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Processo n.º 397/07
 
 2.ª Secção
 Relator: Conselheiro Mário Torres
 
  
 
  
 
  
 
            Acordam na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional,
 
  
 
  
 
                                                1. Relatório
 
                                                Na decisão instrutória proferida, 
 em 15 de Setembro de 2006, no Tribunal Judicial da Comarca de Albufeira, que 
 culminou com a pronúncia dos arguidos A., B., C., D. e E. como co‑autores 
 materiais, em concurso real, de um crime de sequestro, um crime de homicídio 
 qualificado, um crime de profanação (ocultação) de cadáver e um crime de 
 detenção ilegal de arma de defesa, foi inicialmente apreciada a arguição de 
 nulidade (deduzida no debate instrutório pela defesa dos dois primeiros arguidos 
 e posteriormente subscrita pela defesa dos terceiro e quarto arguidos) da busca 
 realizada na residência do arguido D., sita no … – …, Marina de Albufeira, pela 
 Polícia Judiciária, com base na existência de fortes indícios de se encontrar um 
 indivíduo sequestrado e/ou agredido nesse apartamento, mas sem que tenha tido 
 lugar a comunicação imediata da realização da busca ao juiz, nem a sua avaliação 
 e validação. Essa arguição foi indeferida com base na seguinte fundamentação:
 
  
 
 “Desde logo, refira‑se, afigura‑se falecer legitimidade aos arguidos não 
 residentes, à data, naquele apartamento, para arguir a nulidade decorrente de 
 uma busca efectuada num domicílio que, afinal de contas, não era o seu.
 Todavia, o certo é que também o arguido D. subscreveu o respectivo requerimento, 
 pelo que de todo o modo haverá que apreciar de fundo a questão suscitada.
 A regra da inviolabilidade do domicílio tem, desde logo, consagração 
 constitucional (artigo 34.º, n.ºs 1, 2 e 3, da Constituição), cominando ainda a 
 Lei Fundamental com nulidade as provas obtidas mediante abusiva intromissão no 
 domicílio (artigo 32.º, n.º 8, da Constituição).
 No que concerne às buscas domiciliárias, por regra só podem ser autorizadas ou 
 ordenadas pelo juiz (artigo 177.º, n.º 1, do Código de Processo Penal). Porém, 
 segundo dispõe o artigo 177.º, n.º 2, do mesmo diploma, «Nos casos referidos no 
 artigo 174.º, n.º 4, alíneas a) e b), as buscas domiciliárias podem também ser 
 ordenadas pelo Ministério Público ou ser efectuadas por órgão de polícia 
 criminal. É correspondentemente aplicável o disposto no artigo 174.º, n.º 5.»
 Assim, face ao que estabelece o artigo 174.º do Código de Processo Penal, as 
 buscas domiciliárias podem ser efectuadas por órgão de polícia criminal nos 
 casos:
 
  
 
 «(…)
 a) De terrorismo, criminalidade violenta ou altamente organizada, quando haja 
 fundados indícios da prática iminente de crime que ponha em grave risco a vida 
 ou a integridade de qualquer pessoa;
 b) Em que os visados consintam, desde que o consentimento prestado fique, por 
 qualquer forma, documentado;
 
 (…).» (alíneas a) e b) do n.º 4 do referido artigo).
 
  
 Todavia,
 
  
 
 «5. Nos casos referidos na alínea a) do número anterior, a realização da 
 diligência é, sob pena de nulidade, imediatamente comunicada ao juiz de 
 instrução e por este apreciada em ordem à sua validação.» (n.º 5 do artigo 174.º 
 do Código de Processo Penal).
 
  
 No caso, resulta dos autos que, no dia 15 de Setembro de 2005, na sequência da 
 detenção de alguns dos arguidos, elementos da PJ entraram no apartamento em 
 causa, o apartamento …, sito nos …, em Albufeira, onde encontraram o cadáver da 
 vítima F. no interior de uma arca congeladora, e procederam à apreensão dos 
 objectos melhor descritos nos autos.
 A diligência ficou, nomeadamente, documentada a fls. 23 a 25, tendo ali sido 
 invocado pela PJ que, na sequência, encontrando‑se aberta a porta daquele 
 apartamento, por julgar existirem fortes indícios de se encontrar um indivíduo 
 sequestrado e/ou agredido naquele apartamento, verificou que numa arca 
 frigorífica colocada de forma pouco estética junto à porta de entrada se 
 encontrava um cadáver que apresentava indícios ao nível do hábito externo de ter 
 sofrido violentas agressões. A PJ efectuou ainda inspecção judiciária ao 
 referido apartamento, removeu o corpo, que lá se encontrava, e procedeu à 
 apreensão dos objectos melhor descritos nos autos e que lá se encontravam (cfr. 
 ainda fls. 50 a 55).
 Tais diligências tiveram lugar após as 18h30 do dia 15 de Setembro de 2005.
 No dia 17 de Setembro de 2005, os autos foram presentes ao juiz de instrução, 
 juntamente com os arguidos, então detidos, para o seu primeiro interrogatório 
 judicial, o qual teve lugar pelas 12h10 do mesmo dia.
 Nesse mesmo dia, o juiz de instrução, apreciando, não só julgou válidas as 
 detenções de todos os arguidos, sustentando‑se em que foram efectuadas na 
 sequência de crime cometido em situação de quase flagrante delito, tal como este 
 se mostra definido no artigo 256.º, n.º 2, do Código de Processo Penal, como 
 entendeu que resultava já fortemente indiciada nos autos a prática por todos os 
 arguidos, em co‑autoria, dos crimes de homicídio qualificado, previsto e punido 
 nos artigos 131.º e 132.º, n.º 2, alínea g), do Código Penal, de ocultação de 
 cadáver, previsto e punido no artigo 254.º, n.º 1, alínea a), do Código Penal, e 
 bem assim do crime de posse e detenção de arma proibida, previsto e punido no 
 artigo 275.º do Código Penal, tendo‑se decidido pela aplicação a cada um deles 
 da medida de coacção prisão preventiva.
 Os arguidos suscitam duas questões, a ausência de comunicação imediata da 
 realização da busca ao juiz de instrução e a ausência de apreciação dessa mesma 
 busca.
 Desde logo, compulsando os autos, deles resulta manifesto que a entrada naquele 
 apartamento se sustentou em fundados indícios da prática iminente de crime que 
 pusesse em grave risco a vida ou integridade física daquele que, todavia, veio a 
 ser encontrado no interior do apartamento em causa já sem vida, a vítima F..
 Ora, detidos os arguidos, e realizada a busca, os elementos que documentavam a 
 entrada naquele apartamento, juntamente com os arguidos, vieram a ser 
 apresentados ao juiz de instrução ainda antes de decorrido o prazo de 48 horas 
 que a lei estabelece para a apresentação dos detidos a primeiro interrogatório 
 judicial.
 Não se poderá pois deixar de concluir pela comunicação tempestiva da entrada do 
 
