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Processo n.º 277/08 
 
 1ª Secção
 Relator: Conselheiro Carlos Pamplona de Oliveira
 
  
 ACORDAM NO TRIBUNAL CONSTITUCIONAL
 
  
 
  
 I.  Relatório
 
  
 
 1.  Por sentença de 7 de Janeiro de 2008, o Tribunal Administrativo e Fiscal de 
 Sintra julgou totalmente procedente a impugnação judicial deduzida por A., S.A. 
 contra o acto de liquidação da taxa de regulação e supervisão efectuada pela 
 Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC), relativa ao ano de 2006, 
 por considerar que a referida taxa prevista na alínea a) do n.º 3, do artigo 3.º 
 e artigo 4.º do Regime de Taxas da ERC (Anexo I do Decreto-Lei n.º103/06, de 7 
 de Junho) é inconstitucional por violação do disposto no artigo 103.º, n.ºs 2 e 
 
 3, e alínea i) do n.º 1 do artigo 165.º da Constituição.
 Diz-se na sentença, para o que agora releva, o seguinte:
 
 “ [...]
 
 É hoje em dia pacificamente aceite pela doutrina e jurisprudência mais abalizada 
 que a circunstância do legislador ter qualificado determinada figura jurídica 
 como taxa não é relevante, devendo antes verificar se substancialmente ele se 
 reconduz a essa figura, se se trata de um imposto, ou como defendem certos 
 autores como um “tertius genus”. 
 Ora, dificilmente se poderá considerar o tributo em causa como uma taxa atento a 
 falta de uma contrapartida específica e individualizada em relação ao seu 
 sujeito passivo e em concreto, na pessoa do respectivo operador da área de 
 comunicação social sua beneficiária. A questão então põe-se na possibilidade, 
 ainda assim, de considerar as mesmas como uma contribuição financeira a favor de 
 entidade pública genericamente admitida pelo art. 165.º, n.º 1, alínea i), da 
 CRP.- Cfr. nesse sentido parecer do Prof. Gomes Canotilho junto aos autos pela 
 F.P. Não descurando essa possibilidade legal, o que releva nessa sede é, no 
 entender deste tribunal, o de saber se, ainda assim, estará a mesma estritamente 
 subordinada ao princípio da legalidade fiscal (no sentido da exigência de lei em 
 sentido formal), ou ao invés, só se encontra sujeita àquela reserva da lei 
 quanto ao seu regime geral — cfr referida alínea i), do n.º 1, do art. 165.º da 
 C.R.P. Entende aquele ilte jurisconsulto que aquela regulação de um regime 
 especifico de tal contribuição pode ser criado por diploma governamental, desde 
 que observados os condicionalismos da lei-quadro competente, como foi o presente 
 caso — cfr ponto 2 do probatório. Se entendermos, ao invés, que aquele tributo 
 ainda se encontra submetido àquela reserva de lei, ainda que mitigada com a 
 possibilidade de concessão de uma autorização legislativa, no caso presente 
 ter-se-ia de considerar aquela taxa como padecendo de inconstitucionalidade 
 formal por falta de autorização legislativa do governo para o efeito. Em tese 
 pode-se afirmar que, embora prevista na Lei-Quadro que criou a ERC (cfr art. 
 
 51º, da Lei nº 53/05,de 08.11.), as taxas a cobrar junto das entidades que 
 prosseguem actividades sujeitas à supervisão e intervenção do conselho regulador 
 definidas no art. 6º, do respectivo estatuto e nas matérias que não se traduzam 
 em taxas específicas por serviços prestados ou por emissão de títulos 
 habilitadores, igualmente previstos naquela lei-quadro, ainda que se refiram a 
 uma contribuição financeira em favor de outras entidades públicas, se hão-de 
 submeter àquele princípio de reserva de competência parlamentar quanto à 
 determinação da sua taxa e da sua incidência, bem como dos respectivos 
 benefícios fiscais e das garantias dos contribuintes – cfr nesse sentido, Profs. 
 Jorge Miranda e Rui Medeiros, in “C.R.P. Anotada”, Tomo II, 2006, Coimbra 
 Editora, págs. 536. Em conclusão pode-se afirmar que também nas assim 
 designadas, receitas parafiscais, se impõe o princípio da legalidade tributária 
 em termos idênticos ao dos impostos, atento para mais à primazia, em matéria 
 tributária, do principio constitucional da segurança jurídica o qual se impôs 
 igualmente no âmbito do princípio da legalidade tributária, o que não obsta a 
 que tais contribuições se venham a enquadrar num regime geral, cuja definição 
 legal cabe à Assembleia da República, de acordo com o objectivo expresso da 
 revisão constitucional de 1997 de aumentar os poderes parlamentares nessas 
 matérias, o qual teve o seu acolhimento na referida alínea i), do nº 1, do art. 
 
