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Processo n.º 834/07
 
 2.ª Secção
 Relator: Conselheiro Benjamim Rodrigues
 
  
 
             Acordam, em conferência, na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional:
 
  
 A – Relatório
 
  
 
             1 – A. reclama para a conferência, ao abrigo do disposto no n.º 3 do 
 art.º 78.º-A da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, na sua actual versão, da 
 decisão do relator, no Tribunal Constitucional, que decidiu não conhecer do 
 recurso de constitucionalidade interposto da decisão do Presidente da Relação do 
 Porto, de 10 de Março de 2007, que lhe indeferiu a reclamação deduzida de 
 decisão da 1.ª instância, de não admissão de recurso interposto para o Tribunal 
 da Relação.
 
  
 
             2 – Fundamentando a sua reclamação, o reclamante expendeu um longo 
 discurso que acabou por sintetizar nas seguintes proposições conclusivas:
 
  
 
 «1ª    O aqui reclamante vê o seu recurso no conhecido pela decisão sumária por 
 no entender desta o art. 456º do C.P.C. nunca haver sido pronunciado 
 inconstitucional pelo TC e por a instância recorrida da Presidência da Relação 
 do Porto no ter aplicado as normas arguidas de inconstitucionalidades nos seus 
 fundamentos e por o Tribunal Constitucional só poder reapreciar o juízo de 
 inconstitucionalidade que fosse feito na instância recorrida da Presidência da 
 Relação do Porto 
 
  
 
 2ª      Tal como bem escreve a decisão sumária aqui em reclamação “impõe-se que 
 seja sujeita ao seu (do TC) escrutínio decisão dos tribunais que haja concluído 
 em sentido oposto (do TC)” 
 
  
 
 3ª      Nas suas alegações para o Tribunal de Comarca (Pequena Instância do 
 Porto) o aqui reclamante invocou a protecção da confidencialidade das suas 
 missivas assim mencionadas nos termos do art. 126º nº 3 do CPP para obstar a que 
 as mesmas fossem violadas a pretexto de simples prova. Como resposta a essas 
 alegações a Pequena Instância Cível do Porto referiu que se fosse dada protecção 
 confidencialidade das missivas teríamos descoberto a forma de praticar por esse 
 meio crimes impunemente. 
 
  
 
 4ª      Perante esse tribunal de comarca e dentro de reclamação contra a não 
 admissão de recursos, o aqui reclamante ao abrigo da alínea g) do nº 1 do art. 
 
 70º da LTC arguiu a inconstitucionalidade do art. 126º nº 3 do CPP assim 
 interpretado, tal como já fora julgado inconstitucional no Acórdão nº 607/2003 
 do TC. 
 
  
 
 5ª      Foi aplicado pelo mesmo tribunal de comarca o art. 456º do CPC com o 
 sentido de punir o aqui reclamante em litigância de má fé por este advogado de 
 profissão haver praticado infracção disciplinar de cobrar honorários a 
 constituintes oficiosos. 
 
  
 
 6ª      Inconformado o aqui reclamante, advogado de profissão, com tal 
 condenação em litigância de má fé, por desvio de poder disciplinar a cargo da 
 recorrida Ordem dos Advogados e jurisdição administrativa e por ser 
 documentalmente falso que houvesse constituição oficiosa deferida pela 
 autoridade competente, havendo até pelos autos indeferimento transitado desse 
 pedido de constituição oficiosa, arguiu a inconstitucionalidade dessa norma do 
 art. 456º do CPC assim interpretada por infringir a presunção de inocência 
 constitucionalmente consagrada. 
 
  
 
 7ª      A inconstitucionalidade desta norma foi arguida no texto da reclamação 
 apresentada perante o mesmo tribunal de comarca que deu despacho de manter tudo 
 quanto fora decidido, subindo e mesma reclamação para a Presidência da Relação 
 do Porto que não admitiu os recursos em questão, deixando em claro que “se, 
 eventualmente, há ofensa da CRP perante o TC que se devera reagir” 
 
  
 
 8ª      A decisão sumária ao não conhecer o recurso por a Presidência da Relação 
 do Porto não ter examinado as inconstitucionalidades cria um paradoxo processual 
 em prejuízo do aqui reclamante que não pode ser prejudicado por as instâncias 
 jurisdicionais não se entenderem quanto ao conhecimento das 
 inconstitucionalidades arguidas, dizendo o PR que deve ser o TC a conhecer e 
 este que não conhece por o PR no ter conhecido. 
 
  
 
 9ª      Em jurisprudência constitucional menos formalista extrai-se o princípio 
 de que nunca pode ser prejudicado o recorrente por o tribunal “a quo” não ter 
 conhecido das inconstitucionalidades suscitadas devendo mesmo assim o TC 
 dar-lhes conhecimento com o sentido de que o não conhecimento prévio equivale ao 
 indeferimento, e.g. Ac. TC publicado na pág. 4291 do DR II série de 24/03/1999”. 
 
 
 
  
 
 10ª    Foi diametralmente diferente o tratamento formal dado no 
 acórdão-fundamento nº 607/2003, porquanto no tribunal “a quo” – Relação de 
 Lisboa – não foi examinada a inconstitucionalidade do art. 126º nº 3 do CPP, o 
 que não impediu o TC de conhecer esse recurso e de lhe dar provimento.
 