 órgão de polícia criminal no apartamento … sito nos …, na Marina de Albufeira, 
 não se vislumbrando que o legislador, ao impor a comunicação imediata ao juiz de 
 instrução, pretendesse estabelecer um prazo mais curto do que aquele que 
 consagra para a apresentação dos detidos, privados da liberdade, a primeiro 
 interrogatório judicial. Por outro lado, a nosso ver, a cominação de nulidade, a 
 que alude o n.º 5 do artigo 174.º do Código de Processo Penal, respeita apenas à 
 falta da imediata comunicação, não assim à falta de apreciação.
 Todavia, mesmo que assim não se entenda, a verdade é que o teor do despacho 
 proferido pelo juiz de instrução aquando do primeiro interrogatório judicial dos 
 arguidos revela que a busca em causa e os resultados obtidos com a mesma foram 
 apreciados e tidos em consideração nessa decisão.
 Apesar de o juiz de instrução não ter feito uma referência expressa à validação 
 dessa busca, é manifesto que a teve validamente em conta no seu despacho, quer 
 quanto aos fundamentos da validação da detenção dos arguidos, quer quanto aos 
 fortes indícios dos crimes que sustentaram a aplicação da medida de prisão 
 preventiva.
 Isto, quando é certo que o cadáver da vítima fora precisamente encontrado 
 naquele apartamento.
 Do que se conclui que, efectivamente, a busca em causa foi não apenas comunicada 
 imediatamente ao juiz de instrução, e por isso mesmo tempestivamente, como 
 também por ele apreciada e tacitamente validada, não se verificando a nulidade 
 que foi arguida.
 Por todo o exposto, julga‑se improcedente a invocada nulidade da busca realizada 
 na residência do arguido D., sita no apartamento … – …, Marina de Albufeira.”
 
  
 
                                                Contra esta decisão interpôs o 
 arguido D. recurso para o Tribunal da Relação de Évora, terminando a respectiva 
 motivação com a formulação das seguintes conclusões:
 
  
 
 1.º – A pertença [sic] busca efectuada ao apartamento … – …, Marina de 
 Albufeira, é nula 
 
 2.º – O artigo 174.º, n.º 4, alínea a), do CPP não se basta com a mera 
 existência de indícios ou com a investigação de crimes de catálogo.
 
 3.º – É também necessário que se verifiquem fundados indícios da prática 
 iminente de crime que ponha em grave risco a vida ou a integridade de qualquer 
 cidadão.
 
 4.º – Ora, pese ter sido invocado tal circunstancialismo, após a descoberta do 
 corpo, não se entende que o OPC entre as 13h30 horas e as 18h30 estando no 
 local, não tenha agido no sentido de pôr cobro ao grave risco à vida ou à 
 integridade física de um cidadão.
 
 5.º – Decorre daqui ser pouco credível o invocado a posteriori pelo OPC, tudo 
 inculcando que visa branquear a sua actuação.
 
 6.º – Tudo sugere não ter agido o OPC por força de quaisquer fortes indícios.
 
 7.º – Aliás, a existência de um perigo [i]minente enquadrar‑se‑ia num estado de 
 necessidade desculpante, não removível de outro modo, o que não era o caso.
 
 8.º – Na verdade, este estado de necessidade parece ter podido aguardar pelo 
 menos por 5 horas.
 
 9.º – Manifestamente a PJ poderia ter solicitado a emissão de manda[d]os de 
 buscas em tempo útil.
 
 10.º – Assim, no entender da defesa, houve falta do pressuposto exigido pelo 
 artigo 174.º, n.º 4, alínea a), do CPP.
 
 11.º – Pelo que a interpretação dada ao artigo 174.º, n.º 4, alíneas a) e b), do 
 CPP, no douto despacho recorrido é inconstitucional por violação do estatuído 
 nos artigos 18.º, 32.º, n.ºs 1, 4 e 8, e 34.º, n.ºs 2 e 3, da CRP.
 
 12.º – Quando assim não se entenda, também não foi cumprida a exigência 
 prevista no n.º 5 do artigo 174.º do CPP.
 
 13.º – É transparente do auto de 1.º interrogatório, onde ocorreu a primeira 
 intervenção do JIC, que a busca não lhe foi comunicada para efeitos do n.º 5 do 
 artigo 174.º do CPP.
 
 14.º – Consequentemente, o M.mo Juiz não se pronunciou quanto à validação da 
 referida busca, como lhe seria indispensável atento o disposto no artigo 174.º, 
 n.º 4, alínea a), e n.º 5, do CPP.
 
 15.º – Estamos assim perante um problema de omissão de despacho quanto à 
 validação da busca (?), e o facto de se ter decretado a prisão preventiva dos 
 arguidos não branqueia tal lapso.
 
 16.º – Esta é, sem dúvida, a mais curial interpretação a dar ao artigo 174.º, 
 n.º 4, alínea a), e 174.º, n.º 5, do CPP, pois a dar‑se outra então far‑se‑á 
 interpretação inconstitucional das mesmas por violação do estatuído nos artigos 
 
 18.º, 32.º, n.ºs 1, 4 e 8, e 34.º, n.ºs 2 e 3, da CRP.
 
 1[7].° – O despacho sindicado violou os artigos 18.º, 32.º e 34.º da CRP e o 
 artigo 174.º do CPP.
 
 1[8].º – Não há validações de buscas tácitas e expressas, pois caso contrário o 
 legislador disso daria notícia, sendo que as contempladas na lei são as 
 expressamente validadas.”
 
  
 
                                                A esse recurso foi negado 
 provimento pelo acórdão do Tribunal da Relação de Évora, de 19 de Dezembro de 
 
 2006, com a seguinte fundamentação:
 
  
 
 “Perante as conclusões da motivação, a questão a decidir consiste em saber se a 
 busca efectuada na residência de D. é nula:
 
 – por não haver indícios da prática iminente de crime que punha em grave risco a 
 vida ou a integridade física de F.;
 
 – por virtude da busca não ter sido comunicada de imediato ao M.mo JIC;
 
 – por não ter sido validada a busca pelo M.mo JIC.
 