 165.º da C.R.P., que veio tornar premente a definição de um regime geral que 
 tenha em conta outros princípios constitucionais como o da capacidade 
 contributiva, cuja falta também configura uma inconstitucionalidade por omissão, 
 nas palavras daqueles iltes Professores, legitimando a recusa do seu pagamento 
 em relação àquelas que foram criadas depois daquela revisão constitucional – 
 cfr, obra citada, págs 218. E enquanto não forem objecto de regulação nos termos 
 aí previstos, acrescentamos nós, não é legítimo a sua determinação e incidência, 
 fora dos quadros específicos aplicáveis aos impostos, por força do referido 
 princípio de segurança jurídica. Nos termos expostos, julga-se a taxa 
 controvertida, prevista na alínea a), do nº 3, do art. 3.º e artº 4.º, do Regime 
 de Taxas da ERC, inconstitucional por violação do disposto no artºs 103º, nº 2 e 
 
 3 e alínea i), do nº 1, do art. 165.º da C.R.P. 
 
 [...]”
 
  
 Desta sentença recorreu o Ministério Público, ao abrigo da alínea a) do n.º 1 do 
 artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional, por ter sido recusada a aplicação 
 das normas constantes da alínea a) do n.º 3 do artigo 3.º e artigo 4.º do Regime 
 de Taxas da ERC, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 103/2006, de 7 de Junho.
 
  
 Também a ERC recorreu ao abrigo do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 70.º 
 da Lei do Tribunal Constitucional, pretendendo submeter à apreciação do Tribunal 
 Constitucional as normas dos artigos 3.º, n.º 3, alínea a), e 4.º do aludido 
 Regime de Taxas, desaplicadas pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra 
 com fundamento em inconstitucionalidade.
 
  
 Os recursos foram admitidos.
 O Ministério Público apresentou alegação e concluiu: 
 
 “1.º
 A parte final da alínea i) do nº 1, do artigo 165º da Constituição da República 
 Portuguesa prevê a existência de uma terceira categoria tributária, ao lado das 
 taxas “stricto sensu” e dos impostos, permitindo incluir nas contribuições 
 financeiras a favor de entidades públicas as “taxas colectivas” que funcionam 
 como contrapartida do serviço prestado — embora em termos não estritamente 
 individualizáveis — por uma entidade pública a favor de um círculo ou categoria 
 de pessoas, que beneficiam colectivamente da actividade daquela. 
 
 2º
 A taxa de regulação e supervisão, criada e regulada pelos artigos 50º, alínea 
 b), e 51.º dos Estatutos Anexos à Lei nº 53/05, de 08/11, e pelos artigos 3º, nº 
 
 3, alínea a), e 4.º do Regime de Taxas, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 103/06, de 
 
 7 de Junho, insere-se na figura dos referidas “taxas colectivas”, estando 
 consequentemente sujeita a reserva de lei parlamentar apenas quanto ao 
 respectivo “regime geral”. 
 
 3º
 Os traços fundamentais de tal taxa resultam, em termos bastantes, da Lei nº 
 
 53/05, suportando o respectivo desenvolvimento em diploma editado pelo Governo, 
 no exercício da sua competência legislativa própria. 
 
 4.º
 Termos em que deverá proceder o presente recurso.” 
 
  
 A recorrente ERC apresentou alegação, enunciando as seguintes conclusões: 
 
