parecer jurídico), que 
 culminam com a formulação das seguintes conclusões:
 
  
 
                   “1. Aquilo que se censura no impugnado acórdão é o facto de 
 nele as normas dos artigos 23.º, n.º 1, 25.º, n.ºs 2 e 3, 26.º, n.º 12, e 27.º 
 do CE serem interpretadas no sentido de que a mera circunstância de a parcela 
 expropriada se encontrar integrada em RAN – ainda que seja expropriada para a 
 construção de um terminal ferroviário (equipamento urbano), possua 
 características indicadoras de potencialidade de urbanização/construção e 
 beneficie do serviço da maioria das infra‑estruturas urbanas –, exclui ou 
 inviabiliza em absoluto quer a sua classificação como solo apto para construção, 
 quer a possibilidade de que lhe seja aplicado, sequer por analogia, o critério 
 de cálculo do valor do solo previsto no n.º 12 do artigo 26.º do Código das 
 Expropriações.
 
                   2. O quadro factual dado por assente na presente demanda 
 demonstra à saciedade que a parcela expropriada possui características e dispõe 
 de infra‑estruturas que superam largamente as condições exigidas pelo artigo 
 
 25.º, n.º 2, do Código das Expropriações, devendo, por isso, receber a 
 classificação de solo apto para construção e ser avaliada por aplicação directa 
 ou analógica do critério de cálculo do valor do solo previsto no artigo 26.º, 
 n.º 12, do Código das Expropriações.
 
                   3. Um juízo de conformidade/desconformidade das normas objecto 
 deste recurso – ou mais exactamente da interpretação que dessas normas foi feita 
 no recorrido aresto – com a Lei Fundamental não dispensa, antes impõe, que seja 
 dada especial atenção aos elementos de facto implicados na referenciação da 
 solução interpretativa adoptada, na definição do sentido e limites das normas e 
 na salvaguarda da sua compatibilização sistémica, contextual e hierárquica.
 
                   4. Nos casos em que foi chamado a pronunciar‑se sobre questões 
 afins às discutidas na presente demanda, o Tribunal Constitucional sempre 
 envolveu na elaboração das suas soluções jurisprudenciais a ponderação das 
 características típicas e dos elementos de diferenciação das situações de facto 
 analisadas, bem como dos aspectos associados com a finalidade da própria 
 expropriação.
 
                   5. O que bem se exemplifica com o Acórdão n.º 267/97, de 19 de 
 Março, publicado no Diário da República, II Série, de 28 de Abril de 2000, e com 
 o Acórdão n.º 155/2002, de 17 de Abril, publicado no Diário da República, II 
 Série, de 30 de Dezembro de 2002 – estudados no parecer jurídico do Ilustre 
 Jurisconsulto A. Vassalo Abreu ora junto –, nos quais se cristaliza um vector 
 recorrente do pensamento subjacente à produção jurisprudencial deste Tribunal 
 que, ainda que por reporte à vigência de diferentes diplomas legais (Código das 
 Expropriações de 1991 e Código das Expropriações de 1999), abordou o 
 referenciado problema e levou à construção e explicitação conceitual do critério 
 da mais próxima ou efectiva aptidão edificativa decorrente do facto de a 
 entidade expropriante utilizar ou afectar os terrenos expropriados à construção 
 urbana.
 
                   6. As razões de fundo pelas quais no Acórdão n.º 155/2002, de 
 
 17 de Abril, se recusa o reconhecimento de potencialidade edificativa a terrenos 
 situados em RAN/REN e expropriados para a construção de uma unidade de 
 incineração de resíduos e aterro sanitário — razões essas basicamente 
 reconduzíveis ao facto de tal equipamento ser incompatível com a inserção em 
 meio urbano e com quaisquer fins urbanísticos – são exactamente as mesmas pelas 
 quais se impõe o reconhecimento de potencialidade edificativa à parcela de 
 terreno versada nos presentes autos, igualmente situada em RAN, mas 
 expropriada para a construção de um terminal ferroviário, dado que neste último 
 caso, ao invés do primeiro, aquilo que está em causa é um equipamento que pela 
 sua própria natureza só encontra justificação e utilidade em meio urbano e é em 
 si mesmo potenciador de dinâmicas de desenvolvimento e expansão urbana e do uso 
 urbanístico dos solos.
 
                   7. Existe, portanto, entre ambos os casos uma contraposição 
 definida por referência relativa à compatibilidade/incompatibilidade com a 
 inserção em meio urbano e com a susceptibilidade de induzir/repelir o uso 
 urbanístico dos solos, pelo que é legítimo concluir que a ser mantida pelo 
 Tribunal Constitucional a adesão às razões de decidir invocadas, entre outros, 
 no Acórdão n.º 155/2002, de 17 de Abril, não poderá este Tribunal deixar de vir 
 a censurar no recorrido acórdão a desconformidade constitucional da 
 interpretação normativa ao abrigo da qual foi recusada a classificação e 
 valoração da parcela expropriada como solo com potencialidade edificativa.
 
                   8. De acordo com a matéria factual que foi dada como provada 
 nos autos, a parcela expropriada dispõe de acessos pavimentados e do serviço da 
 rede de abastecimento de água, rede de saneamento, rede de distribuição de 
 energia eléctrica, estação depuradora, em ligação com a rede de colectores de 
 saneamento e rede telefónica e encontra‑se inserida num aglomerado urbano e nas 
 imediações de um aglomerado industrial.
 
                   9. Muito embora seja certo que de acordo com o PDM de Braga, 
 em vigor à data da DUP, a parcela expropriada estava incluída em espaço agrícola 
 integrado em RAN, não é menos verdade que a parte sobrante do imóvel objecto de 
 expropriação se encontrava classificada como espaço urbanizável e RAN, tal como 
 sucedia com os terrenos que confrontavam com a parcela expropriada a poente, 
 sendo o coeficiente de ocupação dos solos urbanizáveis situados na envolvente, 
 segundo o mesmo PDM, de 0,4 m2/m2.
 
                   10. Na realidade, a parcela expropriada encontra‑se inserida 
 num contexto de verdadeiro espaço urbano (núcleo urbano de Louredo e núcleo 
 industrial de Celeirós), que se traduz na existência na sua envolvente imediata 
 de todo um conjunto de moradias, edifícios urbanos e espaços urbanizáveis.
 
                   11. Para além disso, os elementos constantes dos autos atestam 
 que a parcela expropriada se destina à implantação do terminal ferroviário de 
 Braga, o que equivale a dizer que se destina a uma específica finalidade 
 construtiva, a construção de um equipamento urbano, que em si mesmo é um factor 
 de potenciação das dinâmicas de expansão e desenvolvimento urbano, sendo certo 
 que a escolha de tal parcela para a implantação de um terminal ferroviário só é 
 compreensível em função da inserção dessa mesma parcela no contexto de um 
 espaço urbano e em directa articulação de proximidade com o espaço industrial 
 
 (Parque Industrial de Celeirós) que de forma mais mediata pretende servir.
 