  
 
 11ª    Não foi suscitada, previamente, a inconstitucionalidade dessa norma no 
 tribunal “a quo” o que não impediu, também assim, a sua declaração de 
 inconstitucionalidade nesse Acórdão nº 607/2003.
 
  
 
 12ª    Esse tribunal “a quo”, a Relação de Lisboa, não aplica sequer a norma – 
 
 126º nº 3 CPP – que viria a ser declarada inconstitucional por entender que os 
 diários, matéria em causa, ao contrário das cartas-missivas confidenciais não 
 têm protecção legal proibitória no C.P.P. ou na Constituição.
 
  
 
 13ª    Tal não aplicação do art. 126º nº 3 C.P.P. na “ratio dedidendi” do 
 tribunal “a quo” foi incapaz de obstar ao conhecimento da sua 
 inconstitucionalidade, incompreendendo-se para o nosso caso em reclamação tanta 
 objecção formal ao seu conhecimento depois de a matéria em causa nos nossos 
 autos (cartas-missivas confidenciais) gozar de ampla e explícita protecção legal 
 e constitucional com a previsão dum processo de suprimento especial, “sine qua 
 non” para a sua valoração probatória contra o consentimento do confidente. 
 
  
 
 14ª    Não lembra a ninguém que diários com confidências pedófilas tenham 
 protecção constitucional superior a cartas-missivas confidenciais sem incidência 
 criminal, depois de a nossa Constituição vedar expressamente a ingerência de 
 autoridades públicas na confidencialidade de cartas – salvo por razões criminais 
 o que não é o caso dos presentes autos – mas não vedar de modo expresso como 
 refere a Relação de Lisboa no acórdão-fundamento nº 607/2003 a ingerência em 
 diários quanto mais em matéria criminal: vide art. 34º nº 4 da Constituição em 
 confronto com acórdão 607/2003 do TC proferido com um acolhimento formal 
 invertido ao que foi dado na decisão sumária em reclamação. 
 
  
 
 15ª    Pode a decisão sumária em reclamação ser alterada por lavrar em erro 
 manifesto quanto a norma arguida pelo recorrente nos termos da alínea g) que é o 
 art. 126º nº 3 C.P.C. e não o art. 456º C.P.C. como julga a decisão sumária. 
 
  
 
 16ª    Pode também ser conhecida ao abrigo da alínea b) a inconstitucionalidade 
 suscitada do art. 456º do C.P.C. se o tratamento formal da questão não for muito 
 invertido do que se fez no acórdão nº 607/2003, sendo inadmissível um Estado de 
 direito em Portugal se o TC se conformar com a forma como foi aplicado ao 
 cidadão aqui recorrente o art. 456º do C.P.C. em claro atropelo do princípio 
 basilar da presunção de inocência». 
 
  
 
             3 – Os recorridos não responderam.
 
  
 
             4 – A decisão ora reclamada tem o seguinte teor:
 
  
 
             «1 – A. recorre para o Tribunal Constitucional, ao abrigo do 
 disposto no art.º 70.º, n.º 1, alíneas b) e g) da Lei n.º 28/82, de 15 de 
 Novembro, na sua actual versão (LTC), da decisão do Presidente da Relação do 
 Porto, de 10 de Março de 2007, que lhe indeferiu a reclamação deduzida de 
 decisão da 1.ª instância, de não admissão de recurso interposto para o Tribunal 
 da Relação.
 
  
 
             2 – No seu requerimento de interposição do recurso de 
 constitucionalidade, o recorrente discorre do seguinte jeito:
 
  
 
             “a) Foi arguida no tribunal a quo a inconstitucionalidade do artigo 
 
 456.º do CPC, com a interpretação de um Tribunal Cível poder condenar um 
 advogado em litigância de má fé com fundamento em prática de alegada infracção 
 disciplinar sem existir qualquer decisão definitiva sobre o cometimento dessa 
 alegada infracção disciplinar proferida pela Ordem dos Advogados ou pela 
 jurisdição administrativa, em procedimento disciplinar previsto nos termos da 
 Lei, por infringir a presunção de inocência enunciada no n.º 2 e n.º 10 do 
 artigo 32.º da CRP e por infringir a parte final do n.º 1 do artigo 211.º da 
 CRP.
 
             O tribunal a quo não atendeu à reclamação de inconstitucionalidade 
 dessa norma pelo que a reclamação subiu para o Juiz ad quem, Presidente da 
 Relação do Porto, que a indeferiu.
 
             Este recurso relativamente a esta norma é ao abrigo do artigo 70.º, 
 n.º 1, alínea b), da LOTC.
 
  
 
             b) Foi arguida a inconstitucionalidade do artigo 678.º, n.º 2, do 
 CPC, com o sentido de poder ser indeferida a admissão da subida dum recurso, que 
 
 é interposto com fundamento em ofensa de caso julgado, por se entender que 
 inexiste qualquer ofensa de caso julgado cometida, infringindo o artigo 2.º e a 
 parte final do n.º 4 do artigo 20.º da CRP, no tribunal a quo que a não acolheu 
 pelo que a mesma subiu para o Juiz ad quem, Presidente da Relação do Porto, que 
 manteve a aplicação da referida norma arguida de inconstitucionalidade.
 