 “A. A decisão recorrida não pode manter-se na nossa ordem jurídica porquanto – 
 contrário do que concluiu sumariamente o tribunal a quo — a taxa de regulação e 
 supervisão constitui uma verdadeira taxa, criada de acordo com as regras 
 constitucionais e no estrito e rigoroso cumprimento da lei, designadamente do 
 disposto na Lei n.º 53/2005, de 8 de Novembro, no D.L. n.º 103/2006 e na 
 Portaria n.º 653/2006, de 29 de Junho. 
 B. Em cumprimento do preceituado no artigo 39.º da CRP, incumbe à ERC a tarefa 
 de proceder à regulação do sector da comunicação social o que, naturalmente, 
 exige uma intervenção dituturna em garantia do pluralismo, da liberdade de 
 expressão dos cidadãos e da liberdade de imprensa dos meios de comunicação 
 social, do equilíbrio entre valores contrapostos e entre os interesses do 
 mercado e as finalidades do serviço público ou as exigências da actuação na 
 esfera pública. 
 C. A distinção entre as figuras da taxa e do imposto tem sido objecto de 
 abundante jurisprudência do Tribunal Constitucional e assenta, em síntese, nos 
 critérios estruturais da bilateralidade e da proporcionalidade a que a taxa de 
 regulação e supervisão dá integral cumprimento. 
 D. A letra do artigo 4.º do D.L. n.º 103/ 2006 é, por si só, elucidativa quanto 
 
 à existência de uma contraprestação e quanto à respectiva natureza: mediante o 
 pagamento da taxa de regulação e supervisão, os operadores beneficiam de um 
 serviço público que se consubstancia na regulação e supervisão do sector onde se 
 insere, i.e., na monitorização e acompanhamento contínuo e regular, que assegura 
 aos regulados — como a ora recorrida — a conservação das condições 
 institucionais de pluralismo, liberdade de expressão e até de concorrência, 
 indispensáveis ao cumprimento das garantias constitucionais em sede de liberdade 
 de imprensa ou comunicação social. 
 E. Concretamente, a recorrida beneficiou desta contraprestação por parte da ERC. 
 
 
 F. No que se reporta ao critério da proporcionalidade, não subsistem quaisquer 
 dúvidas que a relação entre o valor a pagar a título de taxa e o serviço 
 concretamente prestado pela ERC se orienta por uma pauta de estrita 
 proporcionalidade, ou que — delimitando o critério pela negativa como se faz na 
 jurisprudência prolatada pelo Tribunal Constitucional — não se verifica, in 
 casu, uma «desproporção manifesta ou flagrante» entre o custo do serviço e a sua 
 utilidade para os meios de comunicação social 
 G. Com efeito, o cálculo da taxa de regulação e supervisão é efectuado por 
 reporte a um escrupuloso catálogo de categorias de meios de comunicação social e 
 subcategorias de acordo com a diferente intensidade das actividades de regulação 
 e supervisão postuladas em cada situação, o que implica que pagará mais, a 
 título de taxa, quem obriga a ERC a uma actividade mais intensa de regulação e 
 supervisão. 
 H. Para mais, o facto de o legislador ter estabelecido uma taxa anual para a 
 remuneração global dos serviços de regulação e supervisão em nada belisca a 
 natureza de taxa do tributo em apreço nos presentes autos, nem tão-pouco o 
 transmuta num «imposto de repartição», pois nada impede que se opte por um 
 modelo de pagamento global de um conjunto de serviços em detrimento de uma 
 quantificação casuística do valor a pagar. 
 I. Todavia, ainda que não entendesse que a taxa de regulação e supervisão se 
 consubstancia numa verdadeira taxa — hipótese levantada à cautela por mero dever 
 de patrocínio — a receita em causa apenas poderia ser incluída na terceira 
 categoria tributária prevista na CRP: «contribuições financeiras a favor de 
 entidades públicas» (cf. al. i) do n.º 1 do art. 165.º da CRP), categoria esta 
 que tem agora na Constituição um tratamento em tudo igual e paralelo ao que é 
 dado pela Lei Fundamental às taxas. 
 J. Na verdade, com a consagração deste terceiro tipo de tributos, o legislador 
 constitucional veio assim dar cobertura ao conceito de parafiscalidade, 
 admitindo a existência de figuras híbridas que partilham a natureza dos impostos 
 e, ao mesmo tempo, a natureza das taxas, facto que resulta logo da leitura dos 
 trabalhos preparatórios da revisão constitucional de 1997 quanto ao tratamento e 
 natureza que o legislador constitucional pretendeu atribuir às chamadas 
 contribuições financeiras. 
 K. É, de resto, opinião de Cardoso da Costa, Comes Canotilho e Vital Moreira, 
 que a configuração e o regime das contribuições financeiras poderá ser efectuado 
 por diploma governamental e regulado por via regulamentar, desde que observados 
 os condicionalismos da lei-quadro competente, circunstância que, naturalmente, 
 garantiria, em qualquer caso, a conformidade constitucional da taxa de regulação 
 e supervisão. 
 L. Acrescente-se ainda que esta inovação constitucional de 1997 veio, aliás, 
 corroborar uma corrente jurisprudencial do próprio Tribunal Constitucional que, 
 de há muito e sob formas variadas, reconhecia a plena legitimidade de um tertium 
 genus o qual, não configurando uma taxa em sentido estritamente técnico, também 
 repelia a aplicação do regime mais gravoso e exigente dos impostos. 
 M. De nada vale brandir o argumento de que uma tal qualificação só colheria se 
 já houvesse uma lei parlamentar que definisse o regime geral das ditas 
 contribuições financeiras, porquanto a verdade é que inexiste também uma lei 
 definidora do regime geral das taxas e isso não impede — nem nunca impediu — a 
 sua legítima criação por decreto-lei ou por outro instrumento normativo. 
 N. O argumento à luz do qual a impostação de que a lei de autorização apenas 
 previa uma taxa e já não uma contribuição financeira carece em absoluto de 
 sentido uma vez que, do ponto de vista constitucional, tais figuras estão 
 rigorosamente equiparadas, ao que acresce que actualmente, em face da 
 inexistência de leis parlamentares que recortem o regime geral de cada uma 
 delas, essa equiparação é, ao nível da Constituição, integral. 
 Termos em que o presente recurso deverá ser julgado procedente, revogando-se a 
 decisão recorrida que julgou a impugnação procedente, com todas as consequências 
 legais. 
 