                   12. Assim sendo, o elemento situacional diferenciador que 
 importa reter e destacar para ser tido em conta na posterior apreciação do 
 processo de interpretação dos normativos invocados no âmbito da classificação e 
 avaliação do solo da parcela expropriada para efeitos indemnizatórios, é o de 
 que no processo expropriativo em apreço se assume expressamente que essa 
 parcela é destinada a uma específica finalidade construtiva, mais precisamente, 
 
 à construção de um equipamento urbano, um terminal ferroviário.
 
                   13. Na interpretação que faz das normas dos artigos 23.º, n.º 
 
 1, 25.º, n.ºs 2 e 3, 26.º, n.º 12, e 27.º do Código das Expropriações, o douto 
 acórdão recorrido envereda por uma concepção radicalista e que ofende 
 abertamente os princípios constitucionais da igualdade, da justa indemnização e 
 o direito à propriedade privada, consagrados nos artigos 13.º e 62.º da CRP, 
 na medida em que absolutiza as constrições à edificabilidade decorrentes do 
 regime jurídico da RAN, em termos tais que redundam na total negação de 
 potencialidades edificativas, ao mesmo tempo que afasta ou rejeita a ponderação 
 de elementos situacionais e de diferenciação a que o próprio legislador atribui 
 relevância em sede de expropriação por utilidade pública (i. e., características 
 e infra‑estruturas da parcela expropriada, finalidade ou nova afectação visada 
 pelo processo expropriativo, etc.).
 
                   14. Semelhante entendimento parte de uma abordagem incorrecta 
 e abusiva do regime jurídico da RAN e tem implicações que constituem uma 
 intolerável violação do direito à propriedade privada, além do mais, por 
 acarretar para esse direito (com assento e dignidade constitucional) um gravame 
 e detrimento que não pode obter justificação plausível em nenhum interesse 
 público conflituante, nem pode ser sancionado à luz de critérios de 
 necessidade, adequação e proporcionalidade.
 
                   15. Por outro lado, a exigência de ponderação dos elementos 
 relativos à situação, características e infra‑estruturas da parcela expropriada 
 e à finalidade, destino ou nova afectação decorrente do próprio processo 
 expropriativo, no âmbito da classificação e avaliação de solos para efeitos de 
 indemnização, está directamente conexionada com o reconhecimento de que a 
 determinação do valor real e corrente de um imóvel, numa situação normal de 
 mercado, envolve ou é susceptível de envolver a necessidade de ponderação de um 
 conjunto complexo de factores de natureza diversa e de importância variável.
 
                   16. Encarado sob este ponto de vista, o douto acórdão 
 recorrido é igualmente inconciliável com os princípios constitucionais da 
 igualdade e da justa indemnização, na exacta medida em que, com os pressupostos 
 acolhidos nesse aresto, nunca o valor apurado a título de indemnização se 
 aproximará ou tenderá a aproximar do valor real do bem no mercado, como sempre 
 reclamaria o respeito pelo princípio da justa indemnização, do mesmo passo que 
 se ofende o princípio da igualdade, nomeadamente no que contende com a exigência 
 de tratamento desigual dos casos expropriativos desiguais (vertente interna, 
 dimensão negativa) e no que se refere a impedir ou eliminar um tratamento 
 desigual entre expropriados e não expropriados (vertente externa).
 
                   17. Com efeito, à luz do princípio da igualdade jamais poderá 
 ser visto como aceitável que se considere que a integração em área de RAN faça 
 com que (i) seja indiferente saber se a parcela expropriada se destina à 
 passagem de uma via de comunicação, à construção de um aterro sanitário ou de 
 construção de um equipamento urbano (e. g., central de camionagem, gare, 
 terminal ferroviário, etc.) ou que (ii) seja irrelevante que a parcela 
 expropriada se situe ou não em aglomerado urbano, possua ou não características 
 indicadoras de potencialidade de urbanização/construção e beneficie ou não do 
 serviço da maioria das infra‑estruturas urbanas; e, outrossim, se considere que 
 a integração em área de RAN faça com que (iii) seja indiferente saber qual o 
 valor real de outros imóveis com características similares, mas não bafejados 
 com a expropriação, para os agentes que actuam no mercado.
 
                   18. Acrescente‑se igualmente que, face aos invocados 
 princípios constitucionais da igualdade e da justa indemnização e do direito à 
 propriedade privada, a interpretação normativa que aqui se critica é tanto mais 
 reprovável quanto é certo que ela corresponde a impor a valoração tão‑somente 
 como solo agrícola de uma parcela de terreno declaradamente expropriada para a 
 edificação de um terminal ferroviário, dotada de características indicadoras de 
 potencialidade de urbanização/construção e beneficiando do serviço da maioria 
 das infra‑estruturas urbanas, o que em si mesmo constitui uma forma de infligir 
 uma redobrada penalização aos recorrentes, que já se viram patrimonialmente 
 prejudicados com a integração desses terrenos em RAN, sem que por esse facto 
 tenham recebido qualquer compensação indemnizatória.
 
                   19. Vale isto por dizer que se não fosse essa integração em 
 RAN, tais terrenos, que já em data muito anterior pertenciam aos recorrentes, 
 teriam mantido intocada a sua potencialidade edificativa, circunstancialismo 
 mais do que suficiente para justificar e impor, por exigência mínima dos 
 invocados princípios constitucionais, a aplicação directa ou porventura 
 analógica ao caso sub judice – pela equivalência ou estreita semelhança da 
 configuração situacional – do critério de cálculo do valor do solo previsto no 
 artigo 26.º, n.º 12, do Código das Expropriações.
 
                   20. Por tudo o que supra ficou alegado haverá forçosamente que 
 reconhecer e declarar a inconstitucionalidade das normas dos artigos 23.º, n.º 
 
 1, 25.º, n.ºs 2 e 3, 26.º, n.º 12, e 27.º do Código das Expropriações, na 
 interpretação que lhes foi dada pelo Supremo Tribunal de Justiça no impugnado 
 acórdão, uma vez que a mesma viola o princípio da igualdade, o princípio da 
 justa indemnização e o direito à propriedade privada, consagrados nos artigos 
 
 13.º e 62.º da CRP, entendimento que melhor e mais sabiamente se fundamenta no 
 parecer jurídico que o Ilustre Jurisconsulto A. Vassalo Abreu elaborou sobre a 
 matéria em questão e que aqui se acompanha e se dá por integralmente 
 reproduzido.”
 
  
 
                                     A recorrida REFER não contra‑alegou.
 
                                     Tudo visto, cumpre apreciar e decidir.
 
  
 
                                     2. Fundamentação
 
                                     2.1. Embora da fórmula decisória utilizada 
 no acórdão ora recorrido possa parecer ter‑se procedido à revogação total do 
 acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães e à repristinação, também total, da 
 sentença do Tribunal Judicial da Comarca de Braga, é, porém, seguro, face ao 
 exposto no n.º 1 da sua parte III, atrás transcrito, que apenas estava em causa, 
 no recurso de revista, a questão da qualificação da faixa de terreno com a área 
 de 16 316 m2 como “solo para outros fins” (como sustentava a expropriante então 
 recorrente) ou como “solo equiparado a solo apto para a construção, para efeitos 
 do disposto no n.º 12 do artigo 26.º do Código das Expropriações” (como decidira 
 o acórdão da Relação), sendo de assinalar que os expropriados não interpuseram 
 recurso deste acórdão, sequer subordinadamente, na parte em que entendeu que a 
 faixa de terreno em causa não podia ser classificada directamente como “solo 
 apto para a construção”, nos termos do n.º 2 do artigo 25.º, nem, 
 consequentemente, a determinação do valor da indemnização devia atender aos 
 critérios dos n.ºs 1 a 11 do artigo 26.º do referido Código. Ficou, assim, 
 excluído do âmbito do recurso de revista a parte do acórdão da Relação que, por 
 entender haver‑se constituído caso julgado quanto à qualificação, pelo acórdão 
 arbitral, da faixa de 4530 m2 como “solo apto para a construção”, revogou a 
 sentença da 1.ª instância na parte em que esta reclassificou essa faixa como 
 
 “solo para outros fins”.
 