             Este recurso relativamente a esta norma é ao abrigo do artigo 70.º, 
 n.º 1 alínea b), da LOTC.
 
  
 
             c) Foi arguida a inconstitucionalidade do artigo 678.º, n.º 3, do 
 CPC, com o sentido de não poder ser admitido um recurso, que é interposto com 
 fundamento de que o valor da causa excede a alçada do tribunal de que se 
 recorre, entendendo-se que a apreciação feita sobre o valor em causa e que é 
 objecto de recurso, no Tribunal, não constitui uma decisão que admite recurso, 
 infringindo-se a regra dum processo equitativo determinada na parte final do n.º 
 
 4 do artigo 20.º da CRP e o n.º 1 do artigo 202.º da CRP.
 
             O Tribunal a quo não reconheceu a inconstitucionalidade da norma, 
 pelo que subiu a reclamação para o Juiz ad quem, Presidente da Relação do Porto, 
 que a indeferiu.
 
             Este recurso sobre a inconstitucionalidade desta norma é ao abrigo 
 da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LOTC.
 
  
 
             d) Por último, recorre-se para o Tribunal Constitucional, ao abrigo 
 da alínea g) do n.º 1 do artigo 70.º da LOTC (Lei Orgânica do Tribunal 
 Constitucional), da aplicação que foi feita no tribunal a quo de norma já 
 anteriormente declarada inconstitucional pelo Tribunal Constitucional.
 
             Na contra-alegação redigida pelo reclamante contra o recurso da aqui 
 reclamada para condenação daquele em litigância de má fé, evoca-se o artigo 
 
 126.º, n.º 3, do CPP como tutelando a nulidade da prova por violação da 
 confidencialidade de cartas, dando assim fundamento à pretensão do reclamante à 
 não violação da respectiva confidencialidade. Assim se pode ler na parte final 
 da conclusão 1.ª da contra-alegação e até na conclusão 7.ª da alegação do 
 recurso principal redigido pelo agora reclamante.
 
             Perante esta fundamentação da pretensão do aqui reclamante, o 
 tribunal a quo, Pequena Instância Cível do Porto, declara que «litigou de má fé 
 
 … deduzindo e insistindo em … pretensão cuja falta de fundamento não ignorava».
 
             Deste modo, o tribunal a quo considera que a falta de fundamento da 
 evocação do artigo 126.º do CPP é tanta para obstar à valoração de cartas 
 confidenciais como meio de prova que justifica a sua condenação em litigância de 
 má fé.
 
             Ao aplicar o artigo 126.º do CPP com o sentido de ser lícita a 
 valoração de cartas confidenciais como meio de prova para procedimento 
 disciplinar e de constituir litigância de má fé a sua evocação para o impedir, 
 esse despacho do tribunal a quo afronta grosseiramente o Acórdão n.º 607/2003 do 
 Tribunal Constitucional, que, por unanimidade, julga inconstitucional o artigo 
 
 126.º, n.º 3, do CPP, com o sentido de não ser ilícita a valoração como meio de 
 prova dos escritos confidenciais a que se refere a mesma norma para crimes na 
 ausência de uma ponderação, à luz dos princípios da necessidade e da 
 proporcionalidade, sobre o conteúdo, em concreto, desses escritos confidenciais, 
 por violar os artigos 1.º, 26.º, n.º 1, e 32.º, n.º 8, da CRP.
 
             Não estando em causa qualquer crime para a avaliação disciplinar e 
 muito menos um crime com a censurabilidade em causa no acórdão-fundamento do 
 Tribunal Constitucional, apenas uma alegada falta disciplinar, a forma como o 
 tribunal a quo despacha a avocação feita do artigo 126.º, n.º 3, do CPP, para 
 impedir a valoração de escritos confidenciais como meio de prova, está nos 
 antípodas desse acórdão de inconstitucionalidade, muito mais quando se imputa 
 litigância de má fé a quem invoca tal norma como fundamento da sua pretensão à 
 não ingerência dum processo disciplinar no conteúdo dos seus escritos 
 confidenciais.
 
             A norma em causa é, pois, o artigo 126.º, n.º 3, do CPP, julgada 
 inconstitucional pelo Acórdão n.º 607/2003, publicado no Diário da República, II 
 Série, de 8 de Abril de 2004, com a ligeireza como foi aplicada ao ponto de se 
 condenar em litigância de má fé quem pretendia a sua aplicação no espírito 
 constitucional do mesmo acórdão.
 
             Este recurso, nos termos da LOTC, tem efeito suspensivo com subida 
 nos próprios autos e imediatamente após a decisão que venha a recair sobre a 
 arguição de nulidade doutra parte do Despacho.”.
 
  
 
             3.1 – O recorrente, advogado, havia intentado, nos Julgados de Paz 
 da Comarca do Porto, acção declarativa de responsabilidade extracontratual 
 contra Rui Freitas Rodrigues, também advogado, e a Ordem dos Advogados, pedindo 
 a sua condenação solidária no pagamento da quantia de € 3740,98, a título de 
 indemnização por danos à sua personalidade, por, no âmbito do processo 
 disciplinar que lhe foi instaurado pela segunda demandada e distribuído ao 
 primeiro demandado como seu relator, terem permitido que fossem juntas ao 
 referido processo disciplinar duas cartas-missivas confidenciais da sua autoria.
 