 […]”
 
  
 Também a recorrida A.  apresentou a alegação, cumprindo agora decidir.
 
  
 II.  Fundamentação
 
  
 
 2.  O presente recurso, interposto ao abrigo da alínea a) do n.º 1 do artigo 70º 
 da Lei de Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional, tem 
 por objecto a apreciação da conformidade constitucional das normas constantes 
 dos artigos 3º n.º 3 alínea a), e 4º do Anexo I ao Decreto-Lei n.º 103/06 de 7 
 de Junho, que definem o regime da taxa de regulação e supervisão devida à 
 Entidade Reguladora para a Comunicação Social, e que o Tribunal Administrativo e 
 Fiscal de Sintra considerou inconstitucionais, por violação do disposto no 
 artigos 103.º nº 2 e 3 e alínea i) do nº 1 do art. 165.º da Constituição.
 A questão de constitucionalidade que constitui o objecto do presente recurso já 
 foi apreciada pelo Tribunal nos Acórdãos n.º s 365/08 de 2 de Julho e 613/08 de 
 
 10 de Dezembro (juízo depois reiterado nas Decisões Sumárias n.ºs 66/2009 e 
 
 87/2009) todos disponíveis para consulta em www.tribunalconstitucional.pt, tendo 
 sido claramente adoptado um juízo de não inconstitucionalidade de tais normas.
 Pode ler-se no Acórdão n.º 613/08 o seguinte:
 
 “ [...]
 
 6. Ora, o grau de autonomia financeira não pode deixar de se afigurar como um 
 dos critérios decisivos na aferição da efectiva independência de uma entidade 
 administrativa não sujeita a qualquer tipo de poderes de controlo por parte do 
 Governo. O regime de financiamento instituído pelo Decreto-Lei n.º 103/2006, de 
 
 07 de Junho, traduz pois a própria natureza mista da ERC – Entidade Reguladora 
 para a Comunicação Social.
 Na medida em que todos os membros da comunidade residente em território nacional 
 são beneficiários directos da actividade administrativa da ERC, enquanto pessoa 
 colectiva pública especialmente vocacionada para a protecção dos direitos, 
 liberdades e garantias nos meios de comunicação social, é a própria lei [cfr. 
 alínea a) do artigo 50º dos Estatutos da ERC, aprovados pela Lei n.º 53/2005, de 
 