                                     Por outro lado, está documentalmente provado 
 nos autos (cf. certidão de habilitação de herdeiros, de 21 de Janeiro de 1982, 
 a fls. 91 a 94), que os expropriados, ora recorrentes, adquiriram por herança o 
 prédio onde se integrava a parcela expropriada, por morte de sua mãe, a 20 de 
 Dezembro de 1981, e de seu pai, a 29 de Dezembro de 1981.
 
                                     A questão de constitucionalidade que 
 constitui objecto do presente recurso consiste, assim, em apurar se é 
 constitucionalmente conforme, designadamente face aos princípios da igualdade e 
 aos direitos de propriedade privada e de justa indemnização (artigos 13.º e 
 
 62.º, n.º 2, da CRP), a interpretação dos artigos 23.º, n.º 1, 25.º, n.ºs 2 e 3, 
 
 26.º, n.º 12, e 27.º do Código das Expropriações, aprovado pela Lei n.º 168/99, 
 de 18 de Setembro, no sentido – aplicado no acórdão recorrido – de que o valor 
 da indemnização devida pela expropriação, para construção de um terminal 
 ferroviário, de um terreno, que objectivamente preenche os requisitos elencados 
 no n.º 2 do artigo 25.º para a qualificação como “solo apto para a construção”, 
 mas que foi integrado na RAN por instrumento de gestão territorial em data 
 posterior à sua aquisição pelos expropriados, deve ser calculado de acordo com 
 os critérios definidos no artigo 27.º para os “solos para outros fins”, e não de 
 acordo com o critério definido no n.º 12 do artigo 26.º, todos do referido 
 Código.
 
  
 
                                     2.2. A questão que constitui objecto do 
 presente recurso, ou outras suas próximas, tem sido objecto de diversas 
 decisões deste Tribunal, sendo possível identificar duas linhas de orientação 
 divergentes.
 
                                     A primeira, iniciada pelo Acórdão n.º 
 
 275/2004 e prosseguida pelos Acórdãos n.ºs 145/2005, 398/2005, 417/2006 e 
 
 118/2007:
 
                                     1) julgou inconstitucionais, por violação do 
 princípio da igualdade, consagrado no artigo 13.º da CRP: (i) “as normas 
 contidas no n.º 1 do artigo 23.º e no n.º 1 do artigo 26.º do Código das 
 Expropriações (1999), quando interpretadas no sentido de incluir na 
 classificação de «solo apto para a construção» e, consequentemente, de como tal 
 indemnizar o solo, integrado na Reserva Agrícola Nacional, expropriado para 
 implantação de vias de comunicação” (Acórdão n.º 275/2004); (ii) “a norma do 
 n.º 12 do artigo 26.º do Código das Expropriações, aprovado pela Lei n.º 
 
 168/99, de 18 de Setembro, interpretada no sentido de que, para efeitos da sua 
 aplicação, a aptidão edificativa da parcela expropriada não tem de aferir‑se 
 pelos elementos objectivos definidos no artigo 25.º, n.º 2, do mesmo Código” 
 
 (Acórdão n.º 145/2005); (iii) “o artigo 26.º, n.º 12, do Código das 
 Expropriações, aprovado pela Lei n.º 168/99, de 18 de Setembro, quando 
 interpretado no sentido de ser indemnizado como solo apto para construção 
 terreno integrado na RAN com aptidão edificativa segundo os elementos objectivos 
 definidos no n.º 2 do artigo 25.º do mesmo Código” (Acórdão n.º 417/2006); e 
 
 (iv) “a norma do artigo 26.º, n.º 12, do Código das Expropriações, aprovado pela 
 Lei n.º 168/99, de 18 de Setembro, quando interpretado no sentido de ser 
 indemnizável como solo apto para construção, com valor calculado em função do 
 valor médio das construções existentes ou que seja possível edificar nas 
 parcelas situadas numa área envolvente cujo perímetro exterior se situe a 300 m 
 do limite da parcela expropriada, terreno integrado na RAN com aptidão 
 edificativa segundo os elementos objectivos definidos no n.º 2 do artigo 25.º 
 do mesmo Código” (Acórdão n.º 118/2007); e
 
                                     2) não julgou inconstitucional “a norma do 
 n.º 3 do artigo 25.º do Código das Expropriações, aprovado pela Lei n.º 168/99, 
 de 18 de Setembro, interpretada com o sentido de excluir da classificação de 
 
 «solo apto para a construção» solos integrados na RAN ou na REN expropriados 
 para implantação de vias de comunicação” (Acórdão n.º 398/2005).
 
                                     Diversamente, esta 2.ª Secção sempre seguiu 
 orientação diferente. Primeiro, no Acórdão n.º 114/2005 – que não julgou 
 inconstitucional a norma do artigo 26.º, n.º 12, do Código das Expropriações de 
 
 1999 considerada aplicável à determinação do valor do solo incluído na RAN, 
 expropriado para a implantação de vias de comunicação, quando resultam 
 satisfeitos em relação a ele os critérios, enquadráveis na alínea a) do n.º 2 do 
 artigo 25.º do mesmo Código, de proximidade da malha urbana (distância de cerca 
 de 150 m), de envolvência (inserção numa área envolvente onde se situam 
 vivendas familiares) e de acesso por vias públicas –, onde se desenvolveu a 
 seguinte fundamentação:
 
  
 
                   “9.  Importa, então, saber se a norma segundo a qual «é de 
 determinar segundo a regra do artigo 26.º, n.º 12, do Código das Expropriações 
 de 1999 o solo incluído na RAN quando saiam satisfeitos em relação a ele os 
 critérios enquadráveis na alínea a) do n.º 2 do artigo 25.º de proximidade da 
 malha urbana (distância de cerca de 150 metros), de envolvência (inserção numa 
 
 área envolvente onde se situam vivendas familiares) e de acesso por vias 
 públicas, expropriado para fins de implantação de vias de comunicação» ofende o 
 princípio constitucional da justa indemnização por desrespeito de alguma norma 
 ou princípio constitucional, nomeadamente o da igualdade, considerada a sua 
 vertente externa.
 