  
 
             3.2 – Da sentença do Juiz de Paz que julgou improcedente a acção, 
 por considerar não ter havido violação ilícita de direitos de personalidade do 
 demandante, mas que também não acolheu a pretensão dos demandados no sentido de 
 o autor ser condenado como litigante de má fé, recorreu, quanto à primeira 
 decisão, o ora recorrente e, quanto à não condenação como litigante de má fé, 
 recorreu subordinadamente a Ordem dos Advogados.
 
  
 
             3.3 – Por sentença de 15 de Julho de 2005, do 1.º Juízo do Tribunal 
 de Pequena Instância Cível do Porto, foi negado provimento ao recurso principal 
 
 (do autor) e julgado procedente o recurso subordinado (da Ordem dos Advogados), 
 condenando-se o ora reclamante como litigante de má fé.
 
  
 
             3.4 – Desta decisão de condenação como litigante de má fé interpôs o 
 ora reclamante recurso para o Tribunal da Relação do Porto, que foi admitido por 
 despacho de 22 de Novembro de 2005, tendo o recorrente apresentado as 
 respectivas alegações.
 
  
 
             3.5 – Após diversas vicissitudes processuais, foi proferido o 
 despacho de 12 de Outubro de 2006, no qual, constatando-se não ter o recorrente 
 pago a taxa de justiça devida pela interposição do referido recurso e não 
 beneficiando de apoio judiciário no âmbito do presente processo, determinou-se a 
 sua notificação para pagar a taxa de justiça em dívida, acrescida de multa.
 
  
 
             3.6 – O recorrente interpôs, em 31 de Outubro de 2006, recurso deste 
 despacho, que, porém, não foi admitido por despacho de 9 de Novembro de 2006, 
 por o valor da causa não ser superior à alçada do tribunal e por não ser 
 aplicável o estatuído no artigo 678.º, n.º 2, do Código de Processo Civil (CPC), 
 por não se verificar ofensa de caso julgado, uma vez que não houve qualquer 
 decisão anterior (quer do Julgado de Paz, quer do Tribunal de Pequena Instância 
 Cível do Porto) sobre a questão de não beneficiar o recorrente de apoio 
 judiciário no âmbito do presente processo.
 
  
 
             3.7 – Notificado deste despacho, o recorrente apresentou, em 28 de 
 Novembro de 2006, o requerimento de fls. 360 do processo principal e 488 destes 
 autos, no qual, numa primeira parte, interpõe novo recurso “da decisão que 
 refere «o valor da causa não é superior à alçada deste Tribunal»”, e, numa 
 segunda parte, declara “impugna[r] por meio de recurso a decisão que lhe não 
 admitiu o recurso interposto com fundamento em ofensa de caso julgado”. 
 
  
 
             3.8 – Por despacho de 7 de Dezembro de 2006 (fls. 361 do processo 
 principal), não foi admitido o novo recurso, por o referido quanto ao valor da 
 causa não ser uma decisão, mas a fundamentação da decisão de não admissão do 
 primeiro recurso, e, quanto à segunda parte, foi determinada a notificação do 
 recorrente para apresentar reclamação, nos termos do artigo 688.º, n.º 2, do 
 CPC.
 
  
 
             3.9 – Em 9 de Janeiro de 2007, o recorrente deduziu reclamação para 
 o Presidente do Tribunal da Relação do Porto (fls. 364 a 379 do processo 
 principal) contra os dois despachos de não admissão de recurso: (i) o de 9 de 
 Novembro de 2006, que não admitiu o recurso interposto do despacho de 12 de 
 Outubro de 2006, que determinou a sua notificação para pagar a taxa de justiça 
 em dívida, acrescida de multa, e (ii) o de 7 de Dezembro de 2006, que não 
 admitiu o recurso da passagem do despacho de 9 de Novembro de 2006 que refere 
 que “o valor da causa não é superior à alçada deste Tribunal”. 
 
  
 
             3.10 – Essa reclamação termina com a formulação das seguintes 
 conclusões e pedidos:
 
  
 
             “1. É inconstitucional o artigo 456.° do CPC com a interpretação de 
 um tribunal cível poder condenar um advogado em litigância de má fé com 
 fundamento em prática de alegada infracção disciplinar sem existir qualquer 
 decisão definitiva sobre o cometimento dessa alegada infracção disciplinar 
 proferida pela Ordem dos Advogados ou pela jurisdição administrativa, em 
 procedimento disciplinar previsto nos termos da Lei, por infringir a presunção 
 de inocência enunciada no n.º 2 e n.º 10 do artigo 32.º da CRP e por infringir a 
 parte final do n.º 1 do artigo 211.º da CRP.
 
  
 
             2. É inconstitucional o artigo 678.º, n.º 2, do CPC, com o sentido 
 de poder ser indeferida a admissão da subida dum recurso, que é interposto com 
 fundamento em ofensa de caso julgado, por se entender que inexiste qualquer 
 ofensa de caso julgado cometida, infringindo o artigo 2.º e a parte final do n.º 
 
 4 do artigo 20.° da CRP.
 