 É ordenada busca quando houver indícios de que quaisquer objectos relacionados 
 com o crime ou que possam servir de provas, ou o arguido ou outra pessoa que 
 deva ser detida se encontram em lugar reservado ou que não seja de livre acesso 
 ao público (artigo 174.º, n.º 2, do Código de Processo Penal).
 Constitui regra geral as buscas serem autorizadas ou ordenadas pela autoridade 
 judiciária competente, devendo esta, sempre que possível, presidir à diligência.
 Esta regra também tem excepções e, por isso, as buscas domiciliárias, em 
 determinadas situações, podem ser feitas sem prévio despacho do Juiz, mas 
 ordenadas pelo Ministério Público ou ser efectuadas por órgãos de polícia 
 criminal, como resulta do artigo 177.º, n.º 2, em conjugação com o artigo 
 
 174.º, [n.º 4], alínea a), do mesmo diploma, e que são as seguintes:
 a) nos casos de terrorismo, criminalidade violenta ou altamente organizada, 
 quando se verifiquem indícios fundados da prática iminente de crime que ponha em 
 risco a vida ou integridade física de qualquer pessoa (artigo 174.º, n.º 4, 
 alínea a), do CPP);
 b) quando haja consentimento dos visados, desde que o consentimento fique por 
 qualquer forma documentado.
 No caso que nos ocupa, a autoridade policial efectuou a busca na residência do 
 arguido D. sem prévia autorização judicial e não houve consentimento dos 
 visados, logo importa apurar se tal busca obedeceu ao requisito previsto na 
 alínea a) do n.º 4.
 O recorrente entende que não, porque o preenchimento de tal requisito não se 
 basta com a mera existência de indícios ou com a investigação de crimes de 
 catálogo; é também necessário que se verifiquem indícios da prática iminente de 
 crime que ponha em grave risco a vida ou a integridade física de qualquer 
 cidadão e não se entende que o Órgão de Polícia Criminal, estando no local, 
 entre as 13h30m e as 18h30m, só tenha agido no sentido de pôr cobro ao grave 
 risco de vida ou à integridade física de um cidadão cinco horas após a sua 
 chegada ao local.
 Dos autos resulta que a Polícia Judiciária recolheu, antes de proceder à busca 
 domiciliária, os seguintes indícios com interesse para a investigação:
 
 – no dia 14 de Setembro de 2005, pouco antes das 23h30m, três indivíduos que se 
 encontravam num terreno baldio, que serve de parque de estacionamento de 
 viaturas, nas imediações do Lote …, em Lagos, desferiram com objectos de 
 características não concretamente apuradas, mas também com os punhos e os pés, 
 diversos golpes no corpo de F.;
 
 – no local, num percurso de 25/30 metros, encontravam‑se vestígios hemáticos 
 espalhados pelo chão, um dente humano arrancado pela raiz, bem como vestígios 
 supostamente capilares;
 
 – a vítima foi arrastada para uma viatura de marca BMW com a matrícula … e foi 
 introduzida na bagageira da mesma, após o que a viatura arrancou a grande 
 velocidade;
 
 – a Polícia Judiciária foi informada pelo Oficial de Ligação Britânico que a 
 viatura mencionada era utilizada por indivíduos que se encontravam a residir nos 
 
 .., … e …, sitos na Marina de Albufeira;
 
 – a Polícia Judiciária, após ter conhecimento dos caracteres físicos dos 
 suspeitos, deslocou‑se, no dia 15 de Setembro de 2005, cerca das 13h30m, para os 
 apartamentos …e verificou que por debaixo do veículo BMW, de matrícula … havia 
 abundantes rastos de pingos de sangue.
 Na sequência de vigilâncias levadas a efeito, a PJ constatou:
 
 – cerca das 16 horas chegaram três indivíduos numa viatura Lexus, com os 
 caracteres físicos coincidentes com os dos suspeitos;
 
 – poucos minutos depois dois daqueles indivíduos vêm do apartamento … e 
 aparentam estar abalados: um deles pára e vomita para o chão;
 
 – às 17 horas os dois indivíduos vão à viatura Lexus buscar roupa;
 
 – às 17h55m, os três indivíduos encontravam‑se no apartamento … a conversar;
 
 – às 18h30m, C., ao volante da viatura Peugeot 307, .., dirigia‑se para o 
 portão de saída do condomínio de apartamentos e atrás vinha o suspeito E., ao 
 volante do veículo BMW, de matrícula …, também em direcção à saída, altura em 
 que foram interceptados;
 
 – D. e B. encontravam-se à porta do apartamento …, que dista cerca de 20 metros 
 do portão de saída referido, e, ao verem a intercepção feita pela Polícia, 
 puseram‑se em fuga para o interior do imóvel e saíram por uma janela/porta sita 
 nas traseiras. Foram perseguidos e detidos.
 Perante estes factos, a Polícia Judiciária ficou convicta de que no apartamento 
 
 … se encontrava o indivíduo que havia sido agredido em Lagos e que a sua 
 integridade física ou mesmo a vida corriam grave risco; por isso, entrou no 
 referido apartamento, onde encontrou a vítima numa arca frigorífica e os demais 
 objectos relacionados com o homicídio.
 Se a Polícia Judiciária só entrou no apartamento … às 18h30m, tal ocorreu 
 porque, face às acções de vigilância e diligências que fez durante a tarde de 15 
 de Setembro de 2005, no sentido de confirmar as suspeitas que pendiam sobre os 
 arguidos, só naquele momento ficou ciente dos fundados indícios de que lá se 
 encontrava a vítima e que corria grave risco para a sua integridade física face 
 
 à forma como foi agredida, ou até para a sua vida; por isso, não se justificava 
 tal entrada em momento anterior.
 Assim, não assiste razão ao recorrente ao considerar que a Polícia Judiciária 
 deveria ter sido mais eficaz, nomeadamente não esperando tanto tempo para 
 intervir no apartamento.
 Verifica‑se, pois, o requisito previsto no artigo 174.º, n.º 4, alínea a), em 
 conjugação com o artigo 177.º, n.º 2, do CPP, uma vez que estamos perante um 
 caso de criminalidade violenta, em que há fundados indícios da prática iminente 
 de crime que punha em perigo a integridade física ou a vida de um cidadão.
 Alega ainda o recorrente que não foram cumpridas as exigências previstas no n.º 
 