                   O n.º 12 do artigo 26.º do Código das Expropriações de 1999 
 estabelece o critério específico de cálculo do valor do solo para os casos em 
 que «seja necessário expropriar solos classificados como zona verde, de lazer ou 
 para a instalação de infra‑estruturas e equipamentos públicos por plano 
 municipal de ordenamento do território plenamente eficaz, cuja aquisição seja 
 anterior à sua entrada em vigor», determinando que em tais casos «o valor de 
 tais solos será calculado em função do valor médio das construções existentes ou 
 que seja possível edificar nas parcelas situadas numa área envolvente cujo 
 perímetro exterior se situe a 300 m do limite da parcela expropriada».
 
                   Será tal norma efectivamente violadora dos princípios da 
 igualdade e da justa indemnização?
 
                   A ofensa ao princípio da igualdade invocada parece, porém, 
 fundar‑se num juízo sobre uma hipotética não indemnização nos mesmos termos de 
 proprietários em idênticas condições a expropriar futuramente. No entanto, o 
 próprio princípio da igualdade somente impõe a comparação de realidades 
 existentes, extrapolando da sua racionalidade uma violação com fundamento na 
 circunstância de outros proprietários na mesma situação poderem não vir a 
 beneficiar de uma indemnização nos mesmos termos.
 
                   Coisa diferente seria a invocação do princípio da igualdade 
 por quem, nas mesmas circunstâncias, não viesse efectivamente a beneficiar de 
 uma indemnização idêntica – veja‑se o Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 
 
 194/97, publicado no Diário da República, II Série, de 27 de Janeiro de 1999, em 
 que se diz:
 
  
 
                   «Ora, num Estado de Direito, tem que haver igualdade de 
 tratamento, designadamente perante os encargos públicos. Por isso, a 
 desigualdade imposta pela expropriação tem que compensar‑se com o pagamento de 
 uma indemnização que assegure ‘uma adequada restauração da lesão patrimonial 
 sofrida pelo expropriado’ (cf. o citado Acórdão n.º 52/90 e o Acórdão n.º 
 
 381/89, publicado no Diário da República, II Série, de 8 de Setembro de 1989). 
 Só desse modo, com efeito, se restabelecerá o equilíbrio que a igualdade 
 postula.
 
                   O princípio da igualdade, por outro lado, proíbe que se dê 
 tratamento jurídico desigual aos expropriados colocados em idêntica situação, 
 só podendo estabelecer‑se distinções de tratamento ali onde exista um fundamento 
 material para tanto. Por isso, não é constitucionalmente admissível que a alguns 
 expropriados se imponha uma ‘onerosidade forçada e acrescida’ sem que exista 
 justificação material para a diferença de tratamento (cf. o citado Acórdão n.º 
 
 131/88); – recte, do ponto de vista constitucional, é inadmissível, por exemplo, 
 que, ‘em regra, se atenda ao valor real e corrente dos prédios expropriados e 
 que nas situações particulares dos n.os 1 e 2 do artigo 30.º do Código das 
 Expropriações (de 1986) se considere, em muitos casos, um valor abaixo do real 
 e corrente’ (cf. o Acórdão n.º 109/88, publicado no Diário da República, II 
 Série, de 1 de Setembro de 1988).»
 
  
 
                   Mas não é esse o caso de que agora se trata. A invocação pela 
 Administração da violação da igualdade fundamenta‑se apenas em que não será 
 possível realizar no solo expropriado uma construção semelhante às existentes e 
 possíveis de edificar na zona envolvente e assim na previsão de que outros 
 expropriados não serão tratados equitativamente, eventualmente pela 
 interpretação subjacente à solução aplicada ser incorrecta. Contra esta 
 consideração, milita desde logo a circunstância de o terreno objecto de 
 expropriação no caso concreto satisfazer as condições do artigo 25.º, n.º 2, 
 alínea a), do Código das Expropriações de 1999.
 
                   Mas, a consideração de que, de acordo com o critério normativo 
 sob análise, não será exigível a possibilidade de realizar no solo expropriado 
 construção semelhante às existentes pressupõe que a Constituição concebe a 
 justa indemnização confinada a limites mínimos, e que não admite que o 
 legislador possa utilizar critérios de valoração do solo diversos, mas com 
 semelhante expressão no valor da indemnização.
 
                   Por outro lado, o raciocínio hipotético segundo o qual esta 
 solução viola a igualdade porque outros expropriandos não beneficiarão dela não 
 pode ser pertinente, não podendo a igualdade aferir‑se pelo confronto com 
 situações hipotéticas. Aliás, a ponderação realizada no caso para alcançar o 
 valor da indemnização, dada a respectiva especificidade, impede uma comparação 
 automática com hipotéticas situações de proprietários, eventualmente 
 expropriáveis, de parcelas contíguas igualmente integradas na RAN mas que não 
 foram expropriadas, quer considerando a indemnização por uma eventual futura 
 expropriação quer o valor de mercado que os proprietários obterão se porventura 
 decidirem vender os prédios.
 
                   Finalmente, a Constituição, em particular o artigo 62.º, não 
 configura deste modo restritivo o dever de indemnizar, em que está em causa 
 acautelar a compensação do expropriado pela ablação do seu direito em nome do 
 interesse público. Só perante uma manifesta desproporção entre o valor fixado e 
 o valor do bem, o que não está em questão nos presentes autos ou que pelo menos 
 o Tribunal Constitucional não pode avaliar, por neste caso concreto só poder 
 surgir com uma dimensão de aplicação de critérios, é que se poderá colocar um 
 problema de eventual ultrapassagem da justa indemnização por excesso.
 
                   Improcede, portanto, o presente recurso de 
 constitucionalidade.”
 
  
 
                                     Nesta linha se inserem os Acórdãos n.ºs 
 
 234/2007 e 239/2007, tendo ambos decidido não julgar inconstitucional a norma do 
 artigo 26.º, n.º 12, do Código das Expropriações, aprovado pela Lei n.º 
 
 168/99, de 18 de Setembro, no sentido de permitir que solos integrados na 
 Reserva Agrícola Nacional à data da declaração de utilidade pública, 
 expropriados para implantação de vias de comunicação, possam ser avaliados em 
 função “do valor médio das construções existentes ou que seja possível edificar 
 nas parcelas situadas numa área envolvente cujo perímetro exterior se situe a 
 
 300 m do limite da parcela expropriada”. Estes Acórdãos, para além de invocarem 
 a fundamentação do Acórdão n.º 114/2005, atrás transcrita, aderiram à 
 argumentação desenvolvida na declaração de voto aposta pelo Conselheiro Rui 
 Manuel Moura Ramos ao Acórdão n.º 145/2005, declaração essa do seguinte teor:
 
  
 
 “1.1. Não acompanhei a posição da maioria por discordar do entendimento segundo 
 o qual o disposto no artigo 26.º, n.º 12, do Código das Expropriações de 1999 
 
 (CE), interpretado no sentido de que, para efeitos da sua aplicação, a aptidão 
 edificativa da parcela expropriada não tem de aferir‑se pelos elementos 
 objectivos definidos no artigo 25.º, n.º 2, do mesmo Código, viola o princípio 
 da igualdade, consagrado no artigo 13.º da Constituição da República Portuguesa 
 
 (CRP).
 