  
 
             3. É inconstitucional o artigo 678.°, n.º 3, do CPC, com a 
 interpretação de não poder ser admitido um recurso, que é interposto com 
 fundamento de que o valor da causa excede a alçada do tribunal de que se 
 recorre, entendendo-se que a apreciação feita sobre o valor da causa e que é 
 objecto de recurso, no Tribunal, não constitui uma decisão que admite recurso, 
 infringindo-se a regra dum processo equitativo determinada na parte final do n.º 
 
 4 do artigo 20.º da CRP e o n.º 1 do artigo 202.º da CRP.
 
  
 
             4. A ilegitimidade é de conhecimento oficioso por qualquer entidade 
 judicial, não podendo a Presidência da Relação do Porto, como entidade judicial, 
 recusar-se a dela conhecer sob pena de infringir os seus deveres funcionais – 
 vide artigos 494.º, n.º 1, alínea e), e 495.º do CPC.
 
  
 
             5. Conforme a jurisprudência da Relação do Porto votada unanimemente 
 no Acórdão de 21 de Setembro de 2000, registado no Livro n.º 419, a fls. 184 e 
 seguintes, não tem legitimidade para recorrer da não condenação em má fé quem 
 requereu essa condenação da parte contrária sem sucesso.
 
  
 
             6. Cumpre à Presidência da Relação do Porto deliberar essa 
 ilegitimidade, da parte contrária ao aqui reclamante, a qual, precisamente; 
 recorreu de uma decisão que não condenou o aqui reclamante em litigância de má 
 fé.
 
  
 
             7. Fazendo-o, como é seu dever oficioso, a Presidência da Relação do 
 Porto faz cumprir a sua própria jurisprudência de um modo imparcial, geral e 
 abstracto.
 
  
 
             Nestes termos, declare-se a ilegitimidade da parte contrária ao aqui 
 reclamante a partir do recurso por si interposto contra a não condenação do 
 reclamante em má fé e defira-se a admissibilidade dos dois recursos interpostos 
 nos termos da Lei com fundamento em ofensa de caso julgado, o primeiro, e com 
 fundamento em valor da causa que excede a alçada do tribunal de que se recorre, 
 o segundo.”
 
  
 
  
 
             3.11 – Por despacho do Presidente do Tribunal da Relação do Porto, 
 de 10 de Março de 2007, a reclamação foi indeferida com a seguinte 
 fundamentação:
 
  
 
             “Foram precisos quase 38 anos para sermos confrontados com uma peça 
 jurídica como a dos autos. Foram precisos mais de 6 anos para nos chamarem a 
 atenção para o exercício dos nossos deveres jurisdicionais. Finalmente, quando a 
 
 única tábua de salvação que se encontrou é a CRP e invocada, directamente, 
 perante o PR [Presidente da Relação] e em sede de reclamação, é mais do que 
 duvidosa legalidade todo o processado. E é de tal maneira o inusitado que temos 
 vindo a dispensar longas horas para nos apercebermos do que é que aqui se 
 discute e como se discute. Na verdade, recorrer dum despacho que se pronuncia 
 sobre a admissão/não de um recurso interposto e restrito à respectiva 
 fundamentação merece tratamento, pelo menos, extrajudicial: apreciação pela 
 Entidade que superintende sobre a admissão e disciplina dos respectivos membros.
 
  
 
             Mas não ficamos pelas assinaladas originalidades. É que estamos 
 perante uma acção que teve o seu início, por ser essa a competência, que jamais 
 foi questionada, nos Julgados de Paz. Daí que não seja possível o recurso ao 
 Tribunal da Relação e, muito menos, ao PR. Já agora chama-se a atenção de que 
 uma coisa é a decisão, singular, sem recurso, do PR e outra as do Tribunal da 
 Relação, em colectivo dos respectivos Juízes Desembargadores. Como também uma 
 coisa é interpor recurso dum Tribunal de Comarca a funcionar nos termos 
 regulares e outra é quando este se reveste já das funções de tribunal de 
 recurso, pelo que é ilícita – para não qualificar de forma mais gravosa – a 
 invocação generalizada de acórdãos.
 
  
 
             Daí que, pese embora todo o processamento, cuidado e sereno, do Juiz 
 recorrido/reclamado, os autos deveriam ter-se ficado na 2.ª (segunda, está 
 certo) instância deste tipo de acção, vedando-se, à nascença, a remessa ao 
 Tribunal da Relação. Tudo conforme se dispõe nos artigos 688.°, n.º 5, e 687.°, 
 n.º 3, do CPC, bem como nos seus princípios gerais de que o Juiz do processo 
 dispõe de todos os poderes de admissibilidade e regularização das peças que lhe 
 são apresentadas nos autos, sem necessidade de terem de ser não admitidas por 
 quem a elas se dirige.
 
  
 
             Por outro lado, o artigo 62.°, n.º 1, da Lei n.º 78/2001, de 13 de 
 Julho, só permite recurso para o Tribunal de Comarca e em condições muito 
 restritas, pelo que não é possível interpor recurso [ou] deduzir reclamação das 
 suas decisões.
 
  
 
             Se, eventualmente, há ofensa da CRP, é perante o TC que se deverá 
 reagir.
 