 8 de Novembro] que determina que uma parte substancial do orçamento próprio 
 daquela entidade seja assegurada mediante verbas a transferir do Orçamento de 
 Estado, de cada ano, ou ainda mediante a participação nas taxas de utilização do 
 espectro radioeléctrico pagas ao ICP-ANACOM, a título de remuneração por 
 utilização de um bem do domínio público [cfr. alínea a) do artigo 50º dos 
 Estatutos da ERC, aprovados pela Lei n.º 53/2005, de 8 de Novembro]. Como é 
 evidente, ao contrário do que sucede com outras entidades administrativas 
 reguladoras, não seria expectável – ou sequer compatível com o princípio da 
 proporcionalidade – que os regulados pela ERC fossem exclusivamente onerados com 
 os custos financeiros (“excessive burden”) da sua actuação. Pelo contrário, no 
 caso da ERC, a actividade administrativa desempenhada vai muito para além de uma 
 clássica função de mera regulação e supervisão económica do mercado da 
 comunicação social, pelo que sempre será exigível que toda a comunidade 
 contribua, através dos impostos liquidados por cada contribuinte, para suprir os 
 custos financeiros da actividade daquela entidade administrativa independente.
 Mas, para além de assumir a sua função de entidade administrativa de defesa dos 
 direitos e liberdades fundamentais, a ERC actua igualmente enquanto entidade 
 encarregue da regulação e da supervisão do sector económico da comunicação 
 social. Como tal, outra parcela significativa do orçamento próprio da ERC não 
 pode deixar de ser sustentada por taxas (e outras contribuições financeiras) a 
 cobrar junto das entidades que prosseguem actividades de comunicação social e, 
 como tal, se encontram sujeitas à actividade reguladora daquela entidade 
 administrativa independente. Na medida em que a actividade da ERC também visa 
 assegurar a promoção de um mercado mais eficiente, transparente e de sã 
 concorrência, torna-se inevitável que os próprios regulados participem nos 
 custos financeiros daquela actividade.
 Resta assim verificar se, tal como entendido pela decisão recorrida, a 
 participação dos regulados não pode ser feita mediante pagamento de uma “taxa de 
 regulação e supervisão”, na medida em que as normas constantes dos artigos 3º, 
 n.º 3, alínea a), e 4º do Anexo I que consagra o Regime de Taxas da ERC – 
 Entidade Reguladora para a Comunicação Social, aprovado Decreto-Lei n.º 
 
 103/2006, de 7 de Junho, são inconstitucionais, por violação do artigo 103º, nºs 
 
 2 e 3, e da alínea i) do n.º 1 do artigo 165º da Constituição da República 
 Portuguesa.
 
 7. Antes de avançar, importa transcrever os preceitos legais em apreciação:
 
 “Artigo 3.º
 
 (Natureza e espécies de taxas da ERC - Entidade Reguladora para a Comunicação 
 Social)
 
 (…)
 
 3 - As taxas da ERC - Entidade Reguladora para a Comunicação Social integram-se 
 nas seguintes categorias: 
 a) Taxa de regulação e supervisão;
 
 (…)
 Artigo 4.º
 
 (Taxa de regulação e supervisão)
 
 1 - Ao abrigo da alínea b) do artigo 50.º e do n.º 1 do artigo 51.º dos 
 Estatutos da ERC - Entidade Reguladora para a Comunicação Social, aprovados pela 
 Lei n.º 53/2005, de 8 de Novembro, a taxa de regulação e supervisão visa 
 remunerar os custos específicos incorridos pela ERC - Entidade Reguladora para a 
 Comunicação Social no exercício da sua actividade da regulação e supervisão 
 contínua e prudencial. 
 
 2 - Estão sujeitas à taxa de regulação e supervisão todas as entidades que 
 prossigam, sob jurisdição do Estado Português, actividades de comunicação 
 social, sendo o quantitativo da taxa calculado em conformidade com a categoria 
 em que se inserem e com a subcategoria de intensidade reguladora necessária. 
 Ora, a decisão recorrida afirmou que:
 
 “Dificilmente se poderá considerar o tributo em causa como uma taxa atent[a] a 
 falta de uma contrapartida específica e individualizada em relação ao seu 
 sujeito passivo e em concreto, na pessoa do respectivo operador da área da 
 comunicação social sua beneficiária. Efectivamente, aquela não tem por 
 fundamento a prestação concreta de um serviço público, antes visam assegurar os 
 interesses públicos postos a seu cargo pelo Estado, não se concretizando numa 
 utilização individualizada pelo sujeito passivo de bens públicos ou 
 semi-públicos, com contrapartida numa actividade do credor especialmente 
 dirigida ao mesmo.” (fls. 189 a 190).
 Tal concepção de “taxa”, exclusivamente ancorada na verificação de uma 
 contrapartida expressa através da prestação de um serviço público, aparenta 
 desconsiderar que o n.º 2 do artigo 4º da Lei Geral Tributária configura como 
 taxa não só aqueles tributos que visam retribuir a prestação de um serviço 
 público, mas também a utilização de um bem do domínio público ou a remoção de um 
 obstáculo jurídico ao comportamento dos particulares. Porém, não cabe, neste 
 momento, aprofundar um juízo sobre a qualificação jurídico-tributária a atribuir 
 