                   Considero, com efeito, que, tratando‑se de determinar a 
 conformidade constitucional de uma disposição do CE com as características da 
 norma sub judicio, a comparação entre o expropriado e os não expropriados – a 
 análise da indemnização na perspectiva da chamada relação externa da 
 expropriação – não deve realizar‑se na base de conjecturas quanto ao valor de 
 mercado (o mercado é uma realidade social e não normativa) dos terrenos dos 
 restantes proprietários não expropriados, ficcionando uma hipotética venda dos 
 terrenos destes.
 
                   Por outro lado, entendo ainda que o Tribunal deduz de uma 
 questão interpretativa respeitante à norma (saber se a sua ratio é apenas a 
 indicada por Alves Correia no estudo citado no item 9 do Acórdão) um argumento 
 de inconstitucionalidade, quando não tenho por evidente que a interpretação 
 pressuposta pelo Tribunal encerre o verdadeiro e único sentido interpretativo 
 do artigo 26.º, n.º 12, do CE.
 
                  Estas divergências relativamente à posição que fez vencimento 
 carecem de uma maior explicitação que, sem prejuízo do carácter sucinto do 
 presente voto, procurarei efectuar.
 
  
 
                   1.2. Preliminarmente, porém, há que ter presente a 
 circunstância de, recentemente, no Acórdão n.º 114/2005 da 2.ª Secção, este 
 Tribunal ter apreciado a constitucionalidade da norma aqui em causa – face aos 
 princípios da igualdade e da justa indemnização – concluindo, então, pela 
 conformidade constitucional da referida norma.
 
                   Não obstante entender que este anterior pronunciamento do 
 Tribunal (no sentido da não inconstitucionalidade) deveria ter sido o adoptado 
 igualmente na presente situação, cumpre sublinhar a existência de uma 
 importante dissemelhança entre ambos os casos, em termos tais que a questão de 
 constitucionalidade configurada não pode ser considerada a mesma nas duas 
 situações.
 
                   Com efeito, estando em causa aplicações da mesma norma, 
 assentou cada uma delas em interpretações distintas. É que, no presente caso, 
 o artigo 26.º, n.º 12, do CE, enquanto norma objecto do recurso, é apreciado 
 quando interpretado no sentido de prescindir da determinação concomitante da 
 aptidão edificativa da parcela expropriada, através dos critérios do artigo 
 
 25.º, n.º 2, do CE. Diversamente, na situação apreciada pelo Acórdão n.º 
 
 114/2005, a aptidão edificativa (sempre determinada nos termos desse artigo 
 
 25.º, n.º 2) era encarada como pressuposto do cálculo do valor do terreno com 
 base no critério estabelecido no n.º 12 do artigo 26.º do CE.
 
                   Estando, embora, em causa interpretações diversas da mesma 
 norma ou, por outras palavras, aplicações dessa norma baseadas em interpretações 
 distintas, não creio, porém, salvo melhor entendimento, que o resultado em 
 termos de conformidade constitucional deva ser, na presente situação, não 
 obstante as especificidades interpretativas dos dois casos, contrário ao 
 alcançado no citado Acórdão n.º 114/2005.
 
  
 
                   2. A primeira divergência refere‑se, como anteriormente disse, 
 ao sentido que o Tribunal atribui ao princípio da igualdade relativamente à 
 relação externa da expropriação. Ou seja, saber se a aplicação do critério de 
 cálculo constante do n.º 12 do artigo 26.º do CE «conduz à atribuição de uma 
 indemnização excessiva ao expropriado, desproporcionada em relação ao real 
 sacrifício representado pela expropriação e conducente a uma intolerável 
 desigualdade em relação a todos os restantes proprietários de terrenos 
 integrados na área classificada [...] que não tenham sido contemplados com a 
 expropriação» (item 11 do Acórdão).
 
                   Para responder afirmativamente a esta questão (existe 
 desigualdade relativamente aos não expropriados) o Tribunal acaba por 
 ponderar – implicitamente, pelo menos – o valor que obteriam estes (os «que 
 não tenham sido contemplados com a expropriação») se procedessem à venda das 
 respectivas parcelas, concluindo que esse valor, não se verificando os 
 elementos do artigo 25.º, n.º 2, do CE, nunca seria o de um «solo apto para a 
 construção» (o «do valor médio das construções existentes ou que seja possível 
 edificar nas parcelas situadas numa área envolvente cujo perímetro exterior se 
 situe a 300 m do limite da parcela expropriada», como diz o n.º 12 do artigo 
 
 26.º do CE). Esta conclusão, porém, não se nos afigura evidente, por assentar na 
 comparação entre realidades intrinsecamente distintas: as regras, normativas, de 
 cálculo da indemnização no caso de expropriação, e as regras de comportamento 
 dos agentes actuando no mercado.
 
                   Este – o mercado – «é a interacção do conjunto dos vendedores 
 e compradores, actuais ou potenciais, que se interessam pela transacção de 
 determinado produto» (Fernando Araújo, Introdução à Economia, vol. I, 2.ª ed., 
 Coimbra, 2004, pág. 232) e funciona com base numa lógica insusceptível de 
 assimilação a uma realidade que se expressa através de conteúdos normativos. 
 Significa isto que, não sendo irrelevantes, na formação dos preços de um 
 terreno no mercado concorrencial, constrangimentos administrativos à 
 construção, estes não excluem que, em função de múltiplos factores (desde logo 
 das possíveis expectativas de ulterior alteração desses constrangimentos, 
 decorrentes, por exemplo, da evolução previsível do statu quo traduzido numa 
 proximidade de 300 m de terrenos aptos para construção), no mercado, a 
 interacção entre a oferta e a procura produza preços equivalentes aos valores 
 que, sem a verificação dos elementos elencados no n.º 2 do artigo 25.º do CE, 
 seriam alcançados com base no n.º 12 do artigo 26.º do CE.
 
                   É certo que este Tribunal, em sede de controlo da relação 
 externa da expropriação, afasta habitualmente possíveis objecções deste tipo, 
 falando em «valor de mercado do bem [expropriado] normativamente entendido», o 
 que expressaria «a quantia que teria sido paga pelo bem [...] se este tivesse 
 sido objecto de um livre contrato de compra e venda descontados os factores 
 especulativos» (Fernando Alves Correia, caracterizando a jurisprudência do 
 Tribunal Constitucional, no estudo: «Propriedade de Bens Culturais – 
 Restrições de Utilidade Pública, Expropriações e Servidões Administrativas», in 
 Direito do Património Cultural, Lisboa, 1996, pág. 407). Porém, descontados 
 esses factores, ou quaisquer outros actuantes no mercado, e pressupondo (o que 
 não é certo) que esse desconto seja possível, o que fica já não é o valor de 
 mercado e, consequentemente, a comparação entre quem é expropriado – que queira 
 ou não o é – e quem hipoteticamente vendesse, já não tem qualquer sentido, pois 
 já não expressa a realidade, mas uma mera ficção desta.
 