 5 do artigo 174.º do Código de Processo Penal, isto é, a busca domiciliária não 
 foi comunicada ao Juiz de Instrução e, se o foi, tal não ocorreu imediatamente, 
 nem foi expressamente validada.
 Estabelece o preceito mencionado que «nos casos referidos na alínea a) do número 
 anterior, a realização da diligência é, sob pena de nulidade, imediatamente 
 comunicada ao juiz de instrução e por este apreciada em ordem à sua validação».
 Importa antes de mais esclarecer que deste preceito resulta que só constitui 
 nulidade a falta de comunicação imediata da busca e não também a falta de 
 apreciação ou validação pelo juiz.
 Do relato de diligência externa de fls. 61 a 63 e do de fls. 64 a 69, que faz 
 parte do processo que foi apresentado ao Juiz de Instrução juntamente com os 
 detidos, consta do primeiro que «na sequência dos factos e por julgarmos 
 existirem fortes indícios de se encontrar um indivíduo sequestrado e/ou 
 agredido naquele apartamento, verificámos que numa arca frigorífica colocada de 
 forma pouco estética junto à porta de entrada se encontrava um cadáver (…..)».
 E do relato de fls. 64 a 69 refere‑se que foi feita uma inspecção judiciária ao 
 apartamento …, onde residia D., e descrevem‑se de forma pormenorizada os bens 
 que lá foram encontrados relacionados com o homicídio.
 Assim, foi feita a comunicação da busca ao M.mo Juiz na altura em que os 
 arguidos foram apresentados para primeiro interrogatório.
 Terá tal comunicação sido feita imediatamente, como exige o artigo 174.º, n.º 5, 
 do CPP?
 A lei não nos dá uma noção da expressão imediatamente comunicada, por isso a 
 mesma terá de ser interpretada de acordo com o sentido que lhe é dado na 
 linguagem comum e com os objectivos visados com tal comunicação imediata.
 Imediatamente significa «no mais curto espaço de tempo», «de forma rápida», «sem 
 qualquer demora». Com tal comunicação visa‑se o controlo da legalidade da 
 diligência por parte do Juiz no sentido de aferir se a busca se revelava 
 necessária e proporcionada aos fins visados, mas há que ter também em conta as 
 circunstâncias em que a mesma se realiza, nomeadamente quando estão em causa 
 diligências de investigação, que não se podem interromper para se fazer tal 
 comunicação, sob pena de se pôr em causa a investigação.
 Portanto, há que ponderar todos estes elementos de acordo com critérios de 
 razoabilidade e bom senso a fim de se aferir se a busca foi, ou não, comunicada 
 de forma imediata.
 No caso concreto, a busca foi realizada no dia 15 de Setembro de 2005, pelas 
 
 18h30m, hora em que o tribunal está encerrado, e, face à complexidade e 
 gravidade do caso, em que estão em causa crimes muito graves, a elaboração do 
 processo, face aos elementos de prova recolhidos, era demorada; por isso, 
 consideramos que a comunicação da busca, que foi feita no dia 17 de Setembro de 
 
 2005, pelas 12h, juntamente com a apresentação dos detidos ao M.mo Juiz para 
 interrogatório, foi efectuada, de acordo com critérios de razoabilidade e bom 
 senso, o mais breve possível, de imediato.
 Por outro lado, se os arguidos têm de ser apresentados ao Juiz de Instrução no 
 prazo máximo de 48 horas após a detenção, como impõe o artigo 28.º, n.º 1, da 
 Constituição, não se nos afigura que o legislador pretendesse estabelecer um 
 prazo mais curto para a comunicação da busca do que para a apresentação dos 
 detidos para primeiro interrogatório judicial, uma vez que a privação da 
 liberdade constitui uma restrição mais grave dos direitos dos cidadãos do que a 
 restrição de quaisquer outros direitos.
 Por tais motivos, consideramos que a comunicação da busca foi feita de forma 
 imediata.
 Por fim, refere o arguido que o M.mo Juiz de Instrução não se pronunciou sobre 
 a validação da busca, como exige o artigo 174.º, n.º 4, alínea a), e n.º 5, do 
 Código de Processo Penal, e que esta tem de ser expressamente validada, e não 
 tacitamente, como se defende no despacho impugnado.
 A não validação da busca não constitui a nulidade a que se refere o artigo 
 
 174.º, n.º 5, do Código de Processo Penal, mas sim a falta de comunicação da 
 busca ao juiz, como já referimos.
 A busca não foi validada expressamente, como se infere do despacho que 
 determinou a detenção dos arguidos, mas foi apreciada e validada tacitamente.
 Na verdade, após o interrogatório dos arguidos e perante os elementos que já 
 haviam sido carreados para o processo, o M.mo Juiz de Instrução considerou que 
 havia fortes indícios da prática por todos os arguidos, em co‑autoria, do crime 
 de homicídio qualificado, previsto e punido nos artigos 131.º e 132.º, n.º 2, 
 alínea g), do Código Penal, do crime de ocultação de cadáver, previsto e punido 
 no artigo 254.º, n.º 1, alínea a), e do crime de posse e detenção de arma 
 proibida, previsto e punido no artigo 275.º, todos do Código Penal.
 Os elementos de prova constantes dos autos, que são essenciais para se chegar à 
 conclusão que havia fortes indícios dos crimes mencionados, são os que 
 resultaram da busca domiciliária efectuada na residência de D..
 Assim, se havia fortes indícios da prática dos crimes referidos e se os 
 elementos de prova resultantes da busca são essenciais para se extrair tal 
 ilação, então estes foram apreciados e tidos em conta para a prolação do 
 despacho que determinou a prisão preventiva dos arguidos, pelo que foram 
 apreciados e validados implicitamente, que é quanto basta para que a busca seja 
 validada.
 Não nos merece, pois, qualquer reparo o despacho recorrido, nem se vislumbra que 
 tenha sido violado o disposto nos artigos 18.º e 32.º, n.ºs 1, 4 e 8, da 
 Constituição.
 Neste sentido se pronunciou o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 8 de 
 Janeiro de 1998, Colectânea de Jurisprudência, ano VI, tomo 1, pág. 158, o qual 
 refere: «A validação judicial da realização da busca pode ser implícita, desde 
 que se revele inequivocamente», e ainda o Acórdão do Supremo Tribunal de 
 Justiça, de 15 de Dezembro de 1998, in www.dgsi.pt, do qual consta que «Quanto à 
 validação da busca, banidas que estão da prática forense as fórmulas 
 sacramentais, ela resulta inequivocamente do despacho do M.mo Juiz de Instrução 
 Criminal, proferido no dia imediato ao da realização da busca e que validou a 
 detenção do arguido recorrente e lhe aplicou a medida de coacção de prisão 
 preventiva».
 III – Termos em que acordam os Juízes que compõem a Secção Criminal do Tribunal 
 da Relação de Évora em negar provimento ao recurso interposto pelo arguido, 
 mantendo o despacho recorrido.”
 