  
 
             Decidiu o Tribunal de Comarca condenando o aqui reclamante por 
 litigância de má fé, quando o não fizera o Julgado de Paz? Nada obsta, porque 
 tudo decorreu em sede de recurso. E em última instância, quer tenha sido em 
 confirmação da sentença do Julgado de Paz, quer invertendo a sua decisão, pois 
 foi sempre em sede de recurso.
 
  
 
             Por idênticas razões, também não obsta à inadmissibilidade do 
 recurso pela via do valor, o disposto no artigo 456.°, n.º 2, do CPC.
 
  
 
             De igual modo, o que versa o n.º 2 do artigo 678.° sobre ofensa de 
 
 «caso julgado». De qualquer maneira, finalmente, exarado fica que não é possível 
 interpor recurso – muito menos, em duplicado – de despachos de não admissão de 
 recurso restritos à fundamentação: uma decisão pode ser alterada/não mas no seu 
 objecto/fundo mérito, não por não se concordar com este ou aquele fundamento.
 
  
 
             Por isso, também esta reclamação poderia e deveria ter conhecido 
 tratamento mais radical, fazendo-lhe corresponder tantas peças como apensos 
 quantos as vias por que se enveredou nas reacções às decisões judiciais. Quanto 
 mais não fosse para evitar todo um mundo de confusões numa acção, que por 
 natureza e disciplina adjectiva, pressupõe a maior simplicidade de 
 procedimentos.
 
  
 
             Em consequência e em conclusão, indefere-se a reclamação, 
 apresentada no Rec. n.º 4388/05.9THPRT – 1.°, da Pequena Instância Cível do 
 Porto, pelo autor recorrente A.”. 
 
  
 
             3.12 – Notificado desse despacho, o recorrente veio, em 26 de Março 
 de 2007: (i) dele interpor o presente recurso para o Tribunal Constitucional 
 
 (fls. 505); e (ii) arguir a sua nulidade (fls. 507).
 
  
 
             3.13 – Por despacho de 30 de Março de 2007, o Presidente do Tribunal 
 da Relação do Porto, indeferiu a arguição de nulidade.
 
  
 
             3.14 – Notificado deste despacho, dele veio o reclamante interpor um 
 segundo recurso para o Tribunal Constitucional, através de requerimento de 19 de 
 Abril de 2007. 
 
  
 
             3.15 – Este segundo recurso não foi admitido pelo despacho do 
 Presidente do Tribunal da Relação do Porto, de 27 de Abril de 2007.
 
             
 
             3.16 – Desse despacho de não admissão do recurso, o ora recorrente 
 reclamou para o Tribunal Constitucional, nos termos do art.º 76.º, n.º 3, da 
 LTC, tendo essa reclamação sido indeferida pelo Acórdão n.º 359/2007, constante 
 dos autos. 
 
  
 
             4 – Sob apreciação do Tribunal Constitucional está, pois, agora, o 
 recurso interposto da decisão referida no ponto 3.11, através do requerimento 
 transcrito no ponto 2, que apenas foi admitido já depois de proferido o 
 mencionado Acórdão n.º 359/07 (fls. 578).
 
  
 
             5 – Porque se configura uma situação que se enquadra na hipótese 
 recortada no n.º 1 do art.º 78.º-A da LTC passa a decidir-se imediatamente.
 
  
 
             6.1 – O recorrente recorre da identificada decisão do Presidente da 
 Relação do Porto ao abrigo do disposto nas alíneas b) e g) do art.º 70.º da LTC, 
 pretendendo a apreciação das questões de constitucionalidade mencionadas no 
 requerimento que acima se deixou transcrito.
 
             Vejamos, pois.
 
             
 
             6.2 – E começando pelo recurso interposto ao abrigo da alínea g) do 
 art.º 70.º da LTC. Este preceito admite o recurso para o Tribunal Constitucional 
 das decisões dos tribunais “que apliquem norma já anteriormente julgada 
 inconstitucional ou ilegal pelo próprio Tribunal Constitucional”.
 
             Trata-se de uma norma que se fundamenta numa ideia de defesa da 
 Constituição e da legalidade democrática: se o órgão de fiscalização concentrada 
 da constitucionalidade se pronunciou já no sentido da inconstitucionalidade ou 
 da ilegalidade de certa norma, impõe-se que seja sujeita ao seu escrutínio 
 decisão dos tribunais que haja concluído em sentido oposto. 
 
             Embora o não diga expressamente, esse recurso tem como objecto a 
 norma do art.º 456.º do Código de Processo Civil (CPC) “com a interpretação de 
 um Tribunal Cível poder condenar um advogado em litigância de má fé com 
 fundamento em prática de alegada infracção disciplinar sem existir qualquer 
 decisão definitiva sobre o cometimento dessa alegada infracção disciplinar 
 proferida pela Ordem dos Advogados ou pela jurisdição administrativa, em 
 procedimento disciplinar previsto nos termos da Lei”.
 
             Ora, a decisão recorrida não aplicou esta norma. A decisão, ora 
 recorrida – relembre-se, o despacho do Presidente da Relação do Porto – apenas 
 decidiu se deviam ou não ser admitidos os recursos mencionados em 3.9, não se 
 tendo pronunciado sobre o mérito da questão da condenação do recorrente como 
 litigante de má fé, sendo que a dimensão normativa de tal preceito, pretendida 
 sindicar constitucionalmente, contende com a decisão desse mérito. Trata-se de 
 questão que o tribunal ad quem deveria conhecer se o recurso interposto fosse 
 admitido.
 