                   A solução não é, obviamente, prescindir de toda a comparação 
 entre expropriados e não expropriados, mas restringir tal comparação ao que, 
 pela sua natureza, é susceptível de uma comparação efectiva. Foi o que sucedeu 
 no Acórdão n.º 422/2004 (poderíamos citar igualmente os Acórdãos n.ºs 314/95 e 
 
 86/2003), no qual o Tribunal procedeu ao controlo da relação externa da 
 expropriação comparando expropriados com não expropriados no que diz respeito 
 
 à sujeição daqueles e destes a encargos públicos. É que a Contribuição 
 Autárquica ou o Imposto Municipal Sobre Imóveis (em causa no Acórdão n.º 
 
 422/2004) pagavam‑no, efectivamente, tanto o proprietário expropriado como 
 aquele que o não era, podendo‑se quantificar – e por isso comparar – os 
 encargos reais de um e de outro. Aqui, diversamente, o que se compara é o que 
 existe (a expropriação daquele concreto bem num determinado momento) com o que 
 só hipoteticamente existiria e, mesmo assim, produziria efeitos – e são estes 
 efeitos que o Tribunal pretende comparar – com base em modelos que, por não 
 expressarem realidades normativas, actuam de forma e com resultados 
 substancialmente distintos.
 
                   Daí que, citando as palavras do mencionado Acórdão n.º 
 
 114/2005, da 2.ª Secção, entendamos, também na situação sub judicio, que «o 
 
 [...] princípio da igualdade somente impõe a comparação de realidades 
 existentes, extrapolando da sua racionalidade uma violação com fundamento na 
 circunstância de outros proprietários poderem não vir a beneficiar de uma 
 indemnização nos mesmos termos».
 
  
 
                   3. A isto acresce – e abordamos agora a outra divergência 
 relativamente à posição da maioria – que a caracterização da norma em termos de 
 pretender obstar às chamadas «classificações dolosas» (classificação de certa 
 
 área como zona verde, expropriando‑a como terreno não apto para construção, 
 destinando‑a posteriormente a fim diverso que conduziria, não fora a 
 classificação, a uma mais elevada indemnização; v. Fernando Alves Correia, 
 Código das Expropriações, Lisboa, 1992, pág. 23; cf. José Osvaldo Gomes, 
 Expropriações por Utilidade Pública, Lisboa, 1996, pág. 195), tal 
 caracterização, dizíamos, não esgota o sentido possível da norma e não 
 justifica, por isso, a «redução teleológica» que o Tribunal efectua, assente na 
 interpretação de Fernando Alves Correia («A Jurisprudência do Tribunal 
 Constitucional sobre Expropriações por Utilidade Pública e o Código de 
 Expropriações de 1999», in Revista de Legislação e de Jurisprudência, ano 133, 
 págs. 53/54) e que se expressa na seguinte passagem do Acórdão:
 
  
 
                   «[...]
 
                   Tendo o tribunal recorrido prescindido da averiguação da 
 aptidão ou vocação objectiva para a edificabilidade do solo a que respeitava a 
 parcela expropriada – ou, dizendo de outro modo, tendo o tribunal recorrido 
 decidido que a aptidão edificativa da parcela expropriada não tem de aferir‑se 
 pelos elementos objectivos definidos no artigo 25.º, n.º 2, do CE –, conclui‑se 
 que a norma do n.º 12 do artigo 26.º do mesmo Código foi aplicada num sentido 
 que, seguindo o raciocínio de Fernando Alves Correia, não satisfez, em boa 
 verdade, o objectivo de ‘evitar as classificações dolosas de solos ou a 
 manipulação das regras urbanísticas por parte dos planos municipais’.
 
                   [...]»
 
  
 
                   Suscita‑nos esta interpretação algumas dúvidas. Nada exclui 
 que uma norma com as características da do n.º 12 do artigo 26.º do CE possa 
 fundar‑se igualmente numa ratio distinta, a saber: a proximidade até 300 m de 
 
 áreas de construção, ou onde seja possível construir, pode implicar expectativas 
 de valorização fundiária, a curto, médio ou longo prazo (mesmo sem as 
 características indicadas no n.º 2 do artigo 25.º do CE) – expectativas estas 
 que são definitivamente cortadas ao expropriado com a ablação do direito de 
 propriedade, contrariamente ao não expropriado que mantém intactas essas 
 expectativas – que, traduzindo um elemento não irrelevante na relação do 
 proprietário com o bem, devem ser tidas em conta, na avaliação do sacrifício 
 imposto ao expropriado, no momento da cessação coactiva dessas expectativas. 
 Atente‑se em que na formação dos preços, as expectativas relativas a 
 acontecimentos futuros são determinantes do comportamento dos agentes e 
 constituem um elemento imprescindível na análise dos mercados (v. Joseph 
 Stiglitz, John Driffill, Economics, Nova Iorque, 2000, pág. 104), o que, aliás, 
 
 é especialmente relevante na formação dos preços da propriedade imobiliária, 
 relativamente às possíveis alterações do estatuto fundiário, através da 
 projecção de futuras transferências de solo rural para solo urbano (v. Robert 
 Ekelund, Robert Tollison, Economics, 4.ª ed., Nova Iorque, págs. 370/373).
 
                   Nada nos permite excluir este sentido como um dos possíveis 
 relativamente à norma apreciada. Bem vistas as coisas, ao atender‑se, na 
 procura de um valor justo para a compensação do sacrifício decorrente da 
 expropriação, à extinção de expectativas (que, note‑se, persistem incólumes 
 relativamente ao não expropriado), estar‑se‑á ainda a realizar a justiça entre 
 expropriados e não expropriados.
 
  
 
                   4. Como nota final, e sem prejuízo de uma indagação mais 
 aprofundada agora quanto ao sentido do princípio da justa indemnização, 
 plasmado no artigo 62.º, n.º 2, da CRP (norma que se refere ao direito de 
 propriedade privada), temos também sérias reservas quanto à possibilidade de ao 
 abrigo deste preceito constitucional serem inviabilizadas normas que garantam 
 uma indemnização que, não sendo inferior ao valor do bem, possa ser 
 considerada (ao abrigo de algum critério) como mais ampla que um valor 
 
 «aceitável» desse bem.
 
                   Perturba‑nos, enfim, e não temos por seguro que o artigo 62.º, 
 n.º 2, da CRP o autorize, que a suposta afirmação dos direitos de terceiros não 
 parte na relação expropriativa (os outros proprietários não expropriados) possa 
 servir ao expropriante para lograr a diminuição do valor a satisfazer ao 
 expropriado pelo sacrifício que lhe impõe.
 
                   A prossecução da igualdade entre expropriados e não 
 expropriados deve, assim, salvo melhor entendimento, assentar em bases 
 distintas daquelas que conduziram ao presente juízo de inconstitucionalidade.”
 