  
 
                                                O arguido D. requereu a aclaração 
 do precedente acórdão, o que foi indeferido por acórdão de 6 de Fevereiro de 
 
 2007.
 
                                                Veio então o mesmo arguido 
 interpor recurso do acórdão de 19 de Dezembro de 2006 para o Tribunal 
 Constitucional, ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei de 
 Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional, aprovada 
 pela Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, e alterada, por último, pela Lei n.º 
 
 13‑A/98, de 26 de Fevereiro (LTC), pretendendo ver “apreciada a 
 constitucionalidade da norma do artigo 174.º, n.ºs 2, 4, alíneas a) e b), e 5, 
 do CPP na interpretação que lhe foi dada na decisão recorrida”, aduzindo que “a 
 interpretação da norma, dada pelo tribunal de 1.ª instância, viola os artigos 
 
 18.º, 32.º, n.ºs 1, 4 e 8, e 34.º, n.ºs 2 e 3, da CRP, porquanto foi 
 interpretada no sentido de aceitar a ausência de comunicação imediata da 
 realização da busca ao juiz e de entender não ser necessária a validação da 
 mesma, aceitando que a mesma pode ocorrer tacitamente”.
 
                                                Neste Tribunal, o recorrente 
 apresentou alegações, que terminam com a formulação das seguintes conclusões:
 
  
 
 “1.º – Nem a polícia nem o Ministério Público comunicaram a realização da busca 
 ao tribunal a fim de este apreciar e validar, como decorre desde logo da 
 circunstância de apenas se promover a realização de 1.º interrogatório de 
 arguido detido.
 
 2.º – De qualquer maneira, admitindo, sem conceder, aceitar‑se que houve 
 comunicação da busca ao Juiz, esta sempre seria intempestiva, atento a que 
 mediaram mais de 40 horas entre a realização da busca e a apresentação dos autos 
 em tribunal, tendo em linha de conta que no dia 16 de Setembro o tribunal 
 funcionou normalmente.
 
 3.º – A expressão imediatamente, no contexto da busca realizada ao abrigo do 
 disposto no artigo 177.º, n.º 2, em conjugação com o disposto no artigo 174.º, 
 n.º 4, alínea a), ambos do CPP, quer dizer no momento, na sequência, de seguida, 
 sendo esta melhor interpretação do preceito.
 
 4.º – Não se compagina, como se pretende na interpretação dada na decisão 
 recorrida, com o sentido de que imediatamente abrange o prazo em que o detido 
 deve ser apresentado ao Juiz de instrução, ou seja, 48 horas.
 
 5.º – A busca supra referida não foi validada pelo juiz, não podendo, sob pena 
 de se inverterem as regras processuais, defender‑se, como se defendeu na 
 interpretação dada na decisão recorrida, que a mesma foi tacitamente validada.
 
 6.º – De resto, a não validação pelo juiz pode ter ocorrido por várias razões, 
 como seja, o desconhecimento ou a não comunicação da busca, pelo que, a ser como 
 o tribunal a interpreta, não era necessário pronunciar‑se nunca sobre tal 
 validação, pois esta era sempre tácita.
 
 7.º – De resto, nem se percebe a interpretação no sentido de que existe 
 validação tácita, só porque os arguidos ficaram em prisão preventiva.
 
 8.º – Uma interpretação, como a que foi feita [pela] decisão recorrida, não 
 impondo a comunicação ao juiz da realização de uma busca de forma clara e 
 inequívoca, designadamente com um pedido do OPC ou promoção do Ministério 
 Público no sentido de o primeiro validar a busca, ofende as garantias de defesa 
 do arguido e deixa desprotegido o seu direito à privacidade.
 
 9.º – De igual maneira, como já se escreveu, defender, como foi feito na decisão 
 recorrida, a interpretação de [que] é legal apresentar os autos ao juiz para 
 efeitos de apreciação e validação de uma busca, realizada ao abrigo do disposto 
 na alínea a) do n.º 4 do artigo 174.º, conjugado com o disposto no n.º 2 do 
 artigo 177.º do CPP, mais de 40 horas após a mesma, pese o tribunal ter estado 
 em funcionamento, ofende as garantias de defesa do arguido e o seu direito à 
 privacidade.
 
 10.º – Também a interpretação feita na decisão recorrida, e confirmada pelo 
 Tribunal da Relação de Évora, segundo a qual o juiz, fazendo exarar no despacho 
 que validou a detenção e apreciou e/ou validou a busca, daí resulta uma 
 validação tácita, ofende o direito de defesa do arguido, bem como o seu direito 
 
 à privacidade.
 
 11.º – As referidas interpretações da norma constante do artigo 174.º, n.º 2, 
 conjugada com o artigo 177.º, n.º 2, do CPP contendem com o estatuído nos 
 artigos 32.º e 34.º da CRP, inquinando‑a de inconstitucionalidade material.
 
 12.º – Como recentemente foi decidido pelo Tribunal da Relação de Évora, sobre 
 este ponto concreto atrás referido: «Aduzem também estes recorrentes que, mesmo 
 a considerar‑se incluída a busca efectuada na previsão da alínea a) do n.º 4 do 
 artigo174.º do CPP, mesmo assim ela seria nula, porque não observando in casu o 
 disposto no n.º 5 do artigo 174.º, que estabelece que «nos casos referidos na 
 alínea a) do numero anterior, a realização da diligência é, sob pena de 
 nulidade, imediatamente comunicada ao juiz de instrução e por este apreciada em 
 ordem à sua validação» Ora, compulsados os autos, não se descortina que a busca 
 lhe seja sido comunicada nem que tenha havido despacho de validação da mesma. 
 Daí que, face ao normativo apontado, haja que considerar nula a busca efectuada. 
 De resto, refira‑se, não se revela curial a tese defendida pelo Ministério 
 Público no sentido de que sempre o despacho da M.ma JIC que decretou a prisão 
 preventiva dos arguidos abrange e contempla a apreciação e validação da busca 
 efectuada.»
 
 13.º – Esta a melhor interpretação a dar à norma constante do artigo 174.º, n.º 
 
 5, do CPP, conjugada com o disposto no artigo 177.º, n.º 2, ambos do CPP.
 
 14.º – É exactamente o que se pretende ver apreciado, a constitucionalidade da 
 norma do artigo 174.º, n.º 2, n.º 4, alíneas a) e b), e n.º 5, conjugada com o 
 artigo 177.º, n.º 2, todos do CPP, na interpretação que lhe foi dada na decisão 
 recorrida, e se tal interpretação viola ou não os artigos 18.º, 32.º, n.ºs 1, 4 
 e 8, e 34.º, n.ºs 2 e 3, da CRP.”
 