             De qualquer jeito, nunca o Tribunal Constitucional se pronunciou no 
 sentido da inconstitucionalidade de qualquer dimensão normativa do art.º 456.º 
 do CPC que seja coincidente com a definida como objecto do recurso de 
 constitucionalidade, pelo que não se mostra verificada a situação de 
 admissibilidade do recurso de constitucionalidade, prevista na referida alínea 
 g) do n.º 1 do art.º 70.º da LTC.
 
             E o mesmo se diga relativamente às outras questões de 
 constitucionalidade apontadas no requerimento de interposição de recurso se, 
 porventura, o recorrente as pretende sindicar ao abrigo de tal alínea.
 
             
 
             6.3 – O objecto do recurso de fiscalização concreta de 
 constitucionalidade, previsto na alínea b) do n.º 1 do artigo 280º da 
 Constituição e na alínea b) do n.º 1 do artigo 70º da LTC, disposição esta que 
 se limita a reproduzir o comando constitucional, apenas pode traduzir-se numa 
 questão de (in)constitucionalidade da(s) norma(s) de que a decisão recorrida 
 haja feito efectiva aplicação ou que tenha constituído o fundamento normativo do 
 aí decidido. 
 
             Trata-se de um pressuposto específico do recurso de 
 constitucionalidade cuja exigência resulta da natureza instrumental (e 
 incidental) do recurso de constitucionalidade, tal como o mesmo se encontra 
 recortado no nosso sistema constitucional, de controlo difuso da 
 constitucionalidade de normas jurídicas pelos vários tribunais, bem como da 
 natureza da própria função jurisdicional constitucional (cf. Cardoso da Costa, 
 
 «A jurisdição constitucional em Portugal», in Estudos em homenagem ao Professor 
 Doutor Afonso Rodrigues Queiró, Boletim da Faculdade de Direito de Coimbra, I, 
 
 1984, pp. 210 e ss., e, entre outros, os Acórdãos n.º 352/94, publicado no 
 Diário da República II Série, de 6 de Setembro de 1994, n.º 560/94, publicado no 
 mesmo jornal oficial, de 10 de Janeiro de 1995 e, ainda na mesma linha de 
 pensamento, o Acórdão n.º 155/95, publicado no Diário da República II Série, de 
 
 20 de Junho de 1995, e, aceitando os termos dos arestos acabados de citar, o 
 Acórdão n.º 192/2000, publicado no mesmo jornal oficial, de 30 de Outubro de 
 
 2000).
 
             Por outro lado, importa acentuar que, neste domínio da fiscalização 
 concreta de constitucionalidade, a intervenção do Tribunal Constitucional se 
 limita ao reexame ou reapreciação da questão de (in)constitucionalidade que o 
 tribunal a quo apreciou ou devesse ter apreciado. 
 
             Na verdade, a resolução da questão de constitucionalidade há-de 
 poder, efectivamente, reflectir-se na decisão recorrida, implicando a sua 
 reforma, no caso de o recurso obter provimento. 
 
             Tal só é possível quando a norma cuja constitucionalidade o Tribunal 
 Constitucional aprecie haja constituído a ratio decidendi da decisão recorrida, 
 ou seja, o fundamento normativo do aí decidido. 
 
             
 
             6.4 – Ora, analisando a decisão recorrida, constata-se que esta 
 distraiu o fundamento normativo da decisão (recorde-se – o indeferimento da 
 reclamação ou seja, a confirmação da decisão de 1.ª instância de não 
 admissibilidade dos dois referidos recursos) não dos preceitos indicados (art.ºs 
 
 456.º, 678.º, n.º 2 e 678.º, n.º 3, do CPC), sendo que o art.º 678.º, n.º 3 do 
 CPC nem sequer é mencionado, mas dos art.ºs 688.º, n.º 5 e 687.º, n.º 3, do CPC 
 e 62.º, n.º 1, da Lei n.º 78/2001, de 13 de Julho.
 
             Na verdade, diz ela:
 
             “[…]
 
             Daí que, pese embora todo o processamento, cuidado e sereno, do Juiz 
 recorrido/reclamado, os autos deveriam ter-se ficado na 2.ª (segunda, está 
 certo) instância deste tipo de acção, vedando-se, à nascença, a remessa ao 
 Tribunal da Relação. Tudo conforme se dispõe nos artigos 688.°, n.º 5, e 687.°, 
 n.º 3, do CPC, bem como nos seus princípios gerais de que o Juiz do processo 
 dispõe de todos os poderes de admissibilidade e regularização das peças que lhe 
 são apresentadas nos autos, sem necessidade de terem de ser não admitidas por 
 quem a elas se dirige.
 
             Por outro lado, o artigo 62.°, n.º 1, da Lei n.º 78/2001, de 13 de 
 Julho, só permite recurso para o Tribunal de Comarca e em condições muito 
 restritas, pelo que não é possível interpor recurso [ou] deduzir reclamação das 
 suas decisões.
 
             […]”.
 