  
 
                                     A estas considerações aditaram os referidos 
 Acórdãos n.ºs 234/2007 e 239/2007 mais as seguintes:
 
  
 
 “5. As considerações que antecedem, constantes da declaração de voto referida, 
 são procedentes, e conduzem, no presente caso, a uma solução de não 
 inconstitucionalidade, quer em face do princípio da igualdade (artigo 13.º), 
 quer quanto à garantia de justa indemnização em caso de expropriação (artigo 
 
 62.º, n.º 2, também da Constituição).
 Com efeito, a indemnização por expropriação por utilidade pública visa compensar 
 os expropriados do prejuízo que sofrem, e nada na Constituição da República 
 Portuguesa proíbe que na determinação da aptidão edificativa da parcela 
 expropriada para a construção de vias de comunicação, integrada na Reserva 
 Agrícola Nacional, seja tomado em consideração o valor médio das construções 
 existentes ou que seja possível edificar nas parcelas situadas numa área 
 envolvente cujo perímetro exterior se situe a 300 m do limite da parcela 
 expropriada.
 Essa proibição não resulta, por um lado, do princípio da igualdade, desde logo 
 porque, mesmo aceitando a comparação com hipotéticos expropriados na mesma 
 situação, se não sabe se idêntica interpretação e procedimento não serão também 
 seguidos quanto a eles. Aliás, não está no presente recurso em questão uma 
 comparação entre proprietários de terrenos integrados na área classificada, 
 
 «porquanto as parcelas de terreno envolventes não estão todas classificadas como 
 RAN, mas bem pelo contrário, como resulta dos factos assentes», e se pode ler na 
 decisão do tribunal a quo.
 Mas também não resulta, por outro lado, da garantia, consagrada no artigo 62.º, 
 n.º 2, da Constituição, de justa indemnização. Pode, desde logo, duvidar‑se de 
 que esta garantia proíba (embora não seja isso que está decisivamente em causa 
 na presente dimensão normativa) que – considerando o sacrifício imperativamente 
 sofrido pelo expropriado – o Estado entenda valorizar a parcela expropriada 
 mesmo em montante considerado superior ao que lhe poderia vir a ser atribuído 
 pelo jogo do mercado. Mas, de todo o modo, o que é certo é que essa garantia não 
 imporá certamente uma limitação da indemnização em nome da «suposta afirmação 
 dos direitos de terceiros não parte na relação expropriativa (os outros 
 proprietários não expropriados)», e da igualdade com eles, assim possibilitando 
 ao expropriante «lograr a diminuição do valor a satisfazer ao expropriado pelo 
 sacrifício que lhe impõe». Não se verifica, pois, qualquer inconstitucionalidade 
 por violação do artigo 62.º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa, 
 como pretende a recorrente.
 Falham, assim, ambos os fundamentos invocados pela recorrente. E não se 
 divisando outros, que possam justificar um juízo de inconstitucionalidade da 
 norma do artigo 26.º, n.º 12, do Código das Expropriações, interpretada no 
 sentido de permitir que solos integrados na Reserva Agrícola Nacional à data da 
 declaração de utilidade pública, expropriados para implantação de vias de 
 comunicação, possam ser avaliados em função «do valor médio das construções 
 existentes ou que seja possível edificar nas parcelas situadas numa área 
 envolvente cujo perímetro exterior se situe a 300 m do limite da parcela 
 expropriada», há que negar provimento ao presente recurso.”
 
  
 
                                     Por último, o Acórdão n.º 276/2007, também 
 desta 2.ª Secção (este, como todos os anteriormente citados, com texto integral 
 disponível em www.tribunalconstitucional.pt), não julgou inconstitucionais as 
 normas constantes dos artigos 23.º, n.º 1, e 26.º, n.ºs 1 e 12, do Código das 
 Expropriações de 1999, “quando interpretadas no sentido de incluírem na 
 classificação de «solo apto para a construção, e a serem indemnizados de acordo 
 com as regras constantes deste n.º 12, os solos adquiridos em data anterior à 
 entrada em vigor de Plano Director Municipal que os integrou em «Zona de 
 Salvaguarda Estrita», «RAN» e «Espaço Florestal» e expropriados para a 
 implantação de «áreas de serviço» de auto‑estradas”. Este juízo de não 
 inconstitucionalidade foi alcançado por uma dupla via: para quem comunga da 
 orientação traçada pelos Acórdãos n.ºs 114/2005, 234/2007 e 239/2007, por 
 directa aplicação do critério aí tido por constitucionalmente conforme; mas 
 mesmo para quem não defenda a tese que fez vencimento nesses arestos, por se 
 entender que “a edificação das «áreas de serviço» e a actividade e fins que, 
 prevalentemente, prosseguem mais não representa, quando se verifica a situação 
 prevista no artigo 26.º, n.º 12, do CE/99, do que a manifestação de uma 
 objectiva aptidão anterior de edificabilidade, pelo que a valoração do solo 
 como sendo para construção não deixa de corresponder a uma forma de «evitar a 
 manipulação das regras urbanísticas por parte dos planos municipais» (cf. 
 Fernando Alves Correia, “A Jurisprudência do Tribunal Constitucional sobre 
 Expropriações por Utilidade Pública e o Código das Expropriações de 1999, in 
 Revista de Legislação e de Jurisprudência, ano 133, pp. 53/54)”; e, assim, 
 
 “numa tal situação, a expectativa do expropriado em nada sai privilegiada 
 relativamente a outros não expropriados que tenham os seus terrenos sujeitos a 
 idêntico regime jurídico «situacional»”, donde se conclui “que a norma 
 questionada não ofende nem o princípio da justa indemnização nem o princípio da 
 igualdade, na sua vertente externa”.
 
  
 
                                     2.3. As considerações que têm levado esta 
 
 2.ª Secção a não julgar inconstitucionais os critérios normativos, aplicados 
 nas decisões então recorridas, que consideram aplicável o regime do n.º 12 do 
 artigo 26.º do Código das Expropriações de 1999 à determinação da indemnização 
 por expropriação de terrenos que preencham os requisitos elencados no n.º 2 do 
 artigo 25.º para a qualificação dos solos como aptos para a construção mas que 
 venham a ser integrados na RAN por instrumento de gestão territorial posterior à 
 aquisição do terreno pelos expropriados justificam que, inversamente, se julgue 
 inconstitucional o critério normativo, aplicado na decisão ora recorrida, que 
 considerou inaplicável aquele regime a situação similar.
 
                                     É esta uma conclusão que, por pura coerência 
 lógica, se impõe, desde logo, a quem perfilhe o entendimento sufragado nos 
 Acórdãos n.ºs 114/2005, 234/2007 e 239/2007; mas também a quem, no último 
 acórdão citado, fundou o juízo de não inconstitucionalidade aí emitido na 
 consideração de que “a edificação das «áreas de serviço» e a actividade e fins 
 que, prevalentemente, prosseguem mais não representa, quando se verifica a 
 situação prevista no artigo 26.º, n.º 12, do CE/99, do que a manifestação de 
 uma objectiva aptidão anterior de edificabilidade, pelo que a valoração do 
 solo como sendo para construção não deixa de corresponder a uma forma de 
 
 «evitar a manipulação das regras urbanísticas por parte dos planos municipais» 
 
 (cf. Fernando Alves Correia, “A Jurisprudência do Tribunal Constitucional sobre 
 Expropriações por Utilidade Pública e o Código das Expropriações de 1999, in 
 Revista de Legislação e de Jurisprudência, ano 133, pp. 53/54)”; e, assim, 
 
 “numa tal situação, a expectativa do expropriado em nada sai privilegiada 
 relativamente a outros não expropriados que tenham os seus terrenos sujeitos a 
 idêntico regime jurídico «situacional»”, donde se conclui “que a norma 
 questionada não ofende nem o princípio da justa indemnização nem o princípio da 
 igualdade, na sua vertente externa”. Estas considerações são extensíveis ao 
 presente caso, em que a parcela expropriada não se destina directamente à 
 construção de uma via de comunicação, mas antes à edificação de um terminal 
 ferroviário, para apoio a um parque industrial.
 