  
 
                                                O representante do Ministério 
 Público no Tribunal Constitucional contra-alegou, concluindo:
 
  
 
 “1.º – Não constitui restrição desproporcionada à tutela constitucional do 
 domicílio o entendimento segundo o qual é tempestiva a comunicação ao juiz da 
 realização de uma busca domiciliária dentro do prazo de 48 horas, procedendo‑se 
 
 à apresentação conjunta do expediente que a corporiza e do próprio arguido 
 detido.
 
                        2.º – Não viola qualquer princípio constitucional o 
 entendimento segundo o qual é passível de interpretação o despacho judicial 
 subsequente a tal comunicação, tendo-se a busca domiciliária por validada quando 
 o juízo de validação, embora não expresso, constitua antecedente lógico 
 indispensável, implícito no acto que considerou inquestionavelmente válida a 
 aquisição processual dos meios probatórios facultados por tal diligência.”
 
  
 
                                                Tudo visto, cumpre apreciar e 
 decidir.
 
  
 
                                                2. Fundamentação
 
                                                2.1. Cumpre, antes de mais, 
 delimitar com precisão o objecto do recurso.
 
                                                Resulta da conjugação do 
 requerimento de interposição de recurso para o Tribunal Constitucional e das 
 subsequentes alegações que o recorrente abandonou as questões de 
 inconstitucionalidade reportadas à admissibilidade da efectivação da busca sem 
 precedência de autorização judicial (a que aludira nas conclusões 1.ª a 11.ª da 
 motivação de recurso para o Tribunal da Relação de Évora) e à própria existência 
 da comunicação ao juiz da efectivação da busca para efeitos da sua validação 
 
 (aludida nas conclusões 12.ª e 13.ª da mesma motivação). A primeira questão é, 
 de todo, omitida nas alegações do presente recurso, e, quanto à segunda, o 
 recorrente acaba por aceitar que houve comunicação da busca ao juiz (cf. 
 conclusão 2.ª dessas alegações), questionando apenas o respeito pela exigência 
 de essa comunicação ser feita “imediatamente”.
 
                                                Aliás, quanto à primeira questão, 
 o Tribunal Constitucional, em sede de fiscalização preventiva de diversas 
 normas do Código de Processo Penal de 1987, já teve oportunidade de considerar 
 não inconstitucional, no Acórdão n.º 7/87 (n.º 2.7), a norma do n.º 2 do artigo 
 
 177.º, na parte em que, por remissão para a alínea a) do n.º 4 do artigo 174.º, 
 permite que as buscas domiciliárias sejam ordenadas pelo Ministério Público ou 
 efectuadas por órgãos de polícia criminal (mesmo sem autorização do Ministério 
 Público) nos casos de terrorismo, criminalidade violenta ou altamente 
 organizada, quando haja fundados indícios da prática iminente de crime que 
 ponha em grave risco a vida ou a integridade de qualquer pessoa. Esse juízo de 
 não inconstitucionalidade baseou‑se na consideração de que “o direito à 
 inviolabilidade do domicílio, enunciado nos n.ºs 1, 2 e 3 do artigo 34.º da 
 Constituição, dever compatibilizar‑se com o direito à vida e com o direito à 
 integridade pessoal, consignados respectivamente nos artigos 24.º e 25.º da lei 
 fundamental e que aquela alínea a) procura defender, direitos que hão‑de 
 entender‑se como limites imanentes do direito em causa”.
 
                                                As duas questões de 
 inconstitucionalidade normativa que o recorrente coloca ao Tribunal 
 Constitucional prendem‑se, a primeira, com o critério normativo que teria sido 
 acolhido no acórdão recorrido quanto à tempestividade da comunicação, pelo órgão 
 de polícia criminal ao juiz, da efectivação da busca, considerando admissível 
 que essa comunicação ocorra no prazo de 48 horas após a efectivação da busca (à 
 semelhança do prazo de 48 horas, a partir da detenção do arguido, para a sua 
 submissão a apreciação judicial, previsto no artigo 28.º, n.º 1, da Constituição 
 da República Portuguesa – CRP); e, a segunda, com o critério normativo segundo o 
 qual é admissível a validação judicial tácita da busca resultante do despacho 
 que validou a detenção do arguido e lhe aplicou a medida de coação de prisão 
 preventiva. Quanto a esta segunda questão, importa, desde já, precisar que o 
 acórdão recorrido seguiu, neste domínio, orientação já definida no Supremo 
 Tribunal de Justiça (acórdãos de 8 de Janeiro e de 15 de Dezembro de 1998, 
 citados nessa decisão, a que se pode acrescentar, no mesmo sentido, o recente 
 acórdão de 20 de Setembro de 2006, proc. n.º 2321/06, disponível em 
 
 www.dgsi.pt/jstj), no sentido de que, uma vez que estão abolidas da prática 
 forense as fórmulas sacramentais, a validação judicial da realização da busca 
 
 “pode ser implícita, desde que se revele inequivocamente” [sublinhado 
 acrescentado], designadamente no despacho que valide a detenção e aplique a 
 medida de coacção de prisão preventiva. Os preceitos legais pertinentes para 
 suportar as interpretações normativas impugnadas são, assim, o n.º 5 do artigo 
 
 174.º (que – relativamente a buscas não domiciliárias efectuadas por órgão de 
 polícia criminal nos casos referidos na alínea a) do precedente n.º 4, isto é, 
 realizadas sem precedência de autorização judicial, por se tratar de caso, 
 entre outros, de criminalidade violenta e haver indícios da prática iminente de 
 crime que ponha em grave risco a vida ou a integridade de qualquer pessoa – 
 determina que a realização da diligência deve ser, sob pena de nulidade, 
 imediatamente comunicada ao juiz de instrução e por este apreciada em ordem à 
 sua validação) e a parte final do n.º 2 do artigo 177.º (que manda aplicar o 
 disposto no artigo 174.º, n.º 5, às buscas domiciliárias efectuadas por órgão de 
 polícia criminal na descrita situação), ambos do Código de Processo Penal (CPP), 
 surgindo como irrelevantes, como suportes das interpretações normativas 
 questionadas, os preceitos do n.º 2 e da alínea b) do n.º 4 do referido artigo 
 
 174.º.
 
  
 
                                                2.2. Justifica‑se ainda uma 
 segunda nota prévia, no sentido de consignar que, como tem sido repetidamente 
 afirmado, não compete ao Tribunal Constitucional apreciar a correcção da 
 interpretação do direito infraconstitucional operada pelos tribunais recorridos, 
 mas tão‑só averiguar se a interpretação normativa adoptada na decisão impugnada 
 
 – interpretação que é tida como um dado da questão de constitucionalidade que o 
 Tribunal Constitucional tem de decidir – se mostra, ou não, conforme com as 
 normas e os princípios constitucionais.
 