             
 
             É certo que a decisão recorrida fala do n.º 2 do art.º 678.º do CPC. 
 Mas fala dele no sentido de esse preceito “não obstar à inadmissibilidade do 
 recurso”, decorrente daquele preceito do art.º 62.º, nº 1, da Lei n.º 78/2001 e 
 nunca na acepção normativa recortada pelo recorrente na alínea b) do seu 
 requerimento de interposição de recurso, acima transcrita.
 
             Note-se, de resto, que a decisão de 1.ª instância afastou a 
 aplicação desse preceito por a situação em apreço não caber na sua previsão, 
 sendo que o despacho ora recorrido se postou exactamente na mesma linha de 
 pensamento, confirmando-a.
 
             Ora, não cabe ao Tribunal Constitucional sindicar quer a correcção 
 do juízo feito pelos tribunais de instância quanto à determinação da lei 
 infraconstitucional aplicável à solução do caso quer do juízo de subsunção a 
 essa norma da situação concreta.
 
             Deste modo, qualquer que fosse a pronúncia do Tribunal 
 Constitucional ter-se-ia que concluir que ela seria insusceptível de se 
 projectar sobre o sentido da decisão recorrida, pelo que seria inútil, ficando 
 com o valor de uma simples decisão académica.
 
             Ora, essa função não cabe na jurisdição.
 
             
 
             7 – Destarte, atento tudo o exposto, o Tribunal Constitucional 
 decide não tomar conhecimento do recurso de constitucionalidade.
 
             Custas pelo recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 7 UCs.».
 
  
 B – Fundamentação
 
  
 
             5 – Antes de mais importa notar que o reclamante apenas se insurge 
 contra uma parte da decisão reclamada: a respeitante ao não conhecimento da 
 questão de constitucionalidade relativa ao art.º 456.º do Código de Processo 
 Civil (CPC), pelo que as outras se têm por decididas definitivamente. 
 
             Mesmo cingida a reclamação a esta parte da decisão, tem de convir-se 
 que ela em nada abala a sua bondade. 
 
             Toda a argumentação desenrolada contra a decisão ora reclamada 
 assenta uma errada concepção do que constitui o objecto do procedimento de 
 reclamação recortado no art.º 688.º do Código de Processo Civil (CPC) e do 
 
 âmbito material da pronúncia judicial nele prolatada.
 
             Esse processo apenas pode ter como objecto o indeferimento do pedido 
 de interposição do recurso ou a retenção do mesmo. 
 
             Por seu lado, o presidente do tribunal que seja competente para 
 conhecer do recurso, a quem cabe decidir a reclamação, apenas pode conhecer da 
 questão de saber se o recurso que não foi admitido o deve ser ou se o recurso 
 que foi admitido para subir em certa fase processual deve subir em outra altura 
 anterior. 
 
             Não cabe nesse objecto a apreciação das questões que constituam o 
 objecto do recurso interposto e não admitido ou retido, sejam elas questões de 
 facto ou questões processuais ou de lei substantiva. 
 
             Assim sendo, não poderão tomar-se como implicitamente aplicadas por 
 essa decisão, para efeito da admissibilidade do recurso constitucional, as 
 normas alegadas, nessa reclamação, como fundamento de uma pretendida alteração 
 do julgado relativo não às questões da admissão ou da não retenção do recurso, 
 mas antes ao objecto do recurso (condenação como litigante de má fé com base na 
 aplicação do disposto no art.º 456.º do CPC).
 
             Deste modo, a decisão do Presidente da Relação do Porto não conheceu 
 nem tinha de conhecer da questão da alegada aplicação errada do art.º 456.º do 
 CPC, bem como da sua inconstitucionalidade.
 
             Consequentemente, também não pode tomar-se o silêncio sobre esta 
 questão de constitucionalidade como correspondendo a uma ratio decidendi 
 implícita para efeitos da admissibilidade do recurso constitucional.
 
             Note-se que a eventual pronúncia que o Tribunal viesse a efectuar 
 sobre a questão de constitucionalidade do art.º 456.º do CPC jamais poderia ter 
 como efeito a alteração do julgado relativo à admissão do recurso da 1.ª 
 instância para o tribunal da relação.
 
             Assim sendo, é totalmente despido de sentido o alegado paralelismo 
 desenhado pelo reclamante com o julgado no Acórdão n.º 607/03, disponível em 
 
 www.tribunalconstitucional.pt, pois ele é dirigido não relativamente a normas 
 que regulam o objecto da reclamação definida no art.º 688.º do CPC – domínio 
 decisório que constituiria o objecto do recurso de constitucionalidade aqui em 
 causa, mas não já no aresto convocado como análogo – mas relativamente a normas 
 pretensamente respeitantes ao julgamento do objecto dos recursos, sendo que, na 
 presente situação processual, o processo não está nesta fase, por o recurso não 
 ter sido admitido.
 
             De tudo o exposto resulta que a reclamação não merece deferimento.
 
  
 C – Decisão
 
  
 
             6 – Destarte, atento tudo o exposto, o Tribunal Constitucional 
 decide indeferir a reclamação.
 
             Custas pelo reclamante com taxa de justiça que se fixa em 20 UCs.
 Lisboa, 20/12/2007
 Benjamim Rodrigues
 Joaquim Sousa Ribeiro
 Rui Manuel Moura Ramos