 à “taxa de regulação e supervisão”, prevista artigos 3º, n.º 3, alínea a) e 4º 
 do Anexo I relativo ao Regime de Taxas da ERC – Entidade Reguladora para a 
 Comunicação Social, aprovado Decreto-Lei n.º 103/2006, de 7 de Junho.
 Independentemente de tal qualificação ser susceptível de controvérsia – tendo, 
 aliás, sido colocada em causa pela recorrente ERC, em sede de alegações –, não 
 cabe, nos presentes autos, desenvolver este tema. É que, por força do artigo 
 
 79º-C da LTC, o Tribunal Constitucional apenas pode apreciar a 
 constitucionalidade de normas que tenham sido efectivamente desaplicadas pelos 
 tribunais recorridos. Ora, neste caso concreto, a decisão recorrida apenas 
 desaplicou as normas constantes dos referidos artigos 3º, n.º 3, alínea a) e 4º, 
 quando interpretadas no sentido de que a referida “taxa de regulação e 
 supervisão” se reconduz a uma “contribuição financeira” a favor de uma entidade 
 pública e não a uma “taxa”.
 Procede-se, então, ao conhecimento da questão de inconstitucionalidade suscitada 
 pela desaplicação normativa adoptada pela decisão recorrida.
 
 8. Qualquer que seja a terminologia adoptada pelo Decreto-Lei n.º 103/2006, ou a 
 conclusão a que se chegue acerca da discussão sobre a natureza de “taxa” – em 
 função da sua maior ou menor sinalagmaticidade –, importa notar que a actual 
 redacção da alínea i) do n.º 1 do artigo 165º da CRP, após a revisão 
 constitucional de 1997, distingue claramente “impostos”, de uma parte, de 
 
 “taxas” e “demais contribuições financeiras a favor das entidades públicas”, de 
 outra parte (para um maior desenvolvimento, veja-se o Acórdão n.º 365/2008, 
 disponível in www.tribunalconstitucional.pt).
 Se quanto aos “impostos”, é fixada uma reserva de competência legislativa 
 parlamentar quanto à respectiva criação, já quanto às “contribuições financeiras 
 a favor das entidades públicas” apenas é exigível a fixação parlamentar do 
 respectivo regime geral, aproximando-as, a final, do regime aplicável às 
 
 “taxas”.
 
 9. Ora, como já notado por este Tribunal (cfr. Acórdão n.º 365/2008, disponível 
 in www.tribunalconstitucional.pt), na falta de um regime geral fixado por lei 
 parlamentar, deve dar-se por suficientemente protector da reserva de lei 
 parlamentar o preceituado na própria lei de valor reforçado que criou a ERC – 
 Entidade Reguladora para a Comunicação Social. É que o legislador parlamentar, 
 através do n.º 1 do artigo 51º dos Estatutos da ERC, aprovados pela Lei n.º 
 