                                                Isto é: não cabe ao Tribunal 
 Constitucional pronunciar‑se sobre a correcção da interpretação dada no acórdão 
 ora recorrido ao disposto no n.º 5 do artigo 174.º, aplicável por força da parte 
 final do n.º 2 do artigo 177.º, ambos do CPP, que determina que – sendo a busca 
 domiciliária realizada, em inquérito, por órgão de polícia criminal, sem prévia 
 autorização judicial, por se tratar de caso de criminalidade violenta, havendo 
 fundados indícios da prática iminente de crime que ponha em grave risco a vida 
 ou a integridade de qualquer pessoa – a realização da diligência deve ser 
 imediatamente comunicada ao juiz de instrução e por este apreciada em ordem à 
 sua validação.
 
                                                Dito de outra forma: a questão 
 que o Tribunal Constitucional tem de decidir é se a Constituição é violada por 
 normas (sendo irrelevante, para este efeito, que elas resultem da directa 
 estatuição de preceitos legais ou que derivem de interpretações normativas 
 feitas pelos tribunais) que fixem em 48 horas, a contar da efectivação da busca, 
 o prazo para a mesma ser comunicada ao juiz de instrução e que permitam que a 
 decisão judicial de validação da busca resulte, de forma implícita, desde que 
 inequívoca, da decisão de validação da detenção do arguido e de fixação da 
 medida de coacção de prisão preventiva.
 
                                                Por outro lado, importa salientar 
 que a circunstância de o legislador ordinário ter regulado de certa forma o 
 regime das buscas, domiciliárias e não domiciliárias, procurando naturalmente 
 não desrespeitar a Constituição, não transforma essa regulação legal em padrão 
 de constitucionalidade, no sentido de que não seria constitucionalmente 
 admissível qualquer outra regulação ou qualquer interpretação da regulação 
 existente diferente da que o recorrente considera a correcta. Do que se trata é, 
 pois, de apurar se a interpretação do regime legal existente feita pela decisão 
 recorrida respeita as exigências constitucionais pertinentes.
 
  
 
                                                2.3. Como este Tribunal 
 Constitucional referiu no Acórdão n.º 452/89, “a inviolabilidade do domicílio a 
 que se refere o artigo 34.º da CRP exprime, numa área muito particular, a 
 garantia do direito à reserva da intimidade da vida privada e familiar, 
 genericamente afirmado no artigo 26.º, n.º 1, da CRP”, prosseguindo: “por isso 
 mesmo, tal garantia se não limita a proteger o domicílio, entendido este em 
 sentido estrito, no sentido civilístico de residência habitual; antes, e de 
 acordo com a interpretação que dela tradicionalmente é feita, tem uma dimensão 
 mais ampla, isto é, e mais especificamente, tem por objecto a habitação humana, 
 aquele espaço fechado e vedado a estranhos, onde, recatada e livremente, se 
 desenvolve toda uma série de condutas e procedimentos característicos da vida 
 privada e familiar” (cf., ainda, o Acórdão n.º 507/94, que julgou 
 inconstitucionais as normas dos artigos 174.º, n.º 4, alínea b), 177.º, n.º 2, e 
 
 178.º,  n.º 3, do CPP, na interpretação “de que a busca domiciliária em casa 
 habitada e as subsequentes apreensões efectuadas durante aquela diligência 
 podem ser realizadas por órgão de polícia criminal, desde que se verifique o 
 consentimento de quem, não sendo visado por tais diligências, tiver a 
 disponibilidade do lugar de habitação em que a busca seja efectuada”, por 
 entender não se poder prescindir “do consentimento de quem é visado pela medida 
 de busca domiciliária”, e que a decisão recorrida desconsiderara “a reserva de 
 intimidade privada do arguido” e repudiara “uma concepção de inviolabilidade de 
 domicílio que faz radicar tal direito ou garantia fundamental na personalidade 
 do ser humano visado por uma medida probatória”).
 
                                                Atenta a relevância do valor em 
 causa e a correspondente gravidade da sua ofensa, considera‑se 
 constitucionalmente imposto que a verificação da legitimidade desta ofensa, para 
 salvaguarda de outros valores ou interesses constitucionalmente tutelados, seja 
 sujeita a controlo judicial. Como se referiu no Acórdão n.º 114/95: “a 
 intervenção do juiz é exigida pela preocupação de controlar a legalidade da 
 diligência e, bem assim, garantir os direitos fundamentais dos cidadãos, no 
 caso, o direito à inviolabilidade do domicílio, o que, por outras palavras, vale 
 dizer ser a intervenção do juiz, in casu, de dimensão exclusivamente 
 garantística e não de valoração de provas” (cf., ainda, o Acórdão n.º 16/97, 
 que não julgou inconstitucionais as normas dos n.ºs 1 e 2 do artigo 176.º do 
 CPP, e o Acórdão n.º 297/2003, que reiterou a concepção da autorização judicial 
 da busca domiciliária como tendo “uma função, exclusiva ou dominantemente, 
 garantística, visando assegurar a tutela dos direitos constitucionais dos 
 arguidos”).
 
  
 
                                                2.4. Porém, como já se referiu – 
 e não vem questionado no presente recurso –, se a regra é que a efectivação de 
 buscas domiciliárias deva ser precedida de autorização ou de ordem judiciais, 
 situações existem em que é constitucionalmente legítima a efectivação da busca 
 domiciliária por órgãos de polícia criminal sem prévia autorização judicial, 
 designadamente nos casos de criminalidade violenta, quando haja fundados 
 indícios da prática iminente de crime que ponha em grave risco a vida ou a 
 integridade de qualquer pessoa, como ocorreu no presente caso.
 
                                                Na hipótese de efectivação de 
 busca domiciliária por órgão de polícia criminal sem prévia autorização 
 judicial, é sustentável que resulta do sistema de valores constitucionais, 
 embora não exista norma constitucional que explicitamente o imponha, a exigência 
 de um controlo judicial a posteriori, de natureza oficiosa. Isto é: não será 
 suficiente deixar à iniciativa do arguido (ou da pessoa visada com tal busca) 
 provocar a intervenção de um juiz para apurar o preenchimento das condições que, 
 no caso, determinaram a realização da busca sem se obter prévia autorização 
 judicial.
 