                                     Apenas haverá que salientar que, neste 
 contexto, surge como desprovida de fundamento constitucionalmente relevante, 
 perante situações estruturalmente idênticas – expropriação de parcela de terreno 
 que, pelas suas características objectivas, por preencher os requisitos do n.º 2 
 do artigo 25.º, merecia, à partida, a qualificação como “solo apto para a 
 construção”, mas que é privada dessa potencialidade edificativa por instrumento 
 de gestão territorial superveniente à aquisição do terreno pelos proprietários 
 expropriados –, a discriminação do critério para determinação do valor da 
 indemnização consoante esse instrumento de gestão haja classificado o terreno 
 como zona verde, de lazer ou para instalação de infra‑estruturas e equipamentos 
 públicos (hipótese em que se aplica o regime do n.º 12 do artigo 26.º, 
 calculando‑se o valor do solo em função do valor médio das construções 
 existentes ou que seja possível edificar nas parcelas situadas numa área 
 envolvente cujo perímetro exterior se situe a 300 m do limite da parcela 
 expropriada) ou o haja integrado em RAN (hipótese em que se considera relevante 
 o regime do artigo 27.º, que, no caso, por ser impossível aplicar o critério do 
 n.º 1, a sentença da 1.ª instância, neste ponto confirmada pelo acórdão ora 
 recorrido, entendeu ser de atender ao definido no n.º 3 desse artigo 27.º, todos 
 do Código das Expropriações de 1999).
 
                                     Salvo o devido respeito, contrariamente ao 
 que o acórdão recorrido parece subentender, o terreno ora em causa detinha, à 
 data da declaração de utilidade pública, tal como os directamente previstos no 
 n.º 12 do artigo 26.º do Código das Expropriações de 1999, capacidade 
 edificativa objectiva, dado que preenchia os requisitos do n.º 2 do artigo 25.º 
 do mesmo Código. A lesão que à “posição de vantagem” que os seus proprietários 
 detinham, na perspectiva do futuro aproveitamento económico do terreno para 
 edificação urbana, resultou do superveniente cerceamento dessa possibilidade por 
 força da integração desse terreno na RAN merece um tratamento similar ao dos 
 proprietários de terrenos cujo valor edificativo foi afectado por superveniente 
 classificação como zona verde, de lazer ou para instalação de infra‑estruturas 
 e equipamentos públicos.
 
                                     Com esta equiparação não se está a criar 
 simultaneamente uma nova situação de desigualdade, desta feita entre 
 proprietários de terrenos com capacidade edificativa objectiva integrados na 
 RAN que foram expropriados e os proprietários de idênticos terrenos que não 
 foram expropriados. É que, quanto aos primeiros, com a expropriação desaparece 
 irremediavelmente a eventualidade de virem a beneficiar de posterior alteração 
 da classificação dos solos, atenta a mutabilidade dos instrumentos de gestão 
 territorial e a conhecida tendência de alargamento das áreas urbanas em 
 detrimento das rústicas, potencialidade esta que se mantém incólume quanto aos 
 que conservam a propriedade dos terrenos, como, aliás, já se salientou no 
 transcrito voto de vencido aposto ao Acórdão n.º 145/2005.
 
                                     E saliente‑se, por fim, que não se trata de 
 equiparar a presente situação à dos “solos aptos para a construção”, definidos 
 no artigo 25.º, n.º 2, a que são aplicáveis os critérios de determinação do 
 valor da indemnização descritos nos n.ºs 1 a 11 do artigo 26.º do Código das 
 Expropriações de 1999. Apesar de este Código aparentemente assentar numa 
 divisão dicotómica dos solos expropriados – entre “solo apto para a construção” 
 e “solo para outros fins” –, a situação agora contemplada no n.º 12 do artigo 
 
 26.º representa uma situação específica relativamente à qual o legislador tem 
 hesitado em a considerar uma subespécie do solo apto para outros fins (como 
 fazia no Código de 1991, em que a norma correspondente ao actual n.º 12 do 
 artigo 26.º surgia como n.º 2 do então artigo 26.º, dedicado ao “cálculo do 
 valor do solo para outros fins”) ou uma subespécie do solo apto para a 
 construção (como resulta da sua inserção sistemática actual). Instituindo um 
 tertium genus, a que corresponderá indemnização mais elevada do que se tratasse 
 apenas de terreno agrícola, mas menos elevada que a devida aos terrenos com 
 actual capacidade edificativa, a previsão do artigo 26.º, n.º 12, do Código das 
 Expropriações de 1999, alargada às situações de superveniente integração na RAN 
 de prédios à partida aptos para a construção, representa uma solução que se 
 reputa adequada à salvaguarda do direito à justa indemnização dos expropriados, 
 com respeito pelo princípio da igualdade.
 
  
 
                                     3. Decisão
 
                                     Em face do exposto, acordam em:
 
                                     a) Julgar inconstitucional, por violação do 
 artigo 13.º da Constituição da República Portuguesa, a interpretação dos 
 artigos 23.º, n.º 1, 25.º, n.ºs 2 e 3, 26.º, n.º 12, e 27.º do Código das 
 Expropriações, aprovado pela Lei n.º 168/99, de 18 de Setembro, acolhida no 
 acórdão recorrido, segundo a qual o valor da indemnização devida pela 
 expropriação, para construção de um terminal ferroviário, de um terreno, que 
 objectivamente preenche os requisitos elencados no n.º 2 do artigo 25.º para a 
 qualificação como “solo apto para a construção”, mas que foi integrado na 
 Reserva Agrícola Nacional por instrumento de gestão territorial em data 
 posterior à sua aquisição pelos expropriados, deve ser calculado de acordo com 
 os critérios definidos no artigo 27.º para os “solos para outros fins”, e não 
 de acordo com o critério definido no n.º 12 do artigo 26.º, todos do referido 
 Código; e, em consequência,
 
                                     b) Conceder provimento ao recurso, 
 determinando a reformulação da decisão recorrida em conformidade com o 
 precedente juízo de inconstitucionalidade.
 
                                     Sem custas.
 Lisboa, 25 de Setembro de 2007.
 Mário José de Araújo Torres
 Benjamim Silva Rodrigues
 Joaquim de Sousa Ribeiro
 João Cura Mariano (Com declaração de voto que junto)
 Rui Manuel Moura Ramos
 
  
 
  
 
  
 DELARAÇÃO DE VOTO
 
  
 
                                     Votei favoravelmente a decisão de 
 inconstitucionalidade apenas por entender que o cálculo da indemnização, 
 efectuado de acordo com os critérios definidos no artigo 27.º do Código das 
 Expropriações para os “solos aptos para outros fins” e não de acordo com os 
 critérios definidos para os “solos aptos para a construção”, violava o direito a 
 uma justa indemnização, consagrado no artigo 62.º, n.º 2, da CRP, uma vez que a 
 expropriação em causa visava a construção de um terminal ferroviário, o que 
 resulta num reconhecimento implícito de que os terrenos expropriados têm aptidão 
 edificativa.
 
  
 
                                     João Cura Mariano