 53/2005, de 8 de Novembro, não se limitou a remeter para o legislador 
 governamental a fixação das taxas (e demais contribuições financeiras – 
 acrescenta o Tribunal) devidas àquela “entidade administrativa independente”.
 A criação de taxas e demais contribuições financeiras, para efeitos de inclusão 
 nas receitas da ERC, consta expressamente da alínea b) do artigo 50º dos 
 Estatutos da ERC, aprovados pela Lei n.º 53/2005, de 8 de Novembro. Sucedeu 
 apenas que, nos termos do já referido n.º 1 do artigo 51º do mesmo diploma, se 
 remeteu para decreto-lei do Governo a determinação de: i) critérios de 
 incidência; ii) requisitos de isenção; iii) valor das taxas. Daqui decorre que 
 foi a Assembleia da República quem, mediante lei de valor reforçado [cfr. n.º 3 
 do artigo 112º e alínea a) do n.º 6 do artigo 168º, ambos da CRP] criou 
 expressamente as taxas e demais contribuições financeiras a suportar pelas 
 entidades sujeitas à regulação e supervisão da ERC, remetendo para decreto-lei a 
 sua concretização.
 Mas, ainda mais relevante, o próprio legislador parlamentar não se furtou a 
 fixar estritos limites de conteúdo ao diploma legal regulamentador das taxas e 
 demais contribuições financeiras. Pelo contrário, o legislador parlamentar fixa 
 os princípios fundamentais a respeitar pela legislação densificadora, a saber:
 a) Critérios para fixação das taxas (e demais contribuições financeiras), de 
 acordo com princípios de objectividade, transparência e proporcionalidade – cfr. 
 n.º 2 do artigo 51º dos Estatutos da ERC, aprovados pela Lei n.º 53/2005, de 08 
 de Novembro;
 b) Delimitação dos sujeitos passivos das taxas (e demais contribuições 
 financeiras) – cfr. n.º 4 do artigo 51º dos Estatutos da ERC, aprovados pela Lei 
 n.º 53/2005, de 08 de Novembro;
 c) Tendencial sinalagmaticidade entre a actividade de regulação gerada pelo 
 sujeito passivo e o montante da taxa (e demais contribuições financeiras) a 
 suportar – cfr. n.º 4 do artigo 51º dos Estatutos da ERC, aprovados pela Lei n.º 
 
 53/2005, de 08 de Novembro;
 d) Periodicidade da liquidação e pagamento das taxas (e demais contribuições 
 financeiras) – cfr. n.º 5 do artigo 51º dos Estatutos da ERC, aprovados pela Lei 
 n.º 53/2005, de 08 de Novembro.
 Em suma, da análise da concreta configuração da lei de valor reforçado que criou 
 a ERC – Entidade Reguladora para a Comunicação Social, resulta que deve dar-se 
 por preenchida a exigência de previsão parlamentar de um regime geral das 
 contribuições financeiras, sendo que – neste caso concreto – a definição 
 parlamentar dos princípios gerais aplicáveis ao regime de taxas e demais 
 contribuições financeiras se apresenta até mais pormenorizado do que seria 
 exigível a um regime geral fixado por lei parlamentar (neste sentido 
 pronunciou-se este Tribunal, no já citado Acórdão n.º 365/2008, disponível in 
 
 www.tribunalconstitucional.pt).
 Assim, independentemente da discussão sobre a natureza jurídico-tributária da 
 
 “taxa de regulação e supervisão”, e apreciando exclusivamente a interpretação 
 normativa desaplicada pela decisão recorrida, que considerou que aquela 
 integraria a categoria de “contribuição financeira devida a entidade pública”, 
 conclui-se que as normas extraídas dos artigos 3º, n.º 3, alínea a) e 4º do 
 Anexo I que consagra o Regime de Taxas da ERC – Entidade Reguladora para a 
 Comunicação Social, aprovado Decreto-Lei n.º 103/2006, de 7 de Junho, não são 
 inconstitucionais, pois não violaram os nºs 2 e 3 do artigo 103º e da alínea i) 
 do n.º 1 do artigo 165º da Constituição da República Portuguesa, nem se 
 vislumbram outros fundamentos de inconstitucionalidade, pelo que deve ser 
 concedido provimento aos recursos interpostos, com a necessária reforma da 
 decisão recorrida, nos termos do n.º 2 do artigo 80º da LTC.
 
  […]”
 
  
 Não havendo razões para divergir da solução adoptada pelo Tribunal, é a esta 
 jurisprudência que se adere, concluindo-se também no sentido da não 
 inconstitucionalidade das normas que constituem o objecto do presente recurso.
 
  
 
  
 
  
 III.   Decisão
 
  
 
 3.  Nestes termos, e pelos fundamentos expostos, o Tribunal Constitucional julga 
 procedentes os recursos e, em consequência, decide: 
 a) Não julgar inconstitucionais as normas extraídas dos artigos 3º n.º 3 alínea 
 a) e 4º do Anexo I que consagra o Regime de Taxas da ERC – Entidade Reguladora 
 para a Comunicação Social, aprovado Decreto-Lei n.º 103/2006 de 7 de Junho; 
 b) Determinar a reformulação da decisão recorrida em conformidade com o 
 precedente juízo de constitucionalidade.
 Sem custas. 
 
  
 Lisboa, 26 de Maio de 2009
 Carlos Pamplona de Oliveira
 Gil Galvão
 José Borges Soeiro
 Maria João Antunes
 Rui Manuel Moura Ramos