                                                Assim sendo, a resposta à questão 
 de constitucionalidade suscitada no presente recurso depende do juízo de 
 suficiência que, face à razão de ser da exigência de controlo judicial a 
 posteriori, mereçam, ou não, as interpretações normativas questionadas. O que 
 cumpre apurar é, assim, se o entendimento de que a comunicação da efectivação da 
 busca pode ser feita no prazo de 48 horas e de que a sua validação judicial pode 
 decorrer de forma implícita, desde que inequívoca, satisfazem os objectivos 
 constitucionais que se entendem impor o controlo judicial a posteriori de 
 buscas não previamente autorizada [No sentido de que a exigência de comunicação 
 e validação judicial posterior à diligência só vale para os casos da alínea a) 
 do n.º 4 do artigo 174.º do CPP, e já não para os da alínea b) – que pressupõem 
 o consentimento do visado – cf. Ana Luísa Pinto, “Aspectos problemáticos da 
 reserva do regime das buscas domiciliárias”, Revista Portuguesa de Ciência 
 Criminal, ano 15, n.º 3, Julho‑Setembro 2005, pp. 415‑456, em especial pp. 
 
 443‑445].
 
                                                A resposta a ambas as questões é 
 claramente afirmativa.
 
  
 
                                                2.4.1. O prazo de 48 horas não se 
 afigura excessivo, desde logo por comparação com o prazo de apresentação de 
 arguidos detidos sem ordem judicial, em que está em causa a violação de um bem – 
 a liberdade das pessoas – seguramente não inferior ao da inviolabilidade do 
 domicílio.
 
                                                No Acórdão n.º 192/2001, em 
 recurso de decisão que, após reconhecer verificar‑se uma nulidade por falta de 
 apreciação/validação imediata das buscas (no caso, não domiciliárias), 
 considerou sanável a referida nulidade, decidindo que ao abrigo do artigo 122.º 
 do CPP deveria “agora ser praticado o acto omitido”, o Tribunal Constitucional 
 não julgou inconstitucionais as normas conjugadas dos artigos 251.º, 174.º, n.º 
 
 5, e 122.º do CPP, interpretadas no sentido de permitir a sanação da nulidade 
 por falta de validação imediata da busca efectuada com a validação a posteriori 
 da mesma busca. O Tribunal considerou que “a sanação a posteriori da nulidade 
 não se configura com uma solução arbitrária e desrazoável, ou seja, como um meio 
 legal restritivo desproporcionado ou excessivo em relação aos fins 
 prosseguidos”. Reconhecendo que “até à validação da busca e podendo, 
 entretanto, prosseguir a investigação com base nos resultados dessa diligência, 
 existe um momento de incerteza sobre a verificação dos pressupostos legais da 
 mesma diligência, com o aparente risco de vir a ser proferida uma decisão de não 
 validação quando aqueles resultados já proporcionaram a obtenção de outras 
 provas”, entendeu‑se, porém, que “mesmo neste caso – de hipotética não validação 
 
 – o (…) regime estabelecido no artigo 122.º do CPP assegura que os actos 
 subsequentes sejam declarados inválidos se dependerem do acto que não obtém a 
 necessária validação”, e sendo certo que a outra hipótese – a da validação em 
 acto ulterior – “nunca porá em causa as garantias de defesa do arguido”.
 
                                                A comunicação da efectivação da 
 busca dentro do prazo de 48 horas (no presente caso, foi feita 41 horas e 30 
 minutos após a busca) não afecta a substancialidade do controlo judicial a 
 posteriori que se teve por constitucionalmente devido, sendo certo que, como se 
 referiu no Acórdão n.º 192/2001, o risco de se terem entretanto colhido provas 
 só possíveis por causa de uma busca que venha a ser considerada inválida é 
 satisfatoriamente neutralizado graças ao regime do artigo 122.º do CPP, que 
 estende a invalidade da busca aos actos dela dependentes.
 
  
 
                                                2.4.2. E, por outro lado, embora 
 se possa considerar que seria “melhor direito” a exigência de uma pronúncia 
 judicial autónoma e expressa sobre a validação da busca, entende‑se que a 
 validação implícita, desde que inequívoca, satisfaz capazmente os objectivos 
 constitucionais: confirmar que estavam preenchidos os requisitos que permitiam a 
 busca sem dependência de prévia autorização judicial.
 
                                                No presente caso, resulta 
 patentemente do despacho que validou a detenção do recorrente e lhe aplicou a 
 medida de coacção de prisão preventiva que foram considerados validamente 
 obtidos e processualmente atendíveis os meios de prova obtidos na própria busca 
 e na actuação investigatória subsequente do órgão de polícia criminal, pelo que 
 constitui um pressuposto necessário destes juízos o entendimento de que a busca 
 foi validamente efectuada. O controlo judicial a posteriori da validade da 
 busca, constitucionalmente imposto, foi assim efectivamente efectuado, sendo 
 destituída de fundamento a pretensão de, pela circunstância de não terem sido 
 usadas fórmulas expressas, se considerar inexistente esse controlo. Ao que 
 acresce que o juízo sobre a validade da busca, implícita mas inequivocamente 
 manifestado no referido despacho, veio posteriormente a ser reafirmado, agora 
 de forma explícita, quer no despacho que indeferiu a arguição de nulidade, quer 
 no acórdão (ora recorrido) que negou provimento ao recurso interposto deste 
 
 último despacho.
 
  
 
                                                3. Decisão
 
                                                Em face do exposto, acorda‑se em:
 
                                                a) Não julgar inconstitucionais 
 as normas constantes do n.º 5 do artigo 174.º e da parte final do n.º 2 do 
 artigo 177.º do Código de Processo Penal, interpretadas no sentido de que, 
 efectuada busca domiciliária por órgão de polícia criminal sem precedência de 
 autorização judicial, por se tratar de caso de criminalidade violenta e haver 
 indícios da prática iminente de crime que ponha em grave risco a vida ou a 
 integridade de qualquer pessoa, é de 48 horas o prazo para a comunicação ao 
 juiz de instrução da efectivação da busca e a decisão judicial da sua 
 validação pode resultar, de forma implícita, desde que inequívoca, da decisão 
 de validação da detenção do arguido e de fixação da medida de coacção de prisão 
 preventiva; e, consequentemente,
 
                                                b) Negar provimento ao recurso, 
 confirmando a decisão recorrida, na parte impugnada.
 
                                                Custas pelo recorrente, 
 fixando‑se a taxa de justiça em 20 (vinte) unidades de conta.
 Lisboa, 2 de Maio de 2007.
 Mário José de Araújo Torres 
 Benjamim Silva Rodrigues
 João Cura Mariano
 Rui Carlos Pereira
 Rui Manuel Moura Ramos